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Capítulo I – VIRTUOSIDADE ORGANIZACIONAL

3. Consequências da virtuosidade organizacional

3.2 Efeitos amortecedores e amplificadores

Numa perspectiva individual, a virtuosidade funciona como agente amortecedor contra a disfunção e a doença, reduz as consequências negativas do trauma pessoal e favorece a recuperação dos sistemas cardiovascular, emocional e intelectual daqueles que vivem comportamentos virtuosos (Fredrickson, Mancuso, Branigan & Tugdade, 2000). A experiência da virtuosidade diminui ainda a probabilidade de problemas psicológicos e conduz a comportamentos menos destrutivos face a situações adversas (Seligman & Csikszentmihalyi, 2000). Se olharmos para o efeito amplificador, verificamos que os indivíduos que trabalham em ambientes virtuosos tendem a ser mais saudáveis do ponto de vista físico e mental (Ryff & Singer, 1998), mais criativos (George, 1998) e a tomar decisões de maior qualidade (Staw & Barsade, 1993).

Por conseguinte, as razões que justificam que a virtuosidade deve ser reconhecida, encorajada e legitimada no seio das organizações, podem ser agrupadas em dois grandes tipos:

(1) Efeitos amortecedores, preventivos ou protectores. A virtuosidade organizacional amortece/previne os efeitos de contextos, atitudes, sentimentos e comportamentos negativos. O amortecimento é entendido como “a capacidade para absorver choques do sistema, para recuperar de algo, para sarar relações e para colaborar” (Bright et al., 2006, p. 260). A virtuosidade funciona então como um agente amortecedor na medida em que protege, inocula e cria resistência, permitindo que a organização recupere rapidamente (Gittell & Cameron, 2003). Virtudes como a coragem, a esperança, o optimismo, a integridade, o perdão, a confiança e a compaixão são importantes na prevenção do comportamento disfuncional (Cameron et al., 2004). Vários estudos advogam que as acções virtuosas aumentam a resistência ou a capacidade de absorver ameaças, assim como a recuperação na adversidade (Fredrickson et al., 2000; Norman et al., 2005). Tal sucede “devido à presença de maior quantidade de capital social e ao facto de a coordenação e a interacção serem mais fáceis” (Cunha et al., 2007, p. 421). Por exemplo, o downsizing destrói o capital social pela quebra do contrato psicológico e pelo enfraquecimento da “cola” que une os indivíduos uns aos outros e à organização (Cameron, 2003). Bright et al. (2006) demonstraram que adoptar a virtuosidade durante tempos prósperos amortece os efeitos negativos aquando do downsizing nas organizações, através do aumento da solidariedade, resiliência e sentido de eficácia. A virtuosidade pode assim servir como “antídoto” à tendência para a dissolução fomentada pelo downsizing (Cameron, 2003).

(2) Efeitos amplificadores. A virtuosidade organizacional amplifica contextos, atitudes e comportamentos positivos. Ou seja, as demonstrações de virtuosidade nas organizações amplificam demonstrações adicionais de virtuosidade, uma vez que as acções virtuosas tendem a inspirar mais acções deste tipo, gerando uma escalada de efeitos positivos. Segundo Fredrickson (2003), a virtuosidade é “contagiosa”, ou seja, os indivíduos ao observarem actos virtuosos sentem-se inspirados por eles, tendendo a reproduzi-los. A virtuosidade em organizações generaliza-se na virtuosidade através das organizações, ou seja, uma única acção virtuosa em organizações potencia a criação de sistemas que aumentam a probabilidade de virtuosidade através das organizações. Este efeito de ampliação, ao expandir-se pela organização, pode tornar-se parte integrante da sua cultura (Cameron & Caza, 2002). O efeito amplificador da virtuosidade organizacional pode ser

explicado pela sua associação a três consequências: (a) emoções positivas, (b) capital social e (c) comportamento pró-social.

Emoções positivas. Vários autores relataram que a exposição a comportamentos virtuosos produz emoções positivas nos indivíduos que, por sua vez, conduzem a uma reprodução de virtuosidade e, consequentemente, a uma elevação do desempenho organizacional (Cameron et al., 2004; Fineman, 1999; Fredrickson, 1998; Rhee et al., 2003; Seligman, 2002). Segundo Staw e Barsade (1993), que testaram estudantes de MBA em simulações empresariais, é possível que o afecto positivo contribua para mais elevado desempenho organizacional. O desempenho organizacional elevado, por sua vez, cria orgulho na organização, prazer e satisfação no trabalho e favorece o surgimento de comportamentos mais prestáveis e respeitosos entre colegas. Esta espiral de auto-reforço conduz a mais comportamentos virtuosos, “quando os membros das organizações observam compaixão, experimentam gratidão ou testemunham perdão, começa um ciclo mutuamente reforçador” (Fineman, 1996, p. 545).

Desde os estudos de Hawthorne que se tem debatido na gestão e no comportamento organizacional, se os trabalhadores felizes são os mais produtivos (o popular Santo Graal da pesquisa organizacional; Landy, 1985 apud Wright & Quick, 2009a). Em suporte desta tese, um corpo crescente de pesquisa empírica tem encontrado ligações positivas entre o bem-estar psicológico dos trabalhadores e o seu desempenho (Quick & Quick, 2004; Wright & Cropanzano, 2004). Wright e Cropanzano (2004) sugeriram que a felicidade, tradicionalmente considerada como a satisfação com a vida, pode ser conceptualizada como “bem-estar psicológico” ou “bem-estar emocional”, sendo geralmente aceite como “um julgamento subjectivo e global que alguém experimenta com bastante emoção positiva e reduzida emoção negativa” (p. 341). Argumentaram ainda, que a felicidade é uma valiosa ferramenta para maximizar a melhoria pessoal e a performance no trabalho, e deriva de diversos factores entre os quais destacamos as experiências de trabalho significativas (Sandage & Hill, 2001). Uma pesquisa envolvendo estudantes de MBA concluiu que os participantes com níveis de bem-estar superiores mostravam ser melhores decisores, exibiam melhor comportamento interpessoal e recebiam avaliações de desempenho superiores (Wright & Cropanzano, 2004). Bright e colegas (2006) sugeriram

que a relação entre a virtuosidade organizacional e as emoções também se estende a experiências negativas, como por exemplo, o downsizing. Rhee et al. (2003) sugeriram que a percepção de acções organizacionais virtuosas, em resposta à tragédia do 11 de Setembro, aumentou as emoções positivas dos membros.

Para além do efeito amplificador da virtuosidade associado às emoções positivas, é também aqui possível vislumbrar-se um efeito amortecedor. Fredrickson (2003), na sua teoria broaden-and-build, demonstrou que as emoções positivas conduzem a estados da mente e formas de comportamento que, indirectamente, preparam o indivíduo para situações severas ou acontecimentos negativos, aumentando a sua resiliência. Ou seja, as emoções positivas “desfazem” os efeitos duradouros das emoções negativas.8 Estas alargam o estado mental momentâneo do indivíduo e, ao fazê-lo, ajudam a construir recursos pessoais duradouros. A autora colocou em hipótese que tal “alargamento” possibilita a construção de relações sociais mais fortes, melhores climas organizacionais e resultados extraordinários. Defendeu ainda esforços para cultivar emoções positivas para que as organizações evitem a estagnação, e alcancem harmonia, energia e prosperidade.

Capital social. O efeito amplificador da virtuosidade pode ainda ser explicado pela sua associação à formação de capital social (Baker, 2000), que se refere às relações entre os indivíduos, através das quais flui informação, influência e recursos. As consequências que derivam de elevados níveis de capital social são a redução dos custos de transacção, a facilidade de comunicação e cooperação, o aumento do empenhamento e da lealdade, o fortalecimento das relações, a aprendizagem individual e, em última instância, o aumento do desempenho organizacional (Adler & Kwon, 2002).

Naturalmente, uma organização funcionará melhor se os seus membros se conhecerem bem, estiverem informados, sentirem confiança e positividade na sua relação com os outros (Bolino et al., 2002). Por outro lado, observar acções virtuosas cria um sentido de

8 Esta questão foi examinada quando se provocou ansiedade a um grupo de participantes, pedindo-lhes que preparassem um discurso com a pressão de um prazo, sob a avaliação dos pares. Após terem conhecimento que, afinal, não teriam de entregar os discursos, apresentou-se-lhes um de três filmes que incitavam o divertimento, a ausência de emoção ou a tristeza. Ao avaliar a actividade cardiovascular dos participantes detectou-se que as emoções positivas permitiram uma recuperação mais rápida, trazendo os participantes para a mesma situação em que estavam antes de serem submetidos à ansiedade. Assim, as emoções positivas tiveram um efeito claro e coerente, desfazendo as repercussões cardiovasculares das emoções negativas (Fredrickson, 2003).

união e atracção para com o actor virtuoso, o que ajuda os membros de uma organização a experimentarem um forte desejo de se unirem e construírem a partir das acções dos outros (Cameron, 2003). Segundo Rego e Cunha (2009), “os actos de virtuosidade facilitam a comunicação, promovem a confiança e a aprendizagem mútua, e fomentam a cooperação, o espírito de equipa e os actos de entreajuda – contribuindo para o desenvolvimentos do capital social na organização” (p. 160). O efeito amplificador de observar acções virtuosas cria uma tendência que se reforça a si mesma face a uma maior virtuosidade (espirais de acções virtuosas) conduzindo, potencialmente, a relacionamentos mais fortes que traçam o capital social nas organizações (Bright et al., 2006).

Comportamento pró-social. A virtuosidade organizacional também promove o comportamento pró-social, que ocorre quando os indivíduos se comportam de um modo que beneficia terceiros. De uma forma geral, assume-se que um indivíduo é motivado por uma relação de troca, reciprocidade e equidade (McNeeley & Meligno, 1994). Porém, estudos realizados no âmbito da virtuosidade defendem que os indivíduos agem com uma motivação intrínseca, ou seja, são mais prestáveis por predisposição genética (Krebs, 1987) ou depois de terem sido induzidos a sentir emoções positivas através de condições virtuosas (Isen, 1987).

Segundo Cialdini (2000), quando se observam comportamentos exemplares ou morais, a tendência é seguir o exemplo. Então, observar e experimentar virtuosidade organizacional desbloqueia a predisposição para ajudar os outros, conduzindo ao comportamento pró- social. Em suma, as acções virtuosas tendem a inspirar mais comportamentos deste tipo demonstrando o efeito amplificador da virtuosidade organizacional.