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Empreendedorismo em Portugal

Depois de definidos os parâmetros identitários do conceito de empreendedorismo, prosseguimos a caracterizar o fenómeno a nível nacional.

Num primeiro momento faremos uma retrospetiva à evolução do mercado laboral de forma a contextualizar o fenómeno do empreendedorismo na realidade portuguesa. Tal como sublinha Casaca (2008) Portugal não usufruiu da era designada pelos ‘trinta anos gloriosos’, pelo que somente após a revolução do abril de 1974 se debutam um conjunto de reformas em torno da problemática do emprego. O sociólogo Estanque (2009) complementa o painel histórico rebuscando que de há dois séculos passados, a sociedade mudou profundamente e com ela também o mercado laboral, que continua a ser um pilar central no século XXI. O trabalho sofreu nas últimas décadas metamorfoses profundas, surgindo por consequência necessidade de alterar as categorias de análise para a compreensão dos novos conceitos que emergem. O mecanicismo deu lugar ao humanitarismo e por conseguinte, a inclusão cada vez mais profícua das mulheres na atividade

42A este propósito iremos relacionar com a importância das práticas de responsabilidade social e a importância dos e das trabalhadoras para complementar as inovações e renovações das atividades, onde todos colaborem criativamente, assunto a desenvolver no ponto quatro deste capítulo, assim como ao longo do tratamento do conteúdo empírico.

laboral remunerada veio alterar paradigmas sociais. A teoria de ação fundamentada por Touraine (2005) ocupa agora o lugar do modelo de sistemas parsianos (Parsons, 1951).

À procura de elementos que nos reconheçam esta evolução no contexto português revisitamos os anos noventa, através da investigação de Freire (1995). Deparamo-nos com índices que revelam que a idade dos trabalhadores e das trabalhadoras independentes era alta, muitas das atividades eram familiares e ou transmitidas entre gerações e que as mulheres estariam em minoria na autocriação de emprego, conforme reforça o autor “Será, pois, mais correcto falar-se de uma feminização mitigada do grupo dos independentes

em Portugal, nos anos 80 (…)” (Freire, 1995, p. 35). Na continuação, o autor afere que a atividade com

maior percentagem de independentes na época seria a agricultura e o comércio. Os valores mais elevados da taxa de autoemprego encontravam-se nas regiões Centro, Alentejo e Algarve. “Quanto à escolaridade, a

maioria (54%) frequentou apenas o ensino primário (…)” (Freire, 1995, p. 57). Fernandes (2011) realizou

um estudo similar mais recente, baseando-se num correlato de elementos de pesquisa. A sua tese, apesar de limitar-se ao género feminino enquanto objeto de estudo e de se distanciar em pouco mais de uma década do trabalho de Freire, encontra residuais similitudes com os resultados deste último. Na sua amostragem, Fernandes (2011) regista também o vínculo familiar nas atividades empresariais, assim como a idade média das trabalhadoras considera-se alta atendendo à idade ativa dos quadros de emprego43, situando-se na moda estatística dos quarenta e quatro anos. Já no que diz respeito às habilitações, Fernandes encontra que a maioria possui um grau académico, contrariando assim os resultados obtidos há mais de uma década por Freire (1995).

Importa verificarmos a representatividade empresarial em Portugal. No relatório global mais recente do GEM (2017a), Portugal registou uma Taxa TEA (Total Entrepeneurial Activity) de 7,7%, i.e., existem entre 7 a 8 empreendedores e empreendedoras early-stage44 por cada 100 indivíduos em idade adulta. Sabe-se que esta mesma taxa ocupava em 2015 (GEM, 2015d) a 44º posição no universo de 69 países, sendo porém a 7ª mais baixa das 24 economias orientadas para a inovação. Os setores onde se regista maior percentagem de empreendedores são os que estão orientados para o consumidor final, i.e., o setor terciário (comércio e serviços). Sabe-se ainda que o número de empreendedores early-stage em Portugal correspondia a 9,2% da população do sexo masculino e a 6,1% da população adulta do sexo feminino. Em relação a estes últimos elementos comparados a anos anteriores, os estudos apontam para um aumento progressivo do equilíbrio entre o número de homens e mulheres envolvidos em atividades empreendedoras (GEM, 2015e).

Não obstante, preocupa-nos analisar o padrão da anémica ação empreendedora em Portugal. Questionamo-nos se terá influências de condições estruturais ou por outro lado, se enraíza nas motivações do e da agente, ou ainda em ambos os casos. Abordemos nesta continuidade as características estruturais que favorecem ou colocam entraves às ações empreendedoras no cenário português. Um estudo basilar,

43Os indicadores estatísticos determinam o conceito de população em idade ativa entre os quinze e sessenta e quatro anos (INE, 2017).

44Indivíduos envolvidos atividades em fase inicial. Para além deste grupo, importa identificar um outro: o Later Stage Plan - empresas com três ou mais anos e em fase de desenvolvimento, necessitando de introdução de modelos de sustentabilidade, as quais pretendemos pesquisar com prioridade. Entendemos que não é somente na fase de arranque que um empreendimento deve ser analisado, mas sobretudo no seu estágio de desenvolvimento e cumulação de experiências, recolhidas em número e trabalhadas qualitativamente como conhecimento relevante para validação científica.

desta feita de carácter mais qualitativo, realizado pelo GEM (2015d) a um conjunto de trinta e oito especialistas45 em empreendedorismo em Portugal, destaca como aspeto positivo a generalidade das infraestruturas existentes no país, entendendo como um factor facilitador à criação de empreendedorismo. Como infraestruturas designamos, para além de armazéns industriais, escritórios, lojas, entre outros espaços, as incubadoras. A primeira incubadora surge em Portugal em 1987 sob incentivo da União Europeia46. A incubadora tem como função alojar gratuitamente, ou por um montante inferior ao praticado no mercado circundante, uma empresa early stage, bem como prestar apoio a variados níveis, durante o seu período de incubação, i.e., adaptação e inserção nos mercados, o qual se encontra parametrizado na economia global pelos primeiros três anos de atividade. Muito embora não existindo respostas em todos os locais do território português, o número de incubadoras e espaços de coworking47 têm vindo a crescer para acolher empresas em early-Stage e spin-offs universitárias. Não podemos também deixar de elencar aqui o conceito mainstream de Start-up, ações que nascem precisamente com propósitos inovadores, ou com pretensão de introduzir novos engajamentos nas empresas já existentes, tendo em conta a evolução dos mercados globais. Posicionam-se estrategicamente para surpreender mercados, muito embora possam ter um funcionamento disruptivo, i.e., um tempo curto de duração (Innoskills, 2017). A par disso – e não contemplando aqui as vastas associações privadas – Portugal dispõe de um conjunto de entidades públicas coordenadas para dar suporte nas variadas instâncias, i.e., para albergar candidaturas de apoio para instalação e ou expansão de ações empreendedoras, assim como para apoiar internacionalização, inovação e crescimento de atividades existentes, que hajam de acordo com o planeamento global Horizonte202048, e.g. IAPMEI49, EEN50, AICEP51, entre as demais que possam constar e que estejam omissos nesta exposição e inclusive na bibliografia apresentada.

45Alejandro Pan (Departamento de Tecnologia do Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia- INL); António Cunha (Universidade do Minho); António Teixeira (Inova-Ria); Carlos Barbot (BARBOT, SA); Carlos Brito (Universidade do Porto); Dana Redford (Plataforma para a Educação do Empreendedorismo em Portugal); Emídio Gomes (Portus Park – Rede de parques de ciência, tecnologia e incubadoras); Fernando Costa Lima (Banco BPI); Filipe Castro Soeiro (Universidade Nova de Lisboa); Francisco Banha (Gesbanha, S.A.); Francisco Maria Balsemão (Associação Nacional de Jovens Empresários); Gonçalo Amorim (ISCTE-IUL); Inês Santos Silva (Start-up Pirates); João Luís Sousa (Vida Económica); José Trigo da Roza (APBA – Associação Portuguesa de Business Angels); Joaquim Borges Gouveia (Universidade de Aveiro); José Eduardo Carvalho (AIP – Associação Industrial Portuguesa); José Martins (NET, S.A., Business Innovation Center do Porto); José Paulo Rainho (Universidade de Aveiro); Luís Manuel Barata (Millenium BCP); Luís Mira Amaral (Banco BIC); Luís Laginha de Sousa (NYSE Euronext Lisbon); Manuel Laranja (Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa); Maria José Madeira Silva (Universidade da Beira Interior); Mário Rui Silva (Universidade do Porto); Miguel Barbot (Velo Culture); Miguel Lopes (ISCTE-IUL); Miguel Pina Martins (Science4you, S.A.); Nélson Ramalho (ISCTE –IUL); Nuno Gomes (Exatronic); Paulo Andrez (FNABA – Federação Nacional de Associações de Business Angels); Pedro Falcão (Novabase, S.A.); Pedro Félix (NERSANT); Pedro Reis (Grupo Visabeira); Rodrigo Brum (Imprensa Nacional Casa da Moeda); Rui Barros (Bioinstrument, S.A.); Victor Cardial (Creative Wings, SGPS); Vítor Verdelho Vieira (Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa).

46Recurso internáutico http://pme.pt/incubadoras-empresas-portugal/ [27 March 2017].

47Espaços comuns propiciados pelas universidades para a criação de ideias empreendedoras e para apoiar o seu desenvolvimento no mercado.

48Conjunto de medidas de apoio orientadas para o crescimento e a empregabilidade nos países afetos à união europeia. Independentemente de quaisquer crispações políticas plasmadas pelos media e por oposições parlamentares, assim como acontecimentos posteriores à realização deste trabalho, Portugal usufrui atualmente de um programa específico ao seu contexto –Portugal2020- no qual se dota de um programa de financiamento para apoiar projetos que fomentem crescimento e desenvolvimento ao país, que, isoladamente, não recolhia condições de se autofinanciar, face à fraca produtividade do setor público e privado.

49Agência para a Competitividade e Inovação que tem como missão promover a competitividade das empresas e o crescimento económico em Portugal.

50Entreprise Europe Network, entidade internacional que cruza informações com as vastas entidades no sentido de promover o mercado livre e a cooperação internacional entre empresas.

51Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, vocacionada para o desenvolvimento de políticas de exportação, tendo em conta a necessidade de globalização da economia portuguesa.

O empreendedorismo é sinónimo de liberdade, mas também de responsabilidade. Sem embargo, os aspetos desfavoráveis têm aqui que ser elencados. Perante o acervo explorado (entrevistas aos e às especialistas), sublinham-se as imposições fiscais, sobretudo quando se inicia uma atividade, i.e., antes de obtermos qualquer proveito ou lucro já estamos sujeitos a cumprir pagamentos taxativos obrigatórios por lei52. Esta mesma realidade é defrontada por muitos e muitas comentadoras da temática, quer a título científico quer a título empírico. Fernandes, Campos e Silva vêm reforçar a contingência assumindo que

“Muitas dificuldades são impostas a quem abre seu próprio negócio, independente de gênero.”(Fernandes,

Campos e Silva, 2013, p. 7). As personalidades interpeladas pelo GEM (2015d), já aqui citadas, apontam ainda as barreiras existentes quando o assunto é financiar as empresas. Outro precedente diz respeito à educação e formação para empreender, que, no nosso país tende a ser parcialmente insuficiente. Os e as especialistas defendem que a relutância observada no ato de empreender encontra-se enraizada nas normas culturais e sociais, ou seja, na estrutura social portuguesa. Consideram que a cultura nacional está pouco orientada para o empreendedorismo, e que, para além da existência de um excesso de burocracia e de carga fiscal, a sociedade padece de uma falta de estímulo ao êxito individual.

Para além da pesada carga fiscal, os e as especialistas entrevistadas (Thompson, Sarkar, Costa, Assunção, Amich, Valls, Blanco) apontam a existência de uma obstrução cultural, que se manifesta num abstrato temor ao fracasso. O receio de empreender, o medo de falhar, a aversão ao risco, são sentimentos que influenciam o comportamento dos e das agentes. Tal postura resulta muitas vezes em inatividade, bloqueando a iniciativa empreendedora e não permitindo assim testar muitas das ideias criativas que poderiam acrescentar valor social e económico ao país. Na mesma linha, Amorim (2013) confirma que “(…)

em Portugal, existe um estigma enorme relativamente ao insucesso (…) que, de certo modo, acabam por inibir o empreendedorismo” (2013, p. 3). Todavia, poderá não ser um problema exclusivamente português

como a priori se quer transparecer. Na pretensão de complementar este entorno acerca do conceito de ‘temor’, entendemos ser necessário ampliar o nosso ângulo de visão. Desta forma e em contexto de investigação empírica, realizamos duas viagens à cidade de Barcelona53 em dois momentos distintos – dezembro de 2015 e abril de 2016. No primeiro momento, permanecemos durante nove dias na localidade, o que nos permitiu o contacto com entidades-chave, e.g., Institut de Emprenedoria de Universidad de Barcelona; Faculdad de Economia e Negócios de Universidad de Barcelona; serviços agrupados da entidade Barcelona Activa – Ajuntamento de Barcelona: Escola de Donas Empreenedoras, Barcelona Institut de Emprenedoria e Barcelona Treball. Na qualidade de observadora, assistimos e participamos em cursos e eventos54.

52Nomeadamente, assim que se constitui uma empresa, esta fica sujeita ao pagamento de um TOC –Técnico Oficial de Contas, a efetuar descontos para a segurança social sobre salários muitas vezes ainda não auferidos, a efetuar pagamento de taxas regulamentares específicas a determinadas atividades, entre outras imposições que dificultam uma fase de arranque de um negócio.

53Barcelona é considerada a cidade empreendedora na vizinha Espanha, tendo um conjunto de entidades-chave que fomentam a prática na população (EU, 2011).

54Assistimos à International Conference /Innovation, Creativity and Culture: outline of a new socio-economic post-crisis model for cities and regions, organizado pela Faculdade de Economia e Negócios da Universidade de Barcelona; participamos na ação-formação ‘Autoconeixment: Descobreix els teus interessos Professionals, organizada por Barcelona Activa; participamos no Seminário de Especialização ‘Com Afrontar amb Éxit situacions on la comunicació és difícil’, organizado por Barcelona Activa; participamos ni curso de desenvolvimento competencial ‘Planifica’t i Organiza’t Eficaçment, organizado por Barcelona Activa; assistimos à Sessió Informativa d’Emprenedoria, organizada por Barcelona Activa; participamos na ação de formação ‘Elevador Pitch: com Presentar el teu projecte en 3 minutes, organizado por

No segundo momento, para além da contínua observação na comunidade, aprofundamos o contacto com as entrevistas a especialistas realizadas presencialmente a Valls e Blanco - aqui já citadas. A par da exploração em Barcelona, participamos ainda no II Encuentro Luso-Andalus de Empresários Portugal- Espanha–Marrocos, organizado pela PRODETUR e realizado Sevilha. Esclarecemos o quão importante foi o confronto da temática com o território vizinho. Observamos sobretudo junto das ações promovidas pelo Ajuntamento de Barcelona, uma população (maioria de pessoas desempregadas que recorrem a esta entidade ou que pretendem encetar uma atividade própria) manifestamente temerosa55, uma vez que se detetou uma indefinição global de objetivos de vida e uma incerteza perante o trabalho. Blanco (em entrevista) anui que a problemática de aversão ao risco se encontra presente na realidade espanhola, sobretudo mais saliente no sexo feminino.

Face à análise exposta, entendemos denominar este obstáculo de agência por ‘temor ibérico’. Doravante, este conceito operatório irá servir-nos para avaliar o discurso das entrevistadas e aferir elementos mensuráveis que identifiquem se este fator se encontra presente e condiciona ou não estas mulheres.

Em entrevista, Rufino apela à conscientização de que as ações se geram por tentativas e erros, num contínuo processo que construímos e em que nos (re)construímos nessa mesma construção, enquanto postulado teórico (Argento, 2012). De acordo com o relatório GEM (2015d), em Portugal 48,2% da população considera existir boas oportunidades para iniciar uma atividade no país, embora 30,9% destes respondentes sejam demovidos por medo do insucesso. Mas afinal o que é o sucesso e o tão aclamado êxito? Rufino não se atreve a exemplificar. Para a investigadora tal mede-se com o progresso, o caminho e o cumprimento dos objetivos almejados, adiantando que o conceito de sucesso só poderá ser avaliável a médio e longo prazo. Perante esta premissa, se o empreendedor não avança devido a um temor cultural, como pode chegar à fase de avaliar o seu êxito, quer pessoal, quer profissional?

Sarkar (2010) predica como solução as boas práticas de outros países, e.g. Suíça, Suécia, Finlândia, os quais são entendidos na literatura estatística como economias fortes, resultantes de longa tradição de valores clássicos liberais. Governos limitados e descentralizados colocam a tónica na agência, no respeito pela propriedade privada e na capacidade de criação humana. Nestes países ser empreendedor ou empreendedora é um estatuto desejável, respeitável na sociedade (Badenhausen, 2017). Podemos aventar que se apresenta como um estatuto social de topo, almejado pela maior parte dos habitantes da Suécia. Já em Portugal, a realidade é outra e existe um certo temor em relação à falha que aqui tomamos como aprendizagem. Neste país adota-se o entendimento que ser empreendedor ou empreendedora só é bom sinal quando tudo corre bem, mas até lá existe um longo caminho a percorrer.

Inúmeras causas podem justificar o atraso de Portugal face a outros países, já coexistindo esta discrepância, sobretudo europeísta, desde longa data na história – criticada por orfeístas, pela geração de

Barcelona Activa e na ação ‘Comunicación para Emprendedores’, organizada pela Faculdade de Economia e Empresa da Universidade de Barcelona.

55Enquanto investigadores, é com surpresa que recolhemos estes resultados na voz de especialisas nesta região, uma vez que especulávamos encontrar uma população mais intrépida na ação empreendedora, sendo Espanha um país com maior número de empresas em relação a Portugal.

70, por coimbrãs, por renascentistas e por muitos outros literatos dos antepassados (Vieira, 2015) – que, por razões culturais, educativas, geográficas, fracos recursos económicos ou fracos recursos tecnológicos e industriais, nos levam a estes baixos patamares estatísticos. No ranking do GEM (2015), Portugal ainda se encontra abaixo do nível expectável. O complexo de inferioridade sentido nos antepassados da sociedade portuguesa e tão bem figurado no clássico literário de Eça de Queiroz (Queiroz, 2016), aloca-se na perfeição a esta nova praxeologia no trabalho, i.e., o ‘temor ibérico’ elencado como barreira ao empreendedorismo, constitui não só um entrave ao agente, mas também um bloqueio à estrutura que deste modo não acompanha os desideratos da globalização, bem como a proposta de crescimento do país.

Filion (2003) apresenta-nos um roteiro de boas práticas para despertar o crescimento endógeno e de igual modo espelhar uma cultura empreendedora, cuidando que muitas das quais se podem implementar a baixos custos, e.g., a educação, as incubadoras e centros de apoio, o desenvolvimento de spin-offs, o agrupamento de clusters por tipologia de atividade, o engajamento de parceiros institucionais e sociais, o reforço no apoio a grupos tendencialmente desfavorecidos – jovens, mulheres e desempregados, a legislação favorável aos mercados, as jornadas de empreendedorismo, o papel renovado do líder político e a instalação de agências especializadas. Não obstante, o autor (Filion, 2003) alerta-nos que os resultados não são tangíveis a curto prazo e dependem, pois, da natureza e intensidade da implementação das sugestivas práticas.

Respeitante à categorização da empresarialidade existente em Portugal e segundo publicações do INE (2015a), verificamos que a maior parte das empresas existentes são microempresas, o que corresponde a pequenas atividades de subsistência e com fraca probabilidade de crescimento. Das empresas constituídas em Portugal à data desta recolha, totalizamos um universo de 1.119.447. Destas 96,23% categorizam-se como Micro, 3,17% como Pequenas, 0,51% como Médias e apenas 0,09% como Grandes empresas. Classificam- se ainda micro, pequenas e medias empresas como PME56.

Em termos demográficos a maioria das empresas concentram-se no norte do país e em seguida na zona de Lisboa. Os arquipélagos contam com o menor número de empresas e no continente destaca-se a região do Algarve com apenas 55.449 empresas (INE, 2015a). Verificamos que estes dados já vêm refutar os resultados obtidos nos anos noventa do século XX pelo estudo de Freire (1995), uma vez que as mais elevadas taxas de autoemprego se concentravam nas regiões Centro, Alentejo e Algarve.

Nas assimetrias de um país apelidado de periférico (Sousa Santos, 2012), focamos atenções sobre a periferia de outra periferia, i.e., a região do Algarve. Perante os cenários racionados, prevemos aqui encontrar em maior número o microempreendedorismo57. Não obstante, é Portela et al (2006) quem nos

56A definição de PME – Pequenas e Médias Empresas é atribuída pela Recomendação europeia 2003/361/CE (www.entrepriseeuropenetwork.pt, acedido a 20 de novembro de 2017). A categorização do tipo de empresa varia consoante o volume de negócios e o número de empregados. Através do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação e de acordo com o DL 372/2007 de 6 de novembro, classifica-se uma microempresa por ter até 10 trabalhadores e um volume de negócios igual ou inferior a 2 milhões de euros, uma pequena empresa por ter até 50 trabalhadores e um volume de negócios igual ou inferior a 10 milhões de euros, uma média empresa por ter até 250 trabalhadores e um volume de negócio igual ou inferior a 250 milhões de euros e uma grande empresa é aquela que supera estas características (www.iapmei.pt, acedido a 20 de novembro de 2017).

57Ainda a respeito de microempreendedorismo não podemos deixar de frisar o contributo de Mohammad Yunus - Nasceu na Índia em 1940, é economista, banqueiro e um assumido filantrópico dedicado a problemas sociais. Em 2006 foi

reforça que este tipo de empreendedorismo revela a força dos e das agentes no modo de estruturar as suas vidas, dignifica pessoas e constrói futuros nas comunidades locais. Tomamos esta aceção como princípio axiológico desta investigação, entendendo neste quadro, mais importa agir do que esperar que determinada estrutura dite o nosso destino, postulando a teoria de ação presente à escolha racional. Perante as epistemes exploradas, os e as agentes têm o poder de escolher, de entre as opções com que se defrontam, a melhor ação a tomar.

Daqui emana a premência do empreendedorismo para desenvolver o mercado social e económico de um país, em resultância de factores de globalização. Conforme questiona Sarkar, “Mas, sem crescimento

económico significativo, onde vamos arranjar empregos para todos? Uma das soluções é a promoção do espírito de empreendedorismo e inovação.” (Sarkar, 2010, p. 19). Podemos aventar que o

empreendedorismo será uma prioridade aos dias de hoje, por esse motivo é essencial desenvolver a sua