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enContrando o eQuilíBrio entre o envolvimento e distanCiamento

ENVOlVIMENtO E DIStANcIAMENtO NA cONStRUÇãO DA PAz PRÓXIMA

3. enContrando o eQuilíBrio entre o envolvimento e distanCiamento

Neste ponto, em que pretendemos fazer a síntese possível das ideias soltas com as quais procuramos tecer uma certa visão sobre a paz próxima recorremos ao pensamento de Norbert Elias, em Distanciamento e Envolvimento (1997). Nessa obra, Elias enfatiza a importância de perante processos críticos nos distanciarmos o suficiente para reflectir e teorizar por refe- rência a figurações mais complexas. Elias dá como exemplo o conto de Edgar A. Poe “Os Pescadores no turbilhão de maels- trom”, em que um dos três irmãos pescadores naufragados, observando a dinâmica do turbilhão que sugava a embarca- ção para o fundo do mar, libertando-se do medo que o afli- gia, observou que os objectos cilíndricos e mais pequenos se afundavam mais lentamente, decidiu, por isso, atar-se a um barril e salvou-se. hoje, no tempo da pós-modernidade, à es- cala mundial, são bem evidentes as características da socie- dade de risco (the Risk Society) imaginada e teorizada por Ulrich beck (2000). Os riscos, segundo este autor, resultam de processos de desenvolvimento sem a necessária reflexão, que originam consequências imprevisíveis, muitas delas negativas para o bem-estar e segurança das pessoas, das instituições e das nações. beck designou estes processos como “moderniza- ção reflexiva” em que o adjectivo reflexiva surge no sentido de imprevisível e incontrolado das suas consequências.

O tempo da pós-modernidade é um tempo de turbilhão, um tempo de naufrágios e de salvamentos. O grande naufrágio a evitar, na sociedade de risco em que vivemos, é o desconhe- cimento dos outros. Conhecer os outros (envolvimento) é o caminho a percorrer para minimizar situações de indignidade humana e assim tomarmos conhecimento da nossa própria humanidade.

É necessário encontrar as doses exactas de envolvimento para continuar a edificar o sentimento do “nós” que na pers- pectiva de max Weber tão bem caracterizava a comunidade tradicional. É necessário, por outro lado encontrar a dose exacta de distanciamento de modo a promover a individuali- dade e a plasticidade do self, mas sem cair no individualismo. Paradoxalmente, cremos que era esse o sentido mais profundo de Elias, envolvimento e distanciamento, ao invés de antagó- nicos nos seus fins, são dois caminhos para melhor conhecer os outros e a nós mesmos. São dois caminhos para alcançar a humanidade plena.

E que coisas simples podemos fazer para potenciar a nossa humanidade e construir a paz próxima? A lista que se segue não é exaustiva e pode ser completada pela criatividade de cada um. Podemos:

• Reconhecer situações de dignidade e de indignidade humana, segundo as três perspectivas enunciadas; • Incrementar as capacidades comunicacionais quer

as mediatizadas quer as presenciais: melhor conhe- cer os interlocutores, controlar os ruídos, gerir os silêncios, adequar os códigos e as mensagens; • Respeitar diferenças de género, de raça, de cul-

tura, de classe social, de classe etária, de ca- pacidades cognitivas, entre outras;

• Cuidar do espaço público: eliminar obstáculos físicos; criar locais que abriguem da chuva, do vento, ou do sol excessivo; reabilitar os locais de encontro espontâneo no exterior; não sujar; não falar demasiado alto só para ter uma prova da sua própria existência; não protago- nizar situações indecorosas em público, entre outras; • Encontrar tempo para si e para os outros: não tenho

tempo para comer; não tenho tempo para dormir; ob- viamente, não tenho tempo para amar… Disparates. • Recriar os tempos e os espaços de socialização in-

formal e inter-geracional, compensando na medi- da do possível o efeito da institucionalização. • mediar socialmente comportamentos e atitudes, nos-

sos e dos outros, evitando e minimizando conflitos. • Construir relações puras: relações sociais (amor, ami-

zade, parentesco, vizinhança, profissionais, etc.) que são internamente referenciais, isto é, que dependem fundamentalmente de satisfações ou recompensas es- pecíficas dessa mesma relação (Giddens, 2001).

Aquelas pessoas que revelam, em vida, uma extrema huma- nidade continuarão a ser lembradas depois da sua morte e, neste sentido, alcançam o céu. Céu é ser lembrado pela sua humanidade, inferno é ser lembrado pela sua desumanidade ou, simplesmente, esquecido.

reFerênCias BiBliográFiCas:

• beck, Ulrich; Anthony Giddens; e Scott Lash. (2000).

Modernização Reflexiva: Política, Tradição e Esté- tica no Mundo Moderno. Oeiras. 1ª Edição. Celta.

• blumer, herbert. (1982). El Interaccionismo Sim-

bólico: Perspectiva y Método. Colección Psicolo-

gía Social y Sociología. barcelona. hora, S.A.. • CNECV - Comissão Nacional de Ética para as Ciên-

cias da Vida. (1999). Reflexão Ética sobre a Dig-

nidade Humana. [Em linha]. Disponível em:

• www.cnecv.pt/admin/files/data/docs/1273058936_P026_ Dignidadehumana.pdf [ Consultado em 2/02/2011]. • Gandhi, mahatma. (2008). Mahatma Gan-

dhi Autobiografia - Historia de Mis Experien- cias com la Verdad. madrid. Arkano books.

• Giddens, Anthony. (2001). Modernidade e Identidade

Pessoal. Oeiras. 2ª Edição/1ª Reimpressão. Celta Editora.

• Gil, José. (2004). Portugal, Hoje - O Medo de

Existir. Lisboa. Relógio d’água Editores.

• Erikson, Erik. (1976). Identidade, Juventu-

de e Risco. Rio de Janeiro. zahar Editores.

• Elias, Norbert. (1997). Envolvimento e Distancia-

mento. Estudos Sobre a Sociologia do Conhecimen- to. Nova Enciclopédia. Publicações Dom Quixote.

• Schumacher, E. F. (1980). Small is beautiful: Um Estudo de Economia em que as Pessoas também Contam. Univer- sidade moderna. Nº 65. Publicações D. Quixote. Lisboa.

IMORtAlIDADE SIMbÓlIcA, PAz E FUtURO

PAULA ISAbEL SANtOS

DOCENtE

FACULDADE DE CIêNCIAS hUmANAS E SOCIAIS

DA UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA, PORtO · PORtUGAL PSANtOS@UFP.EDU.Pt

mARINA bERNARDO

EStAGIáRIA DE PSICOLOGIA CLÍNICA E DA SAúDE FACULDADE DE CIêNCIAS hUmANAS E SOCIAIS

DA UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA, PORtO · PORtUGAL

RUbEN FARIA

EStAGIáRIO DE PSICOLOGIA CLÍNICA E DA SAúDE FACULDADE DE CIêNCIAS hUmANAS E SOCIAIS

DA UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA, PORtO · PORtUGAL

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RESUmO

O conceito de imortalidade simbólica, constructo operacionalizado por Robert Lifton, diz respeito ao desejo de projecção e preservação no futuro, sendo um constructo variável e sensível às questões de guerra e paz e intrinsecamente relacionado com a saúde mental. Períodos de turbulência social e política podem fazer perigar este conceito. Neste sentido torna-se pertinente a colaboração de técnicos da área da saúde no sentido de fomentar o desejo de projecção no futuro, construindo assim um futuro, ainda que no simbólico, que se prevê melhor. Palavras-chave: Imortalidade simbólica;

Psychic Numbness; Paz e Futuro.

AbStRACt

the concept of symbolic immortality, construct operationalized by Robert Lifton, concerns the desire to design and preservation of the future. this construct is variable and sensitive to issues as war and peace and intrinsically related to mental health. Periods of social and political turmoil can threaten that concept. In this regard it is perti- nent the technical collaboration of health care to foster the desire for projection into the future, building a future that even the symbolic, a future that provides better.

Key-words: Symbolic immortality; Psychic Numbness; Peace and Future.

introdução

Através do medo perante a morte, o homem sentiu a necessi- dade de criar formas simbólicas de prolongar a sua existên- cia, surgindo o desejo de imortalidade simbólica como uma forma de mitigar a angústia perante a morte (Kastenbaum & Aisenberg, 1983; Santos & Pinto, 2009; thompson 1977).

No entanto, por vezes surgem situações, como catástrofes naturais, atentados terroristas ou mesmo situações de guerra que podem pôr em causa o desejo de imortalidade simbólica, visto que situações como essas deixam de dar um significado à vida e à morte, o que pode fazer com que se perca a esperança em relação ao futuro investindo pouco no mesmo.

O objectivo deste trabalho é abordar os construtos sugeridos anteriormente e relaciona-los entre si.