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Capítulo III O diálogo entre a razão e a revelação no livro IV do Ensaio

3.4. A religião na perspectiva de uma relação equilibrada entre razão e revelação

3.4.2. O equilíbrio possível entre razão e fé

No Ensaio, o capítulo xviii do livro IV é o principal para que possamos entender os benefícios que a religião terá se existir equilíbrio entre fé e razão. Já notamos que, apesar desse equilíbrio ser almejado, a sua conquista não é fácil. Paul Helm (1973) reconhece a existência de tensões, no pensamento de Locke, entre as proposições obtidas apenas pelo uso da razão e aquelas do domínio da revelação, mas admite também ser possível encontrar um ponto gravitacional que regule essas forças contrastantes.

A dificuldade central para harmonizar razão e revelação é conseguir identificar uma proposição como sendo de fato revelada. Foi o que apontamos na seção 3.2, mostrando que a razão tem uma função de verificar se uma suposta proposição é, de fato, divinamente revelada. Snyder (1986, p. 206) propõe exatamente esse questionamento sobre a filosofia lockeana, ou seja, a dificuldade de estabelecer seguramente que uma proposição provém de Deus. Caso a proveniência divina pudesse ser conhecida, no sentido forte do termo, a proposta de Locke de equiparar a verdade racional e a verdade revelada seria mais facilmente aceita: “Além do mais, se Deus é infalível, então tudo o que Deus revela é verdadeiro, e tudo o que é verdadeiro pode ser colocado em prática como tal” (SNYDER, 1986, p. 206). Permanece, porém, a dificuldade de se estabelecer, além de qualquer dúvida, quais proposições são reveladas.

Locke, como tratamos acima, apresenta elementos para avaliar se “p” é uma revelação divina, e além desses elementos de discernimento da razão ele adicionou a necessidade de sinais externos que acompanham a revelação divina. Uma vez aceita uma proposição como revelada, ela passa a ser considerada verdadeira como o conhecimento, apesar de não versar sobre o acordo e desacordo de ideias, que é a forma básica do conhecimento, segundo Locke (E IV.i.1). Essa não é a única exceção na epistemologia lockeana quando se trata de conhecimento, mas talvez seja a mais polêmica.

Helm expressa o seu questionamento diante dessa situação da seguinte maneira:

Ao discutir os limites entre questões de fé e questões de razão, Locke se envolve em dois problemas interligados: como identificar uma proposição como uma verdade revelada, e como decidir o que tal proposição significa. (Existem dois problemas para Locke: “p é uma verdade revelada, mas eu não a entendo”, não é para ele uma auto-contradição). (1973, p. 53)

Parece que Helm identifica a verdade somente com o que o homem pode compreender. Por isso a sua perplexidade diante da possibilidade de se aceitar uma verdade que não se pode entender. Para Locke não existe contradição entre a verdade de uma proposição revelada e o fato de estar acima da compreensão humana. Já apresentamos que, no Ensaio, ele admite a existência de proposições acima da razão (E IV.xviii.7) e, nem por isso, essas proposições deixam de ser verdadeiras.

Aqui é preciso defender que na epistemologia lockeana nem tudo o que está em princípio dentro do entendimento é de fato conhecido, nem mesmo tudo o que está no domínio da razão. Claro, seria mais seguro associar a verdade com o conhecimento garantido, mas este último é muito limitado. Por isso, Locke abre concessões para se considerar como altamente confiáveis certas proposições, quase as equiparando com o conhecimento. Tratamos disso no primeiro capítulo desta dissertação. Talvez pudéssemos entender a posição de Locke com relação à revelação dessa mesma maneira. Não se pode conhecer o que é revelado no sentido estrito do termo usado por Locke. Mas, utilizando bem alguns critérios para avaliar a proposição revelada e para ter uma certa garantia da sua origem divina, a revelação pode ter um alto grau de confiabilidade, equiparado ao do conhecimento. Seguindo a linha condutora da sua epistemologia, tudo o que é conhecimento, no sentido forte do termo, é verdade, mas nem tudo o que é verdade está dentro do conhecimento possível ao homem.

Helm procura compreender o problema da demarcação entre fé e razão no pensamento lockeano. Ele sugere que Locke apresenta duas posições para essa questão. Essas

posições são denominadas extrínseca e intrínseca e seriam inconsistentes entre si. Helm propõe uma possibilidade para tornar essas duas posições consistentes e, assim, harmonizar o pensamento lockeano (HELM, 1973, p. 54). Examinaremos essas duas posições que Helm sugere estarem presentes na epistemologia lockeana. E na sequência apresentaremos a proposta de Helm para torná-las consistentes.

A posição extrínseca, para Helm, procura resolver a dificuldade de se conseguir justificar as verdades reveladas. Essas verdades estão quase no mesmo nível daquelas estabelecidas pela razão, mas para a aceitação dessas verdades o homem tem apenas as bases de probabilidade. Essas bases seriam os critérios para discernir a autenticidade de uma revelação.

As bases de probabilidade são, em resumo duas:

Primeira: a conformidade entre uma coisa e o nosso conhecimento, nossa

observação ou nossa experiência.

Segunda: o testemunho de outros que validam nossa observação e experiência.

Deve-se considerar no testemunho alheio 1º O número de testemunhas. 2º A integridade delas. 3º A habilidade das testemunhas. 4º O desígnio do autor, quando se trata de testemunho num livro. 5º A consistência das partes e as circunstâncias da relação. 6º Testemunhos contrários. (E IV.xv.4)

Esses critérios não podem garantir a certeza, no sentido forte do termo, da procedência divina de uma proposição. Helm sugere que a garantia dada por esses critérios estaria no domínio da probabilidade. Mesmo não garantindo a certeza, Locke acredita ser possível obter um alto grau de confiança nas proposições reveladas: “Quando a razão não vai além de probabilidade, a fé determina e a revelação mostra de que lado está a verdade” (E IV.xviii.9). Ainda segundo a resposta extrínseca, a religião seria constituída tanto por verdades racionais quanto por verdades reveladas. Assim, teríamos questões de religião conhecidas no sentido forte do termo e, por isso, verdadeiras. Um exemplo, como vimos, é a própria existência de Deus. E, também, há questões de religião que devemos reconhecer como verdadeiras porque provém de Deus, mas para se afirmar a sua origem divina temos apenas as bases de probabilidade.

Helm (1973) tenta indicar a fragilidade da argumentação lockeana sobre as proposições que provêm de Deus da seguinte maneira:

A revelação de Deus é infalível (por definição), ainda que essas verdades infalíveis nunca possam ser identificadas com certeza, mas só com probabilidade. Portanto, "é provável que p seja infalivelmente verdadeiro" se reduz a "p é provavelmente verdadeiro". Não que Locke deva considerar apenas como provável que Deus afirmou p, mas também que uma vez que a probabilidade seja a única razão para se pensar que p é verdade, p só pode ser considerado como provavelmente verdadeiro. Mesmo que as proposições da revelação sejam verdadeiras, em termos lockeanos,

talvez nunca possamos saber. Um argumento paralelo poderia ser construído com base nessas observações de Locke sobre o significado incerto de qualquer revelação.(HELM, 1973, p. 58)

Locke realmente dá às proposições reveladas um peso epistemológico maior do que o núcleo duro inicial de sua própria epistemologia lhe permitiria. Mas como já salientamos em outras partes desta dissertação, na nossa interpretação, essa exceção é coerente com o contexto da filosofia lockeana.

A segunda posição sugerida por Helm (1973) em relação à questão da relação entre razão e revelação em Locke é a que chamou de intrínseca. Essa posição considera o conhecimento e a crença como dois estados epistêmicos totalmente distintos. Enquanto a posição extrínseca encontra-se no texto do Ensaio, a posição intrínseca encontrar-se-ia nos diálogos entre Locke e Stillingfleet. Nesses diálogos, Stillingfleet argumenta que, segundo a epistemologia lockeana, as proposições reveladas não poderiam ser conhecidas. Por isso, seriam menos certas do que as obtidas pelo uso da razão. Stillingfleet acusa Locke de desvalorizar a religião, pois as suas proposições teriam um valor inferior em relação às proposições racionais. Locke, por sua vez, sustentaria, segundo Helm, que as proposições de fé são “irracionais”, no sentido de não provirem da razão26. Porém, nem por isso seriam mais

fracas que as obtidas pela razão ao ponto de serem desprezadas.

Helm considera que Locke propôs uma divisão radical entre razão e revelação nas respostas que deu a Stillingfleet. Tudo o que diz respeito à religião deveria estar somente no domínio da crença. Essa posição dos diálogos com Stillingfleet seria contrária à posição do Ensaio, pois, nesta última obra, as proposições religiosas podem estar tanto no domínio do conhecimento quanto no domínio da revelação. Helm cita a seguinte passagem do diálogo entre Locke e Stillingfleet para fundamentar a separação entre razão e revelação. Locke sustena:

Uma definição de conhecimento, se boa ou ruim, verdadeira ou falsa, não poderia ser maléfica ou ter qualquer consequência para um artigo de fé. Porque uma definição de conhecimento como um ato da mente, não pode dizer respeito à fé, que é um outro ato da mente muito distinto deste. (Works, Vol. IV, p. 282)

Para Helm são dois os pontos principais da posição intrínseca. O primeiro é: acreditar em “p” é menos que ter a certeza de que “p”. Caso se tenha certeza, deixa-se de acreditar. Então, uma proposição religiosa não poderia estar no domínio do conhecimento,

26 Helm não parece ter sido feliz na escolha do termo, pois ‘irracional’ (irrational) tem uma conotação pejorativa e, portanto, não captura bem a intenção de Locke ao admitir que existem coisas importantes que não estão no domínio da razão. Assim, teria sido preferível utilizar, no caso, o termo 'a-racional'.

pois, nessa interpretação, somente questões de fé estariam dentro da religião. Disso decorre o segundo ponto: a fé é independente do conhecimento e ambos possuem bases próprias. Aceitando esse segundo ponto, Helm vê emergir o problema do irracionalismo e do entusiasmo para a esfera da fé (HELM, 1973, p. 61).

A interpretação de Helm dos textos lockeanos, no caso da posição intrínseca, considera a divisão do entendimento humano como separação radical de domínios. A nossa proposta de interpretação é, ao contrário, de que há dois domínios distintos no entendimento, mas eles se harmonizam e colaboram um com o outro. O domínio da razão auxilia o processo de discernimento de uma revelação. O domínio da crença em geral alarga o entendimento para além dos limites do conhecimento em sentido estrito. Além dessa colaboração, podemos supor até uma interação entre esses domínios. Uma proposição dentro do domínio da crença em geral teoricamente pode passar a ser conhecimento em sentido estrito. A qualificação de conhecimento e crença em geral não faz parte da proposição em si, mas está ligada ao alcance do entendimento humano em relação à proposição em questão. Mesmo uma proposição revelada por Deus poderia, hipoteticamente, ser conhecida pelo homem por meio da razão, a depender da ocorrência de condições propícias. Existe sempre a possibilidade de o homem conseguir fazer outras conexões de ideias que ainda não conseguiu estabelecer e, a partir destas, obter conhecimento. Portanto, não é o fato de uma proposição poder ser conhecida ou não que a qualifica de religiosa. Podem existir proposições fora do domínio da fé ligadas à religião, como o conhecimento de Deus, por exemplo, que é estabelecido por demonstração. Quando Locke defende que conhecimento e fé são estados epistêmicos distintos da mente, não está propondo uma oposição ou conflito entre eles.

Para Helm, na posição extrínseca do problema da demarcação entre fé e razão, Locke admite que uma proposição religiosa esteja tanto no âmbito da razão quanto no âmbito da revelação, com a ressalva de não se misturarem. Tudo aquilo que está estritamente dentro da esfera da revelação não pode ser conhecido pelo homem, porém alguns postulados da religião podem estar na esfera da razão. Na posição intrínseca, Locke também aceita a divisão dos dois âmbitos, porém a religião fica restrita apenas à esfera da revelação. Nas palavras de Helm:

Assim, Locke tem duas teses incompatíveis sobre a relação entre fé e conhecimento, embora seja possível confundi-las por terem uma importante característica em comum. Ambas as teses afirmam que fé e conhecimento são distintos, mas por diferentes razões. No caso da tese extrínseca, ele diz que a fé e o conhecimento são distintos neste aspecto: a pessoa nunca pode conhecer qualquer proposição revelada (exceto aquelas que podem ser conhecidas por meio da intuição e da demonstração,

o que Locke chama de "artigos de fé" em contraste com "artigos de mera fé ". Sobre esta distinção, veja abaixo). No caso da tese intrínseca, fé e conhecimento são distintos neste aspecto: o que uma pessoa acredita nunca pode ser tocado por aquilo que ela conhece. A tese intrínseca deixa sem solução os problemas de identificar p como uma proposição revelada. A tese extrínseca faz da fé uma questão de opinião provável.(HELM, 1973, p. 61-62)

Para resolver essa dualidade, Helm propõe a existência de uma divisão no pensamento de Locke entre artigos de mera fé e artigos de fé. Os artigos de mera fé seriam aqueles que não podem ser conhecidos por nenhuma via racional. Assim, algumas proposições do cristianismo seriam impossíveis de serem determinadas verdadeiras nos padrões atuais da razão. Um exemplo seria a ressurreição dos mortos. Não é possível conhecê-la racionalmente, ainda que a probabilidade seja tão grande ao ponto de se aceitar a ressurreição como uma verdade. Os artigos de fé podem ser conhecidos no sentido lockeano do termo e, por isso, constituem as bases seguras da religião natural. O que Helm está propondo é a existência de uma utilização ambígua desses dois tipos de artigos. Isso causaria uma confusão na interpretação dos textos lockeanos; porém, uma vez estabelecida essa distinção e qualificadas as proposições religiosas, a ambiguidade desapareceria. O problema, segundo Helm, é que a distinção não estaria suficientemente explícita nos escritos de Locke (HELM, 1973, p. 64).

Concordamos que, nesse assunto, o Ensaio deixa margem para certa ambiguidade. Talvez a maior dificuldade seja a linguagem utilizada, menos precisa do que seria necessário para esse caso intrincado. Assim como o termo ideia é usado de uma maneira muito ampla no texto do Ensaio, o que pode dar margem para interpretações equivocadas, acontece o mesmo com os termos fé e crença (tratamos disso no primeiro capítulo da dissertação). Sustentamos, contudo, que é clara, nos escritos de Locke, a diferença existente entre questões de mera fé e questões de fé. Para Locke a religião não está restrita a dados revelados, apesar de eles serem peculiares à esfera religiosa. Dentro da religião, encontramos também proposições do domínio do conhecimento, como a demonstração de Deus, analisada acima. Existem também as proposições morais transmitidas aos homens por revelação, mas que, segundo Locke, poderiam em princípio ser obtidas pela razão.

Tanto as questões de mera fé quanto as questões de fé devem ser consideradas como constituintes da religião para o pensamento lockeano. E a razão tem autonomia para desempenhar a sua função no entendimento humano, realizando uma ação direta nas questões de fé e exercendo o papel de avaliadora das questões de mera fé para constatar se existem bases para se acreditar na origem dessa revelação. Helm (1973) faz bem em distinguir no seu

artigo esses dois modos diferentes de tratar as proposições religiosas. Pois algumas dessas proposições podem estar no domínio do conhecimento e outras somente no âmbito da revelação. Não concordamos, porém, com Helm na consideração dessa distinção como apenas ocasional, sem que Locke percebesse isso. Da mesma maneira que Locke concebia a filosofia da natureza contendo proposições tanto dentro do domínio do conhecimento quanto no da crença em geral, isso também seria possível para a religião. Propomos até que isso era previsto no projeto epistemológico lockeano.

A posição que estamos defendendo, de que Locke buscou sempre a harmonia entre a razão e a revelação para o bem do entendimento e da religião, é parecida com a de Pearson (1978). Esse autor argumenta (1978, p. 248) que a nova epistemologia proposta por Locke no Ensaio faz o homem repensar a relação entre razão e revelação como uma fonte de verdade alternativa. Isso acontece porque ele estava comprometido com a fé cristã, entendida muito mais num sentido moral e experimental do que dogmático, cujas bases se encontram na revelação histórica. Porém, o seu comprometimento com a fé cristã não poderia fazer com que ele desconsiderasse a razoabilidade da religião. A defesa da fé necessita de bases sólidas e claras. Por isso, todo o seu esforço em delimitar bem os domínios presentes dentro do entendimento humano. Pearson faz uma consideração que nos parece refletir muito bem a posição de Locke:

Embora Locke estivesse determinado a estabelecer uma base racional da religião, ele estava longe de estabelecer que o conteúdo da religião deveria limitar-se à esfera racional. Talvez sua dificuldade em elaborar uma moralidade universal baseada na lei natural tenha contribuído para sua determinação em não limitar a religião à esfera racional. (PEARSON, 1978, p. 250)

A nossa interpretação do pensamento lockeano segue essa mesma direção. Estabelecer as bases racionais da religião é importante, mas ela não pode estar limitada somente ao que a razão pode determinar. Pearson também considera existir na obra de Locke uma mudança no tratamento da relação entre razão e revelação, mas essa diferença estaria ligada ao contexto de cada trabalho e não constituiria uma contradição. Para ele existe uma unidade no pensamento lockeano e as diferenças estão ligadas ao contexto de criação de cada obra. Entre os motivos que podem ter levado Locke a embrenhar-se nos estudos que levaram à elaboração do Ensaio, estão, como já notamos, certas discussões, das quais participou, acerca dos princípios da moral e da religião revelada. A Razoabilidade trata especificamente das controvérsias sobre a justificação, ou seja, como o homem chega à salvação mediante a aceitação de Jesus como Messias e do seu ensinamento. O Discurso sobre os milagres (obra

de 1701; a partir de agora vamos nos referir a ela apenas como Discurso) surge da necessidade de tratar do tema dos milagres de maneira sistemática (PEARSON, 1978, p. 255). Levando em consideração esses diversos contextos, a relação entre razão e revelação teria, no final, uma estrutura unitária.

A robusta crença religiosa de Locke não o impediu de questionar a religião institucional, o que causou estranhamento e críticas por parte da ortodoxia religiosa. A sua profissão de fé era curta, ou seja, as proposições religiosas que ele professava, por ter encontrado bases adequadas para a crença a seu respeito, não eram muitas. Porém, o que ele acreditava era tomado com grande segurança. A sua adesão e defesa da racionalidade, como epistemólogo, não o impediu de viver de maneira autêntica a sua fé; pelo contrário, a razão ajudou-o a purificar a religião dos exageros e a buscar o diálogo entre os vários credos, tentando encontrar um denominador comum para proporcionar uma convivência fraterna entre os seus profitentes.

Apresentamos, nas três primeiras seções deste capítulo, as bases da teoria lockeana sobre a revelação que se podem colher no Ensaio. Nesta seção, refletimos sobre a influência, na religião, da relação harmônica entre razão e revelação. Agora analisaremos o que o desequilíbrio dessa relação pode causar. Para isso examinaremos o movimento do entusiasmo, que faz um uso inapropriado da revelação, pois desconsidera os parâmetros racionais da crença. Esse movimento era considerado perigoso por Locke, por transmitir uma falsa ideia da religião, podendo até mesmo levar ao erro em nome de uma falsa revelação.