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um contrato de confiança (BOURDIEU, 1999).

EQUIPE SAÚDE DA FAMÍLIA (2,2 – 25)

OME > 2,45 / f > 22 x GRATIFICANTE (2,6 – 23) OME < 2,45 / f < 22 x RESPONSABILIDADE (1,5 – 13) x PREVENÇÃO (2,38 – 13) x CONFIANÇA (2,3 – 10) OME > 2,45 / f < 22 x DESVALORIZADO (2,7 – 19) x DEDICAÇÃO (3 – 15) x MEMBRO DA COMUNIDADE (2,5 – 14) x COMPETENTE (3,3 – 12) x PACIENTE (3 – 11)

Figura 3 – Demonstrativo dos possíveis elementos centrais e periféricos da configuração estrutural da representação social de ‘agente comunitário de saúde’ construída por agentes comunitários de saúde do município de João Pessoa - PB (n = 313)

Os elementos: (a) orientador, (b) amigo, (c) ajuda, (d) elo de ligação entre comunidade e Equipe Saúde da Família e (e) importante agrupam-se no quadrante superior esquerdo32, constituindo o possível sistema central da representação social do agente comunitário de saúde. O que nos faz concluir haver relevância do mesmo e existência de uma identidade social. Pois,

32 Estes elementos se localizam no quadrante superior esquerdo por possuírem freqüência maior que

22 e ordem média de evocação menor que 2,45. Do mesmo modo, a inserção dos demais elementos nos outros quadrantes depende da combinação da ordem média de evocação e da freqüência.

Se as representações têm um núcleo, é porque elas são uma manifestação do pensamento social: e, em todo pensamento social, uma certa quantidade de crenças, coletivamente produzidas e historicamente determinadas, não podem ser questionadas, posto que elas são o fundamento dos modos de vida e garantem a identidade e a permanência de um grupo social (ABRIC, 2003, p. 39):

Nos demais quadrantes, distribuem-se os possíveis elementos do sistema periférico. Gratificante, um elemento que se situa no quadrante superior direito, e os elementos: (a) responsabilidade, (b) prevenção e (c) confiança, agrupados no quadrante inferior esquerdo, constituem o que Sá (2002a) denomina de periferia mais próxima ou primeira periferia, também por ele já denominados de elementos intermediários No quadrante inferior direito, os elementos: (a) desvalorizado, (b) membro da comunidade, (c) paciente e (d) dedicação, constituem a possível periferia mais distante ou segunda periferia.

A existência de elementos periféricos, até mesmo dos mais individualizados, que sequer foram incluídos no corpus de análise para o desenho da configuração estrutural da representação de agente comunitário de saúde, não significa inexistir uma homogeneidade dos agentes comunitários de saúde com relação a eles próprios. Tornamos a afirmar que, de acordo com os pressupostos teóricos da Teoria do Núcleo Central, são os valores centrais idênticos do sistema nuclear que definem a homogeneidade do grupo com relação ao objeto representacional.

Voltemos nosso foco para o possível sistema central da representação de agente comunitário de saúde. Ou, conforme caracteriza Abric (2003), para a parte da representação que não é negociável.

preferencial33”, que nomeia a identidade auto-atribuída como especialmente

significativa, num determinado momento da vida, parece justificar a ausência de elementos de valor pejorativo e/ou descritores de ações socialmente não legitimadas.

Destacamos que no sistema central da representação social de agente comunitário de saúde estão presentes os dois grandes tipos de elementos descritos por Abric (2003): funcionais e normativos. A maioria dos elementos descreve o papel do ACS: orienta, ajuda, é amigo, é o elo entre a comunidade e a Equipe Saúde da Família. São, inferimos, elementos funcionais, os quais estão associados tanto às características descritivas como à inscrição do objeto nas práticas sociais ou operacionais. Contextualizando: o ACS orienta, ajuda e é o elo entre a comunidade e a ESF. Representam os agentes comunitários de saúde ser este o seu papel. Por isso se consideram importantes no PSF. Eles se descrevem como um amigo, elemento que se relaciona com ajuda, pois há uma representação acerca de ser papel do amigo ajudar. Ainda retomaremos esta discussão. Destacamos, por enquanto, que, diante do aparentemente óbvio, quando nos referimos à classificação destes elementos funcionais como inferência, estamos levando em consideração que não utilizamos nenhum dos dois instrumentos34 disponíveis para a sua determinação.

Quanto ao elemento nuclear ‘importante’, inferimos ser normativo, pois se relaciona ao sistema de valores dos indivíduos. Neste caso, uma apreciação que implica uma autocategorização positiva, valor que se fundamenta tanto porque o ACS faz prevenção, como porque ajuda, conforme ilustram os discursos seguintes.

33Expressão cunhada por Penna (s/d).

34 Referimo-nos ao índice de normatividade/funcionalidade (ABRIC; TAFANI, 1995) e ao índice

Fundamentado também por outras razões. A associação deste elemento a outros objetos nos faz identificar e demonstrar, mais adiante, outras justificativas.

Importante porque é através do agente de saúde que a gente previne as doenças, está mais ao lado daquelas famílias que a gente acompanha. É importante por isso. A gente vê logo, antes de acontecer alguma coisa mais grave (FH47).

Importante porque ele é como se fosse aquela pessoa... Não tem o professor, né? Ele está sempre vendo a deficiência do aluno. O professor que ama o aluno vê sempre sua deficiência. O ACS tem o papel de professor, de pai. É sempre bom ajudar. O agente se preocupa em ajudar. Andando e firme. Consciente que é importante. Ele [AS PESSOAS DA COMUNIDADE] não é uma pessoa desprezível. Ele tem o agente pra buscar (FH113).

Importante é uma apreciação freqüentemente evocada em articulação com muito: “É uma pessoa muito importante na comunidade” (FH75); “Muito importante” (FH109); “Fator muito importante” (MH83). Intensidade que é assim estabelecida:

O agente de saúde é muito importante. Eu acho, sabe? Na comunidade. Porque quando o agente não tinha... é... aquele caso, como eu disse, me procurava muito. E agora, a gente vai até a eles. A gente vai até a eles, eles dizem os problemas deles. A gente é um caminho pra eles. Porque antes não tinha um agente de saúde. A gente sabia muito as coisas, mas as coisas que eles traziam. Algumas pessoas. Mas agora não, a gente vai buscar mesmo (FH75).

Muito importante porque ele está ali, com a comunidade. Deu lugar a população que estava em sua casa. A gente escuta o que eles querem falar com a gente. Desabafar. Eles acham importante. Confiam na gente. Perguntam porque o ACS não passou. Hoje, principalmente as pessoas idosas, já têm quem oriente sobre como tomar os remédios, que dia tem médica. E é muito importante. Eu tenho o melhor emprego do mundo [...] (FH109).

Intensidade que por vezes é dada por ocasião das justificativas para evocações que não a referiram. Como exemplifica a resposta para o seguinte questionamento: Por que você, ao ler agente comunitário de saúde, pensou em ‘importante para a comunidade’?

Muito importante porque é o elo da comunidade. É uma pessoa que tá sempre levando e trazendo informações de um quadro [UM PROBLEMA DE SAÚDE] de uma família. ACS já tá dizendo tudo: a gente faz parte daquela família. Eu sinto a comunidade como uma família. Me sinto muito valorizada. Com minha idade, meus estudos, neste trabalho (FH86).

Ser importante é destacado nas entrevistas, quando os ACSs discorrem sobre a representação dos outros sobre si. Comentários que ainda retomaremos, não exclusivamente por causa das contradições, mas principalmente porque estamos abordando a identidade. Reafirmemos: a identidade também é a representação que o grupo tem dos outros sobre si.

Na minha área, graças a Deus sou bem aceita e todos têm o maior respeito e me considera bastante, acha muito importante (FH47).

É bonito e importante. Porque é a gente que vai lá pra comunidade, a gente é que vem pro posto e volta pra comunidade, pra dar resposta. Então é a gente que rala. Não é toda hora que médico e enfermeiro quer estar dentro da comunidade, sujando seus pezinhos, sujando seu carrinho, não! (MH83).

Observemos ainda que a importância do agente comunitário de saúde se relaciona com a descrição do seu papel profissional. Com este sentido, transcrevemos mais um discurso, que tem uma característica comum a outros, qual

seja: razões múltiplas para tal valoração.

Olhe, o serviço do ACS, ele é um serviço super importante, uma vez que você precisa ir de casa em casa e fazer o controle, a fiscalização em saúde, principalmente das áreas de risco e das demais áreas. O ACS vai ser a pessoa que vai orientar, que vai encaminhar, que vai conscientizar as pessoas, no sentido de fazer a sua própria saúde e o seu próprio bem-estar, tanto pessoal como ambiental. É a pessoa que vai dar o equilíbrio, tentar te dar pelo menos esse equilíbrio, que vai orientar, que vai tentar direcionar e fazer com que as pessoas, na sua coletividade, tentem fazer uma melhor saúde, tanto a mental, como a pessoal (MH5).

A valorização ainda é fundamentada a partir da percepção da importância do ACS para os outros: a família, as pessoas e as famílias da comunidade, e os profissionais da equipe. Faz o agente comunitário de saúde referência a recursos de que ele dispõe: informações. Seja sobre saúde, seja sobre a comunidade. Ilustremos:

Minha família me acha uma pessoa importante. Porque através do meu trabalho, eu aprendi coisas que eu não sabia. E que eu posso salvar uma vida. Em termos de informações (FH104).

Para eles [AS PESSOAS DAS FAMÍLIAS ACOMPANHADAS], a gente é importante. Eles contam os problemas que têm, sabendo que a gente

sempre ajuda. Devido às orientações que a gente repassa para a

comunidade. Os médicos também dependem do trabalho da gente. Se a gente não passasse as informações, eles não iam saber (FH114).

Extrapolando a análise da representação social em si, entendemos a informação tal como a concebe Lima (2001): uma forma de capital social. Segundo ele, a informação é um capital porque é referente às relações sociais, via trocas

permanentes entre os indivíduos, provendo a base para a ação social.

Ainda para Lima (2001, p. 50): “O uso das informações e sua manutenção nas relações sociais fazem com que estas possam ser utilizadas para diversos propósitos”. Contextualizando o agente comunitário de saúde, as informações servem para orientar sobre saúde, ou seja, para a educação em saúde. Mas é útil para seu reconhecimento pelos outros e sua conseqüente luta por distinções e por poder.

A auto-representação positiva, de um profissional valorizado, compartilhada pelos ACSs, nos remete a Abric (1998) quando afirma que as representações sociais permitem a elaboração de uma identidade social e pessoal gratificante.

Em parte é gratificante a gente poder ajudar as pessoas mais simples da comunidade. Em parte a gente não é bem reconhecida. Assim... pela Secretaria, que não valoriza muito o trabalho da gente. Não dá muitas condições. Não oferece muitas condições da gente atender melhor a comunidade (FH114).

É gostoso você poder ajudar alguém, entendeu? Você servir aquela pessoa, e saber que o trabalho que você foi lá, a informação que você levou, a ajuda que você prestou, serviu, de alguma coisa pra aquela pessoa. [...] depois que eu entrei, que fui me entrosando no trabalho, eu gostei. Gostei muito. A raiva que a gente tem, o ACS tem, a revolta, é por conta da falta de reconhecimento deles. Aí sim. Agora, pra prestar... a prestação de serviço ao povo, o trabalho que a gente faz é muito bom, é muito gratificante. Você ver e você resolver o problema daquela pessoa, daquela família que tava precisando disso, daquilo. Eu conseguir resolver! É muito bom você saber que aquela pessoa ficou bem porque você deu uma mãozinha (FH59).

O ser agente comunitário de saúde como gratificante, e em contradição com sua auto-representação de desvalorizado, aproxima-nos da identidade do ser professor como pesaroso e desafiador, e como motivo de frustrações profissionais, porém contraditoriamente gratificante (LIRA; DOMINGOS SOBRINHO, 2001).

Ainda nesta perspectiva, situamos a concepção de Tajfel (1983, p. 294), que articula as condições objetivas da relação intergrupal com uma dimensão cognitiva, fazendo da identidade social uma construção subjetiva - perspectiva psicossociológica:

[...] a identidade social dum indivíduo concebida como o conhecimento que ele tem de que pertence a determinados grupos sociais, juntamente com o significado emocional e de valor que ele atribui a essa pertença só podem ser definidos através dos efeitos das categorizações sociais que dividem o meio social do indivíduo no seu próprio grupo e em outros.

Por isso consideramos relevante enveredar por uma discussão relativa ao gostar de ser agente comunitário de saúde e às razões que fundamentam tais apreciações. Existe uma diversidade de fundamentos para este gosto (APÊNDICE B), não obstante sejam possíveis ressalvas.

[...] De manhã, de tarde, leva chuva, leva sol. A gente não tem um equipamento próprio pra ir trabalhar. Ganhei uma capa faz quatro anos

[RISOS], a capa já se acabou. Fardamento, a gente não tem fardamento apropriado [...] Só roupa de campanha... A gente não tem um sapato pra andar na chuva, não tem uma capa, não tem uma sombrinha. Aí se você não tiver dedicação e gostar do que você faz, você desiste. Porque realmente o salário não é animador não [RISOS]. Tem que realmente gostar do que faz e ter dedicação, realmente. Porque se você não gostar, você não tem dedicação não (FH44).

Ah! De ser agente comunitário, gosto. Demais. Porque eu me sinto bem, ajudando as pessoas [...]. Porque ajudar o meu próximo me dá... me deixa muito gratificada. Eu me sinto bem. Eu me sinto bem mesmo [...] Sonho ser reconhecida, a categoria. Nós não somos reconhecidos. Imagine: eu, vai fazer X anos [...] mas tem XX. Faz mais de oito anos que trabalha. Imagine quantos anos nós já perdemos. Se formos postos pra rua, fica uma mão na frente e outra atrás. Sem ter direito a nada. A gente não tem o direito que o trabalhador tem (FH7).

Uma vez que o ACS gosta de seu papel profissional e se vê como um orientador, é importante destacar que, para Freire (1997, p. 159), a afetividade "Significa esta abertura ao querer bem a [SIC] maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos, numa prática específica do ser humano". Se a docência desperta nos professores a afetividade, a alegria, denominada por Freire de "força misteriosa", a qual é aceita por muitos como vocação, parece-nos ser apropriada sua analogia com o ACS. Isto nos possibilita entender porque, mesmo diante da precarização do trabalho, e embora fazendo ressalvas e/ou apontando outros aspectos negativos, este profissional enfatiza o amor e o compromisso diante dos usuários do sistema de saúde.

[...] porque é um dom você ser agente de saúde. Um dom que nem todos têm condições de vivenciar verdadeiramente o ser agente de saúde. Então pra mim é uma vocação. É como se fosse um chamado a ser, a se despojar, realmente, a buscar realmente, e levar aquilo... tudo que pudermos. Então vocação, isso aí vem de decisão porque como eu falei, a situação irregular da gente. Mas a gente tem aquela disposição. É um chamado. Vê isso, assim, como um chamado da vida (MH70).

[...] acho que foi esse dom que Deus me deu. Acho que Deus me botou no mundo pra isso. Porque ajudar o meu próximo me dá... Me deixa muito gratificada (FH7).

Ele escuta, orienta e procura ajudar, com respeito e dedicação. E ele tem o dom carismático de passar confiança, para a comunidade aceitar suas informações e soluções (FH28).

Estes dados nos levam a apontar o posicionamento de Strauss (1992, p.79), para quem a reivindicação de uma missão ocupa “[...] um papel no contexto de uma luta pelo reconhecimento e pela obtenção de um status institucional”. Porém, como

nos embasamos na praxiologia bourdieusiana, é necessário destacar que apesar de compactuarmos com essa apreciação e com o posicionamento freireano acerca da vocação,

A lógica, essencialmente social, do que chamamos de “vocação”, tem por efeito produzir tais encontros harmoniosos [REFERE-SE AO ENCONTRO COM AS EXPECTATIVAS OBJETIVAS INSCRITAS IMPLICITAMENTE] entre as disposições e as posições, encontros que fazem com que as vítimas da dominação simbólica possam cumprir com felicidade (no duplo sentido do termo) as tarefas subordinadas ou subalternas que lhes são atribuídas por suas virtudes de submissão, de gentileza, de docilidade, de devotamento e de abnegação (BOURDIEU, 1999a, p. 73).

Não ignoramos que Bourdieu aqui faz referência às posições oferecidas às mulheres, pela estrutura fortemente sexuada, no que se relaciona à divisão do trabalho. Mas entendemos que esta pode se aplicar a qualquer situação na qual haja dominadores e dominados. Por isso, embora com base em Freire (1997) avaliemos que o ser agente comunitário de saúde desperta afetividade, não descartamos a possibilidade de existência de uma dominação simbólica cujas vítimas reconhecem a sua desvalorização perante a própria instituição que os instituiu e, como vemos mais adiante, se identificam com outros profissionais, a priori reconhecidos socialmente. Apesar de cogitarmos esta possibilidade em nossa análise, não podemos negar que a afetividade é saliente entre os agentes comunitários de saúde. Dado que nos faz pensar que assim como as representações sociais podem co-existirem dois sentidos para a vocação. Embora, ainda nos questionemos, pautados na avaliação sobre em ambas perspectivas – educação e enfermagem – o cuidado ser remunerado e disto decorrer a expectativa de qualidade. Para obtê-la “[...] é preciso não só dominar as técnicas necessárias, mas estar mediado por afetividade, nem que a expressão

deste afeto seja uma representação necessária [...]” (BORSOI; CODO, 1995, p.141). São nossos dados do Diário de Campo e nossa inserção relativamente longa no campo que nos permitem inferir serem genuínas as representações de afeto dos agentes comunitários de saúde. Ou, extrapolando o dito por Batista e Codo (1999), os quais defendem que os educadores não apenas precisam ser conscientes de seu papel, mas precisam estabelecer um vínculo afetivo e emocional com o educando. Esta necessidade se estende aos cuidadores. Se tivermos em conta que estamos tratando de educadores e de cuidadores de pessoas e de famílias com as quais existem outros laços afetivos, como amizade, parentesco e vizinhança, compreendemos porque outro elemento da configuração estrutural da auto- representação de si a ela se relaciona: a identificação do agente comunitário de saúde com o amigo e com os familiares. Além disso, embora de modo pouco compartilhado, com a feminização do agente, uma vez que seu trabalho foi ligado ao universo feminino da mulher, assim como o é, quando comparado a um dos papéis do círculo familiar: o de mãe.

Amigo, porque realmente a gente é amigo. Eles confiam na gente como se fosse um amigo. A gente se torna amiga deles. Eu tenho muitos amigos. Até nas ruas que eu não mais faço [AS VISITAS DOMICILIARES], as pessoas falam comigo, me tratam como amigo. Que na verdade, o agente de saúde pra mim é mais que um amigo, é um orientador. Que além de passar as orientações de saúde, com o passar do tempo se torna um amigo daquela pessoa. Eles adquirem confiança na gente. Por isso que a gente se torna amigo deles [...] Além de ser amigo, compreensivo, paciente e dedicado, o agente de saúde tem que ser também um pouco de mãe e às vezes de pai. Porque assim como as pessoas adultas precisam da gente, as crianças também acabam adquirindo até um certo laço. A gente chega, eles chamam a gente de tia. Então a gente tem que ter também um pouco de mãe, ser como fosse uma professora. Só que uma professora... não daquelas que fica lá sentada. Mas uma professora, fazer como diz mamãe, como uma tia, que orienta, que cuida: ‘Olha, obedeça a sua mãe, num sei o quê’. E até tem determinada casa que a gente chega, que as mães dizem: ‘Olha, dá um conselho a esse menino, que esse menino tá descuidado’. Então tem que ter também esse lado característico de pai, de mãe, também (FH44).

[...] ele é mais do que um educador. É um pai, é uma mãe, é tudo [RISOS] (FH75).

É muito extenso o trabalho. Tem casa que a gente é mais... Tem casas que a gente é até chamada de mãe, tia (FH64).

O ACS tem o papel de professor, de pai (FH113).

É um amigo, um... é um amigo. Mais do que isso. Eu não vou nem dizer assim: é uma mãe, é um... Mas é um amigo mesmo, porque acho que amigo já inclui a palavra mãe (FH16).

Quando compara seu papel profissional, principalmente ao de um pai e ao de uma mãe, está o agente comunitário de saúde fazendo analogia com cuidadores, no sentido mais amplo: protetores e benfeitores. Parece-nos então ser apropriado fazer referências ao agente comunitário de saúde como cuidador, em relações de ‘cuidar de’ e de ‘cuidar com’, conforme as descreve Tronto (1997), conforme anteriormente citado. De um modo geral, a analogia feita com o amigo, psicólogo, pai, mãe, são ancoragens, associando o não familiar a categorias familiares. Ou, como afirma Arruda (1998, p. 37): “O novo [...] desperta o passado, no qual se espelha para se fazer incorporar”.

A fundamentação para as evocações relacionadas ao gostar de ser agente comunitário de saúde é diversificada, conforme exemplificamos a seguir.