• Nenhum resultado encontrado

Falar sobre o agente comunitário de saúde é despertar paixões (SILVA; RODRIGUES,

2.1 O PACS E O PSF COMO ESTRATÉGIAS DE REORIENTAÇÃO DO SUS

Quando o Ministério da Saúde implantou os programas PACS e PSF como estratégia para reorientação da atenção básica em saúde, modificou uma orientação anterior. Conforme já referido, a reorientação do modelo assistencial se deu através do PACS, e posteriormente do PSF. O estímulo à adoção da estratégia de agentes comunitários de saúde pelos serviços municipais de saúde coube às Secretarias Estaduais de Saúde, como forma de contribuir para a reorientação do modelo assistencial (BRASIL, 1994).

No que concerne à estruturação das equipes do PACS, estas são compostas por um instrutor/supervisor, que geralmente é uma enfermeira, e agentes comunitários de saúde. O Ministério da Saúde (BRASIL, 1997c), através da Portaria nº 1886/GM, recomenda que uma Equipe de Saúde da Família (ESF) seja formada, minimamente, por um médico, uma enfermeira, uma auxiliar de enfermagem e quatro a seis agentes comunitários de saúde (proporção de um agente para, no máximo, 150 famílias ou 750 pessoas). Porém, outros profissionais, como odontólogo, auxiliar de consultório odontológico, assistente social e psicólogo, poderão vir a integrar as equipes, a critério de cada município. Quanto ao acompanhamento e à supervisão do trabalho dos agentes comunitários de saúde, estes são feitos pelos enfermeiros (BRASIL, 1997c).

As ESF atuam nas Unidades de Saúde da Família (USF), onde devem contar com equipamentos e instalações indispensáveis para garantir um bom atendimento à comunidade. Segundo o Ministério da Saúde, as ESF dispõem de meios e de profissionais capazes de resolver a maioria dos problemas de saúde ali mesmo, na

USF, e realizam atendimento no próprio domicílio.

A valorização da família e da comunidade, assim como sua participação ativa na prevenção da doença e na promoção da saúde, é ponto comum aos dois programas. Botelho (2002) avalia que, atualmente, o eixo principal da saúde pública é o PSF. Segundo ela, todas as ações de saúde, até então tratadas de uma forma particularizada, podem ser trabalhadas com o PSF, como, por exemplo, as voltadas para a cobertura vacinal, a tuberculose, a hanseníase e as DST/AIDS.

Tecemos mais comentários relacionados ao PSF por ser este um programa em desenvolvimento, enquanto o PACS, embora represente um importante investimento na atenção básica, destacando-se como prioridade do Ministério da Saúde e do Governo Federal, é uma etapa transitória para o PSF (FONSECA, 2002).

O PSF é uma estratégia de reestruturação do modelo dominante, de forma a garantir o acesso aos serviços, e é baseado na promoção da saúde e no fortalecimento do vínculo com a comunidade. Seu objetivo é viabilizar a transformação da prática sanitária e criar mais condições para garantir a melhoria da qualidade de vida e de saúde. Para Silveira Filho (2002, p. 18),

A proposição do modelo de Saúde da Família deve constituir-se com a consolidação de uma prática que avance para o controle dos processos de saúde e doença de forma integral, que seja exercido sobre uma base populacional definida, que não seja excludente, que seja resolutivo, que busque o auto-cuidado [SIC] e que contribua para a construção de uma sociedade mais equânime.

O PSF inova porque descentraliza, controla e implementa ações, que ficam a cargo dos municípios, com fiscalização dos Conselhos de Saúde. Seu sucesso depende das experiências locais de implantação, ao qual se atrela tanto a gestão

municipal como o engajamento de profissionais e as interações sociais no interior das equipes. Por isso é um programa sujeito a avaliações negativas e positivas.

Assim como o PACS, o PSF demonstrou realizar experiências de focalização dentro de um sistema universalista (VIANA; DAL POZ, 1998). Ele está inserido em um contexto de decisão política e institucional de fortalecimento da Atenção Básica, no âmbito do SUS. O princípio operacional do PSF, de descrição de clientela, proporciona o vínculo das Unidades Básicas de Saúde (UBS) com a população, o que tem possibilitado o resgate da relação de compromisso e de co- responsabilidade entre profissionais de saúde e usuários dos serviços. Esse vínculo tem se constituído como grande diferenciador em relação ao modelo tradicional de prestação de serviços de saúde (BRASIL, 2001b).

Não nos interessa aqui enveredar por uma avaliação dos programas, nem discutir a atuação de outros profissionais da equipe. Isto nos desviaria dos nossos objetivos. Porém, fica difícil falar sobre eles sem tecer comentários avaliativos. Além disso, tecer considerações sobre alguns aspectos possibilita-nos melhor analisar as representações dos outros sobre o agente comunitário de saúde.

Pimenta (2000) destaca que o PACS e o PSF produziram um consenso quanto a um projeto de mudança do modelo de saúde vigente que nenhum outro projeto, na história do SUS, conseguiu. No Encontro Nacional de Entidades Médicas, ENEM, Borba (2003, p.13, grifos nossos) afirmou que o PSF nasceu como alternativa para mudar o modelo assistencial brasileiro, contudo, nos moldes como funciona hoje, restringe-se apenas a fazer ‘medicina de pobre para pobre’. Avaliação que o Ministério de Saúde considera ser inadequada.

Borba (2003) aponta, entre as falhas do PSF, o vínculo empregatício precário, ou a ausência dele, baixa remuneração, freqüente atraso do pagamento dos salários

e excesso de trabalho. Comentaremos posteriormente sobre a remuneração e a precariedade do vínculo empregatício do ACS, particularmente por serem pauta de luta da Associação e do Sindicato dos ACS do município de João Pessoa e temáticas apontadas, algumas vezes até espontaneamente, nas entrevistas. Como uma apreciação precisa incluir tanto aspectos negativos, como positivos, passamos, então a apontá-los.

O Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) avalia positivamente a atuação do agente comunitário de saúde com base em dados que indicam redução dos índices de mortalidade infantil e aumento das taxas de cobertura pré-natal, de vacinação e de vigilância à saúde dos seguintes segmentos: mães, crianças, adolescentes, adultos e idosos, em diversos municípios. Fracolli e Bertollozi (2003) avaliam que, na esfera familiar, o PSF propicia maior proximidade com as pessoas e seus modos de “andar na vida”, principalmente através das visitas e dos atendimentos domiciliares, elencadas como práticas importantes dos profissionais que atuam junto ao Programa. Podemos aqui destacar que esta proximidade é maior quando se trata do agente comunitário de saúde, pois se “[...] a cultura do enfermeiro e da família é diferente, bem como a sua inserção social a do agente comunitário de saúde não o é” (FRACOLLI; BERTOLLOZI, 2003, p. 7). E as estratégias que, segundo as referidas autoras, devem ser buscadas para a compreensão e a aproximação do significado da família acerca da sua qualidade de vida e de saúde, podem ser conseguidas, a nosso ver, através do agente comunitário de saúde.

De acordo com Zoboli; Martins e Fortes (2003), os seguintes princípios éticos devem ser observados, com atenção, nas atividades do PSF: privacidade, confidencialidade das informações, justiça, solidariedade e eqüidade. O dever de manter o segredo das informações constitui-se em obrigação ética dos profissionais

de saúde, técnicos e auxiliares, do corpo técnico-administratrivo e dos agentes comunitários, e devem ser criadas condições para que se mantenham sob sigilo os dados relativos à intimidade do usuário e das famílias. Isto se aplica igualmente ao âmbito interno e próprio de cada família, pois um usuário pode não desejar que alguns fatos ou dados de sua privacidade sejam revelados a outros membros da família.

Os referidos autores defendem ser dever ético dos profissionais de saúde manter sigilo das informações confidenciais e que devem ser criadas condições para a preservação dos dados relativos à intimidade do usuário e das famílias. A confidencialidade também se aplica ao âmbito interno e próprio de cada família, pois um usuário pode desejar que fatos ou dados de sua privacidade não sejam revelados a outros membros da família.

De acordo com o próprio Ministério da Saúde (BRASIL, 2003c), a Reforma Sanitária continua enfrentando muitas dificuldades para a sua concretização. A dificuldade de construir uma prática de promoção da saúde capaz de romper com o próprio modelo do conhecimento e de formação dos profissionais é um dos obstáculos. Deste modo, focalizar, numa pesquisa, o agente comunitário de saúde enquanto profissional que mais se aproxima da demanda do SUS, pode vir a contribuir com a obtenção de dados tanto para a sua capacitação como para a de outros profissionais do PSF.

Capacitar de forma contínua é um propósito da política de recursos humanos no âmbito do SUS. Ao nosso ver, é uma estratégia imprescindível para que a qualificação dos trabalhadores da saúde possa ocorrer de modo efetivo. Diante da relevância dada à educação destes profissionais, dedicamos um item a esta temática. Acrescentamos que, diante da proximidade do tema com a educação em

saúde, no sentido de prática que visa capacitar não trabalhadores de saúde, mas

indivíduos e grupos de um modo em geral, dedicar um tópico referente à educação permanente em saúde é importante. Antecipamos, aqui, que a representação social que os agentes comunitários de saúde constroem acerca da educação em saúde tem vários sentidos, inclusive o de capacitação profissional.