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um contrato de confiança (BOURDIEU, 1999).

3.3 TÉCNICAS E INSTRUMENTOS

3.3.3 OS QUESTIONÁRIOS E AS ENTREVISTAS

O questionário incluiu questões fechadas e abertas sobre dados sócio- demográficos dos ACSs, o exercício da sua atividade profissional e sobre a sua relação com os demais membros da equipe do PAC/PSF e com a comunidade. Uma versão mais ampla do questionário foi aplicada, exclusivamente, aos agentes comunitários de saúde do PACS. Para estes, uma vez que as observações foram realizadas por ocasião da primeira fase de entrada no campo, quando o PSF ainda estava sendo implantado no município de João Pessoa (embora também nas assembléias da AACS-JP e do SINDACS-PB), o questionário teve o propósito

apontado por Ferreira, V. (1986): objetivar informações e explorar fenômenos. A utilização, principalmente, de perguntas abertas permitiu apreender que as diferenças entre estes profissionais e os do PSF não se relacionam às atividades realizadas, mas sim ao apoio de uma ESF e da USF. O comentário de um ACS do PSF, que foi vinculado ao PACS, retrata adequadamente esta diferenciação: “A prestação de serviço do PSF é mais forte do que do PACS. Que a ajuda que o PACS tinha não é que nem agora, do PSF. Agora é mais organizado” (MH116).

Não apenas as questões abertas do questionário, mas igualmente as perguntas das entrevistas em profundidade e as observações permitiram identificar as atividades desenvolvidas pelos ACSs, bem como sua apreciação acerca da importância das mesmas e sobre quais ações se referem à educação em saúde. As fotografias em exposição nos Distritos Sanitários, nas USF, assim como as fotos dos membros das equipes do PACS/PSF e da direção da AACS-JP e do SINDACS-PB, da mesma forma favoreceram a identificação das atividades representadas como fundamentais no cotidiano do agente comunitário de saúde. Deduzimos, inclusive, que o registro fotográfico, além de expressar um gosto dos agentes comunitários, é um símbolo de distinção. Por isso, assinalamos a importância de uma análise posterior, a qual nós mesmos nos propomos a fazer. Com relação à incorporação desta prática espontânea dos ACSs como instrumento de coleta de dados, Sá (2002) nos encoraja a fazê-la, ao destaca a sua originalidade.

Justificamos o uso da entrevista por ser um instrumental que valoriza a fala dos agentes sociais. Segundo Minayo (1998), a possibilidade da fala, por si mesmo, revela condições estruturais, sistemas de valores, normas e hábito. Mas não podemos aqui deixar de destacar que, de acordo com esta pesquisadora, a entrevista transmite, através de um indivíduo, as representações de grupos

determinados, em condições históricas, sócio-econômicas e culturais específicas, e é o que a torna um instrumento de coleta de dados privilegiados para as ciências sociais. Embora esta característica não apóie nossa opção, já que elegemos a Teoria do Núcleo Central como base teórico-metodológica deste estudo, não a desconsideramos.

Uma vez que não realizamos entrevistas estruturadas, conforme descreveremos mais adiante, nelas pudemos identificar a exposição de devaneios, projetos, impressões etc, conforme Brandão, C. (1986) caracteriza a entrevista livre. Ao nosso ver, a exposição de trechos das entrevistas possibilita-nos discernir porque temáticas que a priori não se relacionam à identidade do agente comunitário de saúde, nem à educação em saúde, são abordadas.

Sobre o uso deste instrumental como estratégia metodológica de pesquisa em representações sociais, Sá (1996) aponta que a entrevista em profundidade é amplamente privilegiada por Jodelet e avaliada por Abric, como método indispensável. Para nós, também indispensáveis de serem apresentadas. Partimos do fato de que, como não fragmentamos as associações-livres feitas de modo combinado – sobre este dado ainda comentaremos –, então sensato é expor a fala de pelo menos um agente comunitário de saúde, em sua totalidade. O que não significa afirmar que omissões não possam ser feitas, tanto para não identificar pessoas e lugares, como para se expor exclusivamente o autorizado e o que se faz pertinente aos objetivos da pesquisa.

No que concerne à aplicação das entrevistas, as mesmas foram realizadas individualmente e iniciadas a partir da solicitação de justificativas para as associações-livres feitas, inexistindo, assim, um roteiro previamente elaborado. As explicações das associações, porém, favoreceram questionamentos sobre cinco

temáticas principais: (1) a relação do agente comunitário de saúde com a comunidade, com a ESF e com os órgãos públicos; (2) as ações do agente comunitário de saúde ligadas à educação em saúde; (3) a representação dos outros sobre o agente comunitário de saúde; (4) o gosto pelas atividades desenvolvidas; e (5) os desafios e as lutas enfrentadas pela categoria. Além disso, elas conduziam a que, de forma espontânea, fossem feitos comentários relativos a expectativas geradas pela pesquisa.

Posto que a nossa opção teórico-metodológica requereu um número de agentes comunitários de saúde cuja totalidade não seria necessário entrevistarmos, criamos três situações. Uma, na qual eram aplicadas as associações-livres de palavras, solicitadas suas justificativas e, a partir daí, realizada uma entrevista em profundidade. Outra, que combinava associações-livres e suas justificativas. Uma terceira, que se limitava apenas à aplicação das associações e às justificativas de palavras e expressões pouco evocadas. Para justificar nossa opção com relação às entrevistas, tomamos como base o posicionamento de Sá (1998, p. 92), segundo o qual o requisito amostral não chega a ser necessário porque a representação manifestada por um certo número de sujeitos e por um número maior seria a mesma. Ele sugere empregar o critério de ‘saturação’, ou seja, que quando os temas e/ou argumentos começarem a se repetir sejam realizadas mais algumas entrevistas e se conclua a coleta.

Definimos distintas situações relativas à aplicação dos instrumentos para garantir que as mesmas fossem realizadas junto aos agentes comunitários dos cinco Distritos Sanitários. Desta forma, as entrevistas em profundidade não se concentraram num único distrito, nem numa mesma unidade. Essa medida garantiu que aprofundássemos a coleta dos dados para os casos menos freqüentes: agentes

comunitários de saúde do sexo masculino, agentes comunitários de saúde vinculados à diretoria da AACS-JP e agentes que não eram a esta associados.

As entrevistas foram gravadas, na maioria das vezes, sempre quando houve consentimento. Posteriormente, foram por nós transcritas, o que propiciou o registro de notas analíticas, além de ir tornando o conteúdo das mesmas mais familiares, facilitando assim o processo de impregnação. No que se refere à transcrição, embora na literatura o maior apoio seja à transcrição na íntegra (BARDIN, 1978; SHARROCK; ANDERSON, 1987; GILL, 2002), não optamos por esta forma. Justificamos tal opção com base no posicionamento de Bourdieu (1999d), que defende que, em respeito ao entrevistado, às vezes se faz necessário excluir do texto certos desdobramentos, frases confusas, redundâncias verbais ou de tiques de linguagem (bom, é..., né?). Com o propósito de não deixarmos transparecer quem era o respondente, excluímos os nomes de pessoas e de lugares, principalmente porque estes, na maioria das vezes, retratavam conflitos, ora com a equipe, ora com a comunidade, ou problemáticas ligadas às condições de vida da clientela atendida pelo PACS/PSF. Ainda substituímos termos expressos de modo equivocado pela sua grafia correta (instrói por instrui), desde que não se tratasse de terminologia específica da área da saúde. Decisão que tomamos com base na preocupação do próprio sujeito com o registro de erros ou no seu questionamento acerca da pronúncia correta do termo, como foi o caso do exemplo dado. Procedemos, porém, aos registros das pausas e dos risos, posto que identificamos que os mesmos ocorriam principalmente diante de certas temáticas: Visão da Secretaria de Saúde sobre o agente comunitário de saúde, educação em saúde e a relação agente comunitário de saúde e educador.

mesmas tiveram como questão indutora associações-livres feitas exclusivamente para o estímulo ‘agente comunitário de saúde’, constituindo-se, assim, numa versão compacta da entrevista dos agentes comunitários de saúde. Duas delas foram gravadas, por nossa opção, uma vez que se trataram de entrevistas em profundidade. Precisávamos compreender mais o campo e tirar dúvidas relacionadas ao observado e ao que vinha sendo dito pelos ACSs. Outras duas, embora breves, foram gravadas, mas por solicitação dos respondentes.

Devido à necessidade de aprofundamento de alguns dados obtidos através deste e de outros instrumentais, realizamos observações complementares, as quais se efetivaram durante as assembléias extraordinárias da AACS-JP e em uma assembléia do SINDACS-PB. Nesta última observação, identificarmos ter sido dado ênfase ao registro de nossa presença. É tanto que as credenciais de professora e de pesquisadora foram dadas por ocasião do convite para a composição da mesa. Mas esta observação foi fecunda em informações, principalmente por ter sido possível gravar todo o debate entre agentes comunitários de saúde e um representante do Ministério da Saúde. Os detalhes registrados não apenas nos permitem confirmar a compreensão que tivemos da “identidade instituída” dos agentes comunitários de saúde, como perceber, mesmo que só no discurso, diferenças decorrentes da mudança de governo federal.

A importância dada à pesquisadora, por se interessar em conhecer o trabalho dos agentes comunitários de saúde, foi, ao longo de toda a pesquisa, reafirmada. Isto se atrela, conseqüentemente, às expectativas criadas pelo grupo. Sobre este aspecto, a reação diante do Termo de Consentimento Livre Esclarecido e a gravação das entrevistas se faz necessário posteriormente discorrer porque fornecem indícios da identidade do grupo.