Come¸camos nossa discuss˜ao sobre ´algebras tensoriais apresentando a no¸c˜ao de espa¸co de Fock associado a um espa¸co vetorial, uma constru¸c˜ao muito importante na Mecˆanica Quˆantica, na Teoria Quˆantica de Campos e na Mecˆanica Estat´ıstica Quˆantica, sendo tamb´em relevante em certas ´areas da Matem´atica, como na Teoria dos Grupos de Lie e outras.
• O espa¸co de Fock
Seja U um espa¸co vetorial (n˜ao necessariamente de dimens˜ao finita) sobre um corpo K. Na Se¸c˜ao 2.3.5, p´agina
173, definimos o produto tensorial U⊗Kn que aqui iremos denotar simplificadamente por U⊗n (doravante omitiremos o sub´ındiceK dos s´ımbolos ⊗e⊕). Pela conven¸c˜ao adotada naquela se¸c˜ao, temos U⊗n =K quandon = 0. Agregando a isso a defini¸c˜ao de somas diretas de cole¸c˜oes arbitr´arias de espa¸cos vetoriais, apresentada na Se¸c˜ao 2.3.4, p´agina 171, podemos definir o espa¸co vetorial
T(U) :=
M∞ n=0
U⊗n.
O espa¸co T(U) ´e denominado oespa¸co de Fock84associado85ao espa¸co vetorialV.
Na Se¸c˜ao 2.3.7, p´agina 189, definimos tamb´em os espa¸cos sim´etrico e antissim´etrico (U⊗n)S e (U⊗n)A, respectiva-mente. Com eles, podemos analogamente definir os espa¸cos
TS(U) :=
que s˜ao os subespa¸cos sim´etrico e antissim´etrico de T(U), respectivamente. Acima, para n = 0 convencionamos que U⊗0
S = U⊗0
A=K e paran= 1 convencionamos que U⊗1
S= U⊗1
A=U.
Os espa¸cosTS(U) eTA(U) s˜ao denominados oespa¸co de Fock sim´etricoe oespa¸co de Fock antissim´etrico, respecti-vamente, associados ao espa¸co vetorialU.
Antes de prosseguirmos, comentemos que as constru¸c˜oes deT(U),TS(U) eTA(U), acima, s˜ao puramente alg´ebricas.
Em diversos casos ´e poss´ıvel introduzir topologias nelas casoUseja tamb´em um espa¸co vetorial topol´ogico. Tal ´e verdade no importante caso em queU´e um espa¸co de Hilbert. Por ora, n˜ao entraremos no estudo de espa¸cos de Fock topol´ogicos.
2.5.1 Algebras Tensoriais ´
Lembremos que, de acordo com a defini¸c˜ao de soma direta, cada vetor v de T(U) ´e da forma v0⊕v1⊕v2⊕ · · ·, com vk ∈ U⊗n para todo k, mas somente um n´umero finito de vk’s ´e n˜ao nulo. ´E fun¸c˜ao disso, ´e poss´ıvel definir em T(U) um produto que o transforma em uma ´algebra associativa: para a ∈
M∞ Acima, usamos diversas vezes as propriedades de distributividade estabelecidas no Exerc´ıcio E. 2.129, p´agina 180. Os elementosakq⊗blp−q s˜ao definidos pelo isomorfismo canˆonico: se
x = X
85Os espa¸cos de Fock foram introduzidos em V. Fock, “Konfigurationsraum und zweite Quantelung”, Z. Phys.75, 622–647 (1932).
Aqui, usamos o isomorfismo canˆonico U⊗m⊗U⊗n →U⊗(m+n) (vide (2.109)) para identificar
xr1⊗ · · · ⊗xrm
⊗ y1s⊗
· · · ⊗yns
exr1⊗ · · · ⊗xrm⊗ys1⊗ · · · ⊗ysn.
Observe-se que, devido ao fato de que apenas uma cole¸c˜ao finita de componentesaki eblj ser n˜ao nula, ent˜ao apenas uma cole¸c˜ao finita de elementos da forma
Xp q=0
akq ⊗blp−q, comp= 0, . . . , ∞, ser´a n˜ao nula tamb´em (Exerc´ıcio E. 2.141), provando que o produto acima realmente resulta em elementos deT(U) e, portanto, define um produto emT(U).
E. 2.141 Exerc´ıcio. Sejamai∈U⊗i ebj∈U⊗j para todosi, j= 0, 1, . . . , ∞. Mostre que seai= 0para todoi > M ebj= 0 para todoj > N, ent˜ao
Xp q=0
aq⊗bp−q= 0para todo comp > M+N. 6
O espa¸co vetorialT(U) torna-se, assim, uma ´algebra, denominada´algebra tensorialdeU. Essa ´algebra ´e associativa e unital, como se vˆe nos pr´oximos exerc´ıcios.
E. 2.142 Exerc´ıcio. Mostre que o produto definido acima ´e associativo. Para tal, observe que, para x = x1 ⊗ · · · ⊗xm, y=y1⊗ · · · ⊗ynez=z1⊗ · · · ⊗zo o isomorfismo canˆonico mapeia
x⊗y
⊗z ex⊗ y⊗z
emx⊗y⊗z. 6
E. 2.143 Exerc´ıcio. Sejae∈T(U)da formae:= 1⊕0⊕0⊕ · · ·, onde1´e a unidade do corpoK. Mostre, usando a defini¸c˜ao de
produto dada acima, que1b=bpara todob∈T(U). 6
Algebras tensoriais s˜ao objetos de enorme importˆ´ ancia e diversos outros tipos de ´algebra podem ser constru´ıdas a partir da mesma ou de modo semelhante `a mesma.
Na Se¸c˜ao 2.1.7.5, p´agina 112, mostramos como ´algebras tensoriais podem ser empregadas na denifi¸c˜ao das chamadas Algebras de Clifford, de relevˆancia na F´ısica Quˆ´ antica.
2.5.2 Algebras Exteriores ´
Algebras exteriores s˜ao um tipo especial de ´´ algebras de Grassmann (apresentadas na Se¸c˜ao 2.1.7.4, p´agina 111) e ocorrem de forma importante na Topologia Diferencial e na Geometria Diferencial, especialmente no estudo das chamadasformas diferenciais, introduzidas por ´Elie Cartan86. O tratamento que faremos aqui ´e geral e n˜ao se especializa a estruturas diferenci´aveis.
Na Se¸c˜ao 2.3.7, p´agina 189, definimos o espa¸co (U⊗n)A como o subespa¸co de U⊗n constitu´ıdo pela imagem do operador de antissimetriza¸c˜aoAn. Sejam p, q ∈N0. Se x∈(U⊗p)A ey ∈(U⊗q)A, ent˜ao xe y s˜ao (evidentemente) elementos de U⊗p e U⊗q, respectivamente, e, portanto, o produto tensorial x⊗y (como introduzido acima) define um elemento deU⊗(p+q). Parax∈(U⊗p)A ey∈(U⊗q)A, defina-se o produto∧p, q : (U⊗p)A×(U⊗q)A→ U⊗(p+q)
Apor x∧p, qy := (p+q)!
p!q! Ap+q x⊗y
. (2.159)
Note-se que, por essa defini¸c˜ao, valer´a no casop= 0 quex∈Ke, portanto,x∧0, qy:=Aq x⊗y
=Aq xy
=xAq y
= xy. Analogamente, no casoq= 0 teremosy∈Ke, portanto,x∧p,0y:=Ap x⊗y
=Ap yx
=yAp x
=yx.
De acordo com (2.145), p´agina 190, vale Ap+q
xπ(1)⊗ · · · ⊗xπ(p)⊗yσ(1)⊗ · · · ⊗yσ(q)
= sinal (π)sinal (σ)Ap+q
x1⊗ · · · ⊗xp⊗y1⊗ · · · ⊗yq
(2.160)
para todosπ∈Sp, σ∈Sq. Assim, sexey s˜ao da formax=x1∧ · · · ∧xp ey=y1∧ · · · ∧yq, ent˜ao, usando tamb´em
86Elie Joseph Cartan (1869–1951).´
(2.146) e (2.147), segue que x∈(U⊗p)A. Isso n˜ao ´e necessariamente verdade parappar. Por´em, segue de (2.161) e do comentado no Exerc´ıcio E.
2.134, p´agina 191, que x1∧ · · · ∧xp
∧p, p x1∧ · · · ∧xp
=x1∧ · · · ∧xp∧x1∧ · · · ∧xp= 0 para todop∈N.
Para futura referˆencia, resumindo nossos resultados, temos Proposi¸c˜ao 2.30 Com as defini¸c˜oes acima valem,
1. O produto∧p, q: (U⊗p)A×(U⊗q)A→(U⊗(p+q))A ´e bilinear, ou seja, satisfaz
Essa propriedade ´e por vezes denominadacomutatividade graduada. Casopseja ´ımpar, isso implica quex∧p, px= 0. Para ppar isso n˜ao ´e necessariamente verdade. Por´em, parax1, . . . , xp∈U, vale
x1∧ · · · ∧xp
∧p, p x1∧ · · · ∧xp
=x1∧ · · · ∧xp∧x1∧ · · · ∧xp = 0
para todo p∈N. 2
• A ´algebra exterior deU
Podemos agora proceder de forma an´aloga `a que empregamos ao transformarmosT(U) em uma ´algebra associativa e unital, usando os produtos ∧p, q para fazer tamb´em de TA(U) uma ´algebra associativa. Para a ∈
M∞ A associatividade do produto assim definido decorre diretamente de (2.162) e sua demonstra¸c˜ao ´e deixada como exerc´ıcio.
O espa¸co vetorial TA(U) torna-se, assim, uma ´algebra associativa denominada ´algebra exterior de U. Essa ´algebra ´e unital, como se depreende do pr´oximo exerc´ıcio.
• O caso de espa¸cos de dimens˜ao finita
De particular importˆancia para a Topologia Diferencial e para a Geometria Diferencial ´e o caso em queU ´e um espa¸co de dimens˜ao finita m. Seja{e1, . . . , em} uma base emU. Pelo comentado no Exerc´ıcio E. 2.135, p´agina 191, vale aqui para o espa¸coTA(U) de todos os tensores antissim´etricos,
TA(U) = K⊕U⊕ U⊗2
H´a tamb´em um outro produto ´util que pode ser definido entre espa¸cos U⊗n
A, o chamadoproduto interior. Para
Honorificamente define-se tamb´emIu0≡0.
E. 2.145 Exerc´ıcio. Demonstre as seguintes propriedades do produto interior:
IunIun+1 = 0, 0 ≤ n ≤ m−1. (2.169)
Iun1+n2 ω1∧n1, n2ω2
= Iun1ω1
∧n1−1, n2ω2+ (−1)n1ω1∧n1, n2−1Iun2 ω2
, (2.170)
para todosω1 ∈ U⊗n1
A eω2∈ U⊗n2
A. Observe-se que a propriedade (2.170) ´e similar `a regra de Leibniz para derivadas, exceto
pelo fator(−1)n1 do lado direito. 6 de (2.172) ´e apresentada no Apˆendice 2.A, p´agina 215.