2.3 Espa¸ cos Vetoriais. Estruturas e Constru¸ c˜ oes B´ asicas
2.3.6 Produtos Tensoriais de um Espa¸co Vetorial com seu Dual
M V1⊕ · · · ⊕Vn′
. (2.126)
Pela Proposi¸c˜ao 2.18, p´agina 167, e pelo Teorema 2.13, p´agina 167, segue de (2.126) (tomando-se o dual) que V1⊗ · · · ⊗Vn′
≃ (V1)′⊗ · · · ⊗(Vn)′ ≃ M V1⊕ · · · ⊕Vn
. (2.127)
Essa rela¸c˜ao tamb´em ser´a evocada adiante. 2
• Uma alternativa `a defini¸c˜ao de produto tensorial de espa¸cos vetoriais
A express˜ao (2.125) diz-nos que podemos, para todos os efeitos, identificarV1⊗ · · · ⊗Vn e o dual deM V1⊕ · · · ⊕Vn
, as formasn-lineares emV1⊕ · · · ⊕Vn. Por isso, a igualdade (2.125) pode ser tomada comodefini¸c˜aoda no¸c˜ao de produto tensorial de espa¸cos vetoriais, o que ´e feito por alguns autores. Note-se, por´em, que essa segunda defini¸c˜ao da no¸c˜ao de produto tensorial ´e restrita ao produto tensorial de espa¸cos de dimens˜ao finita. Nossa primeira defini¸c˜ao de produto tensorial de espa¸cos vetoriais (Se¸c˜ao 2.3.5, p´agina 173) ´e mais geral, e se aplica mesmo ao caso de espa¸cos de dimens˜ao infinita.
Nenhuma das duas defini¸c˜oes ´e “elementar” ou “simples” e pode-se adotar uma ou outra de acordo com a conveniˆencia.
A maioria dos textos sobre Topologia Diferencial ou Geometria Diferencial, por exemplo, prefere a segunda defini¸c˜ao (2.123) (espa¸cos tangentes e cotangentes a variedades de dimens˜ao finita s˜ao espa¸cos vetoriais de dimens˜ao finita. Vide Se¸c˜ao 33, p´agina 1604).
• Novamente, identifica¸c˜oes e conven¸c˜oes Como Ψ : V1⊗ · · · ⊗Vn →
M V1⊕ · · · ⊕Vn
′
´e um isomorfismo, convenciona-se tamb´em identificar (sempre em dimens˜ao finita) os espa¸cos V1⊗ · · · ⊗Vn e
M V1⊕ · · · ⊕Vn′
, ou seja, convenciona-se identificar um tensor Ta1···an e(1)a1⊗ · · · ⊗e(n)an com sua imagem porΨ. Com a mesma, (2.124) fica simplesmente
Ta1···an e(1)a1⊗ · · · ⊗e(n)an ≡ Ta1···anma1···an, (2.128) que identifica um tensor com o dual de uma forma multilinear (ma1···an foram definidos em (2.99), p´agina 173).
Devido a (2.126) temos (sempre em dimens˜ao finita) as identifica¸c˜oes deV1⊗ · · · ⊗Vn com
(V1′)⊗ · · · ⊗(Vn′)′
e com
M V1⊕ · · · ⊕Vn
′
. Evocaremos essas identifica¸c˜oes no futuro, por vezes, sem maiores coment´arios.
Comentamos, por fim, que tamb´em adotaremos a conven¸c˜ao de identificar
Ta1···an e(1)a1⊗ · · · ⊗e(n)an ≡ Ta1···anma1···an, (2.129) assim como identificaremos
V1⊗ · · · ⊗Vn
′
com (V1)′⊗ · · · ⊗(Vn)′ e comM V1⊕ · · · ⊕Vn
, devido a (2.127).
2.3.6 Produtos Tensoriais de um Espa¸co Vetorial com seu Dual
SejaV um espa¸co vetorial de dimens˜ao finita. Adotaremos sua dimens˜ao como sendo m∈Ne consideraremosV como sendo um espa¸co real. Em aplica¸c˜oes como `a Geometria Diferencial e `a Teoria da Relatividade (Especial e Geral), estamos muitas vezes interessados em tensores que sejam elementos de produtos tensoriais envolvendopfatoresV eqfatoresV′, comoV ⊗ · · · ⊗V
| {z }
pvezes
⊗V′⊗ · · · ⊗V′
| {z }
q vezes
. Os elementos de tais espa¸cos s˜ao denominadostensores de tipo (ou posto) (p, q).
Outros ordenamentos tamb´em podem ocorrer no produto tensorial, tais comoV ⊗V′⊗V.
2.3.6.1 Tensores Associados a Formas Bilineares Sim´ etricas N˜ ao Degeneradas. M´ etricas
Vamos tratar de um caso de particular importˆancia na F´ısica Relativ´ıstica e na Geometria Diferencial: o caso de tensores de ordem dois associados a formas bilineares n˜ao-degeneradas e sim´etricas.
Com uso de uma forma bilinear n˜ao-degenerada e sim´etrica podemos constituir um isomorfismo entreV e seu dualV′, assim como entre produtos tensoriais deV ⊗ · · · ⊗V Esses isomorfismos est˜ao relacionados `as opera¸c˜oes de “subir e abaixar ´ındices” de tensores, bem conhecidas daqueles familiarizados com a Teoria da Relatividade. Aqui descreveremos o significado matem´atico dessas opera¸c˜oes.
Uma nomenclatura que por vezes utilizaremos ´e a de chamar os elementos deV′decovetores. Covetores s˜ao, portanto, duais de vetores.
• Delta de Kr¨onecker
Sei, j pertencem a algum conjunto discreto, definimos δij ≡ δij ≡ δij ≡ δij :=
1, sei=j , 0, sei6=j . O s´ımboloδassim definido ´e denominadodelta de Kr¨onecker78.
• Mais sobre bases duais. Mudan¸cas de base
Se{e1, . . . , em}´e uma base emV, sua correspondente base dual canˆonica (para a defini¸c˜ao, vide p´agina 164) emV′
com certos coeficientes reaisEkl. Para que a nova base seja composta por vetores linearmente independentes a matriz de mudan¸ca de base S, cujos elementos s˜ao dados por Sij ≡Eij, deve ser invers´ıvel. Vamos denotar os elementos (S−1)ij
da matriz inversa S−1 por Eij ≡ (S−1)ji. Naturalmente, S−1S = 1 e SS−1 = 1, ou seja, Pm (2.130) e (2.133). Esse importante fato ´e um tanto evidente, mas recomendamos ao leitor incr´edulo provar essa afirma¸c˜ao, como exerc´ıcio.
78Leopold Kr¨onecker (1823–1891).
E. 2.130 Exerc´ıcio. Com as conven¸c˜oes e defini¸c˜oes acima, constate que os vetores de base ei ∈ V e ei ∈ V′,i= 1, . . . , m, podem ser obtidos a partir dos vetores de basefk∈V efk∈V′,k= 1, . . . , m, respectivamente, pelas transforma¸c˜oes
ei = Ekifk e ei = Eikfk,
sendoi= 1, . . . , m. 6
• Formas bilineares sim´etricas. Formas bilineares sim´etricas n˜ao-degeneradas
Como antes, denotemos por M(V ⊕V) o espa¸co das formas bilineares emV. Uma forma bilinearω:V ⊕V →R´e dita ser umaforma bilinear sim´etrica se valerω(u⊕v) =ω(v⊕u) para todosu, v∈V. Uma forma bilinear sim´etrica ω :V ⊕V →R´e dita ser umaforma bilinear sim´etrica n˜ao-degeneradase satisfizer a seguinte condi¸c˜ao: ω(u⊕v) = 0 para todo v∈V se e somente seu= 0.
• M´etricas e formas bilineares
Seja g∈M(V ⊕V) uma forma bilinear sim´etrica e n˜ao-degenerada emV: g :V ⊕V ∋(a⊕b)7→g(a⊕b)∈R. Em uma base{e1, . . . , em} deV podemos escrever um vetora∈V comoa=aiei. Assim, teremos
g(a⊕b) = g aiei
⊕ bjej
= g(ei⊕ej)aibj = gijaibj , onde definimos
gij := g(ei⊕ej) ,
as componentes (ditas “covariantes”) de g na base {e1, . . . , em} deV, e escrevemos g =gijmij (mij foi definido em (2.96)–(2.97), p´agina 172). Recordemos que convencionamos identificar formas bilineares em V ⊕V com tensores em V′⊗V′ e, assim, temos
g = gijmij = gijei⊗ej. Vide (2.129). Com essas identifica¸c˜oes, temos o pareamento
g, a⊗b
= D
gijei⊗ej, akek
⊗ blel E
= gijakbl
ei⊗ej, ek⊗el
= gijakbl ei, ek
| {z }
=δik
ej, el
| {z }
=δlj
= gijaibj = g(a⊕b),
como esperado.
A condi¸c˜ao de simetria implica que gij = gji para todos os ´ındices i, j ∈ {1, . . . , m}. Assim, a forma bilinear sim´etricag possuim(m+ 1)/2 componentes independentes. Mais adiante exploraremos as implica¸c˜oes de suporgcomo n˜ao-degenerada. Agora necessitamos saber como as componentes de gtransformam-se por mudan¸ca de base emV.
• Coment´arios sobre a nomenclatura
Uma forma bilinear sim´etrica e n˜ao-degeneradag ´e tamb´em denominada tensor pseudom´etrico, tensor m´etrico ou simplesmentepseudom´etrica oum´etrica, emV.
O leitor n˜ao deve confundir esse conceito de m´etrica com o conceito de m´etrica empregado em Topologia (uma generaliza¸c˜ao da no¸c˜ao de distˆancia entre pontos), estudado no Cap´ıtulo 24, p´agina 1245. Ainda que circunstancialmente haja uma certa rela¸c˜ao entre essas no¸c˜oes em casos especiais (na Geometria Riemanniana, um tensor m´etrico pode sob hip´oteses induzir uma m´etrica topol´ogica em uma variedade), trata-se de uma coincidˆencia de nomenclatura um tanto infeliz.
Outro ponto infeliz da nomenclatura comum refere-se `a part´ıcula “pseudo”. Normalmente, uma forma sim´etrica e n˜ao-degenerada deveria ser denominada tensor m´etricooum´etrica se for tamb´em positivo. Uma forma sim´etrica, n˜ ao-degenerada e n˜ao-positiva deveria ser denominada tensor pseudom´etrico oupseudom´etrica. No entanto, na Teoria da Relatividade, ´e costume n˜ao empregar a part´ıcula “pseudo”, ainda que l´a se lide com formas sim´etricas, n˜ao-degeneradas e n˜ao positivas.
• Transforma¸c˜ao das componentes de uma m´etrica por mudan¸ca de base
• A “inversa” de um tensor m´etrico
A condi¸c˜ao de n˜ao-degenerescˆencia do tensor m´etrico implica que, em cada base{e1, . . . , em} de V, a matriz G com elementosgij, possui uma inversa. Os elementos de matriz dessa inversaG−1 s˜ao denotados porgij, com ´ındices superiores. Como veremos, essa distin¸c˜ao notacional de ´ındices superiores e inferiores, ainda que n˜ao possua nenhum significado profundo em si, ´e muito conveniente e muito empregada em textos de F´ısica. Observe-se que como G´e uma matriz sim´etrica,G−1tamb´em o ´e e vale a rela¸c˜ao simetriagij =gji para todos os ´ındicesi,j.
Naturalmente,G−1G=1eGG−1=1, o que se escreve na forma
gijgjk = δik e gijgjk = δik . (2.135)
Por uma mudan¸ca de sistema de coordenadas G transforma-se segundo G′ = SGST com Sab = Eab
(vide (2.134)).
Logo, G−1 transforma-se como G′−1 = S−1T
G−1S−1. Os elementos de matriz de S−1 s˜ao S−1
ab = Eba (vide (2.131)–(2.132)). Logo, a transforma¸c˜ao dos elementosgij´e
g′ij = EikEjlgkl. (2.136)
E. 2.131 Exerc´ıcio. Verifique isso e constate que essa express˜ao respeita as rela¸c˜oes (2.135), como esperado. 6 Com os elementos gij ´e poss´ıvel definir uma forma bilinearg♯∈M V′⊗V′
Como um tensor de tipo (0, 2), temos
g♯ = gijei⊗ej . (2.139)
E importante notar que as express˜oes (2.137) e (2.139) s˜ao invariantes por mudan¸cas de base. ´´ E suficiente provar essa afirma¸c˜ao para (2.139). De fato,
como quer´ıamos mostrar. Isso prova queg♯tem uma existˆencia intr´ınseca, independente da base adotada.
Agora, um pouco da nomenclatura adotada em textos de F´ısica. As componentesgij do tensor m´etrico s˜ao tamb´em denominadas componentes covariantes do tensor m´etrico. As componentes de g♯ em uma base s˜ao (por defini¸c˜ao)gij e s˜ao denominadas componentes contravariantes do tensor m´etrico. O tensor g ´e tamb´em denominado tensor m´etrico covariantee o tensorg♯´e tamb´em denominadotensor m´etrico contravariante.
• Mapeando V em V′ com os tensores m´etricos
Por uma quest˜ao de simetria, vamos aqui denotar o tensor m´etricogporg♯. Temos, portanto, em bases{e1, . . . , em} e{e1, . . . , em} deV eV′, respectivamente,
g♯ = gijei⊗ej e g♯ = gijei⊗ej.
Os tensoresg♯eg♯permitem-nos definir dois isomorfismos lineares entre os espa¸cosV emV′, os quais, por economia e similaridade, tamb´em denotamos porg♯ eg♯:
• Definimosg♯ :V →V′ como sendo a aplica¸c˜ao linear que a cadaa∈V associa um elemento g♯(a)∈V′ de forma
• Subindo e abaixando ´ındices vetores, covetores e tensores em geral
Como vimos acima, a aplica¸c˜ao que leva um vetor v ∈ V ao covetor g♯(v) ∈ V′ corresponde, no que concerne `as suas componentes em uma base de coordenadas, a transformar as componentes vi nas componentes g♯(v)
j = gjivi. Analogamente, a aplica¸c˜ao que leva um covetor u ∈ V′ ao vetor g♯(u) ∈ V corresponde, no que concerne `as suas componentes em uma base de coordenadas, a transformar as componentesuj nas componentes g♯(u)i
=gijuj. Como g♯ eg♯ s˜ao isomorfismos, ´e costume em textos de F´ısica tratarv ∈V eg♯(v)∈V′ em p´e de igualdade, assim comou∈V′ eg♯(u)∈V.
As componentes vi de v ∈ V em uma base {e1, . . . , em} s˜ao denominadas componentes contravariantes de v, enquanto que as componentes g♯(v)
j de g♯(v)
Com essas identifica¸c˜oes como representa¸c˜oes em componentes da igualdade (2.142).
E. 2.133 Exerc´ıcio importante. Verifique que, de fato, (2.143) expressa (2.142) em coordenadas nas bases {e1, . . . , em} e
{e1, . . . , em}. 6
Esse tipo de nota¸c˜ao, muito mais pr´atica, ´e encontrada ami´ude em livros sobre a Teoria da Relatividade Geral. Assim, de um ponto de vista notacional, no que concerne `as componentes, a passagem de v ∈V a g♯(v)∈ V′ e de u∈ V′ a g♯(u) ∈ V consiste em abaixar e, respectivamente, elevar os ´ındices, transforma¸c˜oes essas definidas pelas contra¸c˜oes vj =gijvi eui =gijuj, respectivamente, com as componentes dos tensores g♯ eg♯. Essas opera¸c˜oes s˜ao inversas uma da outra, pois g♯ e g♯ s˜ao opera¸c˜oes inversas, como j´a comentamos. Componentes de vetores, com ´ındices em cima, s˜ao frequentemente denominadas componentes contravariantes e componentes de covetores, com ´ındices em baixo, s˜ao frequentemente denominadas componentes covariantes.
Com tensores que sejam elementos de produtos tensoriais dos espa¸cos V e V′, as aplica¸c˜oes g♯ e g♯ estendem-se tamb´em de maneira ´obvia, permitindo, analogamente, definir as opera¸c˜oes de elevar e abaixar ´ındices tensoriais. Assim, definimos
como a aplica¸c˜ao linear que leva o tensor
Ti1···ipj1···jq ei1⊗ · · · ⊗eip⊗ej1⊗ · · · ⊗ejq no tensor “dual” Ti1···ipj1···jq ei1⊗ · · · ⊗eip⊗ej1⊗ · · · ⊗ejq , onde
Ti1···ipj1···jq := gi1k1· · ·gipkpgj1l1· · ·gjqlqTk1···kpl1···lq .
Com essas opera¸c˜oes de subida e abaixamento de ´ındices em componentes de tensores gerais podemos constituir grandezas invariantes por mudan¸cas de base, tais como Ui1···ipj1···jqVi1···ipj1···jq.