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O esporte educacional, como uma das manifestações das práticas esportivas, deve ser garantido pelo Estado. A Constituição Federal da República Federativa do Brasil garante tal direito, enfatizando que a destinação dos recursos deve ser prioritária para esse fim.

Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento. (BRASIL, 1988).

No ano seguinte, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi lançado, pela Secretaria de Educação Física e Desportos, vinculado ao Ministério da

79 Educação, o caderno esporte na escola, no qual consta a “Carta Brasileira do Esporte na Escola”, elaborada na I Conferência do Esporte na Escola, que destacou a promoção prioritária ao esporte educacional, como previsto na Carta Magna. Além disso, abordou alguns aspectos acerca do esporte educacional, entre eles:

Considerando que, no Brasil, as chamadas manifestações de Esporte-Educação foram, na sua maioria, reproduções do esporte institucionalizado, sem uma preocupação substantiva com o sentido educativo.

Considerando, ainda, que aos educadores compete: a) ter como referência o sentido educativo emancipador para os praticantes do Esporte na Escola, que ultrapassa o simples domínio corporal e a saúde, contribuindo para o desenvolvimento pleno e harmonioso do ser humano em comunidade; b) recusar toda forma de preconceito e a especialização precoce; c) favorecer o crescimento pessoal e social dos praticantes do Esporte na Escola, através de uma atuação pedagógica apoiada na ação e na reflexão; d) perceber que mesmo as situações de treinamento e competição do Esporte-Educação necessitam continuar referenciadas nos preceitos educacionais do Esporte; (BRASIL, 1989).

É notório que as manifestações do esporte de rendimento institucionalizado, conforme referenciado no documento, sempre estiveram presentes no ambiente educativo. Há uma intenção explícita, nas determinações da carta, de tentar romper com essa hegemonia, incumbindo e dando autonomia aos educadores no sentido de buscar essa ruptura, almejando o sentido educativo e emancipador para os praticantes do Esporte na Escola, recusando toda forma de preconceito e especialização precoce, além de permitir o crescimento pessoal e social dos praticantes.

O esporte educacional não pode estar desvinculado das políticas públicas da educação e do bem estar social da população. Não pode estar distante da escolarização e do Projeto Político Pedagógico da escola, assim como não pode ser admitido fora do contexto de reinvenção e transformação da sociedade. (Taffarel, 2000)

Nessa perspectiva, a Educação Física no âmbito escolar aborda, pedagogicamente, um conhecimento denominado de cultura corporal. O esporte, enquanto conteúdo do componente curricular, está inserido como um dos temas dessa cultura.

O esporte, como prática social que institucionaliza temas lúdicos da cultura corporal, se projeta numa dimensão

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complexa de fenômeno que envolve códigos, sentidos e significados da sociedade que o cria e o pratica. Por isso, deve ser analisado nos seus variados aspectos, para determinar a forma em que deve ser abordado pedagogicamente no sentido de esporte “da” escola e não como esporte “na” escola. (SOARES et al., 2013, p.59).

A legislação9 específica que institui as normas gerais sobre o esporte evidencia que o mesmo pode ser reconhecido em diversas dimensões, como visto anteriormente, uma delas é o esporte educacional. Este pode ser realizado dentro do espaço escolar, relacionando-se com a educação formal, caracterizando-se como “esporte escolar”. Segundo Kunz (2003, p. 73), “a escola é por excelência o lugar social específico onde a organização da situação educativa é formal e explícita, onde o espaço pedagógico é penetrado de intenções”.

Pode ser também realizado fora da escola, em formas assistemáticas de educação, tal qual prevê a mesma legislação, como por exemplo em: projetos socioeducativos oferecidos por meio de políticas públicas, clubes, escolinhas, academias, centros de iniciação desportiva, entre outros, relacionando-se com a educação não formal.

A prática esportiva educacional deve estar relacionada à transformação, possibilitando educar e transformar o indivíduo ou até mesmo uma sociedade por intermédio do esporte, e a escola, por possuir autonomia pedagógica, acaba se tornando um espaço ideal para se empreender essa metamorfose.

É, sobretudo, embora não exclusivamente, na escola que se estabelece uma relação especial com o esporte, afinal, é ali que o conhecimento produzido pelo homem é pedagogizado e tratado metodologicamente para que o aluno venha a aprendê- lo ou apreendê-lo. (ASSIS, 2001, p.6).

Uma vez que o esporte escolar10 deve ser inclusivo, respeitando a diversidade, os alunos têm o direito de aprendê-lo na perspectiva da autonomia, e praticá-lo independentemente de condições físicas, de raça, cor, sexo, idade, religião ou condição social, através de atividades auto-organizadas e autodeterminadas. (PNE, 2005).

O esporte escolar é o esporte praticado na escola no âmbito da educação básica e superior, seja como conteúdo curricular ou

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Lei nº 9615/98, conhecida popularmente por Lei Pelé, institui as normas gerais sobre o desporto.

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Diante do que foi debatido no capítulo anterior, deve-se compreender que o esporte escolar é um desdobramento do esporte educacional, contemplado dentro do espaço formal de educação, ou seja, a escola.

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atividade extracurricular, atendendo aos objetivos do Projeto Político Pedagógico. (PNE, 2005, p.25).

O ensino do esporte na escola não deve orientar-se, apenas, para formação de uma futura elite esportiva, visando o alto rendimento, mas também não significa a eliminação da possibilidade de identificação de possíveis atletas.

Da forma como vem sendo tratado no interior da escola, o esporte, com suas características e abordagens atuais, tem sido bastante questionado devido a sua caracterização hegemônica do alto rendimento. Kunz (2003, p.125) evidencia isso ao afirmar que:

[...] o esporte ensinado nas escolas enquanto cópia irrefletida do esporte competição ou de rendimento, só pode fomentar vivências de sucesso para uma minoria e o fracasso ou vivência de insucesso para a grande maioria.

Diante dessa situação, a estrutura organizacional do esporte fomentada pelo Estado, deve contemplar os locais e meios adequados, que não seja a escola, para a realização de um trabalho específico de iniciação desportiva.

No âmbito do Distrito Federal, há uma política pública que relaciona o esporte escolar à iniciação esportiva. Um projeto vinculado à Secretaria de Educação, gratuito e exclusivo, realizado nas unidades escolares, em ginásios ou em quadras comunitárias. O CID (Centro de Iniciação Desportiva)11, como é intitulado, atende aos alunos matriculados na rede pública de ensino, acontecendo em turno contrário, onde são oferecidas variadas modalidades esportivas. Já na esfera Federal, vinculado ao Ministério do Esporte, é nomeado de CIE (Centro de iniciação ao Esporte).

Os Centros de Iniciação Desportiva (CID) objetivam proporcionar aos alunos da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal o conhecimento técnico e tático de diferentes modalidades esportivas, buscando identificar diferentes aptidões e interesses dos estudantes, ampliando o processo de seleção e formação de futuros atletas. (SEEDF, 2018).12

O objetivo dos Centros de Iniciação ao Esporte (CIE) é ampliar a oferta de infraestrutura de equipamento público esportivo qualificado, incentivando a iniciação esportiva em territórios de vulnerabilidade social das grandes cidades brasileiras. (ME, 2018).13

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Para mais informações a respeito do CID, acessar o sítio http://www.se.df.gov.br/centro-de- iniciacao-desportiva-cid/

12

Disponível em: http://www.se.df.gov.br/centro-de-iniciacao-desportiva-cid/

Acesso em: 11/03/2019

13

Disponível em: http://www.esporte.gov.br/index.php/cie

82 Os objetivos explícitos dos Centros de Iniciação Desportiva, por serem espaços educacionais que visam a iniciação ao esporte, não deveriam se distanciar de uma proposta relacionada à abordagem pedagógica e lúdica do desporto, por mais que essa seja desenvolvida implicitamente.

A prática pedagógica esportiva incorpora ideias e valores educativos quando não submete os alunos a uma perspectiva excludente que visa à seleção dos mais habilidosos e a exclusão dos menos talentosos. Deve ser democrático proporcionando a participação de todos.

A participação assim como a totalidade, a coeducação, a emancipação, a cooperação e o regionalismo fazem parte dos princípios do esporte educacional, referendados pelo Congresso Internacional sobre Educação Populacional e Desenvolvimento da UNESCO, realizado na cidade de Paris em 1993.

Esses princípios se complementam. Pois, no que se refere ao princípio da participação, todas as ações que levam os protagonistas do esporte educacional a interferir na realidade através da participação estão presentes nesse princípio que, por sinal, compromete os praticantes no campo social do esporte pelas vivências que essa atuação oferece.

Os princípios da totalidade e da coeducação cooperam respectivamente por defender que o esporte educacional deve fortalecer a unidade do homem consigo, com o outro e com o mundo, tendo como elementos indissociáveis a emoção, a sensação, o pensamento e a intuição e, ao afirmar que a prática esportiva educacional integra situações heterogêneas de sexo, idade, nível socioeconômico, condições físicas, dentre outras, das pessoas envolvidas nas práticas esportivas.

Da mesma forma, o princípio da emancipação (também introduzido nas atividades esportivas educacionais) busca levar os participantes a situações estimulantes de desenvolvimento da independência, autonomia e liberdade. Sendo assim complementado pelos princípios da cooperação e do regionalismo que incentivam ações conjuntas durante a prática do esporte educacional a fim de promover o respeito, a proteção e a valorização das raízes e heranças culturais.

Nota-se que os princípios do esporte educacional fortalecem uma abordagem inclusiva do esporte, seja ele realizado dentro ou fora da escola, valorizando as

83 diferenças de seus praticantes, estimulando a cooperação, além de tentar conduzir o indivíduo à aquisição de sua autonomia e liberdade.

Esses princípios reforçam a necessidade de se refletir criticamente o esporte educacional, devendo levar em consideração as práticas pedagógicas dos professores na abordagem do conteúdo, tentando buscar a reinvenção e transformação do esporte. Essa reflexão gira em torno das contradições explicitadas entre a instituição esporte e suas relações com a educação.

Essa manifestação contraditória se dá por meio dos interesses políticos e econômicos de exploração do mercado esportivo, tornando-o, a partir da escola, local privilegiado para sua introdução, ampliação e domínio.

Diante de todo o contexto, fica transparente que “a finalidade do esporte escolar é o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo, democrático e participante.” (Ministério do Esporte, 2018)14

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