• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 2 RACIOCÍNIO PROPORCIONAL E PROPORCIONALIDADE:

2.4 ESTA PESQUISA NO CENÁRIO DAS INVESTIGAÇÕES JÁ DESENVOLVIDAS:

Após investigação realizada para relacionar o fenômeno de interesse e o Modelo Preliminar elaborado (Figura 3) com base nas ideias de outros pesquisadores sobre o desenvolvimento do raciocínio proporcional e aquisição do conceito de proporcionalidade, constata-se a necessidade de reavaliar o modelo elaborado, bem como a questão de pesquisa proposta. Para tanto, apresenta-se nesta seção uma síntese dos entendimentos produzidos ao elaborar a subseção 1.1.2 do Capítulo 1 e as seções 2.1, 2.2 e 2.3 deste capítulo.

No Capítulo 1, subseção 1.1.2, foram apresentadas ideias de pesquisadores (MELLO, 2009; PIRES, 2000; SACRSITÁN; PÉREZ-GÓMEZ, 1998; SACRISTÁN, 2013) para aprofundar o entendimento acerca de currículo, de suas diferentes fases e dos materiais curriculares elaborados para cada fase. Assim, nesta pesquisa, currículo é compreendido como um processo de ação e reflexão que permite analisar e organizar as práticas escolares. Foram identificadas cinco fases: currículo prescrito, planejado, organizado, em ação e avaliado. Para cada fase são elaborados diferentes materiais curriculares, fundamentados ou não no currículo

prescrito, por exemplo, livros didáticos, produções de secretarias estaduais e municipais

(referenciais curriculares, cadernos de apoio ao professor), produções da escola (planos de estudos), produções dos professores (planejamentos), produções dos órgãos responsáveis pelas avaliações de larga escala (matrizes de referência do SAEB e do ENEM).

Destaca-se que as fases do currículo não se desenvolvem de forma contínua, por exemplo, na produção dos materiais do currículo planejado (livros didáticos), nem sempre, segue o que está recomendado no currículo prescrito (PCN, Referenciais Curriculares

estaduais). Pode-se afirmar que há aproximações e distanciamentos, em especial, na elaboração do currículo em ação, influenciadas pelas concepções dos professores e materiais que tiveram acesso para a elaboração dos seus planejamentos.

Ainda, no Capítulo 1, subseção 1.1.2, ao realizar o mapeamento das pesquisas sobre o processo de ensino e aprendizagem do conceito de proporcionalidade constatou-se que a maioria das pesquisas dedicou-se a: avaliação do desempenho dos estudantes ao resolverem situações proporcionais ou organização e desenvolvimento de sequências de ensino com estudantes dos Anos Finais do Ensino Fundamental e professores de Matemática (Apêndice A). Quanto as fontes de produção de dados, poucas pesquisas analisaram livros didáticos (currículo

planejado) e não há pesquisas que tenham investigado o planejamento dos professores da

Educação Básica (currículo em ação) (Apêndice B).

Este dado revela que pouco se conhece a respeito do currículo efetivamente praticado pelo professor da Educação Básica, sobre as interpretações e adaptações que ele realizou por meio da utilização dos diferentes materiais curriculares; bem como sobre as transformações/modificações e escolhas realizadas para organizar as situações de ensino no que tange ao desenvolvimento do raciocínio proporcional e aquisição do conceito de proporcionalidade. Há um campo de pesquisa aberto no que se refere a análise de materiais curriculares utilizados e produzidos pelos professores.

A construção apresentada no Capítulo 2, seção 2.1, forneceu alguns elementos para compreender a proporcionalidade como um conceito essencial da Matemática e não apenas como um conteúdo a ser trabalhado em poucos momentos da Educação Básica, bem como a importância de garantir espaços-tempos nos materiais curriculares para o desenvolvimento do raciocínio relacionado a este conceito, ou seja, o raciocínio proporcional. O esquema (Figura 29) expõe os elementos que permitem afirmar que a proporcionalidade é um conceito formador e unificador da Matemática que possibilita relacionar esta área do conhecimento a outras e as práticas sociais.

Figura 29: Proporcionalidade um conceito formador e unificador da Matemática

Fonte: Elaborada pela autora.

O estudo da teoria dos RRS, seção 2.2, possibilitou ampliar a compreensão sobre a aprendizagem matemática do ponto de vista epistemológico e cognitivo, visto que esta teoria tem balizado os estudos da autora desta pesquisa. Neste sentido, destaca-se a importância das representações semióticas para o acesso aos objetos matemáticos, pois estes não são empíricos, são semióticos. Assim, a atividade matemática requer que sejam mobilizados e coordenados muitos sistemas de representação semióticos, ou seja, que ocorram transformações de representações. Estas transformações de uma representação à outra do mesmo objeto matemático é a “condição cognitiva para poder compreender e utilizar os conceitos e algoritmos” (DUVAL, 2014, p. 37).

Há dois tipos de transformação cognitiva o tratamento e a conversão que precisam ser considerados na elaboração de situações para a aprendizagem matemática. Se as situações são propostas no registro da língua natural, por exemplo, os problemas multiplicativos, é importante a mobilização de uma representação auxiliar de transição, neste caso, a tabular, pois esta permite discriminar as unidades de sentido pertinentes no enunciado do problema e transformar em outros registros matemáticos. Ressalta-se que os dados do mapeamento (Apêndice B) revelam que a teoria dos Registros de Representação Semiótica foi utilizada, apenas, na pesquisa Vizzoli (2006). A construção elaborada na seção 2.2 evidencia a importância desta

teoria cognitiva na análise dos materiais curriculares, pois permite analisar o paradoxo cognitivo da matemática, ou seja, não confundir o objeto com a representação, mesmo que o aceso só possa ser feito por meio de representações semióticas.

A pesquisa realizada para elaborar a seção 2.3 exigiu aprofundar o entendimento de conceitos-chave da teoria dos Campos Conceituais (subseção 2.3.1), em especial, o conceito de situação, pois para Vergnaud (1993, 1996, 2009b) o conhecimento é elaborado em situações. Os conceitos tem seus sentidos traçados por meio da variedade de situações. Assim, as situações dão sentido aos conceitos e são referência dos objetos. Cada situação não pode ser analisada por um conceito apenas, precisa-se de um campo de conceitos.

A opção por compreender os conceitos-chave da teoria dos Campos Conceituais deu- se, principalmente, pelo interesse nos estudos realizados por Vergnaud (2009a) quanto ao campo das estruturas multiplicativas, pois identificou-se no mapeamento (Apêndice B) que a maioria das pesquisas busca nos tipos de problemas deste campo suporte para elaborar sequências de ensino, analisar o desempenho de estudantes e analisar alguns materiais curriculares (livros didáticos e materiais elaborados pelas secretarias dos estados). Além disso, ao apresentar as categorias do campo conceitual multiplicativo (subseção 2.3.1.2) foi possível evidenciar a natureza multiplicativa da proporcionalidade e do raciocínio proporcional, assim como, destacar para cada classe de situações estratégias (análise escalar e funcional) que podem ser utilizadas pelos estudantes. Confirmou-se a importância das representações auxiliares de

transição para resolver as situações por meio da análise escalar e funcional.

Sublinha-se que o esquema do campo conceitual das estruturas multiplicativas (Figura 13), elaborado por Magina, Merlini e Santos (2010), com base em Vergnaud (2009a) sintetiza os diferentes conjuntos de situações deste campo e pode contribuir na análise e elaboração de materiais curriculares.

Os dados do mapeamento das pesquisas (Apêndice C), também, indicam que ao tratar do raciocínio proporcional os pesquisadores buscam respaldo teórico, principalmente, nos estudos de Lesh, Post e Behr (1988) e as estruturas multiplicativas centrais (rede de conceitos, Figura 25) elencadas por Lamon (2007, 2008) foram mencionadas em apenas três pesquisas (MIRANDA, 2009; CARVALHO, 2013; OLIVEIRA, 2014). Destas apenas a pesquisa realizada por Oliveira (2014) utilizou a rede de Lamon (2008) para elaborar e analisar atividades propostas para um grupo de professores em formação continuada. Considerando que poucas pesquisas discutem a rede de conceitos de Lamon (2007, 2008) para investigar o desenvolvimento do raciocínio proporcional e aquisição da proporcionalidade, optou-se por apresentar os conceitos-chave desta rede.

A leitura das obras de Lamon (2007, 2008) permitiu compreender as relações entre o raciocínio proporcional e as diferentes interpretações do número racional, relações já identificadas no final da realização da pesquisa de mestrado da autora do trabalho, bem como destacar, no campo das estruturas multiplicativas, conceitos (medida, partilha, comparação,

quantidade, covariação, unitização) e raciocínios (absoluto, relativo, progressivo e regressivo)

a serem investigados no conjuntos de situações propostas nos materiais curriculares, especialmente, nos livros didáticos e planejamentos dos professores, dada a relevância na aprendizagem da proporcionalidade.

Diante das reflexões postas até aqui, fundamentas nas produções de “outros” pesquisadores e no Modelo Preliminar, expõe-se, na Figura 30, o Modelo Modificado desta pesquisa (etapa 4 do Modelo de Romberg-Onuchic).

Figura 30: Modelo Modificado

Fonte: Elaborada pela autora.

O estudo realizado para relacionar o fenômeno de interesse e o Modelo Modificado com as ideias de outros pesquisadores, permitiu elaborar uma nova questão para orientar a investigação:

De que forma as estruturas multiplicativas centrais do raciocínio proporcional e o conceito de proporcionalidade vem sendo abordados em materiais que expressam o currículo

planejado e o em ação, considerando as escolhas de um grupo de professores?

Para responder a questão de pesquisa, elaborou-se os seguintes objetivos:

 Identificar e analisar o tratamento dado ao conceito de proporcionalidade e a presença das estruturas multiplicativas centrais do raciocínio proporcional e da proporcionalidade no currículo planejado e em ação da Educação Básica, considerando as escolhas de um grupo de professores.

 Verificar quais transformações cognitivas são consideradas nas situações apresentadas nos materiais curriculares.