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APRENDIZAGENS, TRANSFORMANDO O ESPAÇO ESCOLAR E A PRÁTICA PEDAGÓGICA

“CANÇÃO DE GHANA” –

4.1 AS EXPERIÊNCIAS VIVENCIADAS PELAS PROFESSORAS NA OFICINA MUSICAL: EXPECTATIVAS E IMPRESSÕES

4.1.6 ESTABELECENDO CONEXÕES ENTRE A LINGUAGEM MUSICAL E OS CONTEÚDOS DESENVOLVIDOS EM SALA DE AULA

Diante de um cotidiano carregado de responsabilidades, cansaços, dificuldades inerentes à profissão docente, verificamos que a música acrescentou alegria às professoras e alunos, mostrando que é possível valorizar o lado lúdico do ensino, dinamizando, assim, a aprendizagem dos conteúdos do currículo formal.

Sobre esse aspecto, Gainza (1964) afirma que a música contribui, juntamente com as demais disciplinas, para modelar o espírito e a terna personalidade infantil. As crianças que aprendem e vivem, de uma maneira profunda, suas experiências musicais na escola não tardam em incorporar a música às suas vidas, passando a praticar atividades musicais, coletivas e individuais, junto à família e no seu núcleo social. Segundo a autora,

existem relações naturais que podem ser destacadas e estudadas na escola entre a música e as matérias que fazem parte do currículo formal. Ela dá alguns exemplos:

- Linguagem e literatura: a criança pode elaborar textos poéticos para melodias conhecidas ou criadas pelos alunos, adequando os acentos e ritmos do idioma aos acentos e ritmos musicais.

- Educação Física: com a música, a atividade física se transforma em atividade rítmica, sendo o ritmo da música traduzido em ritmos corporais.

- História: as crianças podem cantar e vivenciar atividades a partir de canções que narram fatos históricos. Além disso, podem conhecer os distintos tipos de músicas e canções ao longo do tempo.

- Geografia: a música permite que se estude a correspondência entre as características do ambiente geográfico de diferentes países ou de diferentes regiões de um mesmo país. - Sociologia: através da vivência com a música e o seu papel na sociedade, a criança é

favorecida na compreensão da evolução cultural.

- Zoologia: a música permite que a criança observe, analise e reproduza sons produzidos pelos animais.

Também Dalben (2002) ressalta o quanto atividades musicais podem contribuir no processo de ensino-aprendizagem integrando-se às demais atividades, ao envolver atividades ligadas às diversas formas de expressão dos indivíduos e dos grupos, à criatividade, à socialização, ao desenvolvimento da autonomia, da lógica e ainda dos aspectos psicomotores. No entanto, como lembra a autora, muitas vezes a música enfrenta posturas equivocadas por parte do professor, as quais permitem que as crianças considerem a música apenas como parte das festas escolares, apenas um ornamento, um pano de fundo, um cenário.

O contato com as professoras e seus alunos possibilitou que observássemos o quanto elas aprenderam e se desenvolveram no sentido de conectar as aprendizagens musicais aos conteúdos pertencentes ao currículo formal. No início verificávamos a predominância da música enquanto algo à parte dentro da sala de aula, com utilidades e não objetivos, ou seja, útil em comemorações ou esporadicamente para ilustrar algum conteúdo, predominantemente canalizada para utilidades momentâneas. Não havia continuidade, não havia um processo em relação ao ensino musical. Porém, no decorrer da intervenção,

observamos que a música começou a fazer parte do cotidiano de professoras e alunos passando a integrar-se à sala de aula de maneira que não mais representasse algo separado dos demais componentes curriculares, nem tampouco apenas um recurso didático. A música adquiriu um papel diferenciado: ao mesmo tempo em que proporcionava alegria, possibilitava a experimentação, a improvisação, também era um incentivo para novas aprendizagens. Em nossas reuniões, sempre procurávamos discutir com as professoras as possíveis conexões entre as atividade musicais vivenciadas naqueles momentos e os conteúdos já normalmente trabalhados em sala de aula, sempre levantando novas possibilidades de tornar a música mais próxima das crianças e professoras.

Márcia – Aqui está falando de rodar, de afastar, chegar, né, então você pode estar trabalhando bastante, aqui, a noção de direção, né? Noção de direção, lado...Direita e esquerda...

Inês – Dá para trabalhar tempo...

Márcia – É, faz um ano, faz um dia.... O Iaiá, aqui, dá para a gente trabalhar geografia, né? “Iaiá, quem fala é o pessoal lá ....” a gente pode trazer um mapinha, mostrar para eles no mapinha....localização... Inês – Vocabulário...

Márcia – Vocabulário também...dialeto também porque Iaiá não é da região sudeste, né, eles não estão acostumados com esse Iaiá...

Luciana – Keila, pesquisa sobre a espécie, em ciências....

Márcia – Sobre o periquito maracanã... sobre a espécie...o tipo de ave...

Cristiane – Matemática....um dia, quantos dias tem o ano? Quantos dias tem o mês? Probleminhas.... Márcia – Quantas vogais tem em cada palavra...ou em cada linha...quantas consoantes têm em cada linha...eu trabalho muito isso...Dá para trabalhar rima... nossa, vai dar super legal!

Cristiane – ... dá para trabalhar produção de texto...o que será que aconteceu com a Iaiá? Inês – Imaginação deles, né? Por que será que ela não tinha voltado?

(...)

Inês – Bom, eu já pensei, eu não tenho muita idéia sobre dança, sobre coreografia mas essa música dá para trabalhar muito a questão da escrita....

Luciana – Eu pensei na pesquisa porque foi uma época em que a música brasileira teve o seu auge né...então eu pensei em fazer uma pesquisa sobre esse ...Chico Buarque, outros compositores que marcaram, algumas músicas que marcaram, que eles ainda vão ouvir quando crescerem que são dessa época...

Os diálogos mostram o quanto as professoras foram se desenvolvendo quanto à inserção da música na sala de aula. As idéias foram surgindo mais claramente e os objetivos relacionados às crianças foram se delineando. Assim, podemos destacar um desenvolvimento quanto à capacidade de refletir sobre o papel da música na sala de aula: não apenas um recurso didático, usado apenas para leitura e escrita, nem tampouco apenas canções comemorativas, sem nenhum espaço para a expressão corporal, para o desenvolvimento da sensibilidade auditiva, rítmica, etc. Pelas implicações entre o aspecto lúdico e o didático, a música passou a ser explorada com objetivos, ou seja, cada professora

sabia exatamente o que buscava quando aplicava alguma atividade com música, e o retorno das aplicações, de certa forma, clareava os objetivos.