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2.1 BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

2.1.2 O Estado Avaliador

O padrão de qualidade das universidades a ser garantido, segundo orienta a Constituição Federal de 1988, é um quesito importante na prestação de contas à sociedade civil acerca do investimento público nesse nível de ensino, como forma de responsabilidade social. Para que esse padrão pudesse ser avaliado e verificado, o Estado vem, desde a década de 1980, desenvolvendo mecanismos de avaliação dos cursos e das universidades.

Antes mesmo da promulgação da Constituição Federal, o MEC propõe o Programa de Avaliação da Reforma Universitária (PARU), em 1980, medida que utilizava de entrevistas com dirigentes, docentes e estudantes, de forma que pudessem avaliar a estrutura administrativa e didática das instituições de Educação Superior do Brasil. Contudo, esse programa, transcorrido um ano, foi desativado e substituído por outras medidas governamentais.

Segundo Afonso (2013), essa década e a seguinte se configuram como a 1ª fase do Estado Avaliador, cuja característica é a prioridade do controle social pelo Estado, sem avaliações internacionais sistemáticas. O PARU foi substituído, inclusive, por, entre outras medidas governamentais, o Grupo Executivo para Reforma da Educação Superior, no âmbito do MEC, com o objetivo de elaborar uma reforma universitária. Para essa fase do Estado Avaliador, Afonso pontua:

A adoção de políticas de avaliação (incluindo a avaliação em larga escala no interior de um mesmo país) dependeu, em grande medida, de uma (ainda) expressiva autonomia relativa dos Estados nacionais ou, mesmo, da autonomia relativa de Estados enquanto unidades de uma Federação (como no caso brasileiro) (AFONSO, 2013, p. 271).

Ainda nesta década, há a promulgação da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), que em sua redação traz como dever do Estado a formulação do PNE, bem como das medidas que tiveram representatividade na década seguinte. Em 1993, surge o Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), que tinha como objetivos não só a avaliação externa, como também fazer com que as universidades promovessem a autoavaliação.

Após o PAIUB, que vigorou entre 1993 e 1994, houve a promulgação da nova LDB/1996 que reforçava, em seu Artigo 9º, a ideia de uma avaliação nacional sob

responsabilidade da União, não apenas para avaliar, mas também “autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de Educação Superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino” (BRASIL, 1996, p. 10).

No mesmo ano da nova LDB, algumas formas de avaliação foram instituídas, como o Exame Nacional dos Cursos (ENC) (conhecido como “Provão”), aplicado entre 1996 até 2003, a Avaliação das Condições de Ensino (ACE) e a Avaliação para Credenciamento de IES, numa tentativa de nivelar a qualidade do ensino oferecido pelas instituições.

Em paralelo a esse engajamento nas avaliações, ocorrem no Brasil os Censos – dentre eles, o Censo da Educação Superior. Essa pesquisa faz parte do mecanismo do Estado Avaliador e, em geral, demonstra o reflexo das ações governamentais a despeito desse nível de ensino.

O Censo da Educação Superior, apesar de não ter como objetivo avaliar as Instituições de Educação Superior, mas, sim, ser uma forma de tornar públicos dados sobre a sociedade, é um interessante instrumento analítico para ser levado em conta, uma vez que expõe um retrato do setor. Esta coleta de dados, definida pelo Decreto nº 6.425, de abril de 2008, determina que as pesquisas devem ser realizadas, de acordo com o Artigo 3º:

Anualmente em regime de colaboração entre a União, os Estados e o Distrito Federal, em caráter declaratório e mediante coleta de dados descentralizada, englobando todos os estabelecimentos públicos e privados de Educação Superior e adotando alunos, docentes e instituições como unidades de informação. (BRASIL, 2008, p. 1)

Ao referirmo-nos ao acompanhamento estatístico das pessoas com deficiência averiguadas em Censos, é perceptível um desinteresse por esse tema até meados de 2006, durante o primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva, como afirma o estudo de Martins, Leite e Lacerda (2015).

Tal estudo (MARTINS; LEITE; LACERDA, 2015), feito a partir de uma análise do Resumo Técnico do Censo da Educação Superior entre os anos de 2000 a 2011, produziu um quadro que ilustra muito bem a ausência de dados públicos a respeito da inclusão de pessoas com deficiência no Educação Superior. Para esse quadro, os autores consultaram 9 resumos técnicos desse recorte temporal, levando em consideração a menção à pessoa com deficiência no documento e a disponibilidade de acesso a estes dados.

Quadro 1 – Análise do Resumo Técnico do Censo da Educação Superior

Fonte: INEP/Secretaria da Educação Superior. Elaborado por: Martins; Leite; Lacerda (2015, p. 999).

É intrigante reconhecer o atraso na menção à pessoa com deficiência nos Censos desse período. Esse atraso é reflexo do desafio que é a inserção desses sujeitos em tal nível de ensino, uma vez que “está ocorrendo de forma lenta e ainda sem mecanismos que sustentem tanto o acesso, quanto a permanência de tal aluno no contexto das exigências peculiares à Educação Superior” (MAGALHÃES, 2013, p. 47).

Martins, Leite e Lacerda (2015) também apontaram a inconstância na forma de se referenciar ao público-alvo da Educação Especial, o que é retrato de uma política de inclusão, que data apenas de 2008, ainda engatinhando para configurar nos Censos com informações completas.

Os autores trazem, ainda, que “as políticas públicas para o acesso de pessoas com deficiência ao Ensino Superior brasileiro vêm sofrendo ao longo dos últimos dez anos um processo de adequação ao pleito mundial” (MARTINS; LEITE; LACERDA, 2015, p. 1008). Essa demanda mundial é um motor necessário para que países como o Brasil possam atingir dados mais animadores quanto à inclusão nesse nível de ensino. Os autores afirmam que há uma inexpressividade tanto em matrículas de pessoas com deficiência quanto em estudos que tragam dados sobre como essas pessoas ingressam, permanecem e concluem os cursos superiores.

Outro mecanismo de levantamento de informações por parte do Estado Avaliador, sendo criado pela Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, é o SINAES, que segue as diretrizes do

CONAES, cabendo ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira” (INEP) a organização e aplicação dessa avaliação.

O SINAES fundamenta-se em princípios da avaliação formativa, o que é considerado um marco na avaliação da Educação Superior, uma vez que os métodos de avaliação que o antecedeu tinham como função a regulação. Essa avaliação formativa alicerça-se no princípio da melhoria das IES, o que, de certa forma, deve resultar num maior comprometimento e responsabilidade para a eficácia desse nível de ensino. Esse sistema avaliativo será retomado mais à frente com aprofundamento.

Destarte, em relação à avaliação, nesse percurso histórico em que o Estado brasileiro vai se transformando (principalmente revisando o status de regulação), apesar de maturar aos poucos, já surgem frutos significativos quando ela é aliada a outros métodos avaliativos, como o próprio documento afirma:

O conjunto das avaliações resultantes da implementação do SINAES, aliado ao Conceito Preliminar de Curso (CPC) e ao Índice Geral de Cursos (IGC), materializa o cumprimento de uma importante etapa rumo à consolidação de uma cultura de avaliação na Educação Superior (SINAES, 2015, v. 1, p. 22).

Entretanto, apesar de figurar nessa posição de marco e de consolidação de uma cultura de avaliação, pesa-nos a superficialidade do trato da pessoa com deficiência e seus desdobramentos e demandas, como um sujeito informante fundamental para a avaliação da perspectiva inclusiva na Educação Superior.

Ainda que não seja o objetivo deste trabalho trazer aspectos da avaliação institucional, é impossível dissociar a discussão, uma vez que tal pesquisa justifica-se pelo olhar global do sujeito egresso sobre a sua formação, também podendo servir de parâmetro para a UFRN como um processo de reflexão sobre as atuais práticas e como nortear algumas ações futuras. Essa perspectiva e essa subseção também são norteadas pelo SINAES, que afirma que tal público, na literatura, é colocado “sobretudo, como avaliador de sua formação, isto é, repercutindo aspectos importantes no seu processo formativo” (SINAES, 2015, v. 4, p. 29).

Esse fato é muito bem explicado pelo teor histórico de exclusão e estigmatização do público-alvo da Educação Inclusiva, não configurando apenas como uma fragilidade do sistema avaliativo. Veremos na seção seguinte um histórico da inclusão na Educação Superior que será fundamental para tal afirmação.