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I) APONTAMENTOS DO ESTADO MODERNO E O ADVENTO DO ESTADO SOCIAL:

1.3.8 A crise do Estado social:

A par de todas as críticas tecidas e contradições inerentes a um modelo político que se pretende social erigido sobre uma base hedonista, o Estado social se disseminou na cultura capitalista e permaneceu enquanto seu contrário – Estado socialista – esteve vivo.

Com o ocaso da URSS, o termo dos Estados socialistas do leste europeu e a abertura econômica da China, aceitando o sistema econômico ocidental, o Estado social começa a fazer a curva que aponta para o seu declínio posto não haver mais óbice e amarras para o expansionismo capitalista. A alternativa ao capitalismo era a própria mola propulsora da procura de um elemento social nesse modo de produção, o que redundava no reconhecimento de suas contradições e injustiças.

Outro elemento que determina a crise do Welfare State é a globalização econômica. É a imposição de um sistema de fora para dentro, sem limites de territorialidade e sem se preocupar com as necessidades e peculiaridades locais. O mercado internacional inicia uma fase de ascendência não só sobre o Estado, mas também sobre o próprio mercado nacional.

A internacionalização dos mercados, além de tornar mais impessoais as relações de troca, virtualizando-a, questiona a própria soberania estatal. As teorias clássicas da soberania não encontram mais guarida no atual cenário de economia globalizado. O conteúdo da economia globalizada traz implícita uma diminuição do poder estatal e, com isso, a necessidade de diminuição do próprio ente público.

Quando a primazia do mercado era delimitada dentro do território nacional, o Estado poderia intervir mais eficazmente, traçando limites, subsidiando, fomentando, restringindo atividades econômicas e sociais. O Estado tinha forças frente ao mercado nacional. Com a internacionalização do mercado, o Estado perde muito desse poder, sendo quase que subjugado pelas forças externas. O mercado externo é que começa a ditar os limites e as restrições do Estado, fomentando e subsidiando as atividades do ente público que as multinacionais e organismos internacionais como o FMI, a OMC e o Banco Mundial, entendam salutar para o desenvolvimento de suas atividades.

Francisco de Oliveira já enfatizou:

“O rompimento do círculo perfeito do Estado-providência, em termos keynesianos, é devido, em primeira instância, à internacionalização produtiva e financeira da economia capitalista. A regulação keynesiana funcionou enquanto a reprodução do capital, os aumentos de produtividade, a elevação do salário real, se circunscreveram aos limites – relativos, por certo -, da territorialidade nacional dos processos de interação daqueles componentes da renda e do produto. Deve-se assinalar, desde logo, que aquela circularidade foi possível graças ao padrão de financiamento, entre outros aliás, que levaram à crescente internacionalização. Ultrapassados certos limites, a internacionalização produtiva e financeira dissolveu relativamente à circularidade nacional dos processos de retro-alimentação. Pois des- territorializam-se o investimento, e a renda, mas o padrão de financiamento público do Welfare State não pôde, até agora - des-territorializar-se. Em outras palavras, a circularidade anterior pressupunha ganhos fiscais correspondentes ao investimento e à renda que o fundo público articulava e financiava; a crescente internacionalização retirou parte dos ganhos fiscais, mas deixou aos fundos públicos nacionais a tarefa de continuar articulando e financiando a reprodução do capital e a força do trabalho. Daí que, nos limites nacionais de cada uma das principais potências industriais desenvolvidas, a crise fiscal ou ‘o que um ganha é o que o outro perde’ emergiu na deterioração das receitas fiscais e parafiscais (previdência social, por exemplo), levando ao déficit público”164.

Esse cenário se agrava quando o país a ser tratado está plantado na periferia do capitalismo, cuja dependência e a imposição do mercado externo é total. Assim, países da periferia capitalista que nunca se tornaram efetivamente um Estado social já vêem sua crise.

O que não se pode perder de vista é que a crise do Estado social é, antes de tudo, uma crise fiscal do Estado. É uma crise situada no financiamento do Estado que, por

164 “In” Os direitos do antivalor. Ob. cit. p. 26.

Francisco de Oliveira trata neste livro da questão dos fundos públicos para manutenção do sistema capitalista, sendo este o elemento que deu azo a criação do Estado social. Esses fundos públicos teriam dupla vertente: servir de salário indireto, já que concede benefícios sociais (saúde, educação, lazer...) aos trabalhadores. São os direitos sociais. E na outra ponta servir de estímulo à própria atividade capitalista, subsidiando e incrementando setores da economia, desenvolvendo mecanismos de infra-estrutura para melhoria do mercado etc. Ele ressalta que o que está em crise é apenas a primeira vertente do fundo público, sendo a segunda ainda colocada como dever do Estado e numa escala crescente. Vejamos o que foi escrito:

“Trata-se de uma verdadeira regressão, pois o que é tentado é a manutenção do fundo público como pressuposto apenas para o capital: não se trata, como o discurso da direita pretende difundir, de reduzir o Estado em todas as arenas, mas apenas naquelas onde a institucionalização da alteridade se opõe a uma progressão do tipo “mal infinito” do capital. É típico da reação thatcherista e reaganiana o ataque aos gastos sociais públicos que intervêm na nova determinação das relações sociais de produção, enquanto o fundo público aprofunda seu lugar como pressuposto do capital; veja-se a irredutibilidade da dívida pública nos grandes países capitalistas, financiando as frentes de ponta da terceira revolução industrial” (p. 44).

conseguinte, gera a crise dos gastos públicos. Em outras palavras, os gastos públicos são colocados em xeque porque o sistema não se predispõe mais a financia-los nos patamares anteriores quando existia uma alternativa concreta ao sistema capitalista (socialismo do leste), sendo intensificada a crise no estabelecimento de um mercado internacional, haja vista a maior impessoalização das relações e, com isso, a despreocupação com as mazelas locais.

Sem a concorrência de um outro sistema mais social (socialismo) e com o exacerbamento de uma concorrência, dentro do mesmo sistema, mais individualista, galgado, agora, a patamares globais (globalização), o capitalismo não vê outra saída que não seja restringir os gastos sociais e voltar a competição nas formas primitivas do seu nascimento. E para reduzir os gastos sociais deve-se reduzir o tamanho do Estado, já que ele é a principal figura a implementar esses gastos.

Forma-se o ciclo: redução dos gastos sociais e para que esse ocorra deve-se reduzir o Estado e, com isso, aumenta-se o número de excluídos não mais em nível nacional, mas, agora, em níveis globais, de países inteiros. Isso gera a necessidade de mais gastos sociais para tentar minorar a depreciação humana daqueles marginalizados, no entanto, os recursos para os gastos sociais são menores e cada vez menos aptos a suprir as necessidades sociais. Caracterizada está a crise desse modelo estatal. Daí em diante, consoante a crise for se acirrando, o Estado antes social e assistencial na periferia passa a se tornar policial e sancionador.

A crise do Estado social é a própria crise do aspecto social que o capitalismo se arrogou ter.

1.4 – O Estado Pós-social ou Neoliberal:

Incontinênti à crise do “Welfare state”, uma nova modelagem política começa a se delinear sobre a mesma infra-estrutura capitalista: o neoliberalismo. Com a crise do elemento social do capitalismo, que se situava na superestrutura jurídica e política, a acumulação de riquezas, o egocentrismo, o monopólio privado, a diminuição do Estado, a igualdade meramente formal e a liberdade apenas no e do mercado econômico voltam a fazer coro, profetizando o futuro da sociedade do século XXI. A ideologia do liberalismo volta a ganhar espaço e vários pensadores começam a compartilhar ideais com essa corrente.

O remate do regime socialista e a internacionalização dos mercados oriundo do processo de globalização são as molas propulsoras para que o capitalismo volte a ser o que

sempre foi: um sistema hedonista, individualista e egoísta. O aspecto social que o capital se arrogou ter ao balizar o incremento de um Estado social é questionado por ele mesmo na nova política do neoliberalismo.

O desfecho socialista significou o fim das amarras que prendiam o capitalismo a um qualificativo social. Ele não vê mais motivos para ser social, já que não há mais alternativa concreta. A globalização econômica significa a facilitação das relações de trocas, o fim das barreiras territoriais e até mesmo reais, pois ela ganha um conteúdo virtual, sendo esse um novo cenário criado para incrementar a economia capitalista. Em contrapartida, a impessoalização das relações em grau cada vez mais crescente dá o tom do novo capitalismo.

Esse prefixo “neo” não significa exclusivamente um novo liberalismo, sendo muito mais apegado a tese de aplicação do liberalismo clássico do século XVIII e XIX em um novo contexto social. É a ressurreição da “mão invisível”, da lei da oferta e da procura, de Adam Smith, das teorias malthusianas e ricardinas, da filosofia de Kant e sua paz perpétua, que desconsidera os conflitos sociais e desigualdades vivenciadas no mundo terreno. Resta a indagação: se o liberalismo outrora encontrou sua fundamentação na derrubada de um sistema absolutista, no fim das arbitrariedades reais, no ocaso do poder da igreja sobre o Estado, nas restrições à intervenção estatal, que tinha o intuito apenas de beneficiar o próprio rei e os nobres que o cercavam, qual é a fundamentação para o neoliberalismo, considerando que o Estado social é a própria evolução do liberalismo na tentativa de corrigir seus erros?

O professor Fábio Comparato já se pronunciou:

“O conjunto de direitos sociais acha-se hoje, em todo o mundo, severamente abalado pela hegemonia da chamada política neoliberal, que nada mais é do que um retrocesso ao capitalismo vigorante em meados do século XIX. Criou-se, na verdade, uma situação de exclusão social de populações inteiras inimaginável para os autores do Manifesto Comunista”165.

165 “In” A afirmação histórica dos direitos humanos, ob. cit., p. 66.

Em outro artigo, o professor Comparato completa que:

“A despeito do surto de privatismo e da vaga de concentração do poder capitalista, que se abateram sobre o mundo no último quartel do século XX, a criação do Estado Social de Direito, com base no ‘espírito de fraternidade’, invocado no art. I da Declaração Universal dos Direitos Humanos veio para ficar. O curso da História pode apresentar recuos momentâneos, mas a sua linha direcional não é regressiva. A consciência de que ‘todo homem, como membro da sociedade, tem direito à seguridade social e à realização (...) dos direito econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade

François Xavier Merrien, Titular de Ciências Sociais na Faculdade de Ciências Políticas e Sociais da Universidade de Lausanne, na Suíça, leciona que:

“Desde o início da década de 1980, o cenário internacional torna-se um campo de missão dos especialistas neoliberais. A globalização é utilizada como um argumento forte na luta simbólica para justificar análises e proposições que colocam em primeiro plano a crença nas virtudes dos mercados e das associações voluntárias, e que afirmam, ao mesmo tempo, o posto residual que deve ocupar o Estado e a política social. O sucesso dessa interpretação se deve muito ao engajamento nessa luta de grandes organizações internacionais (Banco Mundial, FMI, OCDE), de especialistas internacionais, de organizações não-governamentais envolvidas na promoção de políticas neoliberais em escala internacional”166.

(mesma Declaração, art. XXII) faz parte, hoje, do patrimônio ético da humanidade” (“In” O Ministério Público na defesa dos direitos econômicos, sociais e culturais, ob. cit., p. 67).

166

O novo regime econômico internacional e o futuro dos Estados de Bem-Estar social. Trad. Lorena Vasconcelos Porto. “In” DELGADO, Maurício Godinho e LORENA, Vasconcelos Porto (organizadores). O Estado do bem-estar social no Século XXI. São Paulo: LTr, 2007, p. 132.

François Merrien discorre sobre a importância que o Banco Mundial adquiriu em detrimento das organizações internacionais de proteção ao trabalhador, tais como a OIT:

“A partir de 1994, o Banco Mundial, aproveitando de seu papel de credor internacional, torna-se a organização principal em matéria de política social. As políticas públicas de proteção social dos trabalhadores, defendidas pela Organização Internacional do Trabalho, tornam-se objeto de uma intensa campanha de deslegitimação. O Banco Mundial destaca a sua ineficácia, a sua incapacidade de fazer frente aos desafios demográficos, seus efeitos antieconômicos. Ele propaga mundialmente um novo programa de política social, cujos pontos fortes são: a privatização dos regimes de aposentadoria (o Chile torna-se o modelo a ser seguido), uma menor seguridade social para a classe média e a limitação da proteção social que beneficia os despossuídos. Os países em vis de desenvolvimento e os países ex-comunistas tornam-se um laboratório de experimentação das reformas da proteção social.

O objetivo redistributivo, defendido tradicionalmente pela OIT e pelos profissionais da seguridade social, é abandonado em benefício de uma política de economia individual acompanhada de políticas sociais dirigidas aos mais pobres. Em matéria previdenciária, as grandes organizações preconizam a supressão dos regimes de aposentadorias públicas. O modelo defendido é aquele de três pilares. Um primeiro pilar mínimo, obrigatório e financiado pelos impostos; um segundo pilar privatizado e capitalista; e, por fim, um terceiro pilar apoiado na economia voluntária. A mudança de orientação é radical e traduz-se na perda da influência da OIT no cenário internacional e no aumento do poder do Banco Mundial, que apóia um programa social liberal inovador. A passagem de um sistema de aposentadoria por repartição (‘pay-as-you-go’) a um sistema por capitalização gera problemas técnicos reais.

Teria sido bem mais simples introduzir uma reforma do sistema anterior para colocar fim aos abusos, mas as pressões dos organismos internacionais e o apoio das novas elites econômicas fizeram com que essa opção fosse pouco levada em consideração. Os especialistas da OIT destacam os riscos de reformas que fazem todos os riscos pesarem sobre os indivíduos, mas essas críticas, até o momento, não foram devidamente compreendidas.

Em matéria de saúde, sob a influência do Banco Mundial e do FMI, vários países abandonaram a abordagem universalista defendida pela OMS. É antes de tudo a UNICEF que rompe com o programa fundador para se aliar à nova tese, deixando pouca opção à OMS, senão aquela de se aliar à nova temática da política social. As novas políticas dão ênfase à necessidade de privatizar as prestações de saúde, apresentadas como particularmente custosas e beneficiárias, sobretudo, das classes médias. A nova problemática da política de saúde privilegia a contratualização das prestações de saúde (segundo os princípios do ‘New Public Management’) oferecendo, dessa forma, um lugar importante ao setor privado e aos organismos não governamentais” (p. 136/7).

Esse catedrático suíço expõe sobre o problema de se tentar manter um Estado social na economia capitalista globalizada:

“Um dos problemas essenciais que devem ser enfrentados por todos os governos é o de saber como manter uma disciplina orçamentária, monetária e fiscal, exigida pela economia internacional, mas continuando a financiar os direitos sociais adquiridos e a cobrir despesas sociais geradas pela situação de crise (desemprego, pobreza, exclusão). No mesmo momento em que os recursos diminuíram de maneira drástica e que não é mais possível recorrer ao déficit orçamentário, os Estado de Bem-Estar Social são obrigados a financiar maciçamente as medidas de adaptação, a intervir para facilitar as saídas em aposentadoria antecipada, a ajudar as reconversões industriais, a favorecer a formação profissional e a reciclagem dos trabalhadores, a assegurar uma renda mínima aos menos favorecidos”167.

Com base nisso, segundo o mesmo autor, na “maior parte das décadas de 1980 e 1990, as grandes organizações internacionais tornam-se as maiores defensoras das análises neoliberais em matéria de proteção social, assim como em termos de política de saúde. Nos dois domínios, esse alinhamento ideológico as conduz a uma análise excessivamente crítica das políticas públicas (‘State failures’), a subestimar os efeitos perversos das políticas de mercado (‘market failures’) tudo as conduzindo à defesa das estratégias arriscadas de privatização, de contratualização e de cortes”168.

167 Idem, ibidem, p. 131. 168 Idem, ibidem, p. 138.

Não obstante constatar uma volta de preceitos liberais, esse cientista social francês conclui que ainda persiste uma ideologia voltada para a manutenção do Estado social nos países desenvolvidos:

“a análise concreta das trajetórias dos Estados de Bem-Estar Social revela que existem poucos sinais de transformações profundas e estruturais desses Estados, que permitam falar globalmente do fim ou do declínio generalizado dos Estados de Bem-Estar Social. Muito pelo contrário, mesmo quando existem reorientações, revisões ou adaptações dos sistemas de seguridade social, parece que – salvo no caso de alguns países pouco numerosos, que optaram pela via neoliberal – a maioria dos governos se esforça para manter o coração de seu Estado social” (p. 155).

Em uma conclusão empírica e terminando assim seu artigo permite:

“uma comparação das performances econômicas dos países desenvolvidos ao longo dos últimos anos mostra claramente que aqueles que optaram por seguir mais fielmente a via liberal nem sempre são os que lograram maior êxito. De fato, os países que foram mais bem-sucedidos não são necessariamente aqueles cujos salários são os mais baixos, nem os que mais desestruturaram o mercado de trabalho (como a Nova Zelândia ou a Grã-Bretanha), mas, ao contrário, os países que combinaram: capacidade de negociação coletiva, reexame das prestações sociais (é onde a França encontra dificuldades, pela falta de consenso social), esforço de solidariedade global e recusa do dualismo social (como a Holanda, a Suécia e a Dinamarca)” (p. 155).

O cientista político e sociólogo norueguês, Stein Kuhnle faz percuciente observação de quais países defendem o neoliberalismo e que apontam para a crise do Estado social:

“Um paradoxo é que os ataques mais intensos contra o extenso papel do Estado nas políticas sociais ocorreram nos Estados de Bem-estar menos abrangentes - EUA e Inglaterra – e não naqueles mais amplos, como os da Escandinávia e da Europa continental” (Globalização e o desenvolvimento das políticas sociais. Trad.

Ademais, é evidente que o capitalismo apenas cederia e tentaria se tornar mais social, contrariando sua essência, enquanto se sentisse ameaçado. Finda a ameaça, o intento social começa a ser desdito e o discurso individualista volta à tona.

Os volumosos recursos que o capitalismo deve despender para concretização dos direitos sociais e políticas públicas começam a dar o tom da crise do Estado social. Os agentes econômicos que financiam os governantes e controlam o poder estatal, não se sentindo mais ameaçados pela sua própria derrocada e mais seguros da sua soberba, despreocupam-se de investir no social para manter os mais desprivilegiados controlados.

O discurso que volta a ecoar é do Estado mínimo. O Estado apenas com fito de segurança pública, como se a expressão “pública” se esgotasse na proteção dos detentores do poder econômico. A segurança pública vira sinônimo de força policial, e não mais de previdência aos riscos sociais. O Estado, descuidando de seu aspecto social, começa a dar ares de Estado policial, tornando-se aquele mínimo Estado da violência organizada na defesa exclusiva dos privilegiados e de sua propriedade.

A luta neoliberal pelo enfraquecimento do Estado, a privatização do seu poder, a submissão do público ao privado, a busca de lucro no espaço público e até nas necessidades sociais, além de todas as características já conhecidas do pensamento liberal (individualismo, contratualismo e propriedade privada), resume a diretriz do novo liberalismo. A busca do neoliberalismo é o acúmulo de riquezas capitalistas sem precedentes, o monopólio privado, o máximo lucro em detrimento de toda a coletividade. E para concretizar esse ideal torna-se necessário enfraquecer o já submisso Estado providência, numa sanha de evitar qualquer correção da desigualdade e manutenção dos atuais desníveis sociais.

O paradoxo do neoliberalismo é que ele se embate com um ente que está ao seu lado e que foi colocado à sua disposição – Estado capitalista – cuja remodelação para Estado social se deu exatamente para permitir que o capitalismo sobrevivesse. Dessa forma, uma das conseqüências visíveis da concretização do neoliberalismo é o suicídio do capitalismo, pois ao enfraquecer o Estado ele perderá o aliado que permite sua existência.

A sociedade que o neoliberalismo visa criar é denominada pelo professor Ricardo Lobo Torres de “sociedade de riscos”, como característica do Estado subsidiário,

Lorena Vasconcelos Porto. “In” DELGADO, Maurício Godinho e LORENA, Vasconcelos Porto (organizadores). O Estado do bem-estar social no Século XXI. São Paulo: LTr, 2007, p. 97).

“que contrasta com a sociedade industrial, que dava sustentação ao Estado de Bem-estar Social ou Estado Providência”.

“Na sociedade de riscos há uma cadeia de subsidiariedades, que se caracteriza pela responsabilidade primeira do indivíduo pela sua própria sobrevivência, secundada pela da comunidade se houver impossibilidade de cumprimento pelo cidadão, e complementada, em última instância pelo Estado”169.

Essa sociedade neoliberal, como dito, é uma sociedade de riscos, em que deixar o Estado com uma atuação meramente subsidiária ou sem qualquer atuação torna-se