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I) APONTAMENTOS DO ESTADO MODERNO E O ADVENTO DO ESTADO SOCIAL:

1.3.7 O auto denominado Estado social brasileiro:

Não há dúvidas que nossa Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, esculpiu um modelo político de Estado social, com a positivação do maior número de direitos sociais de todas as constituições modernas.

Isso já se apresenta no Preâmbulo (“assegurar o exercício dos direitos sociais... o bem-estar... a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna... fundada na harmonia social”), bem como nos objetivos fundamentais previstos no artigo 3º, em especial no inciso III, além das previsões específicas do capítulo II (Dos Direitos Sociais – art. 6º ao 11º), colocado no bojo do Título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”). Devem ainda ser considerados os vários artigos esparsos no Texto Fundamental, principalmente no Título VII (“Da Ordem Econômica e Financeira”), que logo no capítulo I, enuncia no caput, do art. 170, que a ordem econômica é fundada nos ditames da justiça social, sendo princípios dessa ordem econômica: a função social da propriedade (inciso III) e a redução das desigualdades regionais e sociais (inciso VII). Não se pode olvidar ainda o Título VIII, que é peculiar à Ordem Social, sendo repetido aí o primado do trabalho, do bem-estar e da justiça social (artigo 193). Segue esse título com o tratamento da seguridade social (capítulo II, que abarca a saúde, a previdência social e a assistência social), da educação, da cultura e do desporto (capítulo III), da ciência e tecnologia (capítulo IV), da comunicação social (capítulo V), do meio ambiente (capítulo VI), da família, da criança, do adolescente e do idoso (capítulo VII) e fechando com o capítulo dos índios (VIII).

Se a medição da qualidade de um Estado social se desse pelo número de direitos sociais positivados, com certeza, o Brasil seria o melhor de todos os países. Todavia, não é o que confirma a realidade.

No Relatório de Desenvolvimento Humano – PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), publicado pela Organização das Nações Unidas em 2007, com base nos dados coletados de 2005, o Brasil ocupa a 70º posição no índice de desenvolvimento humano, com fator de 0,800 de IDH, estando atrás da Argentina (38º), Chile (40º), Uruguai (46º), Costa Rica (48º), Cuba (51º), México (52º), Trinidad e Tobago (59º), Arábia Saudita (61º), Panamá (62º), Malásia (63º) e Rússia (67º)150.

Não obstante o Brasil integrar o rol dos países de desenvolvimento humano elevado segundo o último relatório de desenvolvimento humano da ONU, fato é que ele está

150 Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/2008. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

(PNUD), 2007, p. 231/232. Acesso: em 05/12/2007.

em último lugar desses países, estando atrás da média dos países da América Latina, cujo fator é 0,803.

Como se não bastasse essa situação extremamente constrangedora para ficar numa expressão mais amena, se compararmos com o relatório do ano anterior, 2006, com base nos índices de 2004, o Brasil ficava em 69º colocação e no relatório de 2005, com base nos dados de 2003, na 65º posição, que, malgrado não colocasse o Brasil junto aos países de alto desenvolvimento, demonstram que nosso país vem piorando em relação aos demais. Isso comprova, portanto, que a política que vem sendo empregada, de cunho neoliberal, apenas serve para piorar o desenvolvimento humano, que já é precário em nosso país.

Segundo esse relatório da Organização das Nações Unidas, o Brasil apenas foi alçado a país de desenvolvimento humano elevado por causa de programas assistenciais, em específico o “Bolsa-Família”, que atinge cerca de 46 milhões de brasileiros, concedendo subsídios para pessoas que se encontram abaixo da linha da pobreza (que é de R$ 120,00 mensais), aproximadamente um quarto da nossa população, no valor de R$ 60,00 e R$ 120,00, por mês, consoante o nível de pauperização151. Quer dizer, o Brasil não perpetrou um programa efetivo de desenvolvimento social, tão-somente se limitou a fazer o mínimo possível, que é tirar 25% da população brasileira de uma situação de miserabilidade completa152.

Corroborando esses números, o IBGE divulgou pesquisa realizada em 2006 contendo números que retratam a renda média do brasileiro. Segundo essa pesquisa, mais de 40% da população nacional recebem até um salário mínimo, e cerca de 30% por cento recebem entre um e dois salários mínimos. Em síntese, a esmagadora maioria da população brasileira (cerca de 70%) não recebe mais do que dois salários mínimos. Na outra ponta, apenas 3% recebem mais do que dez salários mínimos, do qual apenas míseros 0,8% recebem mais de vinte salários mínimos153.

Como se vê, se auto proclamar, num âmbito meramente normativo, um Estado social não significa, em absoluto, atingir esse “status” social e político no mundo dos fatos. Gilberto Bercovici adota em seu magistério essa mesma linha de raciocínio:

“Não podemos classificar um Estado como Estado Social simplesmente porque ele se auto-denomina assim, nem por meio da mera comparação de gastos nos setores

151 Idem, ibidem, p. 180 e 183.

152 Segundo dados do relatório do PNUD, o Brasil precisou apenas de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), ou

cerca de R$ 4 bilhões de reais para cumprir essa pequena obrigação (p. 183).

sociais. O elemento essencial a ser analisado é a estrutura do Estado. Há dúvidas se podemos considerar um Estado desenvolvimentista, como o brasileiro, um Estado Social. Para tentarmos solucionar esta questão, precisamos diferenciar a concepção de Estado Social em Estado Social em sentido estrito e Estado Social em sentido amplo. O Estado Social em sentido estrito é o Estado de bem-estar (Welfare State, État Providence), caracterizado pelo amplo sistema de seguridade e assistência social. Já o Estado Social em sentido amplo é o Estado intervencionista. Desta maneira, se nos limitarmos à concepção de Estado Social em sentido estrito, o Estado desenvolvimentista brasileiro não é um Estado Social. Na melhor das hipóteses, pela Constituição de 1988, é um Estado Social em construção. Caso adotemos a idéia de Estado Social em sentido amplo, podemos afirmar, categoricamente, que o Estado desenvolvimentista brasileiro é um Estado Social”154.

Andreas Krell também acentua que:

“A Constituição do Brasil sempre esteve numa relação de tensão para com a realidade vital da maioria dos brasileiros e contribuiu muito pouco para o melhoramento da sua qualidade de vida; o texto legal supremo, para muita gente, representa apenas uma ‘categoria referencial bem distante’. Encontram-se em contradição flagrante a pretensão normativa dos Direitos Fundamentais Sociais e o evidente fracasso do Estado brasileiro como provedor dos serviços essenciais para a vasta maioria da sua população”155.

Francisco de Oliveira, compara esse Estado brasileiro com a figura de um “ornitorrinco”, que é uma figura estranha, sendo um mamífero que não apresenta mamas e é ovíparo, apresentando-se estagnado no ciclo evolutivo. Assim, ele é definido negativamente, muito mais pelo que ele não é do que pelo que ele é. Ele não é um país desenvolvido, mas também não chega a ser um país subdesenvolvido. É um país que reproduz para a pequena elite econômica o padrão de vida das elites dos países mais ricos, ao mesmo tempo que também reproduz para a maioria da população o nível de pobreza dos países mais pobres do mundo. Melhor é a definição do próprio sociólogo:

154 “In” Desigualdades regionais, Estado e Constituição, São Paulo: Max Limonad, 2003, p. 54.

Já enfatizamos nossa posição anteriormente (capítulo sobre a “contribuição à crítica do Estado social”), que poderia ser enquadrada na primeira orientação, já que concluímos que nem todo Estado interventor é social, mas o Estado do bem-estar é necessariamente interventor, o que leva a uma visão conectada ao Estado social em sentido estrito, delimitando, assim, nosso objeto de estudo.

É interessante notar que dependendo da orientação encampada na extensão do Estado-providência, conclusões diferentes são adotadas. Apenas a título de exemplo, o “Welfare State” de Paulo Bonavides é também o de um sentido estrito (“in” do Estado Liberal ao Estado Social, ob cit.). Já para Fernando Scaff é o sentido amplo, é todo Estado interventor (“in” Responsabilidade Civil do Estado Intervencionista, ob., cit.). Disso decorrem algumas críticas que o segundo faz ao primeiro (p. 86).

155 “In” Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha – os (des)caminhos de um direito

“Como é o ornitorrinco? Altamente urbanizado, pouca força de trabalho e população no campo, dunque nenhum resíduo pré-capitalista; ao contrário, um forte agrobusiness. Um setor industrial da Segunda Revolução Industrial completo, avançado, tatibitate, pela Terceira Revolução, a molecular-digital ou informática. Uma estrutura de serviços muito diversificada numa ponta, quando ligada aos estratos de altas rendas, a rigor, mais ostensivamente perdulários que sofisticados; noutra, extremamente primitiva, ligada exatamente ao consumo dos estratos pobres”156.

Ainda para Francisco de Oliveira,

“O ornitorrinco é uma das sociedades capitalistas mais desigualitárias – mais até que as economias mais pobres da África que, a rigor, não podem ser tomadas como economias capitalistas -, apesar de ter experimentado as taxas de crescimento mais expressivas em período longo; sou tentado a dizer com a elegância francesa, et pour cause. As determinações mais evidentes dessa contradição residem na cominação do estatuto rebaixado da força de trabalho com dependência externa. A primeira sustentou uma forma de acumulação que financiou a expansão, isto é, o subdesenvolvimento, conforme interpretado neste Crítica à razão dualista, mas combinando-se com a segunda produziu um mercado interno apto apenas a consumir cópias, dando como resultado uma reiteração não virtuosa”157.

A despeito de uma alteração no Estado social brasileiro a professora de Filosofia do Direito da USP, Jeannette Antonios Maman, já concluiu:

“só haverá mudança na ordem jurídica quando for mudada a situação existencial do povo brasileiro. É necessário abolir a distância que separa o discurso legal, mais ou menos retórico, da real situação econômica e social”158.

Aliás, professora Jeannette, nesta obra, explora bem a situação do Brasil num neocolonialismo, importador de ideais não compatíveis com nossa realidade fática por imposição das forças do capitalismo avançado como forma de manter a submissão de nosso povo e o controle de nossos poderes instituídos e até de nossa elite econômica.

“No Brasil o direito legal ainda é essencialmente o sistema de auto-proteção das pequenas minorias, desde cinco séculos incrustadas no poder. Sucederam-se o colonialismo português, o absolutismo monárquico, o idealismo constitucionalista pseudo-

156 “In” Crítica à razão dualista – O ornitorrinco. São Paulo: Boitempo editorial, 2003, p. 133. 157 Idem, ibidem, p. 143.

158 “In” Fenomenologia existencial do direito – crítica do pensamento jurídico brasileiro, São Paulo: Quartier

liberal, as ditaduras de tipo latino-americano, o oportunismo cínico do chamado centro, o neoliberalismo privatista, as utopias alienadamente exóticas – e tudo isso foi legalizado, legitimado, constitucionalizado, até em nome da democracia. Estas sucintas observações podem ser formuladas na seguinte proposição, a ser demonstrada: a ordem jurídica dos povos latino-americanos (e, por inclusão, a do brasileiro) é expressão de sua situação existencial.

No essencial, essa ordem jurídica é um sistema de garantia, sob coação, dos privilégios de uma oligarquia aliada aos centros externos de poder, verbalizado em linguagem técnica, dissimuladora de uma estrutura social de opressão, espoliação e alienação”159.

A defesa do estrangeirismo por grupos internacionais e mesmo por uma elite brasileira avessa as mudanças sociais e no intento de manter seu nível de vida elevado em detrimento da pobre população brasileira tem sido a marca da nossa política interna. Positivam-se direitos sociais deveras abstratos, que se mostram irrealizáveis na prática e que, por muitas vezes, são utilizados por essa própria elite, na defesa de seus interesses privatísticos, alegando-se a universalização dos mesmos, subvertendo, assim, o já deficitário “Welfare State”.

Consoante já dito alhures, a formulação de um Estado social se torna mais frágil nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, onde as desigualdades são alarmantes, posto que os recursos para concretização dos direitos sociais são escassos, já que oriundo do sistema capitalista, que ainda está em desenvolvimento, e as demandas sociais são muito maiores do que nos países de capitalismo já desenvolvido.

Faz parte daqueles paradoxos que apontamos de maneira geral no Estado- providência construído sob o modo de produção capitalista, cuja lógica se resume em: países de capitalismo avançado = mais recursos para implementar direitos sociais e menos problemas dessa ordem; países de capitalismo periférico = menos recursos para disponibilizar aos direitos sociais e maiores demandas sociais.

O Brasil, encontrando-se na segunda situação, positivou o maior número de direitos sociais de todas as constituições modernas, mas, logicamente, não consegue dar cabo desse múnus, gerando um abismo entre o “ser” (a realidade vivida pela população brasileira) e o “dever-ser” (a normatividade do Estado brasileiro).

A retórica e a realidade levaram Marcelo Neves a escrever sobre a constituição simbólica, colocando a Constituição Federal de 1988 como um mero símbolo

sem efetividade prática, o que acarretaria uma crise de legitimidade do Poder do Estado com o desinteresse da população em relação à política exercida no país, abrindo ensejo a arbitrariedade e até mesmo alterar a Constituição aos sabores dos grupos de pressão privilegiados. É a suma de seu pensamento:

“ao texto constitucional includente contrapõe-se uma realidade constitucional excludente do ‘público’, não surgindo, portanto, a respectiva normatividade constitucional; ou no mínimo, cabe falar de uma normatividade constitucional restrita, não generalizada nas dimensões temporal, social e material”160.

O que se torna mais contraproducente à realização de um possível Estado social brasileiro é que a própria elite econômica, nacional ou estrangeira, se acha no direito de arrogar os direitos sociais para si, e o que costumeiramente faz, visando, praticamente, se excluir dos riscos sociais e, conseqüentemente, aumentando a margem desses perigos para os que já se encontravam defronte aos riscos originados e/ou desenvolvidos pela sociedade capitalista161.

160 “In” A Constitucionalização Simbólica, São Paulo: WMF Martins Fontes, 2007, p. 94.

161 Virgílio Afonso da Silva, em um artigo publicado originariamente em inglês, discorrendo sobre o delicado

tema da jurisdicionalização das políticas públicas no Brasil, não obstante defender a figura de um Poder Judiciário ativo, ressalta as impropriedades que a realidade pode guardar, entre elas, os interesses subrepetícios de empresas preocupada em obter ganhos sobre a concretização dos direitos sociais e o acesso a esses direitos apenas aos já portadores de potencial econômico:

“in a scenario of scarce resources, the costs incurred by these judicial decisions have to be covered by withdrawing resources from other public policies. This could mean, for instance, that less money is available for buying medicines to cure other diseases, or for building hospitals. The collective nature of social rights is undermined in these cases in favour of the individual, since the money that could be spent in global programmes has to be allocated to individual claims. It could be said that too much individual success often means collective failure.

Furthermore, most of these individual claims for a particular drug or for a particular medical treatment are in fact encouraged by the pharmaceutical industry, in the hope that a large number of judicial decisions granting their medicines to individuals will force the government to include them in the list of drugs in the official health programme. This would mean a huge amount of money to these companies. So, although judges may not be aware of it, their decisions not only undermine the collective character of social rights and public policies, but also help the pharmaceutical industry to sell its new medicines.

One could argue that, although the problems mentioned above do exist, it is also true that many people can only gain access to medical treatment or other social rights by appealing to the judiciary, and this in itself, in theory, would be enough to justify judges' activism. This would probably be true in a fairly equal society, but it is surely not the case in Brazil and in many other developing countries in the world. The reason for this is quite simple. Despite the efforts of public and pro-bono attorneys, a successful outcome in a Brazilian court is almost always linked to having enough money to pay for good lawyers. Real access to the judiciary is in reality restricted to the wealthiest in society.

It is no coincidence that many of the cases relating to access to medication are AIDS related, and not for diseases more likely to affect the lower classes, such as diphtheria, tuberculosis etc. While the poor have no access to the basics, the upper middle class are winning their cases to pay for their expensive treatm” (Singing

Out of Tune: Public Policies, Social Rights, and the Judiciary. “In” This Century´s Review,Frankfurt am Main, 01 ago. 2006. http://www.thiscenturysreview.com/Singing_Out_of_Tune.singingoutoftune.0.htm. Acessado em 12/11/2007).

Ou seja, essa elite, conhecendo a previsão abstrata dos direitos sociais, se apropria do direito de utilizar alguns deles em seu próprio favor, via judiciário (exemplo: concessão de remédios aos já detentores de poder econômico, consubstanciado em tratamentos caros fornecidos no interesse da indústria farmacêutica, consoante apontado, em nota, pelo professor Virgilio Afonso da Silva), gerando custos muito maiores para o Estado pela concessão individual, que de forma geral, já que não é precedida de licitação nem dos rigores para preservação da supremacia do interesse público. E o que acentua o disparate é que demandam contra o Estado de forma privada, um direito que seria para toda a sociedade, exigindo altas condenações de honorários advocatícios, diminuindo ainda mais os escassos recursos que poderiam ser alocados para os direitos sociais162.

Em vista disso, o princípio da “reserva do possível” ganha especial destaque entre nós. A problemática que reside nesse postulado é que ele pode ser utilizado para defender posições completamente antagônicas entre si. Pode servir a interesses privatísticos de limitação a atuação do Estado, com vistas a manutenção dos atuais privilégios e da hierarquia social; ou pode atender a uma exegese da realidade, buscando-se o real limite de atuação do Estado e até para legitimar uma desequiparação com fulcro no caráter econômico, colocando no centro dos destinatários das políticas públicas as classes mais desprivilegiadas e deixando a ‘reserva’ apenas para as mais favorecidas.

Esse é o cuidado que deve se ter quando se intenta estudar o princípio da reserva do possível. É definir a quem ele interessa: aos já privilegiados que querem se manter nessa posição e reduzindo suas despesas (tributos) para com o Estado? Ou aos desprivilegiados que necessitam do Estado social?

162 Ivan César Ribeiro, em um estudo empírico sobre a realidade das decisões judiciais brasileiras, constatou que

a tese de que o Poder Judiciário faz justiça social e que, malgrado a maioria dos juízes afirmem privilegiarem os mais fracos, não é verdadeira. Os resultados que as análises dos casos concretos chegaram são:

“a) Os juízes favorecem a parte mais poderosa. Uma parte com poder econômico ou político tem entre 34% e 41% mais chances de que um contrato que lhe é favorável seja mantido do que uma parte sem poder;

b) Uma parte com poder apenas local tem cerca de 38% mais chances de que uma cláusula contratual que lhe é favorável seja mantida e entre 26% e 38% mais chances de ser favorecido pela Justiça do que uma grande empresa nacional ou multinacional, um efeito aqui batizado de subversão paroquial da justiça.

c) Nos Estados Brasileiros onde existe maior desigualdade social há também uma maior probabilidade de que uma cláusula contratual não seja mantida pelo judiciário. Passando-se, por exemplo, do grau de desigualdade de Alagoas (GINI de 0,691) para o de Santa Catarina (0,56) tem-se uma chance 210% maior de que o contrato seja mantido”.

Consta da conclusão desses autores que No Brasil, "a operação das instituições legais, políticas e regulatórias é subvertida pelos ricos e politicamente influentes em seu próprio benefício", uma situação que se designou como "redistribuição do tipo King John" (em oposição à "redistribuição do tipo Robin Hood"). (“In”

Robin Hood versus King John: Como os juízes locais decidem casos no Brasil? http://getinternet.ipea.gov.br/ipeacaixa/premio2006/docs/trabpremiados/IpeaCaixa2006_Profissional_01lugar_te ma01.pdf. Acesso em: 14/11/2007).

Fábio Konder Comparato já asseverou que:

“É claramente impossível compelir o Estado a providenciar imediatamente, a todos os que o demandem, um posto de trabalho, uma moradia, uma vaga em creche, um tratamento médico-cirúrgico de alta complexidade, e outras prestações dessa natureza. Diante dessa evidência incômoda, todos acabam por se resignar à conclusão de que os direitos econômicos, sociais e culturais têm uma eficácia limitada, em comparação com os direitos e liberdades individuais. Em suma, tornou-se lugar comum na doutrina afirmar que vigoraria, nessa matéria, o pressuposto implícito da ‘reserva do possível’.