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CAPÍTULO 2- Percursos Metodológicos

2.3 Estratégias de Análise: Um Olhar Sobre o Objeto

Para atender os objetivos de pesquisa, metodologicamente precisamos adentrar nos princípios etnográficos com base na observação. A inserção e negociação no campo de pesquisa ocorreu de maneira tranquila, mas alguns acordos foram firmados. Como explicitado no organograma deste trabalho, há uma ilha na redação que é responsável pela elaboração de conteúdos para as sociais. Pois então, o foco de observação esteve centrado neste lugar, onde o trabalho era produzido.

Como eram muitas pessoas trabalhando e exercendo essa função, a atenção voltou-se para a pessoa que possuía maior poder de decisões naquele ambiente. Nos horários, as observações se modificaram entre os dias de semana e os finais de semana. Mas a maioria foi estabelecido um horário de observação eu seria entre as 09 horas da manhã e as 19 horas da noite. É válido ressaltar que o trabalho dos analistas de conteúdo começa pela manhã a partir das 7 horas da manhã, seguindo até às 10 horas da noite. Por adequações metodológicas e estratégicas o horário foi recortado, pois a maior concentração de atividades desenvolvidas pelos analistas se concentravam no horário comercial. Nos horários restantes haviam poucos jornalistas na sala de redação. Aos finais de semana, como a carga horária de trabalho é reduzida, as observações se voltaram apenas par ao período da tarde que esteve entre as 13 e 16 horas.

No âmbito da literatura sobre etnografia, devemos considerar que de fato, os estudos desta área tem origem no campo da Antropologia. Isso porquê, em sua essência, a etnografia visa descrever a cultura de um grupo, de um povo. Estudar essa cultura por essa perspectiva acarreta em observar seus comportamentos, costumes e crenças compartilhados em determinado grupo. O método foi introduzido por Brosnislaw Manilowski e por Franz Boas em fins do século XIX e início do século XX. Os estudiosos das academias europeias e norte- americamas queriam entender os povos colonizados, para tanto, defendiam os dois estudiosos a necessidade de se inserir nas comunidades, observando seus hábitos e costumes. (ALMEIDA; 2003)

Em uma definição de Agrosino (2008), a etnografia pode ser entendida como uma ciência de descrever um grupo humano, seja nas suas instituições, produções ou seus comportamentos interpessoais, onde o pesquisador possui o papel de descrever as vidas cotidianas rotineiras das pessoas que estão sendo estudadas. Ela deve ser feita in loco ou seja, é necessário participar diretamente na vida para poder coletar dados nas experiências humanas vividas e descrever todas as instâncias de interação ou produção.

A etnografia não pode ser designada apenas como uma simples aplicação de questionários e nem pode resultar de questões previamente pensadas pelo pesquisador e colocadas em perguntas para verificação. Ela consiste de uma experiência social sobre o qual o pesquisador e a construção de um saber durante um determinado tempo de observação, conforme Agier (2015). Sendo mais objetivo, não há possibilidade de realizar uma etnografia sem que haja a inserção em um campo de pesquisa, ou seja, viajar, sair de casa e olhar o mundo com olhos que estejam distantes de si no pesquisador. Esse distanciamento possibilita relações mais simplificadas com os seres humanos pesquisados, como também contribui para que note- se as semelhanças e diferenças do grupo com a sua cultura e o seu cotidiano.

Como o objetivo do trabalho está em observar e descrever o cotidiano e a produção de um determinado grupo de jornalistas que exerce um determinado trabalho, de maneira rotineira, referenciamos argumentos teóricos que nos auxiliam a compreender a etnografia adaptada aos estudos jornalísticos. Por isso nos utilizamos de Mainardes (2009) que defende a etnografia como método adaptável em diferentes áreas do conhecimento, principalmente dentro das ciências sociais, na qual exerceremos os princípios etnográficos para adaptá-los em meio a um método de observação. O autor apresenta a etnografia como um procedimento que envolve um pesquisador na participação e observação da vida cotidiana de pessoas ou grupos durante um longo período de tempo. Nesse caso, observa-se as situações rotineiras com a promoção de diálogos com os seres humanos, perguntas, questionários entre outras técnicas que facilitem o contato e a inserção no campo pesquisa, para que dessa maneira, seja possível coletar dados que indiquem a qualidade dos agentes do campo bem como suas ações e fazeres.

Mais do que isso, é necessário estar atento ao ambiente que está sendo observado. Perde-se e encontrar-se diversas vezes para que uma descrição detalhada seja realizada. A leitura interior colabora com a identificação dos processos de produção, por isso, também viver e compreender o espaço com empatia constrói uma fluidez na observação. Dentro das ciências sociais aplicadas, o pesquisador, primeiramente, precisa definir o objeto de pesquisa e formular questões para que seja possível testar hipóteses do ambiente pesquisado. Assim como que é preciso que o pesquisador tenha clareza do seu papel no campo de investigação, ou seja, o cientista deve ter uma série de princípios que nortearão a sua pesquisa e postura nas relações que terá com os sujeitos, pois a presença do observador no campo de pesquisa pode alterar as situações observadas. De alguma maneira, o pesquisador pode ser rejeitado pelo grupo na qual está inserido ou até mesmo tornar-se muito familiar ou envolvido. Essas formas de distanciamento ou aproximação podem dificultar a análise objetiva da realidade que está sendo investigada.

O pesquisador precisa se envolver com as pessoas e os fatos. O pesquisador precisa tomar cuidado para não se tornar muito próximo nem muito distante do grupo e das pessoas investigadas, pois esses comportamentos extremos podem afetar o acesso e a coleta de dados. As relações com os sujeitos são construídos ao longo do tempo e dependem da postura do pesquisador frente ao grupo. (MAINARDES, 2009, p. 107)

Mas o etnólogo Agier (2015) defende que o campo não pode ser definido como uma coisa ou um lugar, quão pouco um grupo étnico ou uma instituição. Ele até pode ser todo esse conjunto de fatores, mas antes de tudo precisamos considera-lo como um conjunto de relações pessoais na qual o pesquisador deve estar ponto para aprender e observar coisas. Fazer pesquisa de campo é saber estabelecer relações pessoais com personagens que o pesquisador não possuía contanto anteriormente. Tanto que como elas se desenvolverão futuramente são incógnitas, pois elas podem ser amigáveis e harmoniosas com uns, porém conflituosas com outros. Essas hipóteses iniciais são pontos de partida necessários, porém podem ser reelaboradas no percurso de coleta de dados, como também é necessário definir um campo de pesquisa e avaliar o tempo que precisará para coletar todos os resultados. Por isso, decidiu-se nessa pesquisa estudar o jornal GauchaZH como base para poder compreender como um jornal de referência regional possui atividade profissional jornalística nas mídias sociais.

Incluir esse procedimento metodológico dentro dos estudos jornalísticos transparece como um processo possível. Investigar as práticas e rotinas produtivas de uma redação depende da observação dos atores (sejam eles humanos ou não) que estão incluídos nesse processo. Na coleta de dados nesse ambiente, torna-se evidente a observação de papeis individuais dos jornalistas, os constrangimentos organizacionais, as suas normas profissionais, as suas culturas e todos os momentos de tensão que podem ser atribuídos entre seres humanos ou em máquinas, visto que o trabalho tem como objetivo construir resultados com base nas pressões que são, em partes, ocasionadas pelas mídias sociais. Dentro da redação jornalística, o pesquisador deve observar as rotinas, pressões e tensões de um ou mais setores, demarcando os aspectos que marcam esse cotidiano de trabalho. O trabalho de pesquisa pode ser acompanhado com a presença do pesquisador nas reuniões de pauta, nas produções fora da redação, nos movimentos e em todos os processos do fazer notícia.

O pesquisador deve analisar quais são as estruturas e organizações do ambiente, bem como os quadros de funcionários, aplicações, fluxos, contrafluxos e ciclos presentes. Bronosky e Schoenherr (2016) defendem que as pesquisas de campo tem como papel fundamental identificar situações e marcas dentro de determinados cenários. A metodologia etnográfica demanda dos pesquisadores a criação de uma imagem dos fenômenos e das situações nas quais

os sujeitos estão envolvidos e deve ser compreendida cientificamente com três competências: o saber ver, saber estar com e o saber escrever. Segundo os autores, os cenários não são estruturados somente por objetos fixos ou relações estáveis, há também a presença de variações, processos e ações:

Os estudos etnográficos oferecem condições de qualificar a identificação de cenários complexos e móveis, comportamento dos sujeitos e as relações dos sujeitos com os objetos; através de estratégias observacionais, oferecem condições para articular múltiplos enquadramentos. (BRONOSKY; SCHOENHERR, 2016, p. 10)

Os ambientes de redação possuem marcações objetivas que podem colaborar com o desenvolvimento de estratégias de pesquisa de campo, como: finalidades de produção; ambiente de trabalho; rotinas e etapas produtivas; hierarquia funcional; ritmo; e a combinação particular do individual e do coletivo na produção. Mas o “observar” não pode ficar restrito apenas aos olhares atentos de um pesquisador. Deve haver uma técnica predominantemente conhecida dentro do campo da antropologia que denomina-se “caderno de campo”. Consiste em um documento - como um caderno, folhas, computador, gravador - que possui uma finalidade de memorando. Ou seja, anotar detalhadamente todos os processos que foram observados durante o período de percurso etnográfico. Bronosky e Schoenherr (2016) destacam a importância das técnicas de registro e construção de cadernos de anotações. Porém, no campo de investigação jornalística, os pesquisadores necessitam gerar táticas que estejam mais próximas as particularidades do jornalismo. Ressaltam que a qualidade dos dados coletados está vinculado ao reconhecimento das especificidades culturais inseridas no ambiente, como identificar e reconhecer o cenário e seus sujeitos. Para Mainardes (2009), o caderno serve como um apoio ao pesquisador, onde devem-se ser anotadas todas as impressões do pesquisador sobre o cotidiano do coletivo que está sendo pesquisado. Essas anotações são essenciais para que posteriormente haja uma organização dos dados e a produção de uma descrição densa da cultura que foi investigada.

Tudo que foi observado no campo de pesquisa deve ser anotado de maneira detalhada, mesmo que tudo se transforme em texto etnográfico de pesquisa, desde as conversas informais que ocorrem dentro e fora da redação, como por exemplo os almoços e momentos do café. Incluir-se nas sensações e no clima de trabalho faz parte do etnólogo, ou seja, de viver e presenciar todos os momentos. Nesse diário, também deve constar uma descrição minuciosa do lugar onde está inserido, dando atenção a distribuição de ilhas, lugares de chefia, monitores, pontos de movimentação, entre outros aspectos. (VIEIRA; 2018)

Na descrição final da observação, o pesquisador necessita realizar uma descrição densa da sua etnografia no documento de pesquisa. O recomendável, segundo Viera (p. 84; 2018) é: “descreva, descreva, descreva e você encontrará os principais mediadores (actantes), os intermediários (que transportam, mas não mudam nada), as ideologias, as forças, os poderes, as razões, as estruturas e as agências circulando”

Podemos entender esse procedimento como notas metodológicas, conforme compreende Burgess (1997), ou seja, ser descrito todas as anotações de todas as atividades que foram realizadas pelo pesquisador. Adaptando-as para o jornalismo, podemos utilizar as notas como possíveis ferramentas que contribuem para uma avaliação sobre o ambiente estudado e serem aplicadas posteriormente para sanar questionamentos e inquietações do pesquisador durante o período de observação. Essas notas são importantes para que posteriormente, pós- coleta, haja uma reflexão na forma de analisar o caderno de campo e utilizar o que pode ser favorável para o trabalho.