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CAPÍTULO II — O AGIR MORAL NO EXERCÍCIO DA CIDADANIA

1. Adaptação pedagógico-didática ao contexto

1.3. Estratégias didáticas utilizadas com sucesso

A palavra didática procede da expressão grega Τεχνή διδακτική, que tem o significado de arte de ensinar, a qual «dependia muito do jeito de ensinar e da intuição do professor»184. A evolução do conceito leva-nos à didática como ciência cujo objeto fundamental reside no estudo das estratégias de ensino, das questões práticas relativas à metodologia, meios e recursos de aprendizagem. No ensino, a didática equivale a adaptação e adequação ordenada destes elementos no ato educativo, para orientar a aprendizagem do educando em ordem a atingir um estado de maturidade que lhe permita encarar a realidade de maneira consciente, eficiente e responsável, para nela atuar como um cidadão participante185. Deste modo, vamos agora expor as principais estratégias de ensino utilizadas com sucesso na nossa Prática de Ensino Supervisionada.

Grande parte dos conteúdos solicitados para as lecionações acerca da Unidade Letiva 4, Promover a concórdia, são de caráter teórico e baseiam-se no desenvolvimento de definições conceptuais, declarações categóricas, regras de conduta, enunciação de valores e afirmações bíblicas. Por isso, desde o começo nos questionámos sobre a forma de conseguir motivar alunos do 5.º ano de escolaridade, com 9 ou 10 anos, para apreender conceitos que lhes são, em princípio, estranhos e que fogem do seu interesse imediato. Uma metodologia passiva, em que os alunos e alunas tratem de assimilar o que o professor lhes transmite, através de aulas essencialmente expositivas, pode conduzir o grupo a situações de distração, desmotivação e cansaço. Tal não deve ocorrer. Por isso, sem colocar de lado a necessidade de introduzir momentos de exposição do professor, consideramos que um modelo de aprendizagem passiva não seria adequado para a lecionação dos temas atinentes à promoção da concórdia.

A recolha de dados biográficos dos alunos e dos seus agregados familiares, junto da professora cooperante e da Diretora de Turma, a nossa experiência docente e os conhecimentos adquiridos ao longo do presente mestrado, sobretudo na área da Psicologia da Aprendizagem e da Didática da Educação Moral e Religiosa Católica, ajudaram-nos a definir o modelo pedagógico que melhor se adaptava ao grupo e aos interesses educativos. Parecendo-nos possível e desejável o envolvimento dos alunos. Por isso, optámos por implementar um modelo de aprendizagem ativa, em que os alunos e alunas pudessem ser e

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NÉRICI, Imídeo, Didática Geral Dinâmica, São Paulo: Atlas, 198710, 46.

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sentir-se parte integrante do processo de ensino e aprendizagem186. Por isso, como veremos no terceiro ponto deste capítulo, onde apresentamos e fundamentamos a nossa Prática de Ensino Supervisionada, procurámos dar preponderância à colaboração dos alunos e alunas e à proximidade do professor.

Nesta modalidade o professor cria ferramentas e constrói, juntamente com os alunos e alunas, um ambiente favorável à aprendizagem, implementando estratégias criativas, que tenham significado para os discentes e que os motivem para aprender187. Através da envolvência de todos nas atividades propostas, inspirados na pedagogia da alteridade de Emmanuel Lévinas, tentámos dar rosto humano a todas as lecionações, em que o aluno ou a aluna deixaram de ser alguém que encontramos sentado atrás de uma carteira, à espera de ser ensinado, para ser o outro que me obriga a sair de casa e ir ao seu encontro, no seu espaço e no seu tempo, não da minha história pessoal, mas da sua vida construída e a construir.

Subjacente à aprendizagem ativa, está um conceito fundador da responsabilidade, da autonomia e da coragem para arriscar e aprender mais e melhor. Em nosso entender, estas atitudes afiguravam-se, de antemão, como favoráveis à implementação dos temas relacionados com a promoção da concórdia e o exercício de uma cidadania responsável. Neste enquadramento, a gestão da sala de aula sustentou-se pela procura constante do da conciliação e do entendimento, que induzia constantemente o envolvimento de todos nas aprendizagens, sem ser necessário outro recurso.

Durante o percurso da prática letiva, tivemos sempre a preocupação de manter elevados os níveis de motivação. A motivação é um estado interior que estimula, dirige e centra os esforços que permitem alcançar determinados objetivos. Dependendo dos fatores em causa, estaremos perante dois tipos de motivação: intrínseca ou extrínseca. Entende-se por motivação intrínseca a tendência natural de procurar vencer desafios, tendo por base os próprios interesses e aptidões. A motivação extrínseca é aquilo que leva a fazer algo com o intuito de se ser recompensado ou de não se ser prejudicado. Em educação, ambas as motivações são relevantes, pois ao estimular a curiosidade dos alunos o docente está a potenciar a sua motivação intrínseca. A motivação extrínseca é igualmente válida e deve surgir em forma de recompensa na aquisição de boas classificações ou, mesmo, o reforço

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Cf. HOHMANN, Mary - WEIKART, David, Educar a Criança, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 20095.

187

Cf. FARIA, Luísa - RURATO, Paulo - SANTOS, Nelson, “Papel do autoconceito de competência cognitiva e da autoaprendizagem no contexto sócio laboral”, in Análise Psicológica 27 (2000) 219.

positivo. Também a satisfação e o facto de não ter medo de falhar e de ser capaz de aplicar os conhecimentos a novas realidades, são fatores importantes neste processo188.

Dado que cabe ao professor promover a motivação para aprender, fazendo com que todos os alunos se envolvam nas atividades propostas, levando-os posteriormente a refletir sobre as aprendizagens realizadas, tratámos de despertar a curiosidade dos alunos sobre as atividades, introduzindo elementos com surpresa; e sobre os temas teóricos, mesmo os mais difíceis, procurando que, através da citação de exemplos, tivessem relação com o seu quotidiano189. Além disso, introduzimos estímulos e incentivos pessoais e coletivos; lançámos alguma pressão para que todos realizassem os trabalhos e participassem nas atividades e criámos expetativas e interesse em torno de determinados temas ou ações, por vezes em relação à aula seguinte, como ocorreu com a representação teatral. Sempre que se mostrou adequado reforçámos positivamente os alunos, sobretudo na sequência dos debates e após questões tratadas na oralidade.

Para uma melhor organização do ambiente educativo tivemos a preocupação de estabelecer rotinas e utilizar transições claras e percetíveis para as mudanças de tema ou de atividade. Além disso, para cada aula criámos estratégias variadas com dimensão suficientemente facilitadora para o tipo de aprendizagem ativa adotado.

O papel do professor situou-se na criação de situações que mobilizassem os conhecimentos já adquiridos pelos alunos e alunas e, ao mesmo tempo, desafiassem a sua imaginação e conduzissem o seu pensamento para as novas aprendizagens, em particular no que se refere à introdução de conceitos novos e descoberta de valores humanos e sociais, a partir de situações do quotidiano190.

Em todas as aulas procurámos ter um momento de exposição de conteúdos, em que, como método, evitámos que os alunos e alunas nos interrompessem, antes de terminar a referida exposição. Depois disso, questionámos o grupo sobre se tínhamos sido suficientemente claros. Procurámos nutrir com equilíbrio o discurso, servindo-nos de uma linguagem simples, próxima do universo lexical dos alunos e evitando termos demasiado elaborados e técnicos. No entanto, quando os conteúdos da Unidade Letiva, lecionada no âmbito da Prática de Ensino Supervisionada, assim o exigiram, utilizámos palavras ou expressões menos familiares aos alunos, explicando-lhes o sentido. Fizemos desses instantes um momento de aprendizagem, certificando-nos constantemente se era percetível

188

Cf. OLIVEIRA, Helena - COSTA, Paulo, Motivar para aprender — o que fazer?, in AA.VV., Atas do I

Encontro Internacional do Ensino da Língua Portuguesa, Coimbra: Escola Superior de Educação de

Coimbra, 2009, 229.

189

Cf. Ibidem, 228.

190

Cf. OLIVEIRA-FORMOSINHO, Júlia - ARAÚJO, Sara, “O envolvimento da criança na aprendizagem: Construindo o direito de participação”, in Análise Psicológica, 22 (2004) 82.

a nossa explanação, para que todos os alunos e alunas compreendessem os significados em questão. O exemplo mais expressivo do que estamos a relatar, foi a introdução da palavra

concórdia, cujo significado foi trabalhado em aula pelos alunos através da estratégia dita

«chuva de ideias». Em seguida, tratámos de expor o significado de concórdia partindo dos conceitos correlacionados, que os alunos haviam fornecido e se encontravam patentes no quadro. Ao longo das seis lecionações sobre este tema, verificámos que os alunos da turma mostraram não só grande capacidade de apropriação deste e de outros conceitos, mas também de os mobilizar e aplicar em novas situações.

Mantivemos um tom de voz natural e uma atitude de escuta, seja no diálogo com os alunos, seja a colocar-lhes questões, seja a fazer a exposição de conteúdos. Utilizámos uma linguagem inclusiva, para que, quer rapazes, quer raparigas, se sentissem permanentemente implicados no e pelo nosso discurso. Em geral, os alunos e alunas mostraram compreender a linguagem por nós utilizada e não revelaram dificuldades cognitivas, exprimindo-se adequadamente, quer na vertente oral, quer na escrita.

No sector comportamental e disciplinar, desde as primeiras lecionações, procurámos estabelecer um clima de abertura interpessoal, em que cada aluno e aluna se sentisse como um elemento com voz dentro do grupo e, simultaneamente, protagonista da história construída dentro da sala de aula. Sempre que foi necessário chamar a atenção dos alunos, suspender conversas paralelas, interromper comportamentos menos corretos, ou estabelecer a ordem na sala de aula, fizemo-lo com um tom de voz mais firme, de forma clara e inequívoca, dirigindo-nos diretamente ao aluno, ou alunos em causa, dizendo os respetivos nomes, declarando os motivos da chamada de atenção e indicando o comportamento a adotar e porquê. No capítulo disciplinar, apenas uma vez, pedimos a um aluno que mudasse de lugar, por comportamento desadequado.

Para a consolidação das aprendizagens, parece-nos que foi fundamental a revisão das aprendizagens da aula anterior, feita no começo de cada aula, como uma rotina introduzida refletidamente. «Quer no significado comum do conceito de rotina quer na sua etimologia perpassa a ideia de repetição, hábito, caminho, roda, círculo»191. A introdução de algumas rotinas na gestão da sala de aula reveste-se de importância na formação e desenvolvimento do aluno a partir de uma pedagogia ativa, dado que o ajuda a situar-se com certa autonomia no processo de ensino e aprendizagem192.

Na organização da participação oral, dado ser o professor a dirigir o diálogo, geralmente interpelávamos diretamente os alunos e alunas com menor tendência para

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BRAMÃO, Beatriz - GONÇALVES, Daniela - MEDEIROS, Paula, “Rotinas na Aprendizagem”, in

Cadernos de Estudo, 4 (2006) 25.

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intervir nas aulas, através deste género de estruturas de participação, com questões de resposta simples, porque fazia parte da nossa estratégia de ensino que todos participassem. Por princípio, embora tivesse havido exceções, só permitíamos que um aluno ou aluna interviesse pela segunda ou mais vezes, quando tínhamos a certeza de que já todos os outros tinham tido alguma intervenção. O controlo destas participações foi feito através da confirmação na planta da sala, com o nome dos alunos. O critério justifica-se pelo facto de nos parecer que nenhum aluno ou aluna pode sentir-se como externo ao processo de ensino e aprendizagem. Normalmente, este desígnio cumpria-se durante o tempo dedicado à revisão das aprendizagens da aula anterior, em que, respondendo em diálogo com o professor, todos tinham oportunidade de intervir oralmente.

Nem todas as intervenções dos alunos são orais, dado que consideramos intervenção, por exemplo, a distribuição do material do «Jogo da opinião livre». Confiámos esta tarefa ao aluno referenciado com Necessidades educativas especiais. Devido às dificuldades deste aluno, atrás descritas, a sua intervenção oral nem sempre era provocada pelo professor e, quando o era, ocorria através de perguntas de resposta simples e acessível. Preferíamos que a sua intervenção oral ocorresse de forma espontânea, pelo que lhe dávamos prioridade sempre que levantava o braço. Por vezes, a sua intervenção não decorreu do contexto imediato da aprendizagem, mas de uma necessidade pessoal, ou de algo que lhe ocorria e desejava manifestar. Devemos notar que, sendo ele o encarregado de distribuir aos colegas as peças do jogo, no começo de cada aula dirigia-se ao professor e perguntava se lhe era permitido cumprir a tarefa naquela aula. Este facto manifesta o interesse do aluno em participar na aula, de acordo com as suas capacidades.

Promovemos o trabalho no lugar, quer individual, quem em grupo de dois elementos, facilitado pelo facto de as mesas dos alunos serem de dois lugares. Acompanhámos pessoalmente quer o trabalho individual, quer o de grupo.

Em suma, estabelecemos nas aulas da Prática de Ensino Supervisionada um clima de cooperação e de interajuda. Nesse sentido, encorajámos constantemente a participação de todos os alunos e alunas, conscientes de que cada um deve ser encarado como um potencial auxílio na construção de significados para os seus colegas. Tivemos o cuidado de, em todas as aulas, dar oportunidade a que todos os alunos exprimissem a sua opinião sobre os assuntos abordados. Entre as estruturas de participação preferimos as dirigidas pelo professor, promovendo momentos de perguntas e respostas, de discussão e de debate. Nestes casos, aos alunos que desejavam participar foi pedido que levantassem o braço e esperassem a indicação do professor para intervir. Quando suscitada a discussão ou debate entre os alunos, não era permitido que falassem ao mesmo tempo, nem que tomassem a iniciativa de responder aos colegas, sem a autorização do professor. Esta regra nem sempre

foi cumprida, dado o entusiasmo com que algumas matérias foram debatidas, o que consideramos perfeitamente normal e sem gravidade, porque, atendendo à faixa etária dos alunos, é natural alguma incapacidade para controlar a impulsividade da resposta.