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CAPÍTULO II — O AGIR MORAL NO EXERCÍCIO DA CIDADANIA

3. A Prática de Ensino Supervisionada

3.4. O agir moral

Toda a ação humana, executada com conhecimento e liberdade, é um ato moral. Os atos sem reflexão, sem consciência, sem conhecimento e sem liberdade, podem também ser considerados bons ou maus, mas não são atos morais. Assim, o ato moral é, por definição, o ato próprio do ser humano que se pode qualificar como bom ou mau, porque consciente e livre.

Ao planificarmos uma aprendizagem sobre esta matéria, tínhamos consciência de estar a penetrar num dos capítulos mais sensíveis da moral, fazendo jus ao núcleo ético da disciplina. Significava transportar os alunos para a plataforma da autoconsciência, do discernimento e da capacidade de agir livre e conscientemente. Por isso, por um lado, deveríamos ser extremamente adequados na escolha da estratégia e seleção de recursos, mas também na assertividade da exposição, para motivar os alunos, captar a sua atenção e sermos suficientemente claros na explicação dos conceitos.

A importância da temática justificava que lhe fosse consagrada uma parte significativa da aula. Somando as estratégias utilizadas para a exposição faseada do tema, contávamos com a utilização de 15 minutos, a que se seguiam 10 minutos para a realização de uma Ficha Formativa sobre o mesmo assunto, a fim de consolidar as aprendizagens. No conjunto planificámos 25 minutos para a explanação desta aprendizagem. O restante tempo seria distribuído pelo acolhimento, revisão das matérias da aula anterior e encerramento da aula, com a possibilidade de esclarecer alguma dúvida.

Parecia-nos que a transição deveria ser clara, mas não abrupta. Por isso, após a revisão da aula anterior e da correção do trabalho de casa, em que os alunos e alunas apresentaram o relato dos exemplos que havia recolhido para operacionalizar os conceitos de: união, acordo, entendimento, harmonia, conciliação e paz, propusemos uma pausa para que cada um pensasse naquilo que mais gostaria que lhe acontecesse e naquilo que mais gostaria que lhe fizessem.

Ouvimos a opinião descontraída e empenhada de todos e partimos para uma brevíssima exposição, que pretendia colocar no campo genérico e abstrato os exemplos concretos que cada aluno havia trazido. Tal ocorreu mediante a projeção de um slide com uma simples frase, em jeito de máxima, que foi colocada à consideração do grupo: «Gostamos que as coisas nos corram bem e que as pessoas nos façam bem». A afirmação recebeu a aprovação de todos, o que nos dava a indicação de que tinha sido adequada para aglutinar os exemplos anteriores. A cor da afirmação (verde, esperança) bem como a escolha das imagens que ilustravam a afirmação introduziram um certo otimismo no ambiente da sala e ajudaram os alunos a compreender melhor o lado positivo da vida, que legitimamente todos desejam. A menina que nos olha nos olhos exibindo o seu diploma «construir uma escola mais humana» reforça a firmação «Gostamos que as coisas nos corram bem». O abraço entre amigos reforçava a afirmação «Gostamos que as pessoas nos façam bem» (ver figura 8).

Dado estarmos a trabalhar sobre o ato moral, o objetivo da estratégia não se quedava pelo gostar. Pretendíamos conduzir os alunos ao verbo querer, relacionado com a vontade e com o agir. O verbo gostar surge, porém, por ser mais próximo do sentir imediato dos alunos e alunas desta idade, podendo, assim, mas facilmente apropriar-se da afirmação e emitir um primeiro assentimento positivo face às noções que pretendíamos introduzir, como, de resto, ocorreu. Devemos notar que a capacidade de abstração desta faixa etária não se encontra ainda totalmente desenvolvida, pelo que, quando se passa para o campo do abstrato, se torna necessário construir afirmações que lhes sejam o mais familiares possível.

O slide seguinte propõe o reverso da medalha, isto é, o que não gostamos que nos aconteça ou nos façam. De igual modo, a cor vermelha e a fotografia que incluímos têm o objetivo de iluminar as palavras. A fotografia apresenta apenas o rosto de uma criança em lágrimas, a que tirámos a cor para dissipar qualquer sinal de alegria (ver figura 9).

Figura 9: Não gostamos que as coisas nos corram mal.

Após esta figura e partindo dos exemplos que cada aluno e aluna havia citado sobre si mesmo, podíamos falar do bem e do mal como algo que gostamos ou não gostamos que nos aconteça. O passo seguinte foi transpor o verbo «gostar» para o verbo «querer» nas afirmações atrás referidas, repetindo os slides, mas com a palavra «querermos» / «não querermos» em azul, unicamente para surgir destacada. A diferença não é significativa, dado as afirmações se manterem no sentido passivo, pelo que o assentimento dos alunos foi imediato e espontâneo, quando lhes perguntavam se estavam de acordo com a alteração no texto. Este assentimento mostrava que estavam criadas as bases para a aprendizagem seguinte, dar um sentido ativo ao verbo «querer»: quero fazer o bem; não quero fazer o bem. A exposição do docente, recorrendo a vários exemplos, foi acompanhada pela mudança de slide e projeção da afirmação: «AGIR BEM; fazer o bem», em azul.

Chegámos ao momento de expor a regra de ouro da moral que, dado o caminho já percorrido, encontrou favorável acolhimento. Alguns alunos mostraram já conhecer a máxima: «Faz o bem e evita o mal», que, como deixámos dito no segundo capítulo deste relatório, se deve atribuir ao filósofo grego Epicleto251. O docente procurava que cada aluno visse a afirmação como uma regra que nos compromete ativamente na construção de uma cidadania responsável. Independentemente de quem quer que seja o outro, para nos servirmos dos termos de Emmanuel Lévinas, o bem é sempre bem e deve ser praticado; assim como o mal é sempre mal e deve ser evitado. Esta é, no fundo, a base da ética da alteridade, evocada no segundo capítulo, que é sempre ativa, geradora e criadora. Deste modo, os conteúdos desta aprendizagem articulam-se perfeitamente com os da disciplina Saúde, Ambiente e Empreendedorismo, no que diz respeito à promoção de valores positivos para construir uma cidadania responsável.

Neste momento mobilizámos um dos conhecimentos adquiridos na aula anterior, expondo uma das afirmação que tinha sido votada pelos alunos, no «Jogo da opinião livre» com o máximo número de placas «concordo» levantadas: «Não faças aos outros o que não gostas que te façam a ti». Completam este momento da aprendizagem quatro provérbios populares que incitam a fazer o bem: «nunca te arrependas do bem que fizeres»; «Fazer o bem sem olhar a quem»; «Nunca é tarde para fazer o bem»; e «Fazer o bem pelo bem e não pela recompensa». Foi pedido a vários alunos que, por palavras suas, explicitassem o significado de cada um dos provérbios, dando exemplos.

Não ficaria completa esta aprendizagem, no âmbito da Educação Moral e Religiosa Católica, sem o apoio do texto bíblico. Entre os diversos que poderíamos citar, selecionamos o seguinte texto lucano:

Naquele tempo disse Jesus: «O que quiserdes que os outros vos façam, fazei-lho vós também. Se fazeis bem aos que vos fazem bem, que agradecimento mereceis? Amai os vossos inimigos, fazei o bem sem nada esperar em troca. Então, a vossa recompensa será grande e sereis filhos do Altíssimo». (Lc 6,31.33.35).

A escolha deste texto justifica-se amplamente pela pertinência relativamente ao tema do agir moral. O desafio que Jesus colocou aos alunos e alunas, através das suas palavras, encerra tanto o sentido passivo como o sentido ativo que atrás desenvolvemos. É colocado em destaque o verbo fazer, como ação; e o bem como objetivo252. O texto foi lido

251

Segundo Aurelio Fernández, Epicleto terá dito: «Há que fazer o bem e evitar o mal»: Cf. FERNÁNDEZ, Aurelio, Compendio de Teología Moral, Madrid: Ediciones Palabra, 1999, 195.

252

Ao revermos estas matérias, na aula seguinte, oito dias depois, foi muito satisfatório termos verificado que um dos alunos se lembrava perfeitamente desta aprendizagem: o fazer como ação e o bem como objetivo.

inicialmente por um aluno a partir de um slide, por causa da estratégia que, em seguida explicitamos. Depois de comentado pelo docente em diálogo com o grupo, o texto foi novamente lido por outro aluno, com a seguinte particularidade. Todas as palavras relacionadas com o verbo fazer ficaram em cor verde claro, pela projeção de um novo slide. O aluno deveria ler o texto em voz alta e pausadamente e, sempre que surgisse o verbo fazer, sob qualquer forma, devia ser lido por todos os alunos em uníssono. Finalmente, o texto teve uma terceira leitura, desta vez com a palavra «bem» destacada pela cor laranja, utilizando a mesma dinâmica. Deste modo, demos destaque nas palavras do Mestre, ao verbo fazer (ação) e ao substantivo bem (objetivo).

Terminada a parte teórica da aprendizagem, demos início à parte prática, com a distribuição das folhas para a realização de uma Ficha Formativa sobre estes assuntos253. O objetivo desta ficha consiste em consolidar as aprendizagens e não tanto em avaliá-las, embora também seja considerada para avaliação. Por isso, é de muito acessível resolução. Contém duas partes. A primeira (questão A), obrigatória, é composta por sete afirmações para completar, que repetem as regras de ouro e provérbios trabalhados na aula. A segunda (questão B), propõe um desenho relacionada com o significado de uma das afirmações da primeira questão. Esta não é obrigatória, mas consta para que os alunos que, de uma forma mais lesta conseguissem resolver a primeira questão, tivessem uma atividade complementar que lhes permitisse continuar a refletir sobre a problemática, revelando o seu pensamento através de uma forma de expressão diferente, em articulação com a disciplina de Educação Visual. Esta Ficha Formativa consta entre os instrumentos de avaliação desta aprendizagem, pela aplicação dos conhecimentos adquiridos, juntamente com o interesse, atenção, participação e empenho.