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Estratigrafia, cronologia e outros materiais

Sumário

Mapa 1. Mapa feito por Nimuendajú sintetizando a distribuição dos estilos Tapajó e variantes no rio Arapiuns e Monte Alegre (vermelho) e Kondurí (azul) no Baixo Amazonas É indicada com círculo vermelho a Serra de Parintins, como limite da ocorrência de fragmentos do estilo Tapajó associado ao Kondurí e outros estilos próximo ao rio Xingu Em azul o autor indica áreas

11. Parte da cerâmica fabricada sobre esteiras

1.5 Estratigrafia, cronologia e outros materiais

O crescimento da arqueologia de contrato permitiu a identificação de centenas de sítios arqueológicos e a escavação de algumas dezenas, especialmente nas proximidades de Porto Trombetas e no município de Juruti. Junto com esses resultados, pesquisas acadêmicas (LIMA et al., 2013; JÁCOME, 2017) ampliaram muito a dispersão do estilo Konduri e mapearam a diversidade de sítios. Uma ampla gama de informações foi acumulada em relação à localização de sítios arqueológicos, estratigrafia, cronologia, processo de formação do registro arqueológico, tecnologia lítica, grafismos rupestres, caracterização petrográfica e geoquímica da cerâmica (GUAPINDAIA, 2008; FONSECA JÚNIOR, 2013, 2018; GUAPINDAIA, FONSECA JÚNIOR, 2013; RODET et al., 2010; RODET et al, 2016; DUARTE-TALIM, 2012, 2015; KERN, KÄMPFN, 1989; PEREIRA, 2003; PEREIRA et al., 2008; COSTA et al., 2004a; COSTA et al., 2004b; SCHMIDT et al., 2014, entre outros). Essas informações, no entanto, não foram completamente associadas às diferentes ocupações nos principais sítios escavados. Ainda se compreende pouco a ligação das feições identificadas e a cerâmica Konduri.

Soma-se a esse quadro, certa indefinição estratigráfica. Apesar de ter sido indicada uma camada arenosa entre as ocupações Pocó e Konduri no rio Nhamundá (LIMA, 2008, p. 316), esta não é a realidade na maioria dos sítios. No sítio arqueológico Boa Vista, escavado pelo Projeto Arqueológico Porto Trombetas, não foi identificada uma clara separação entre as camadas com cerâmica Pocó e Konduri (GUAPINDAIA, 2008; GUAPINDAIA e LOPES, 2011). Uma situação ainda mais complexa ocorre no sítio Cipoal do Araticum: a cerâmica Pocó aparece em todos os níveis, variando apenas a proporção (CHUMBRE, 2014, p. 166 e 169; NEVES et al., 2014, p. 141). Panachuk (2016a, p.287) sugere que esse pode ser um padrão em sítios multicomponenciais profundos em sítios com ocupações Pocó e Konduri. Em dois sítios no município de Juruti e em um no município de Nhamundá, todos multicomponenciais e com terra preta profunda, não há nenhuma separação ou hiato entre as ocupações mais antigas e mais recentes, variando apenas a proporção das cerâmicas. As autoras têm sugerido ocupações contínuas para os sítios multicomponenciais, mas é possível que a presença de materiais Pocó resulte de perturbações devido às várias reocupações. Existem sítios arqueológicos com camadas menos densas de terra preta apenas com material Konduri. Além disso, nas camadas

mais superficiais há apenas (ou majoritariamente) fragmentos Konduri (ver imagens em CHUMBRE, 2014).

A delimitação de uma cronologia de ocupação dos sítios multicomponenciais tem sido um problema devido à indefinição estratigráfica. O sítio Boa Vista apresenta datações que recuam até o século XI, que foram associadas a ocupação Konduri. A cronologia, como a estratigrafia, do sítio Cipoal do Araticum é a mais complexa. Guapindaia e Fonseca (2013) sugeriram uma ocupação contínua entre 2000 a.C. e 1000 AD. Essa continuidade foi proposta porque existe uma datação de 880 a 990 AD e se assumiu que os níveis artificiais teriam uma equivalência em termos de cronologia. Correlacionando as datas com a cronologia de outros sítios, é possível agrupá-las em torno das fases Pocó e Konduri. As datações para a ocupação Konduri, no entanto, teriam que ser recuadas para o século IX. Os sítios unicomponenciais Konduri apresentam datas muito recentes, que giram em torno do século XIV e XV AD. Não conhecidos sítios Pocó unicomponenciais.

Na região de Porto Trombetas foi possível identificar uma diferença nas áreas ocupadas e utilizadas pelos produtores de cerâmica Pocó e Konduri. Guapindaia (2008) mostrou que há uma concentração de sítios arqueológicos com terra preta nas margens de rios e lagos, sendo estes sempre multicomponenciais, com cerâmica Pocó e Konduri em Porto Trombetas. No interflúvio (terras baixas e topo de platô), no entanto, há apenas ocupações Konduri, com manchas de solo escurecido e menor profundidade. A única exceção é o grande sítio Cipoal do Araticum de grandes dimensões e multicomponencial (GUAPINDAIA, FONSECA, 2013). A pesquisadora interpreta os sítios de interflúvio, com menor densidade de material e solo mais claro, como resultado de ocupações temporárias para caça e coleta, enquanto as mais densas seriam resultado de ocupações sedentárias. No caso de um dos sítios em topo de platô, a autora sugere uma utilização para rituais por causa da densidade de material decorado, ausência de terra preta e a presença de várias plantas medicinais nas imediações (GUAPINDAIA; LOPES, 2011).

No sítio Aviso I, apenas com material Konduri, foi identificado o uso de percussão direta dura no lascamento do silexito, além da presença de contas líticas em argilito e uma rodela de fuso (GUAPINDAIA, 2008; GUAPINDAIA, LOPES, 2011).

Jaqueline Rodet e colaboradores (2010, 2014) apontaram diferenças na tecnologia lítica entre as ocupações Pocó e Konduri no sítio Boa Vista. O material da ocupação Konduri, majoritariamente em silexito, apresenta estigmas de debitagem por percussão direta dura e sobre bigorna, enquanto o da ocupação Pocó apresenta uma indústria marcada pelo lascamento de quartzito e, menos frequentemente silexito, a partir da técnica de percussão sobre bigorna. Além disso, as lâminas polidas de machado parecem apresentar uma morfologia característica denominada por Becker e Mello (1963) como tipo “Sacuri”. No sítio Cipoal do Araticum, talvez devido a perturbações na estratigrafia, não foi possível diferenciar o material lítico mais recente do mais antigo (DUARTE-TALIM, 2012, 2015).

A descontinuidade entre as pesquisas realizadas na região dos rios Trombetas, Nhamundá e os municípios de Juruti e Parintins, além da falta de publicações de muitos resultados, impede a construção de um quadro mais amplo da ocupação nas áreas de ocorrência da cerâmica Konduri. O quadro construído por Hilbert (1955a) não foi completamente revisto e não se sabe até que ponto alguma de suas unidades tem validade ou se sobrepõe. A situação do “estilo globular”, por exemplo, parece indicar uma resistência em abandonar uma unidade já criada. Esse “estilo” não aparece em nenhum contexto estratigráfico delimitado e a maioria de suas peças mais características podem ser classificadas como Pocó, como apontou Jácome (2017).