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Sumário

Mapa 4. Localização de sítios com amostras nas coleções analisadas Autor: Henrique Koslowski.

3.7 Método de análise cerâmica

Considerando as limitações em relação às informações contextuais, é possível analisar o material cerâmico de coleções de museu a partir dos mesmos métodos de análise macroscópica. Desse modo, descrevemos cada peça em um banco de dados voltado a compreensão de aspectos macroscópicos da cadeia operatória. A ficha descritiva foi construída a partir da proposta pelo Projeto Norte Amazônico na Universidade Federal de Minas Gerais (JÁCOME, 2017), tendo sido adaptada a partir da consulta de manuais de análise cerâmica (SHEPARD, 1956; RYE, 1981; RICE, 1987; ORTON; HUGHES, 2013), fichas de análise de outros trabalhos (RODRIGUES, 2011; MACHADO, 2005; GASPAR, 2014; BELETTI, 2016) e também atributos de interesse destacados por Hilbert (1955a). Os atributos descritos sistematicamente foram: parte da vasilha representada, antiplástico, cor, indicativos de queima, morfologia (lábio, borda, base, contorno, abertura da boca), alisamento, tratamento de superfície, decoração, variações morfológicas de apliques, modificações antrópicas recentes e conservação das superfícies. Em relação aos indicativos de queima, o único atributo observado foi a configuração do núcleo. A queima de cerâmica em atmosfera oxidante tende a gerar um núcleo mais claro enquanto uma atmosfera redutora, um mais escuro. A presença de matéria orgânica também influencia na coloração do núcleo (RYE, 1981, p. 116). Por esse motivo, evitamos o uso das expressões “oxidante” ou “redutor” para denominar a configuração do núcleo. Denominando-os apenas a partir de uma sequência numérica seguindo a proposta de Gaspar (2014).

A análise de pasta consistiu na observação das características dos elementos antiplásticos ou inclusões: sua natureza, concentração e comprimento. Isso foi feito tanto com o uso da lupa binocular quanto de microscópios digitais portáteis (Dino Lite AM3113T e Cooling Tech 500x). A observação na lupa permite uma melhor compreensão do relevo dos elementos presentes na pasta e sua textura. Os microscópios, por sua vez, permitem realizar fotografias com diferentes aumentos e medir os grãos de antiplásticos (ver DRUC; CHAVEZ 2014). Nas análises realizadas no MN foi utilizado apenas o Cooling Tech 500x, uma vez que o outro microscópio – com melhor resolução – não estava disponível e não havia lupa binocular na reserva técnica da instituição. A porcentagem aproximada de inclusões foi estimada a partir do gráfico reproduzido em Orton e Hughes (2013) (Figura 35). O comprimento máximo das inclusões foi estimado diretamente a partir das fotografias retiradas com microscópios

digitais. As espículas de cauixi não foram medidas dada a sua variação micrométrica. Devido a sua importância para compreender o complexo Konduri, sua porcentagem foi medida em separado de outras inclusões.

Figura 35. Gráfico de estimativa de porcentagem de antiplástico na pasta cerâmica. Adaptado de Orton e Hughes (2013).

Mantivemos a separação entre tratamento de superfície e decoração, seguindo Shepard (1956). O primeiro processo engloba apenas a regularização da superfície (alisamento fino ou grosso e polimento). O outro, por sua vez, engloba uma ampla gama de técnicas plásticas e pictóricas formando motivos e padrões gráficos e revestimentos de superfícies (engobo, brunidura, resina). Foram descritas na tabela apenas a combinação de técnicas e sua localização, sendo descritas à parte as características de motivos e padrões gráficos. A manutenção da separação não busca reificar a diferença entre “utilitário” e “simbólico”, como o uso corrente do termo “decoração” pode sugerir, mas apenas organizar as informações. A expressão “modificação de superfície”

utilizada por Orton e Hughes (2013) para agrupar apenas as alterações plásticas (incisões, ponteados), poderia ser usada para englobar os mesmos atributos tratados como decoração.

O limite de tempo e recursos para analisar coleções em diferentes instituições levou a adoção de reduções de atributos analisados em relação às fichas adotadas em outras pesquisas. A face externa foi tomada como principal foco descritivo de cor e alisamento. Isso se justifica porque, em geral, esses atributos não tendem a diferir entre as faces. Quando uma diferença significativa foi notada, esta foi indicada como observação. Ao final das análises, ficou claro que esta não foi a melhor solução, uma vez que podem não ter sido anotadas todas as ocorrências distintas de tratamento de superfície entre as faces. Em termos da coloração isso pareceu menos problemático, mas o mesmo pode ter ocorrido.

Devido aos próprios problemas de conservação de materiais em superfície e nas instituições de guarda poucos vestígios de uso se conservaram (fuligem, depósito carbônico, abrasão, etc). Por esse motivo, esse atributo foi anotado apenas como observação. Marcas de reutilização dos fragmentos, como a presença de sulcos, também foram anotadas dessa maneira. Nesse caso, houve menos problemas porque as ocorrências eram, de fato, muito menos frequentes e fáceis de controlar.

O diâmetro das vasilhas foi estimado com o uso de um ábaco com as bordas estabilizadas. Para estimar diâmetro de bordas com apêndices no lábio partiu-se do princípio que era possível estimar o diâmetro da porção mais próxima do lábio com o uso de um copiador de contornos paralelo ao lábio, uma solução desenvolvida por Igor Rodrigues durante os trabalhos do Projeto Norte Amazônico. Optar por desenhar as bordas dessa maneira. Sabemos, entretanto, que tal escolha pode levar a equívocos quanto à angulação da borda. Trabalhos futuros com exemplares maiores poderão confirmar ou não as tentativas de projeção. Hilbert (1968) projetou a morfologia de duas vasilhas que análises posteriores mostraram ser equivocadas, talvez devido aos problemas com a conservação e dimensão dos fragmentos (ver MORAES, 2013). Outra convenção foi o uso de bases planas para todas as reconstituições, uma vez que estas eram predominantes no conjunto estudado. O uso de bases arredondadas, ao contrário,

cria a falsa impressão de que esse era um atributo comum, apesar de haver poucos indicativos para este tipo de base (PANACHUK, 2016b; SCIENTIA, 2013).

A grande quantidade e diversidade de apliques modelados nas coleções de museu criou a necessidade de observar alguns atributos específicos. O primeiro foi à diferenciação entre (1) apêndices (ou “adornos”), (2) alças e (3) pés modelados ou suportes. O termo “aplique” é utilizado de maneira genérica para qualquer modelagem proeminente aderida a superfície de um pote, a exceção de pequenos filetes e botões. Os apêndices, por sua vez, são elementos morfológicos figurativos ou não, cuja funcionalidade não pode ser diretamente relacionada à preensão ou à suspensão. Seguindo algumas questões colocadas por Hilbert (1955a) sobre métodos de queima e construção das vasilhas consideramos a presença de ranhuras, furos, solidez e forma do apêndice. As ranhuras são um indicador do método de “costura” enquanto a presença de furos e modelagens ocas são relacionadas a queima das vasilhas.

Em relação à morfologia dos apêndices foram opostos os com uma forma mais arredondada, em relevo pleno, e aqueles achatados ou em placa. No caso dos apêndices figurativos, também foram considerados os tipos de olhos. Há uma grande diversidade no modo de formar olhos nas modelagens e este tem sido um atributo tradicionalmente considerado na arqueologia do baixo Amazonas e Orinoco. Os olhos podem ser compostos de apenas de um ponto feito com instrumento maciço (tipo A) ou oco (tipo B)51, um disco ou elipse modelado ou uma incisão, podendo esses elementos serem combinados. Inicialmente, tentamos medir todos os apêndices, mas isso foi abandonado durante os trabalhos devido ao tempo necessário e a impossibilidade de comparar dimensões. Apenas os pés modelados tiveram altura máxima e diâmetros máximos e mínimos considerados. Também foi considerada a variação da ponta (extremidade inferior) dos pés modelados.

Museu Coleção Amostra Total Analisado MAE-

USP

Tapajônica Selecionada 8516 301

006 Selecionada SD 34

Luís Paixão Selecionada 179* 14

MCT

Protásio Frikel Instituição 1 1

Peter Hilbert Instituição SD 5

Peter e Klaus Hilbert Instituição SD 6

MHN Aricy Curvello Não selecionada 436 436

MN

Amazônia Selecionada SD 11

Comissão Geológica Selecionada SD 5

Gastão Cruls Selecionada 36 2

Comissão Rondon/ Barbosa de Faria Não selecionada/ Selecionada 1210 803 MPEG

Peter Hilbert Não selecionada 876 876

Peter Hilbert e Harald Schultz Não selecionada 406 406 Charles Townsend Jr. Instituição a 3050 62

Frederico Barata Instituição 66 66

T-881 ("Nimuendajú") Não selecionada 72 72 T-1564 ("Galvão, 1965") Não selecionada 38 38 T-1465/1466 ("Galvão, 1967") Selecionada 511 24 MD 13 e 42 Não selecionada 31 31 Outros Instituição 5 5

Tabela 8. Quantidade de peças analisadas em relação ao total de cada coleção e sua organização nas instituições.

Durante a pesquisa notamos a importância da documentação fotográfica das peças com vários detalhes iconográficos. Por este motivo, com exceção dos fragmentos de parede lisos, todas as peças foram fotografadas individualmente – às vezes, em vários ângulos. Posteriormente, este material poderá servir para a montagem de um catálogo da cerâmica Konduri ou da região dos rios Trombetas e Nhamundá e municípios de Óbidos, Juruti e Parintins.

No total foram analisados 3197 fragmentos cerâmicos e 7 vasilhas inteiras/semi- inteiras em 5 instituições52 (Tabela 7) (Tabela 8).Essa quantidade, entretanto, não representa a soma de todas as coleções de museu com cerâmica Konduri nessas instituições. O objetivo inicial era analisar a totalidade de fragmentos das coleções visando construir uma interpretação mais holística possível das amostras disponíveis e sua variabilidade. Isso foi realizado no MNH, que serviu de “plano piloto” da pesquisa, uma vez que a coleção contava com pouco mais de 400 fragmentos e horários flexíveis de trabalho no laboratório. Nas outras instituições, não foi possível dado os limites de tempo, recursos e as próprias singularidades dos conjuntos. Algumas coleções somam milhares de fragmentos provenientes de áreas muito além do âmbito deste trabalho, além de pouca ou nenhuma informação contextual. Assim, foram adotadas estratégias de amostragem e seleção que privilegiassem peças com maior controle sobre sua proveniência e/ou exibisse atributos formais de interesse (bordas, paredes decoradas, apliques). No caso de coleções com melhor documentação e conservação, tentamos analisar toda a amostra de um sítio ou área, não excluindo peças de outros estilos, datados de períodos diferentes.