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À semelhança da natureza do conhecimento profissional do professor, também a sua estrutura é reconhecidamente complexa, ou não estivesse esta dimensão do conhecimento igualmente sob a influência imprevisível e intrincada das situações em que se desenvolvem os processos de ensino-aprendizagem (Goded, 1999). Diversos autores procuraram caracterizar a estrutura deste conhecimento, de entre os quais merecem particular destaque os modelos desenvolvidos por Elbaz (1983) e por Shulman (1986), pelo impacto que tiveram.

De acordo com Shulman (1986), numa perspectiva global, os domínios e categorias do conhecimento estão representados na mente do professor segundo três formas de conhecimento: o proposicional, o de casos e o estratégico.

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O conhecimento proposicional é constituído pelos princípios (resultantes da investigação empírica), as máximas (provenientes da experiência e correspondendo a ideias que nunca foram confirmadas pela investigação, em geral devido à dificuldade em o fazer) e as normas (reflectindo valores ideológicos ou filosóficos e não sendo, como tal, nem teóricas nem práticas, mas guiando o trabalho do professor porque são consideradas moral e eticamente correctas). A vantagem da representação do conhecimento sobre a forma de proposições prende-se com a economia da sua forma e com a redução da complexidade que daí decorre, no entanto, as proposições nem sempre são fáceis de recordar e a referida economia (que se deve ao seu carácter descontextualizado e reduzido ao essencial) pode estar tanto na origem dessa dificuldade como na dificuldade de as aplicar adequadamente. E são precisamente estas dificuldades que levaram o autor a sentir a necessidade de um outro tipo de conhecimento que complementasse o conhecimento proposicional.

Shulman (1986) propõe então o conhecimento de casos, um conhecimento específico, bem documentado e que descreve com precisão e detalhe os acontecimentos. E os casos tanto podem consistir em exemplos concretos de acontecimentos no âmbito do processo de ensino, que incluam uma descrição detalhada dos contextos em que ocorreram e dos pensamentos e sentimentos do professor, como podem ser concretizações minuciosas de uma proposição mais abstracta ou de uma afirmação teórica. E o autor distingue três tipos de casos, não necessariamente disjuntos: os protótipos (que exemplificam os princípios teóricos), os precedentes (que ilustram as máximas) e as parábolas (que incidem sobre as normas). No entanto, a essência do caso não decorre de imediato da sua descrição, tal como não é inerente ao caso a sua generalização. Um caso precisa de ser explicado, interpretado, pelo que terá inevitavelmente uma ligação ao conhecimento teórico e estes aspectos levam o autor a sentir novamente a necessidade de uma outra forma de conhecimento. Uma forma que de certo modo reúna as duas anteriores e lhes dê unidade.

É o conhecimento estratégico que entra em acção quando é necessário articular as duas formas de conhecimento anteriormente referidas, especialmente quando o professor se depara com princípios contraditórios, entre si ou com

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algum caso. O conhecimento estratégico é assim um conhecimento que o professor desenvolve e que respeita à relevância das proposições e dos casos e que permite a formação de um conhecimento base subjacente que articula as diferentes formas de conhecimento.

Tal como Shulman, Elbaz (1983) também procura caracterizar a estrutura do conhecimento prático do professor, apoiando-se em três termos específicos que reflectem diferentes formas de mediação entre o pensamento e a acção. A autora refere-se a regras práticas para reflectir a relação com a prática, a princípios práticos para reflectir a experiência do professor e a imagens para reflectir uma dimensão pessoal.

As regras práticas tendem a ser formuladas pelo próprio professor e consistem em afirmações concisas que estipulam o que fazer, e como fazer, numa situação específica com que o professor se depara frequentemente. O seu intuito é reduzir a necessidade de pensar, permitindo ao professor uma rápida implementação da acção. Estas regras tendem a ser explícitas, no entanto, um conjunto vasto de circunstâncias, onde merece destaque a complexidade da situação, pode interferir com a capacidade de o professor as explicitar.

Os princípios práticos são mais abrangentes do que as regras práticas e menos explícitos. Consistem em afirmações que orientam a prática, através de um conjunto de ideias fundamentais e tanto se podem desenvolver de forma intuitiva a partir da experiência, como podem derivar formalmente de pontos de vistas teóricos, como decorrer da conjunção da teoria com a prática (que é a situação que a autora considera mais comum). Geralmente, os princípios práticos caracterizam-se ainda pela presença de uma dimensão mais pessoal do que sucede nas regras práticas, identificável na forma como os seus detentores conseguem fundamentar as suas posturas. Um princípio prático pode ser simplesmente aplicado, à semelhança de uma regra prática, mas também pode ser encarado como um objectivo que pretendemos alcançar e, neste sentido, fazer a mediação entre o pensamento e a acção.

As imagens são simultaneamente o nível mais abrangente e o menos explícito e combinam sentimentos, valores, necessidades e concepções, proporcionando orientação geral para a acção do professor. Assumem a forma de

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afirmações breves, descritivas e, por vezes, metafóricas. São usadas de forma intuitiva e, ao contrário das regras práticas, não ditam a acção, sendo antes algo a que se responde.

Outros autores inspiraram-se nas caracterizações de Shulman e Elbaz e aprofundando as noções ou recorrendo a novas terminologias procuraram dar o seu contributo para a compreensão da estrutura do conhecimento profissional do professor. É o caso de Clandinin (1986), que elabora o conceito de imagem proposto por Elbaz, atribuindo-lhe uma dimensão moral, emocional, privada e profissional.

Em comum, todas estas caracterizações têm os diversos níveis de generalidade dos diferentes constituintes da estrutura (conhecimento proposicional, conhecimento de casos e conhecimento estratégico, segundo Shulman, e regras práticas, princípios práticos e imagens, segundo Elbaz) e os diferentes níveis de ligação à acção.