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Cavanagh e Mitchelmore (2003), a partir da observação de aulas de um conjunto de professores, caracterizam a utilização que estes fazem da calculadora gráfica em três níveis de integração crescente. Num primeiro nível, a calculadora apenas é utilizada para confirmar os resultados obtidos, tanto ao nível dos cálculos, como do traçar de gráficos. Todo o trabalho é realizado com papel e lápis, só então sendo confirmada a sua correcção recorrendo à tecnologia. Num segundo nível, a calculadora gráfica é encarada como uma forma rápida de gerar exemplos. Os alunos podem assim aperceber-se de importantes características partilhadas por gráficos de determinadas famílias de funções, sem que no entanto seja descurada a sua capacidade para traçar gráficos com papel e lápis. E por fim, num terceiro nível, a integração da calculadora gráfica torna-se um pouco mais

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sofisticada, com a máquina a ser vista como uma ferramenta para estimular e melhorar a capacidade de prever as principais características do gráfico de uma função. O realce anteriormente dado à capacidade de traçar gráficos com papel e lápis é agora atribuído à articulação entre diferentes representações, ao mesmo tempo que é estimulado o desenvolvimento do espírito crítico e o cepticismo racional face à informação veiculada pela máquina.

Os autores apontam ainda diferenças ao nível da dinâmica estabelecida na sala de aula, com os dois primeiros níveis a corresponder tendencialmente a aulas centradas no professor, onde este começa por exemplificar na sua própria calculadora enquanto os alunos vão acompanhando através do projector e reproduzindo as indicações transmitidas na sua própria máquina. Posteriormente segue-se um momento dedicado à prática, em que os alunos resolvem exercícios seguindo as indicações detalhadas disponibilizadas pelo professor numa ficha de trabalho. A aula termina com um momento de síntese protagonizado pelo professor, que geralmente consiste na apresentação das soluções através do projector. Ao terceiro nível já correspondem aulas mais centradas nos alunos, em que lhes é permitido explorar, testar e validar hipóteses, numa busca de compreensão sobre os conceitos envolvidos.

Thomas e Hong (2005) elaboram uma caracterização semelhante para a utilização que o professor faz da calculadora gráfica, igualmente em três níveis, mas onde procuram ir um pouco mais longe, associando cada nível não só à actuação do professor mas também, e principalmente, ao seu conhecimento. Assim, num primeiro nível consideram os professores cujo conhecimento pedagógico da tecnologia (um conhecimento específico de como ensinar Matemática com a tecnologia) está ainda num estado de desenvolvimento incipiente, fundamentalmente devido a um conhecimento superficial da tecnologia e a uma consequente falta de confiança na sua utilização. A falta de familiaridade e à-vontade com os aspectos técnicos da máquina requerem que o professor centre toda a sua atenção na operação da tecnologia. O esforço cognitivo que tal exige impede o professor de dar atenção a qualquer outro aspecto, nomeadamente de se concentrar na Matemática envolvida. O resultado

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tende a ser uma prática muito focada em procedimentos e no carregar nos botões adequados da máquina.

Num segundo nível, os autores consideram os professores que se encontram numa fase intermédia de desenvolvimento do seu conhecimento pedagógico da tecnologia, caracterizada por um foco considerável em aspectos procedimentais. A calculadora é valorizada pela forma como permite diferentes vias para chegar a um dado resultado e pela simplificação que trás a determinadas tarefas (por exemplo, traçar gráficos). Nas aulas os assuntos tendem a ser introduzidos com base em exemplos, sendo as noções posteriormente trabalhadas a partir daí. Embora por vezes ainda surjam algumas dificuldades de natureza técnica, o domínio existente já permitiu o desenvolvimento de um sentimento de confiança por parte do professor quanto à utilização da máquina. Como tal, já não existe uma concentração tão grande nos botões da calculadora que devem ser premidos, o que permite que por vezes seja dada atenção às ideias matemáticas envolvidas. No entanto, continuam a não existir momentos de investigação ou discussão em torno dos conceitos. Com efeito, apesar da relativa confiança em termos técnicos, subsiste a ideia que os alunos necessitam que lhe sejam dadas indicações detalhadas do que fazer (passo a passo), razão pela qual o ensino continua a ser focado no processo e na obtenção de soluções. É esta ênfase na calculadora em vez de na Matemática, a que se alia uma incapacidade para considerar a Matemática e adaptar a tecnologia de forma a focar-se no conteúdo em estudo que caracterizam esta fase intermédia do desenvolvimento do conhecimento pedagógico da tecnologia.

E por fim, um terceiro nível caracterizado por um domínio crescente do professor relativamente ao funcionamento da calculadora gráfica, a que se associa um foco nos aspectos importantes, tais como o estabelecimento de conexões entre diferentes representações (gráfica, tabular e algébrica). Estes aspectos são visíveis no diálogo que o professor estabelece com os alunos, onde as indicações explícitas de instruções relativamente às teclas em que carregar deram lugar a referências ao que se pretende realizar. O conhecimento pedagógico da tecnologia detido pelo professor permite-lhe agora encarar a tecnologia numa perspectiva mais abrangente, que vai para além da de uma simples calculadora. O professor

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sente-se confiante e à-vontade para assumir uma postura menos controladora, encorajando os alunos a embrenharem-se nos conceitos matemáticos, explorando ideias matemáticas e formulando e testando hipóteses. É a Matemática e não a tecnologia que está no centro das atenções, fazendo a calculadora gráfica parte integrante do normal trabalho desenvolvido na aula.

Repare-se que os conhecimentos do professor surgem aqui muito associados ao nível de confiança exibido por este relativamente à calculadora gráfica, que por seu turno se associa à forma como esta é integrada pelo professor na sua prática. Também Cavanagh e Mitchelmore (2003) identificaram relações entre estes aspectos, considerando que o nível de confiança do professor na sua própria compreensão do funcionamento da máquina é determinante na eficiência com que a utilizam na sala de aula. Os professores que não se sentem confiantes tendem a conceber e implementar aulas muito estruturadas e centradas em si.

Também Goos e Geiger (2000) procuraram desenvolver uma caracterização para a utilização que os professores fazem da tecnologia. Os autores propõem quatro níveis que baptizam em função do papel que o professor atribui à tecnologia na sua prática. Começam por considerar um primeiro nível, que designam por tecnologia como senhor (technology as master), onde o professor é subserviente da tecnologia, que usa de uma forma muito limitada, ancorada nos reduzidos conhecimentos que detém sobre esta. Frequentemente a utilização ocorre porque o professor se sente de alguma forma obrigado a tal e não tanto por sua própria vontade (por exemplo, porque frequentou uma acção de formação que prevê a utilização).

O segundo nível, da tecnologia como serviçal (technology as servant), engloba professores que, podendo já ser bons conhecedores da tecnologia, a usam de forma limitada e apenas como suporte para os métodos de ensino que já costumavam utilizar. Assim, recorrem à tecnologia quando tal se lhes afigura útil, mas sem pretender adoptar uma postura inovadora e mudar a natureza das tarefas em que esta é utilizada.

O terceiro nível, da tecnologia como parceiro (technology as partner), corresponde a professores que já desenvolveram afinidade com a tecnologia e que a integram na sua prática de forma criativa, para potenciar a aprendizagem dos

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alunos. Ao contrário do que sucedia nos níveis anteriores, em que o foco da atenção estava na tecnologia, que dominava toda a aula como um senhor (no primeiro nível) ou que era chamada especificamente para desempenhar determinadas tarefas, como um serviçal (no segundo nível), neste caso a tecnologia surge como um parceiro pleno de todo o trabalho realizado na aula. Fundamental aqui é o controle sobre o que é feito, que permanece sempre no utilizador, nunca passando para a máquina (contrariamente ao que sucede nos níveis anteriores).

O quarto e último nível, da tecnologia como uma extensão de si próprio (technology as extension of self), corresponde ao nível pleno de integração da tecnologia, que os autores consideram não ser muito comum. Os professores que alcançam este patamar fazem uma utilização poderosa e criativa da tecnologia, que faz parte integrante do seu reportório de conhecimentos em que se baseiam para ensinar, como fazem, por exemplo, os conhecimentos matemáticos.

À semelhança do que sucede nas classificações apresentadas por outros autores, também aqui é dado particular realce aos conhecimentos técnicos que o professor detém sobre a tecnologia. Este é um aspecto que parece marcar os níveis mais baixos de todas as caracterizações, com a passagem aos níveis seguintes a ser influenciada pelas características das tarefas seleccionadas pelo professor, pelo papel atribuído aos alunos e a si próprio e pelo consequente controle sobre a aula e pelas mudanças relativamente à prática anteriormente implementada pelo professor. Ao contrário dos autores anteriormente referidos, Goos e Geiger (2000) não consideram no entanto que seja possível classificar em absoluto cada professor, determinando em que nível este se encontra. Com efeito, entendem esta classificação em função de cada actuação e não de cada professor. E isto porque num determinado momento a prática de um professor pode ser classificada num certo nível, mas noutro momento já o poderá ser noutro nível ou até num nível intermédio que apresente simultaneamente características de mais do que um nível. E os autores ilustram com o exemplo de um professor que, em função dos seus conhecimentos muito reduzidos relativamente ao funcionamento da calculadora gráfica, lidava com a tecnologia de uma forma que se enquadrava no primeiro nível, mas que numa turma onde existia um aluno que conhecia muito

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bem a máquina, se apoiou neste, passando a utilizar a calculadora como um serviçal (utilização de nível dois).