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A forma como o professor encara a integração da tecnologia no ensino da Matemática é um dos aspectos que inevitavelmente interfere com a utilização que este posteriormente faz dela nas suas aulas (Bosley, Hong, Santos, & Thomas, 2007). De acordo com Zbiek e Hollebrands (2008), a reacção de um professor à introdução de uma determinada inovação é, por norma, marcada por um conjunto de preocupações relativamente a esta. Estas preocupações, que correspondem às percepções, sentimentos e motivações do professor face a uma inovação, não são no entanto estáveis, tendendo a sofrer alterações à medida que este se vai familiarizando com a utilização de tecnologia. O modelo CBAM (Concerns-based

adoption model) procura caracterizar as diferentes etapas que marcam a adopção

de uma inovação, partindo do pressuposto que a mudança é um processo onde o professor é o actor principal e que se trata de uma experiência extremamente pessoal que não decorre de forma contínua (Hall & Loucks, 1978). As sete fases de preocupações propostas pelo modelo são:

 Fase 0: a tomada de consciência (o professor fica ciente da existência da inovação),

 Fase 1: a informação (o professor informa-se sobre a inovação),

 Fase 2: a implicação pessoal (o professor preocupa-se com a forma como a inovação o vai afectar),

 Fase 3: a gestão/organização prática (o professor preocupa-se com a forma como vai implementar a inovação),

 Fase 4: a avaliação das consequências (o professor preocupa-se com o impacto da inovação sobre os alunos),

 Fase 5: a colaboração (o professor preocupa-se em cooperar com colegas tendo em vista a implementação da inovação),

 Fase 6: o reajustamento (o professor avalia a inovação e interessa-se em reajustá-la e melhorá-la).

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Hall e Loucks (1978) agrupam posteriormente estas preocupações em quatro classes. A primeira classe engloba as preocupações da fase 0, não necessariamente ligadas com o ensino e a aprendizagem. A segunda classe comporta as preocupações do professor consigo próprio, correspondendo às preocupações da fase 1 e 2. A terceira classe, das preocupações com as tarefas, envolve as preocupações da fase 3 e centra-se em torno da escolha das tarefas e da forma de gerir a tecnologia na sala de aula. E por fim, a classe das preocupações com o impacto nas aprendizagens dos alunos, que envolve as preocupações das fases 4, 5 e 6. Os autores alertam ainda para a provável existência de múltiplas preocupações por parte de cada professor, pelo que a classificação em determinada fase ou classe deverá ser sempre feita tendo em conta a preocupação mais marcante para o professor.

Destas preocupações, e segundo Zbiek e Hollebrands (2008), três são particularmente úteis para organizar e compreender o que a investigação tem revelado relativamente às preocupações do professor quanto à utilização da tecnologia. São elas a implicação pessoal, a gestão/organização prática e a avaliação das consequências. Ou, em termos de classes, a preocupação consigo próprio, com as tarefas e com o impacto.

Relativamente à preocupação consigo próprio no âmbito da utilização da tecnologia, a investigação tem revelado preocupações relativamente à forma mais adequada de organizar o espaço físico da sala de aula, preocupações relativamente ao tempo necessário para preparar as actividades lectivas e para as implementar e também preocupações relativamente aos conhecimentos necessários para lidar de forma eficiente com as exigências impostas pela utilização da tecnologia na sala de aula (ver, por exemplo, Thomas, Tyrell, & Bullock, 1996; Wiske & Houde, 1993).

As preocupações com as tarefas têm igualmente sido alvo de alguma atenção por parte da investigação no âmbito da utilização da tecnologia. Influente na escolha das tarefas que o professor propõe aos seus alunos e na utilização da tecnologia que se lhe encontra associada são os aspectos relativos à gestão da aula e ao papel que este acha que deve assumir e as preocupações quanto às implicações que determinadas opções poderão ter sobre os alunos e a sua

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aprendizagem (Zbiek & Hollebrands, 2008). Neste sentido, Zbiek e Hollebrands (2008) referem um estudo realizado por Tharp, Fitzsimmons e Ayers (1997) em que estes concluíram que os professores que têm uma perspectiva da Matemática centrada em regras, tendiam com mais frequência a adoptar tarefas muito estruturadas. Referem também um estudo conduzido por Akujobi (1995) que chegou a uma conclusão de algum modo semelhante, ao constatar que os professores com estas características reservavam a utilização da tecnologia para actividades de recuperação ou para actividades de treino repetitivo. Zbiek e Hollebrands (2008) associam igualmente a criação de tarefas menos abertas e mais directivas relativamente à forma como a tecnologia deve ser utilizada, a professores que manifestam uma grande necessidade de controlo sobre tudo o que decorre na sala de aula.

As preocupações com o impacto que a tecnologia pode ter sobre a aprendizagem, de acordo com Zbiek e Hollebrands (2008), tendem a surgir um pouco mais tardiamente e só depois de ultrapassadas as preocupações que caracterizam as duas classes anteriormente referidas. De um modo geral o professor parece sentir necessidade de se familiarizar com a tecnologia e de desenvolver formas de a integrar no seu ensino para que comece a preocupar-se com o impacto desta sobre os alunos. No entanto, quando tal sucede, uma das principais preocupações prende-se com os conhecimentos que os alunos já devem ter antes de começar a recorrer à tecnologia. E este parece ser um aspecto delicado para muitos professores. Segundo um estudo realizado por Fleener (1995), os professores estão divididos quanto à conveniência de os alunos aprenderem primeiro o conceito e só depois usarem a calculadora. Ainda assim, parece haver algo em comum entre os que defendem que se deve aprender primeiro a fazer sem a máquina. De acordo com Fleener (1995), estes professores em geral tendem a ver a Matemática como cálculos e não como raciocínio, um processo para regularidades e resolução de problemas. Baseando-se nas conclusões alcançadas num outro estudo, o mesmo autor (1995) acrescenta que os professores com perspectivas diferentes relativamente à conveniência de dominar primeiro o conceito, exibiam também posturas diferentes quanto ao controle, à compreensão dos conceitos e à importância da reflexão crítica.

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Hall e Hord (1987) associam ainda as preocupações do modelo que desenvolveram à utilização que é feita da tecnologia. Descrevem assim oito níveis de utilização, três correspondentes a não utilização efectiva e às preocupações 0, 1 e 2 e cinco correspondentes a utilização e às restantes preocupações (nível mecânico, rotineiro, refinamento, integração e renovação).

White (2008), em vez de considerar as preocupações sentidas pelo professor, centra-se na experiência e nas crenças deste relativamente ao ensino e à aprendizagem da Matemática e relativamente à tecnologia. Partindo de uma análise da literatura existente, elabora uma categorização em cinco níveis, através da qual procura relacionar a utilização que é feita da calculadora gráfica e as crenças do professor. O autor (2004, 2008) procura assim contribuir para clarificar as razões que estão na origem do que considera uma grande diversidade na forma como a tecnologia é integrada na prática.

No primeiro nível da sua categorização inclui os professores que encaram a tecnologia como um demónio. São professores que estão contra a tecnologia no ensino, mostrando receio relativamente à sua integração ou não pretendendo aprender a trabalhar com ela e que, de forma activa ou passiva, farão tudo o que estiver ao seu alcance para que a integração não ocorra. Quando obrigados a utilizar a tecnologia fazem o menor investimento possível, o que geralmente leva a uma integração muito superficial e por vezes mesmo inadequada.

O segundo nível engloba os professores que têm uma posição conservadora relativamente à tecnologia, integrando-a na sua prática mas sem que tal implique alterações às metodologias ou estratégias de ensino usualmente adoptadas. Geralmente são professores que valorizam a transmissão de conhecimentos no ensino, colocando um grande foco na prática mecanizada como forma de aprendizagem.

O terceiro nível corresponde aos professores que idolatram a tecnologia, considerando-a uma solução milagrosa para o ensino. Geralmente não consideram as implicações desta sobre o processo de ensino e aprendizagem para além de um nível muito superficial, acabando por a transformar no centro da aprendizagem, concentrando-se em desenvolver as competências, capacidades e atitudes que se lhe encontram associadas, em vez de ensinar Matemática com a tecnologia.

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O quarto nível abrange os professores que vêem a tecnologia como um parceiro no ensino, um recurso com que podem contar para proporcionar aos seus alunos novas experiências de aprendizagem, nomeadamente recolhendo e tratando os seus próprios dados. São professores que deixaram de ensinar sobre a tecnologia para passarem a ensinar com a tecnologia. Esta tornou-se parte integrante do processo de ensino, que alterou não só a forma como os alunos aprendem como também aquilo que eles aprendem.

E, por fim, surge um quinto nível, em que a tecnologia é encarada pelo seu potencial libertador. Para os professores neste nível, a tecnologia significa grandes mudanças. Trata-se do que o autor designa por uma abordagem radical, onde a tecnologia é integrada num processo amplo de reforma, com implicações sobre toda a organização e estrutura da escola. Neste nível, as escolas e os professores estão a trabalhar para alcançar novas e inovativas formas de utilizar a tecnologia, para efectivamente melhorar as aprendizagens dos alunos.

Também Tharp, Fitzsimmons e Ayers (1997) se interessaram pela relação entre a forma como a calculadora é utilizada e as crenças e concepções do professor. O estudo que realizaram permitiu-lhes concluir que os professores que têm uma perspectiva sobre a aprendizagem da matemática menos centrada em regras, estão mais disponíveis para adoptar a calculadora como parte integrante do processo de ensino do que aqueles que vêem a matemática como algo centrado em regras. Além disso, os professores que não têm uma perspectiva centrada em regras têm um estilo de ensino que questiona mais os alunos e que é flexível quanto ao recurso à calculadora, permitindo que sejam os alunos a decidir quando e como a devem utilizar. Doerr e Zangor (2000) consideram assim que o estudo de Tharp, Fitzsimmons e Ayers (1997) sugere que existe uma importante relação entre os conhecimentos e as perspectivas do professor, as suas estratégias pedagógicas e a forma como os alunos utilizam a calculadora. Algo de semelhante parece poder concluir-se relativamente aos professores que participaram no estudo de Simmt (1997). Com efeito, estes professores são descritos como tendo uma visão da matemática que favorecia fortemente uma abordagem tradicional dos problemas, o que, segundo Doerr e Zangor (2000), sugere que seriam professores que tenderiam a centrar-se em regras e menos predispostos a adoptar

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uma utilização mais integrada da calculadora. Também Dunham (2000), baseando-se nos estudos conduzidos por Futch e Stephens (1997) e por Tharp, Fitzsimmons e Ayers (1997), conclui que os professores que têm uma visão da Matemática baseada em regras têm mais hipóteses de ver a calculadora como um obstáculo e não como fonte de aprendizagem.

Jost (1992) estudou as perspectivas dos professores face à calculadora gráfica, as suas práticas e as características do currículo com que trabalhavam. A análise que efectuou levou Penglase e Arnold (1996) a concluírem que certos estilos de ensino são mais compatíveis com as calculadoras gráficas do que outros. Segundo estes autores, os professores que mostravam uma preferência por metodologias mais interactivas recorriam mais à calculadora do que os professores que preferiam outras abordagens. Além disso, era notória uma relação entre as perspectivas dos professores face à utilização da calculadora e a integração que depois era feita desta tecnologia no processo de ensino. Com efeito, os professores que viam a calculadora como uma ferramenta a que recorrer para executar cálculos, tendiam a valorizar os objectivos centrados nos conteúdos e consideravam que os alunos aprendem escutando atentamente o professor. Por seu turno, os professores que encaravam a calculadora como uma ferramenta de ensino, tinham objectivos centrados nos alunos e na disciplina, valorizando um estilo de ensino centrado no aluno.

São igualmente as concepções e crenças do professor que Doerr e Zangor (2000) apontam como determinantes na utilização que é feita da calculadora. Neste caso, o que marcou a utilização da calculadora foi a valorização que o professor envolvido no estudo fazia da compreensão e o seu desejo de impedir que a calculadora funcionasse como uma caixa negra que miraculosamente proporcionava respostas. O recurso a um modelo construído pelos alunos para encontrar uma curva que adequadamente representasse um conjunto de pontos, em detrimento do recurso à função pré-instalada da calculadora, é disso ilustrativo.

Dunham (2000) acaba por sintetizar a ideia que transparece em todos estes estudos, ao afirmar de forma peremptória que a investigação mostra que as concepções dos professores sobre a Matemática afectam as suas concepções sobre

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o uso da calculadora. Mas esta autora destaca também a influência do conhecimento do professor.

O conhecimento que o professor detém da tecnologia será naturalmente um aspecto influente sobre a utilização que faz desta na sua prática profissional. Ainda assim, este é um aspecto que não tem sido alvo de grande atenção, como reconhecem Penglase e Arnold (1996), Doerr e Zangor (2000), Powers e Blubaugh (2005) e Rocha (2008).

Powers e Blubaugh (2005) consideram que o professor fará uma utilização adequada da tecnologia se tiver conhecimento de como o fazer. E, a este nível, os autores destacam o conhecimento que o professor precisa de ter da tecnologia, mas também um conhecimento da tecnologia no ensino da Matemática, ou seja, um conhecimento que vai para além do conhecimento da máquina e que exige mais do que um conhecimento técnico do seu funcionamento.

Vrasidas e Glass (2005) criticam precisamente a forma como o conhecimento do professor tem tendencialmente sido considerado, com um grande enfoque em torno da tecnologia e completamente desligado do que designam por um conhecimento pedagógico. Esta opção, segundo os autores, tem conduzido os professores a fracassar no propósito de tirar partido das potencialidades da tecnologia, que acaba por ser utilizada para ensinar de forma meramente tradicional.

Neste sentido, Powers e Blubaugh (2005) valorizam particularmente a experiência do professor e as oportunidades que teve de aprender com a tecnologia. Tendo por base os elementos que recolheram, realçam nomeadamente a experiência vivida pelo professor enquanto aluno. E isto porque consideram que o professor tem alguma tendência para continuar a “pensar pedagogicamente da forma como foi ensinado, em vez de pensar no potencial que a tecnologia pode trazer à aprendizagem” (Powers & Blubaugh, 2005, p. 260). De modo análogo Vrasidas e Glass (2005) valorizam a experiência do professor, defendendo que estes devem ter a oportunidade de experimentar a tecnologia e de vivenciar diferentes abordagens à sua utilização no contexto da sua própria prática. Tunks e Weller (2009) dão atenção à prática profissional e, articulando as suas próprias conclusões com as de Hall e Hord (2001), referem um período de três a cinco

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anos como o necessário para que a inovação em causa integre a prática do professor de uma forma que não seja meramente transitória ou acessória. Esta perspectiva é partilhada por outros autores, como Laborde (1998) e Kissane (2003), que, embora nem sempre quantificando, consideram que é necessário um longo período de tempo para que um professor adapte a sua prática de forma a tirar partido da tecnologia.

Fleener (1995) destaca igualmente a importância da experiência do professor, encarando-a como uma grande influência sobre a forma como este vê a sua utilização no ensino. No entanto, considera que muitos dos estudos que têm sido realizados não fazem qualquer referência a este aspecto. Tanto a experiência anterior do professor na utilização da calculadora, como o conhecimento que detém sobre o seu funcionamento, simplesmente não são referidos. E este é um dos aspectos de que Penglase e Arnold (1996) também se aperceberam na meta- análise que realizaram, e que criticam. Tal como estes autores, Dunham (2000) destaca igualmente a importância do conhecimento do professor, que considera uma grande influência sobre a forma como a calculadora é integrada na prática lectiva. Para além de se referir a um conhecimento da tecnologia e a um conhecimento de como a integrar no ensino da Matemática, como os autores anteriormente referidos, esta autora menciona o conhecimento do professor relativamente aos resultados de investigação, relativamente às capacidades da máquina e ao seu funcionamento e relativamente à forma de a usar adequadamente.