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5. ORGANIZAÇÕES HOSPITALARES

5.3. EVOLUÇÃO DA TECNOLOGIA MÉDICO-HOSPITALAR

Nos últimos trinta (30) anos houve uma revolução na tecnologia médico- hospitalar. Como resultado, a indústria de equipamentos médico-hospitalares passou a ocupar uma posição de destaque no sistema da saúde e as organizações hospitalares e seus profissionais tiveram suas atividades profundamente modificadas. Os Estados Unidos impulsionaram esta revolução que atingiu o Brasil, de maneira desordenada, a partir da década de 70.

O termo tecnologia médico-hospitalar não possui uma definição unânime. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde o termo refere-se essencialmente à:

"…informação incorporada em elementos tão tangíveis como são os instrumentos, equipamentos, medicamentos e outros insumos materiais; em procedimentos e práticas que configuram a atividade em saúde; em instrumentos

normativos que prescrevem condutas e comportamentos, em habilidades e desempenho do pessoal e em base de dados e outras formas de conservação e difusão da informação…"(SANTINI, 1993, p.22).

O Official Journal of the European Communities defini o termo como segue: "…qualquer instrumento, aparato, aparelho, material ou outro artigo, usado isoladamente ou em conjunto com outros, incluindo qualquer software necessário para sua aplicação adequada, intencionada pelo fabricante para ser usado para seres humanos com o objetivo de:

-diagnosticar, prevenir, monitorar, tratar ou aliviar uma doença

-diagnosticar, monitorar,tratar, aliviar ou compensar por um acidente ou deficiência

-investigar, repor ou modificar a anatomia de ou o próprio processo fisiológico…"(OFFICIAL JOURNAL OF THE EUROPEAN COMMUNITY, 1993).

Sendo a definição tão ampla, as estatísticas sobre a área muitas vezes apresentam inconsistências. Apesar das dificuldades, serão apresentados a seguir um panorama da evolução tecnológica no mercado internacional e, posteriormente, um histórico deste mercado no Brasil.

A indústria de equipamentos médico-hospitalares representa um mercado global de, aproximadamente, 105 bilhões de dólares (FURTADO, 2001). Os Estados Unidos são responsáveis por 44% da produção mundial e seus principais competidores são o Japão e a Alemanha. De acordo com um estudo do governo dos Estados Unidos, o mercado norte-americano consome 45% da produção mundial, seguido do Japão, que representa 18%, a Alemanha, 11%, e a França, que atinge 5%. Estes quatro países totalizam aproximadamente 80% do mercado mundial de equipamentos médico-hospitalares. Finalmente, o ritmo de crescimento médio do comércio desta indústria foi de 2,5% nos últimos dez (10) anos (FURTADO, 2001).

De acordo com FURTADO (2001), existem duas forças principais que alimentam o dinamismo da evolução tecnológica na área: (a) as circunstâncias que afetam a demanda, em especial as instituições da saúde e da seguridade e; (b) a capacidade tecnológica da indústria de produtos médico-hospitalares.

Em primeiro lugar, existem demandas numerosas, múltiplas e diferenciadas. Nos Estados Unidos, por exemplo, a curva etária e o crescimento continuado da economia permitiram que a indústria crescesse 8,4% ao ano, entre 1987 e 1997. Adicionalmente, o crescimento econômico dos países em desenvolvimento contribuiu, significativamente, para impulsionar a demanda global. Em segundo lugar, a interação freqüente entre os fabricantes e as outras indústrias do setor tecnológico tem permitido o desenvolvimento de soluções diferenciadas, crescentemente complexas e com incrementos sucessivos de desempenho.

Os principais atores da indústria de equipamentos médico-hospitalares são fortemente internacionalizados, como por exemplo, as empresas Siemens e General Electric. O sucesso e o poder de mercado destas empresas tem uma base mais ampla do que a simples venda de seus produtos tecnologicamente sofisticados. Elas visam oferecer aos seus clientes potenciais um produto- serviço que pode ser caracterizado como diversificado e integrado. Ele é formado pelo equipamento propriamente dito, que integra em si funções inteligentes, o elemento físico e um conjunto de programas de software, capazes de constituir uma ferramenta poderosa de diagnóstico e apoio à decisão médica. Adicionalmente, o uso dos equipamentos pode estar associado a um conjunto de insumos físicos e químicos dispendiosos, que ampliam a relação entre o comprador e o fornecedor e, na realidade, colocam o usuário em uma dependência prolongada com o produtor (F URTADO, 2001). Para FURTADO (2001), os Estados Unidos tornaram-se, nos últimos vinte (20) anos, a base mais importante para a produção do setor e para o desenvolvimento de "normas" técnicas para uso de novas tecnologias. A reunião, em um mesmo mercado, de uma demanda de grandes dimensões, de um sistema de saúde fortemente apoiado na ciência e de uma base industrial diversificada, fez dos Estados Unidos o local de definição de parâmetros para a área da saúde que vieram a ser adotados em todo o mundo. Esta influência tem sido, ainda, reforçada pela ação articulada das empresas de tecnologia médica que oferecem "soluções globais", isto é, pacotes que contêm um conjunto de bens materiais (equipamentos, insumos, etc.) e imateriais

(programas e procedimentos) aos quais se adicionam os serviços financeiros que tornaram a aquisição de equipamentos dispendiosos atrativa.

Segundo FURTADO e SOUZA (2001), o desenvolvimento do mercado interno brasileiro de insumos e equipamentos médico-hospitalares está atrelado à industrialização do país. A indústria local desenvolveu-se através do processo de substituição de importações a partir do início da década de 50, e este processo se aprofundou na década de 70, com a consolidação das empresas fabricantes de equipamentos eletroeletrônicos. A indústria local, no entanto, sofreu uma perda de competitividade nas décadas de 80 em função do crescimento acelerado da indústria no plano internacional e pelo falta de dinamismo da economia brasileira.

A década de 90, com a estabilidade econômica proporcionada pelo Plano Real, foi marcada por um extraordinário dinamismo do mercado interno e o aumento do consumo foi suprido por importações. Estima-se que entre 1989 e 1998 as importações de produtos médico-hospitalares no Brasil aumentaram mais de quatro (4) vezes e que, na década de 90, as importações chegaram a representar 50% da demanda interna do país, contra 25% no início da década de 80. O Brasil passou a ser um grande importador de tecnologia de alto valor, tais como os tomógrafos computadorizados e os aparelhos de ressonância magnética. O segmento da demanda que alimentou este crescimento foi, principalmente, o setor privado (FURTADO e SOUZA, 2001). Os dados que expressam os valores movimentados no mercado brasileiro de tecnologia da médico-hospitalar são variados. As estimativas estão em torno de hum (1) bilhão e quinhentos (500) milhões de dólares por ano (CALIL, 2001).

De acordo com relatório preparado pelo MINISTÉRIO DA SAÚDE EM 1997, a incorporação de novas tecnologias médico-hospitalar em ambientes da saúde no Brasil tem sido feita de forma desordenada e com falta de planejamento (CALIL, 2001). Segundo o próprio MINISTÉRIO DA SAÚDE (1997), houve um significativo aumento nos custos, bem como desperdícios de inúmeros investimentos realizados. Segundo CALIL (2001) um estudo publicado no Panorama Setorial da Gazeta Mercantil em 1988 destacou as seguintes características para o mercado de tecnologia da saúde no Brasil:

"(a) o Brasil combina dois índices discrepantes, uma das maiores concentrações de tomógrafos no mundo e taxas de mortalidade infantil similares a alguns países da África; (b) os custos de aquisição de equipamentos médico- hospitalares podem atingir, em média, 75% do valor da construção civil do hospital, variando de acordo com o porte e características de atendimento;

(c) a empresa Siemens comercializou no ano de 1997, somente para três hospitais da cidade do Rio de Janeiro, um total de dez (10) milhões e setecentos e oitenta (780) mil dólares, sendo que dentre os equipamentos do pacote comercializado, havia um equipamento de ressonância magnética e um tomógrafo computadorizado para cada hospital;

(d) Não existem dados exatos sobre a dimensão do mercado de equipamentos médico-hospitalares no Brasil. Estima-se que este mercado movimenta um (1) bilhão e trezentos (300) milhões de dólares/ano (quinhentos (500) milhões para o setor de diagnóstico por imagem);

(e) Houve um crescimento de 128% no período de 1994/98 no setor de diagnóstico por imagem (ABIMED); (f) no período de 1994/97, o setor adquiriu cento e trinta e uma (131) unidades de ressonância magnética e quinhentas e sessenta e oito (568) unidades de tomografia computadorizada. " (CALIL, 2001, p. 118) Os estudos realizados até a data indicam que, no Brasil, a incorporação tecnológica na área da saúde tem sido desigual (entre as diversas regiões do país e entre os setores público e privado), pouco regulamentada e fiscalizada e, conseqüentemente, desordenada (CALIL, 2001; SOEIRO, 2002). Em países como Estados Unidos, Canadá e França os hospitais públicos e privados têm a seu dispor legislação e procedimentos de avaliação tecnológica que permitem a realização de investimentos que tenham o potencial de produzir um sistema mais eqüitativo, mais eficiente e serviços de melhor qualidade (CALIL, 2001). Entretanto, no Brasil, o conceito de eficiência econômica parece permear as decisões de incorporação de novas tecnologias, o que resulta em uma negligência dos aspectos sociais relacionados à área da saúde. Pesquisa realizada recentemente por CHERCHIGLIA (2002) indica que:

"…o conceito de eficiência, imanente na reforma do Estado (e setorial) brasileira, independentemente de sua roupagem, tem-se alinhado à limitação estreita do cálculo econômico, não abrangendo, portanto, critérios de eficiência coletiva ou social, num cálculo econômico entre o possível e o necessário…"(CHERCHIGLIA, 2002, p.260).

Em concordância com esta autora, a mensuração da eficiência de programas ou tecnologias adotadas na saúde deveria "…abranger critérios coletivos,

sociais, ecológicos… portanto, a racionalidade limitadora da economia empresarial precisa ser superada." (CHERCHIGLIA, 2002, p.218).

Pesquisa recente publicada pela GIURLIANI (2002) indica que, no Brasil, apenas 5% dos hospitais possuem um nível satisfatório de sofisticação tecnológica (equipamentos de medicina diagnóstica, sistemas de informação hospitalar, sistemas de gestão, prontuários eletrônicos, etc.). Estas instituições são grandes hospitais privados, financiados por entidades comunitárias e religiosas ou pela iniciativa privada. Outros 33% possuem alguma sofisticação tecnológica, geralmente fornecida pelo governo e, finalmente, 62% possuem pouca ou nenhuma sofisticação tecnológica.