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EM BUSCA DO TERRITÓRIO IDENTITÁRIO

3.1 Evolução da paisagem do bairro Bugio

3.1 Evolução da paisagem do bairro Bugio

Como o primeiro questionamento partiu pelo fato do Bugio ser rodeado por mangues e da possibilidade desses constituírem símbolo da paisagem e elemento da identidade de seus habitantes, esse capítulo se inicia com uma análise evolutiva da paisagem, utilizando de fontes secundárias e depoimentos de alguns dos primeiros moradores.

Nesse contexto, serão elencados os aspectos ambientais em geral, suas características naturais e também qual o significado do ecossistema para a população do bairro.

O processo de ocupação do Bugio teve início desde a sua implantação em 1979, com o então Conjunto Assis Chateaubriand. A figura 08 mostra uma fotografia aérea de 1971, desvelando a área antes de início das obras.

Na fotografia são observados coqueirais, manguezais, salinas, algumas construções e estradas. A foto mostra o que muitos entrevistados mencionaram nas informações: “era um sítio que tinha viveiros, salinas, lagoas no Estrela do Oriente, áreas alagadas” 11; outro enfatiza “antes eu vim aqui num sítio, eram coqueiros, tinha

salina no Ângela Catarina e tinha uma granja. Aterraram o mangue, tinha uma prainha que o povo tomava banho” 12

.

11

Sandoval, morador.

Figura 08: Fotografia da área do Bugio antes de sua edificação (1971) Organização: Rodrigo Lima

Nessa época estavam em vigor políticas habitacionais financiadas pelo Governo Federal por meio do Banco Nacional de Habitação (BNH) e o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) por toda a cidade de Aracaju. A criação do SFH/BNH impulsionou o crescimento urbano das capitais brasileiras como diz Campos (2006, p. 229):

Assim, as capitais e principais cidades médias brasileiras, impulsionadas por grandes investimentos públicos a partir do final dos anos sessenta e início dos anos oitenta, registraram intensos processos de construção imobiliária e expansão urbana, que ocorre paralelamente à implantação das superintendências de desenvolvimento industrial que se ampliou no território brasileiro no período da chamada ditadura militar (1964/1985).

Com a intenção de erradicar as construções de favelas que ocupavam áreas valorizadas, transportaram as pessoas para os arredores por meio da construção dos primeiros conjuntos habitacionais de Aracaju: conjunto Agamenon Magalhães (1950) e conjunto Jardim Esperança (1974).

O crescimento da ocupação humana sobre a área de mangue iniciou-se desde a instalação do Conjunto Assis Chateaubriand junto à Avenida Poço do Mero. Em 1980 existia o projeto original do bairro dividido por etapas, 0, 1, 2, 3, 4 e o Bugio III. Em seguida, o processo de ocupação foi sendo feito sobre áreas de manguezal, desrespeitando a legislação de proteção desse ecossistema. Pessoas que se intitulavam donos, aterraram e obtiveram loteamentos para vender os terrenos e constituir lucros. Assim, surgiram os loteamentos Anchietão, Estrela do Oriente, as Travessas e o Beira Rio.

No momento atual, os bosques de mangue, remanescentes de mangue, encontram-se reduzidos e poluídos, mas resistentes em alguns locais. Mesmo rarefeitos, há habitantes pescadores e, portanto, os mangues têm também importância econômica para alguns, mas outros demostraram-se indiferentes diante deles.

Figura 09:Evolução da ocupação urbana no Bugio Organização: Rodrigo Lima

Na figura 09 é possível observar a ocupação do manguezal no decorrer dos anos. Observa-se que toda a área fora do plano ocupado até 1980 era considerada de manguezal e sua ocupação não era permitida por se tratar de área de proteção ambiental.

O manguezal é protegido como ecossistema de preservação permanente ou reserva ecológica, conforme o Código Florestal, Lei 4.771, Art. 2, de 15/09/1965, Art.18 da Lei 6.938, de 31/08/1981, Decreto 89336, em 31 de abril de 1984 e resolução 4 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), de 18/09/1985. A despeito dos instrumentos legais protetivos, a erradicação e a degradação dos mangues circundantes vêm se mostrando progressivas desde a implantação das primeiras etapas do conjunto habitacional.

A importância dos manguezais é inegável, tanto do ponto de vista físico- biológico, quanto do humano-econômico. Servem como controladores de inundações, erosão e estabilizadores de costas. Os bosques retêm os sedimentos e tóxicos, mas também os nutrientes, que são “exportadores” de biomassa, fonte de recursos florestais e animais; sustentam e provêm a diversidade biológica, (ALVES, 2008). Afora estas características físico-químicas tão intrinsecamente relacionadas com a apropriação da natureza como recurso, destacam-se os manguezais como provedores da sobrevivência de ribeirinhos, mas também como áreas de turismo.

É, pois, sobre uma complexa área estuarina com restingas e manguezais que o Bugio foi assentado e, como a paisagem encontra-se quase que totalmente urbanizada, vale ainda trazer maiores informações sobre sua base física. Situado sobre área de geomorfologia associada à planície costeira onde há predomínio de processos erosivos deposicionais, é uma área de formação recente, em grande parte permeada por instabilidades, com ênfase devido à transição entre a costa e o oceano. Nesse caso, os manguezais servem para equilibrar esse contato.

Geologicamente são encontrados os depósitos colúvio-eluviais que têm como característica principal a constituição por material inconsolidado sob formação por sedimentos areno-argilosos. O aparecimento de Barreiras, formadas no terciário, hoje é totalmente encoberta pela ocupação do solo por domicílios e, os depósitos litorâneos; são sedimentos ligados à deriva litorânea, situados entre os níveis de preamar e baixa-mar. Em zonas litorâneas abertas são relativamente comuns os

sedimentos arenosos e cascalhos, enquanto que em zonas litorâneas protegidas há predomínio de depósitos arenosos finos e síltico-argilosos como é o caso do Bugio13. Com relação aos solos, são possuidores de sais solúveis e resultantes da deposição proveniente das cabeceiras dos rios que atravessam áreas salinizadas. Tal fato explica a presença de antigas salinas na área antes da ocupação. O outro tipo é o argissolo vermelho amarelo, associado à decomposição de rochas do grupo Barreira e com área restrita no Bugio.

De acordo com a divisão climática do Estado de Sergipe, Aracaju e o Bugio encontram-se no litoral úmido com precipitação média entre 1.800 a 1.900 mm anuais. Todavia, com relação ao conforto térmico, as temperaturas no Bugio são bastante elevadas pois a arborização das ruas é precária; com lotes pequenos, os quintais são deficientes em árvores e o padrão de construção das casas, com pé direito baixo e fachadas frontais, não favorecem a ventilação. Aracaju apresenta temperatura média de 26ºC e, com as condições descritas, pode-se afirmar o desconforto em muitas áreas do Bugio, sobretudo aquelas mais distantes dos canais e com fachadas frontais para o poente.

Diante das características da paisagem atual é evidente o processo de crescimento de Aracaju na escala do conjunto que se transformou em bairro pelo acréscimo de ocupações ao seu redor, áreas essas anteriormente ocupadas por atividades tipicamente estuarinas como salinas e plantações de coco, bordeadas por mangues e um emaranhado de braços de canais que proporcionavam uma farta pesca. Os bosques de mangue estão distantes e parcos, assim como a pesca praticada por poucos, resistem em pequenas franjas.