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93 (excluindo o sargaço) tomaram-se superiores aos dízimos dos frutos da terra A

recolha do sargaço tinha também o seu peso na economia, já que este produto dava

importantes lucros ao município94, o que terá por certo contribuído para a fixação das

gentes no litoral e assim, juntamente com o desenvolvimento da actividade da pesca, justificado a urbanização, que para sul teve como linhas ordenadoras a Rua dos

Ferreiros e o mar. Assumiu-se, então no século XVIII, num esquema morfológico rectilinear comprovativo de um crescimento urbano planificado, estruturado com base nos aforamentos95 de chãos de areia feitos pela Câmara.

Mas foi, sem dúvida, com o rasgar, pelos finais do século96, da Rua Nova de S.

Roque ou Rua Nova de S. Roque da Junqueira, em direcção à zona da Areosa, que se

91 Idem, pp. 63-64: data de 1672 a referencia ao "monte da igreja".

92 AMORIM, Manuel - A primeira postura municipal, in "O Notícias da Póvoa de Varzim", ano III, n.° 116, de 20

de Março de 1985.

93 AMORIM, Manuel - Os nossos antigos mareantes, in "O Notícias da Póvoa de Varzim", ano III, n.° 120, de

24deAbrilde1985.

94 O sargaço pertencia à Igreja, da qual a Câmara era o fabriqueiro. Assim, possuía todos os direitos e

rendas sobre este produto, que dava importantes lucros: todo o sargaço, verde ou seco, vendido para fora do termo, pagava imposto - cf. AMORIM, Manuel - A primeira postura municipal, in "O Notícias da Póvoa de Varzim", ano III, n.° 116, de 20 de Março de 1985.

95 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de; GALHANO, Fernando - Casas de pescadores da Póvoa de Varzim, Porto,

Associação Portuguesa de Antropologia e Etnologia, 1957, p. 9 e nota 17.

96 É de 1694 a referência mais antiga à Rua da Junqueira - cf. BARBOSA, Jorge - Art. cit., vol. XII, n.° 2, 1973,

lançou um outro sentido para a ocupação desta área litoral, o qual foi plenamente entendido na centúria seguinte.

Ao longo do século XVII desenvolveu-se um estaleiro de construção naval na Ribeira da Póvoa, muito contribuindo para dinamizar aquela zona e dando origem à

formação de um novo grupo97, a dos carpinteiros da Ribeira que, embora numerosa,

nunca conseguiu atingir o prestígio dos mareantes quinhentistas. Muitos carpinteiros poveiros foram trabalhar para Lisboa, para o estaleiro da Ribeira das Naus e este facto fez com que se sentisse na Póvoa certa dificuldade em preencher os cargos municipais, pois havia falta de mesteirais98. Veiga Leal acentuou bastante a importância e dimensão

do estaleiro poveiro, onde havia sido construída a nau Nossa Senhora de Guadalupe que capitaneada por Diogo Dias teria participado na recuperação de Pernambuco, em

1631".

O processo de decadência em que a classe dos mareantes entrou e que culminou na perda da sua expressão como grupo social não impediu, no entanto, que ao longo do período de grande instabilidade social que caracterizou a primeira metade do século, o governo da comunidade estivesse nas mãos de alguns dos seus membros. A sua força política está patente no domínio da vida pública exercido por figuras como o capitão

António Cardia ou o capitão Diogo Dias de S. Pedro100, homens influentes e senhores

97 AMORIM, Manuel - Os nossos antigos mareantes, in "O Notícias da Póvoa de Varzim", ano lli, n.° 120, de

24deAbrilde1985.

98 AMORIM, Manuel - A Póvoa Antiga..., p. 109.

99 AMORIM, Manuel - O capitão Diogo Dias de S. Pedro (1582-1639), in "O Notícias da Póvoa de Varzim",

ano III, n.œ 123 e 125, de 15 e 29 de Maio de 1985.

100 AMORIM, Manuel - Os nossos antigos mareantes. Segundo o testemunho de Veiga Leal, António Cardia

foi o piloto-mor da armada que expulsou os Holandeses da cidade de Baía, armada que saiu de Lisboa em 22 de Novembro de 1624 - cf. Noticia da Villa..., p. 325. O capitão Diogo Dias (7-1639) era filho do piloto Amador Álvares e de Inês Dias ou Brás (irmã do piloto Diogo Pires de S. Pedro) e ocupou por vários anos o cargo de juiz ordinário. Do legado pio que deixou constavam duas missas a N.a S.a do Rosário e dinheiro

para um manto - cf. AMORIM, Manuel - O capitão Diogo Dias de S. Pedro (1582-1639), Idem - Apontamentos

para a história da Confraria de Nossa Senhora do Rosário da Póvoa de Varzim, in "Confraria de Nossa

de avultados bens, fundadores da Irmandade do Santíssimo Sacramento (que em 1702 passou a Confraria), instituída na Capela da Madre de Deus, em 1622.

O capitão António Cardia e sua filha Mónica Cardia, nos testamentos101 realizados

conjuntamente (a 16 de Abril de 1678), deixaram várias propriedades e foros à Confraria

do S. Sacramento102, com a obrigação de missas anuais e da realização das cerimónias

da Semana Santa. Foi na sequência da instituição destas cerimónias que se tornou necessário empreender obras na antiga igreja matriz com vista a substituí-la por uma

construção mais espaçosa103. A condução dos trabalhos foi assumida pela Confraria do

S. Sacramento, tendo tido início depois de 1680, pela nave, e construindo-se a capela- mor em 1685. Na edificação do templo aproveitaram-se muros e peças da capela medieval: uma parede lateral de silharia irregular, com uma porta de arco apontado, a pia baptismal, a lápide do pórtico sul e o sarcófago medieval. Concluída a estrutura arquitectónica, em 1687 celebraram-se na igreja as solenidades da Semana Santa. Entre 1687 e 1696 fizeram-se os acabamentos no interior, com a colocação do retábulo-

mor, forro, apainelamento e azulejos104 na capela-mor. Formado por uma única nave, o

templo apresentava duas capelas perto do arco cruzeiro, uma de cada lado da nave, que se prolongavam, ligeiramente, no exterior. A frontaria seiscentista sofreu

101 Documentos Históricos da Povoa de Varzim. Testamento do capitão Antonio Cardia e sua filha Monica Cardia de Macedo; anno de 1678, in "A Independência", anno XI, n.°*518, 519, 520 e 522, de 14, 21 e 28

de Fevereiro e 13 de Março de 1892.

102 Entre os bens legados a esta instituição, contam-se a Cortinha do Prado, no Campo da Calçada e o

Campo dos Favais, propriedades emprazadas em 1808 ao Reverendo Francisco Leite Pereira, capelão do Castelo, por tempo de três vidas - cf. Ap. Doc, A.D.P., doe. n.° 348. Por testamento de 1662, Maria de Faria Granjeiro, esposa do Capitão Cardia, legou a N.a S." do Rosário a Cortinha da Bouça, na Rua de S.

Pedro e metade do Campo da Cachada, no Coelheira, com o encargo de cinco missas anuais. Pela lei pombalina de 1768 as associações religiosas viram-se obrigadas a vender os seus bens de raiz - cf. AMORIM, Manuel - Apontamentos para a história da Confraria..., p. 29.

103 Sobre estas obras vd. GONÇALVES, Flávio - Um templo desaparecido..., pp. 201-202 e 224-239.

104 Existem no Museu Municipal de Etnografia e História vários painéis de azulejos do século XVII

transformações na segunda metade do século XVIII, com a substituição do portal e aberturas por outros, ao gosto da estética barroca.

Outras Irmandades e Confrarias105 foram sendo instituídas ao longo deste século,

quase todas na Igreja Matriz (antiga): as Irmandades do Nome de Jesus (1661) e de S. Roque (1685 ou antes) e as Confrarias de Nossa Senhora do Rosário (1686), das Almas (1693) e dos Santos Passos (1699), que agregou a Irmandade do Nome de Jesus.

A vida da povoação na época seiscentista ficou marcada por uma organização a vários níveis: a vida paroquial passou pela formação de associações de carácter religioso, pela instituição da Semana Santa e pelo aumento da igreja matriz; no domínio da vida pública, refira-se a reforma eleitoral (1612) e a reforma fiscal (Foral das Sisas, de 1656, e anexação de Aver-o-mar); a luta contra a opressão senhorial tomou forma com a Casa de Bragança (limitação do termo), com o Cabido de Braga (fábrica da Igreja de Argivai) e com a Câmara de Vila do Conde, como procuradora do Mosteiro (nomeação dos escrivães).

Assistimos ao longo de Seicentos a uma expansão urbana que se concretizou na ligação entre os três pontos de ocupação do território: o centro cívico-político da Madre de Deus, a zona rural da Vila Velha onde se situava a Igreja Matriz e o aglomerado piscatório que se estava a afirmar na zona da Junqueira.

105 As Irmandades citadas evoluíram para Confrarias, excepto a de S. Roque que foi extinta - cf. COSTA,

Martins da - Irmandades e Confrarias da Póvoa de Varzim, in Bol. Cult. "Póvoa de Varzim", vol. XVII, n.° 1, 1978, pp. 33-67. SIMÕES, Joaquim; COSTA, Martins da - Memória da instituição da Confraria das Almas da

O SENTIDO DO CRESCIMENTO DO SÉCULO XVIII