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32 residência, o estado perante a Igreja e a existência de legados pios ou profanos

Sendo por vezes a única fonte, e preciosa, que o historiador possui para determinado

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período, o registo paroquial, anterior ao aparecimento do registo civil e de características mais ou menos rudimentares, estava a cargo da Igreja Católica. Tornado obrigatório pelo Concílio de Trento (1563) o registo do baptismo e do casamento para toda a Cristandade, em 1614 foi-lhe acrescentada a obrigatoriedade do registo de óbito.

30 Vd., entre outros, NAZARETH, José Manuet - Ob. cit.

31 SANTOS, Cândido dos - A população do Porto de 1700 a 1820. Contribuição para o estudo da demografia urbana, in "Revista de História", n.° 1, Porto, INIC/Centro de História da Universidade do Porto, 1978, pp.

281-349; FERREIRA, Olegário A. Vieira - A introdução dos registos paroquiais em Portugal, in "O Estudo da História", II série, n.os 12-15, II vol., Lisboa, Associação de Professores de História, 1994, pp. 893-910. Para

as questões metodológicas são ainda fundamentais os trabalhos de Maria Norberta Bettencourt AMORIM:

Método de exploração dos livros de registos paroquiais e Cardanha e a sua população de 1573 a 1800,

Lisboa, Centro de Estudos Demográficos do I.N.E., 1980, ou Método de exploração dos livros de registos

paroquiais e reconstituição de famílias, Guimarães, Ed. de autor, 1982, entre outros títulos da autora. 32 AMORIM, Maria Norberta Bettencourt - Subsídios dos registos de óbitos da freguesia de Nossa Senhora da Oliveira para um estudo da sociedade vimaranense dos séculos XVII e XVIII, in "Actas do Congresso

Histórico de Guimarães e sua Colegiada", vol. Ill, Guimarães, 1981, p. 525.

33 Em Portugal, deve-se ao Código Civil de 1867 a instituição do registo civil e o estabelecimento do

A própria natureza da fonte, ao incidir exclusivamente sobre o mundo católico, pode ser apontada como uma limitação aos dados que fornece. Refira-se ainda o facto do registo de óbito nem sempre ter considerado os menores, pelo menos aqueles que não atingiram a idade de receber qualquer sacramento .

O levantamento dos registos paroquiais da freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Póvoa de Varzim foi realizado de forma sistemática por Manuel Amorim para o século XVI, permitindo uma ampla caracterização socioeconómica da povoação,

acompanhada pela determinação do número de habitantes35. A partir da mesma fonte,

o autor contabilizou os efectivos populacionais para os dois séculos seguintes, os quais nos indicam que durante o século XVIII a população mais que duplicou, passando de 2000 habitantes para 4500 no final da centúria36.

Também os róis de confessados37 - registos feitos pelos párocos anualmente, por

altura da Páscoa, sobre as pessoas de confissão e comunhão - se podem revelar extremamente úteis pois, sendo considerados "como uma das fontes mais ricas para estudos demográficos em épocas recuadas da nossa história", permitem uma análise sociodemográfica por freguesias, considerando a evolução dos seus efectivos populacionais (estruturas etárias, sexo e estado civil), o comportamento demográfico da população (natalidade, nupcialidade e mortalidade) e a caracterização dos fogos

(dimensão, estrutura e composição)38. Nestas listagens, organizadas em função das

34 SANTOS, Cândido dos - Art. cit., p. 309.

35 AMORIM, Manuel - A Póvoa Antiga. Dois estudos sobre a Póvoa de Varzim, séculos X-XVI, Póvoa de

Varzim, 1985.

36 Estes dados, não estando ainda publicados, foram apresentados na comunicação Introdução à História Local inserida na Acção de Formação "Património Natural e Cultural do Concelho da Póvoa de Varzim",

Póvoa de Varzim, Câmara Municipal, 12 de Abril de 1997.

37 AMORIM, Maria Norberta Bettencourt - Exploração de Róis de Confessados duma Paróquia de Guimarães: 1734-1760, Guimarães, Ed. Autor, 1983; RODRIGUES, Teresa Ferreira - Para o estudo dos Róis de Confessados: a freguesia de Santiago em Usboa, 1630-1680, in "Nova História", n.°s 3/4, Lisboa, Guide-

Artes Gráficas, 1985. Estes estudos fornecem indicações metodológicas para o uso desta fonte.

ruas existentes na freguesia, cada fogo aparece individualizado e contém informações relativas ao nome do cabeça de casal, por vezes seguido do nome da esposa, dos ascendentes e descendentes (com indicação do sexo e idade) e dos "servidores" (referindo para estes a profissão). Uma das limitações deste tipo de fonte, inerente às suas próprias características, é que só inclui os efectivos maiores de confissão, sendo portanto necessário ultrapassar a ausência de referências aos menores de sete anos.

Embora não tenhamos consultado directamente os róis, e por isso se nos escapem todos os elementos que permitiriam uma análise sociodemográfica das estruturas populacionais e dos fogos, podemos conhecer a evolução demográfica (registada em número de fogos e almas) através do "Mappa da população da freguezia de N. Senhora da Conceição da villa da Povoa de Varzim em différentes annos, a principiar do anno de 1720, extrahido dos roes do Parocho da mesma freguezia, de cujo mappa são excluídos os menores de um até sete annos; porque também o foram dos do

Parocho", publicado em 1851 pelo P.e Martins Gesteira nas suas Memorias Históricas da

Villa da Povoa de Varzim33.

As informações de natureza eclesiástica contidas nos registos paroquiais e nos róis de confessados faziam dos párocos os melhores conhecedores dos efectivos populacionais das suas freguesias e, até à segunda metade do século XIX, serviram quase sempre de base aos levantamentos demográficos. Os volumes da população obtidos pelas fontes eclesiásticas implicam certa prudência na sua leitura, relacionável com os conceitos quer da unidade "fogo", quer de "alma", assimilada a indivíduo (não

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contemplando, eventualmente, os menores de sete anos) .

da Ameixoeira (1740-1760), in "População e Sociedade", Porto, CEPFAM, ir0 1, 1995, p. 245.

39 GESTEIRA, José Joaquim Martins - Memorias Históricas da Villa da Povoa de Varzim, Porto, Typographia

de J. J. Gonçalves Basto, 1851, p. 78. Apresentamos os dados constantes deste "Mappa da população" no

QUADRO I.

Uma outra fonte valiosa para a demografia histórica diz respeito às listas das Companhias de Ordenanças. Efectuadas para dar resposta a necessidades de ordem militar, apresentam o arrolamento dos "homens com capacidade de mobilização em vista a uma rápida formação de corpos de tropas"41. Os inscritos eram organizados em

companhias, comandadas por um capitão, e subdivididas em esquadras, lideradas por um cabo; esta organização militar foi abolida no pós guerra civil de 1832-34. O conteúdo das listas não se limita à enumeração dos recrutados, mas fornece informações sobre o nome do cabeça de casal, a respectiva idade, profissão, categoria militar e por vezes o rendimento, assim como indica o nome da mulher e dos filhos varões e, para estes, a correspondente idade e profissão e fornece ainda o registo dos ausentes. Estas listas permitem estabelecer o número de fogos com bastante segurança (mesmo quando o chefe de família é uma mulher, o agregado consta da listagem) e possibilitam também uma visão socioeconómica da comunidade. No entanto, o facto de não referir os descendentes do sexo feminino faz com que os efectivos populacionais fornecidos pequem por defeito e se torne necessário fazer uma correcção dos valores obtidos.

As listas de Ordenanças da Póvoa não foram ainda objecto de qualquer estudo, não nos podemos pois valer das suas preciosas informações.

Um trabalho inicial de análise isolada de cada uma das fontes poderia ser complementado com um estudo comparativo e respectiva síntese, mas não foi nossa intenção, dado que não cabe no âmbito desta dissertação, fazer o estudo da demografia a partir do levantamento das fontes indicadas.

41 MARQUES, José Augusto Maia - Nota sobre as listas das Companhias de Ordenanças do concelho da Maia. Freguesia de Vilar do Pinheiro (1764-1797), in "Bol. Cult, do Ginásio Clube Vilacondense", n.os 4/5,

Vila do Conde, Dezembro de 1979, p. 44. Sobre a utilidade desta fonte vd., a titulo exemplificativo, os estudos de DUARTE, Margarida Maria - As profissões em Vila Nova de Gaia em 1764, in "Gaya - Actas das Jornadas de História Local e Regional de Vila Nova de Gaia", vol. II, Vila Nova de Gaia, Gabinete de História e Arqueologia de V. N. de Gaia, 1984, pp. 303-318 e SILVA, Francisco Ribeiro da - Paços de

Assim, na ausência desse levantamento, e ressalvando as deficiências encontradas na qualidade das fontes utilizadas e na incompatibilidade de alguns dados, limitamo-nos, num primeiro momento, a reunir os dados disponíveis referentes a fogos e almas, a que por vezes se junta o número de ausentes. Esses elementos formam o

QUADRO 1 - A POPULAÇÃO DA PÓVOA DE VARZIM (freguesia de N.a S.a da Conceição) ENTRE 1720 E

1836.

Como já atrás referimos, as fontes apresentam os quantitativos populacionais contabilizados em almas ou em fogos, por vezes das duas maneiras, mas raramente em habitantes. Nestas circunstâncias, coloca-se o problema da determinação do coeficiente habitantes/fogo. Quando, a propósito da população no século XVI, aludimos à questão da dificuldade em definir um número médio de habitantes por fogo, indicámos que existe uma certa unanimidade por parte dos investigadores da demografia histórica na adopção do coeficiente 4 ou 4,542. Assim, o multiplicador 4 de que nos servimos, para a partir do número de fogos, achar o número dos habitantes, integra-se dentro dos valores considerados, sendo também confirmado pela relação fogos/almas fornecida pelo Censo de 1801 (onde a alma é entendida como habitante porque engloba os menores de sete anos).

Tendo presente que reconstituir o quadro demográfico implica um "conjunto de operações de manipulação, correcção e ajustamento dos dados fornecidos pelas fontes" no sentido de se encontrarem os valores que, com uma certa credibilidade, podem ser tomados como representativos do estado e da evolução dos efectivos populacionais , os números reconstituídos para os habitantes, e indicados no QUADRO 1, têm um

assumido carácter provisório e são passíveis de alteração.

42 Capítulo I, nota 38. Cf. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, "Introdução" in A população de Portugal em 1798. O censo de Pina Manique, p. XXVIII.

43 SERRÃO, José Vicente - O quadro humano, in "História de Portugal" (dir. de José Mattoso), vol. IV, Lisboa,

O número de ausentes remete-nos para um fenómeno constante da nossa história, a emigração. Já desde o século XVI, os poveiros deixavam a sua terra com destino a variadas paragens além-fronteiras e ainda para a capital do Reino. Na primeira metade do século XVIII registou-se um intenso movimento de saída da Vila, o qual tendo abrandado na segunda metade de Setecentos, atingiu os valores mais elevados nas duas primeiras décadas do século XIX, quando coube ao Brasil ser o destino eleito para a procura de uma vida melhor. Pela leitura dos Notariais assim o entendemos, pois são

várias as referências a poveiros que embarcaram para os Estados do Brasil4 , tendo

alguns aí feito a sua fortuna, como, por exemplo, Joaquim José Gonçalves Campos, no

Rio de Janeiro, e Félix Rodrigues da Costa, na Baía45. Este último aí veio a falecer,

deixando a fortuna a seus pais, António Rodrigues da Costa e Maria Francisca,

moradores na Rua da Senra46. É ainda a mesma fonte que permite observar que o

número de embarcadiços ou marinheiros - considerada população habitualmente não residente na povoação - se tornou mais significativo a partir dos últimos anos da segunda década do século XIX47.

Com os elementos apresentados no QUADRO 1 pretendemos demonstrar o

crescimento demográfico ocorrido ao longo do século XVIII até ao final da nossa época

44 O casal Inácio Gomes Cruz e Vitória da Rocha eram, em 1810, dados como "asistentes no Rio de Janeiro

"; Manuel Gonçalves Morim, "embarcadiço", encontrava-se no Brasil entre 1811 e 1831; em 1830, alguns dos filhos do lavrador José António Vicente Mouta eram emigrantes em terras brasileiras; no mesmo ano, José Moreira Alexandre Maio necessitou de contrair uma dívida para poder comprar a passagem para o Brasil; por último, temos conhecimento que, em 1831, Manuel Francisco Gomes encontrava-se no Brasil - cf. Ap. Doc, A.D.P., does. n.os 381, 410, 830 e 848.

45 Ap. Doc., A.D.P., does. n.05491 (1815) e 683 (1823).

46 A.D.P., Núcleo Notarial, Póvoa de Varzim, 3.° cartório, 2.a série, Iv. 88, fis. 104v-105.

47 Se nos primeiros anos da segunda década raros são os embarcadiços/marinheiros de que temos

notícias, a partir de 1817 a sua presença tomou-se mais constante nos registos notariais, mantendo-se pelos anos 20 e 30. Eram homens cujos locais de residência estavam espalhados por toda a Vila, desde as Ruas da Consolação, S. Sebastião, Amadinha, Madre de Deus e Nova, até às da Ponte, Fortaleza, Bandeira, Ferreiros e Fieira - cf. Ap. Doc, A.D.P., does. n.os 388, 400, 490, 518, 539, 543, 545, 548, 556, 561, 570, 572, 581, 603, 626, 641, 654, 685, 839 e 861. GRÁFICO 5.b.

de estudo. Sublinhe-se que os 1396 habitantes indicados para o ano de 1720 e os 4700 para o ano de 1800 estão próximo da estimativa feita por Manuel Amorim a partir dos registos paroquiais, indiciando uma população que passa, com o correr da centúria, dos 2000 para os 4500 indivíduos.

Para conseguir uma leitura mais imediata da evolução demográfica, apresentamos os dados relativos aos habitantes no GRÁFICO 1 - A POPULAÇÃO DA PÓVOA DE VARZIM (freguesia

de N.a S.a da Conceição) ENTRE 1720 E 1836. Importa assinalar a irregularidade dos

intervalos apresentados, já que encontramos períodos, que podem ir até um máximo de 8 anos, para os quais não possuímos dados.

Utilizando os dados referentes aos habitantes, procedemos a uma análise inicial dos ritmos de crescimento demográfico através do cálculo das taxas médias anuais , que apresentamos no QUADRO 2 - TAXAS DE CRESCIMENTO ARITMÉTICO DA POPULAÇÃO DA PÓVOA DE VARZIM.

Da leitura conjunta dos QUADROS e do GRÁFICO obtemos para a globalidade da

época considerada um padrão de evolução demográfica dominado por um crescimento significativo. Para o período compreendido entre 1720 e 1768 temos um ritmo acelerado, com taxas médias que chegaram a atingir os 2,99 %. Segue-se um abrandamento e algumas quebras na transição para o século XIX. Essas quebras verificadas nos anos de 1795 e 1801 relacionam-se possivelmente com a natureza das fontes utilizadas para esses anos e, por isso, pensamos que não vêm afectar uma leitura global de sentido crescente. Esta tendêndia evolutiva que cobre a segunda metade do século XVIII integra-se no aumento demográfico verificado ao nível do País, com a população a passar de 2 500 000 indivíduos para 3 000 000, entre 1758 e 179849.

48 "Quando dispomos, ao longo do tempo, de diversas informações acerca do volume de uma população, a

primeira análise que normalmente se executa é a do cálculo do ritmo de crescimento. Esse ritmo de crescimento deve proporcionar um resultado anual médio em ordem a se poder comparar períodos de diferente amplitude - cf. NAZARETH, José Manuel - Ob. cit., p. 164.

Um notável aumento populacional marcou a primeira década de Oitocentos, com valores médios de 1,22 %. Reparamos que a conjuntura de recessão e estagnação demográfica que marcou o País, como consequência das invasões francesas (1807-10), lutas liberais, independência do Brasil e guerra civil (até 1834), com os efectivos populacionais a diminuírem entre 1807 e 1815 e a manterem-se estacionários até 183550, reflectiu-se de forma muito "sui generis" na demografia poveira, colocando-a um

pouco à margem da tendência geral. O período de 1812 a 1818 caracteriza-se pela diminuição da população, causada pelo surto de peste ocorrido em 1811 que levou à criação de um hospital provisório no novo edifício dos Paços do Concelho. A epidemia teve graves consequências, provocando entre Maio de 1811 e Março do ano seguinte

cerca de trezentos mortos51. E assim se entende a urgente criação do hospital para

combater "o progreço do contagio que graça nessa Villa com tanta viloencia" facilitado pelas precárias condições de habitabilidade, com "numerozas famillias reunidas no pequeno recinto de huma pobre caza"52. A guerra, a fome e o surto epidémico formaram

um cenário pavoroso a envolver a Vila durante vários anos, com a falta de alimentos e a subida do preço dos mesmos a causaram grande pânico na população. Os pescadores, pelas piores condições em que viviam, foram os mais afectados pela situação, como expõem num requerimento enviado ao Arcebispo de Braga, onde esclarecem que "são pobres, e a pobreza trás comsigo a mizeria, e a nececidade. Tem elles numerozas famillias que sustentar, os vibres na prezente conjunção dos tempos, e guerra estão em hum extraordinário preço alem de falta dos mesmos" .

De 1812 a 1818 verifica-se, assim, um declínio do crescimento, mas ultrapassada esta fase difícil, entra-se de seguida, a partir de 1820, num ritmo de grande crescimento

50 CÓNIM, Custódio - Portugal e a sua População, vo». I, Lisboa, PuW. Alfa, 1990, pp. 25-26. 51 AMORIM, Manuel - O caderno de Alves Anjo..., p. 255.

52 Ap. Doe., AM.P.V., B, doe. n.° 10, de 29 de Julho de 1811. 53 Ap. Doe., A.D.P., doc. n.° 396, de 8 de Abril de 1811.

que caracteriza todo o resto do período. Entre 1812 e 1824 podemos apontar uma taxa média anual de 1,97 % e entre 1824 e 1836 de 2,04 %.

Na documentação encontramos diversas passagens que nos indicam que o aumento da população foi sentido de forma notória desde os finais do século XVIII, porém são igualmente constantes as referências às condições de grande pobreza em

que a maioria da população habitava e ao perigo constante de epidemias54. Assim se

registou numa Acta de Vereação do ano de 1796, a propósito do papel desempenhado pela Irmandade da Misericórdia: "não podia haver couza de maior utelidade e da mais indespençavel nececidade para secorro dos muitos pobres para esta Villa que hé de hum muito nomorozo povo e coazi todo dos pescadores pobres mizaraveis" Ainda numa acta de reunião camarária, onde se tomaram medidas para superar a falta de trigo, se menciona a pobreza da Vila "por ser a terra povoada a maior parte da gente do

povo de homens que vivem com penúria"56. Já bem entrado o século XIX, em 1825,

numa Provisão de D. João VI colhe-se a seguinte informação sobre a Póvoa de Varzim: "aquella Villa era das mais populozas do Reino, e mais pobre por ser na maior parte

habitada por mizeraveis pescadores"57. No ano seguinte, D. Pedro IV, ao autorizar a

construção do hospital, referiu-se à população poveira como sendo formada "quazi toda de pescadores que formam hum ramo de pescaria dos maiores e mais interessantes deste Reino", mas no entanto viviam "sempre empenhados e submergidos em mizeria"58.

Uma última referência à percepção do aumento populacional por parte dos contemporâneos pode ler-se na introdução ao Diccionario Geographico de Portugal

54 Ap. Doc., A.M.P.V., A, does. n.os 19, 46 e 47.

55 A.M.P.V., Actas de Vereações, mç. 16, Iv. de 1791-99, fl. 93v: acta de Vereação de 27 de Setembro de

1796.

58 A.M.P.V., Actas de Vereações, mç. 16, Iv. de 1791-99, fl. 190: acta de Vereação de 2 de Julho de 1799. 57 A.M.P.V., Registos Gerais, mç. 38, Iv. 231 (1820 a 1827), fis. 102-103v: "Registo da Provizão para concerto da Igreja".

(Memórias Paroquiais de 1758), redigida em 1832, que informa que a "Povoa de Varzim,

he villa antiga, e marítima da Commarca do Porto; com Camará, Vereadores etc. para governo de seo povo, que ultimamente tanto cresceo, que se julgou necessário, que

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hum Juis de Fora presidisse a sua Camará (...) .

A importância que atribuímos aos dados demográficos justifica-se na sua estreita relação com o desenvolvimento urbano, já que os elementos e estruturas de um aglomerado - ruas, praças, casas, igrejas, edifícios públicos, etc. - crescem porque cresce também o número daqueles que deles fazem uso. Gostaríamos pois de possuir mais informações sobre o aumento populacional dentro da área urbana para o podermos relacionar de uma forma mais aprofundada com a expansão urbanística mas, como já esclarecemos, os valores que as fontes nos fornecem abrangem, por norma, os limites da freguesia.

Difícil é, então, distinguir as fontes que se referem unicamente à Vila. No entanto, embora sendo muito escassos, reunimos alguns números que consideramos relacionáveis com essa unidade espacial no QUADRO 3 - A POPULAÇÃO DA PÓVOA DE VARZIM (ZONA URBANA) ENTRE 1732 E 1824. O primeiro valor apresentado indica 840 almas para o

ano de 1732, valor esse que, depois de comparado com os números do QUADRO 1, consideramos abrangente da população que ocupava exclusivamente a zona urbana. Através da Noticia do Doutor Leandro Rodrigues60 ficamos a saber que, em 1736 o

núcleo urbano era composto por "435 fogos juntos em hum so Povoado na villa e seus arrabaldes" e tinha mais catorze fogos espalhados pelas quatro aldeias que segundo o autor pertenciam à Póvoa (Vila Velha, Gesteira, Casal do Monte e Regufe). Já em 1758 a Vila apresentava "quinhentos e quarenta e cinco visinhos a que vulgarmente chamam

58 Provizão Régia de 1 de Abril de 1826 - doe. transcrito por AMORIM, Manuel - Art. cit., p. 323.

59 BARBOSA, Fernando - O concelho da Póvoa de Varzim no século XVIII. As Memórias Paroquiais de 1736 e