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4.3 CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DECISÓRIO, DA COMUNICAÇÃO

4.3.1 Características do processo decisório A

4.3.1.2 Fase de desenvolvimento

A fase de desenvolvimento foi iniciada após a primeira aprovação da idéia do investimento pelo conselho de administração da organização A. Nessa fase, ocorrem as atividades que vão estabelecer uma ou mais soluções para o assunto em decisão (MINTZBERG;

RAISINGHANI; THÉORÊT, 1976). Na decisão da organização A, não foram elaboradas diferentes alternativas para o investimento; foi apresentada apenas uma única proposta refinada ao longo dessa fase, basicamente por meio de reuniões internas entre as gerências, diretoria executiva e conselho de administração.

Para Mintzberg, Raisinghani e Théorêt (1976), existem duas rotinas na fase de desenvolvimento: busca e design. No processo decisório A, foi verificada a existência de processos que se relacionam apenas com as características da rotina de busca.

A rotina de busca pode ser classificada como ativa, pois buscou diretamente desenvolver a única alternativa para a decisão (MINTZBERG; RAISINGHANI; THÉORÊT, 1976). Ela foi operacionalizada por meio da rotina de comunicação-investigação, que procura realizar buscas e pesquisas específicas para confirmar as informações que serão utilizadas no processo decisório (MINTZBERG; RAISINGHANI; THÉORÊT, 1976).

De acordo com o entrevistado 1, a busca das informações foi dividida entre as gerências e a diretoria executiva. Porém essa busca pode ser agrupada em três grupos de informações:

informações de caráter técnico, informações de mercado e informações de viabilidade econômico-financeira. As informações sobre a capacidade de produção de matéria-prima necessária para atender à modernização da indústria foram investigadas de forma superficial,

porque, como já foi apresentado, havia um volume de captação de leite excedente para a organização A.

As informações de caráter técnico foram levantadas após a diretoria comunicar, por meio de reunião quais eram os parâmetros para a reestruturação da indústria: “... precisamos fazer isso, a produção vai ter novos produtos, a capacidade vai para tanto e queremos chegar aqui e daqui a tantos anos lá” (ENTREVISTADO 2). A partir desse ponto, o departamento da indústria começou a realizar suas buscas das informações técnicas dos equipamentos necessários para atender aos objetivos da decisão.

A rotina de comunicação-investigação levantou informações qualitativas (opiniões sobre um determinado equipamento) e quantitativas junto a concorrentes, parceiros e fornecedores de equipamentos por meio de telefone ou visitas a outras indústrias. As informações levantadas estavam ligadas à reestruturação das instalações da planta industrial (prédio, telhas, tubulação, canaletas, etc), porém a maior concentração foi na parte técnica e operacional dos equipamentos necessários, tais como: custo de aquisição; quantidade de funcionários para operar a máquina; necessidade de vapor do equipamento e verificação da capacidade da caldeira; quantidade necessária de ar e água gelada para o equipamento e consumo de energia elétrica.

Nesse processo de elaboração da proposta houve processos de comunicação para coordenar o andamento das buscas. As informações sobre os equipamentos eram solicitadas e entregues em reuniões ou por telefone para o coordenador do projeto na época do investimento. Depois da compilação dos dados técnicos para os equipamentos provenientes de diferentes fornecedores, as propostas começaram a ser discutidas com os fornecedores até atender aos

dois critérios: técnico e custo. Esses critérios demonstram a idéia de satisficing proposta por Simon (1965) e March e Simon (1965), ilustrada pela citação a seguir: “... a gente foi discutindo [as propostas] na hora que chegou no ponto que a gente queria tanto técnico quanto custo, a gente colocou o esforço só naquele fornecedor...” (ENTREVISTADO 2).

A partir desse ponto, a rotina de comunicação-investigação ficou mais concentrada em realizar visitas a outras plantas industriais para verificar os equipamentos funcionando, com o intuito de confirmar os dados levantados na etapa anterior. Essa foi uma etapa criteriosa, ao ponto que o entrevistado 2 fez uma visita “não autorizada” a um concorrente para verificar a operação de um equipamento:

... a ‘visita’ foi por intermédio do fabricante do equipamento [...] a indústria não tinha abertura para entrada de pessoas estranhas que não fosse o fabricante [...] eu fui até como técnico da empresa para fazer manutenção [do equipamento]

(ENTREVISTADO 2)

Os equipamentos escolhidos não representavam a proposta mais cara nem a mais barata. Após essas duas etapas foi que um determinado equipamento foi confirmado para a proposta da decisão da organização A. Para as informações técnicas, na fase de desenvolvimento, ocorreram duas etapas: a primeira para a criação de alternativas a respeitos dos possíveis equipamentos e a segunda para confirmar apenas um único conjunto de equipamentos que fariam parte da proposta final.

As informações de mercado foram levantadas para conhecer quais eram as previsões do mercado de leite em pó no Brasil e no exterior, já que a organização havia iniciado um processo de concentração no core business para se tornar uma cooperativa de commodities.

A gerência administrativa-financeira e a diretoria executiva utilizaram a rotina de comunicação-investigação para buscar as informações disponíveis para caracterizar este mercado. Para o mercado interno, entre outras, foram levantadas informações sobre o crescimento do leite, o consumo de leite, dados do IBGE, análises sobre a bacia do leite em que a organização se inseria e o potencial do leite em pó. Ela contratou uma consultoria para colaborar com as simulações de cenários e preços, porém a organização A não fez uso das informações de institutos de pesquisa: “por causa do custo alto e é mais voltado para o varejo”

(entrevistado 1). Para o mercado externo, foram avaliadas informações sobre os preços do mercado internacional do leite em pó, por causa da influência do leite em pó importado no mercado brasileiro e as políticas de subsídios agrícolas da Europa que afetam o preço do leite em pó mundial.

O conjunto destas informações de mercado foi trabalhado por meio de reuniões ordinárias e extraordinárias e telefone, e a rotina de comunicação-investigação foi direcionada para coletar dados para a elaboração da única proposta de investimento.

As informações sobre a viabilidade econômico-financeira da proposta foram elaboradas após a organização possuir o conjunto de dados técnicos e de mercado já finalizados, pois era necessário saber quais seriam os custos totais do investimento e as previsões de vendas para o setor poder elaborar os índices de viabilidade econômico-financeira. Foram construídos os índices padrões para analisar se o investimento era economicamente viável e financeiramente atrativo, tais como: payback, valor presente líquido (VPL), retorno sobre o investimento (ROI) e demonstrações de fluxo de caixa futuro. A organização A também utilizou a consultoria contratada na elaboração desses demonstrativos. A rotina de comunicação-investigação para as informações de viabilidade econômico-financeira foi composta

basicamente de processos de inserção dos últimos dados na proposta que estava sendo elaborada.

4.3.1.2.1 análise da comunicação na fase de desenvolvimento

De acordo com o que foi apresentado, a rotina de comunicação-investigação foi o suporte para que a fase de desenvolvimento pudesse ser executada e a proposta elaborada (MINTZBERG;

RAISINGHANI; THÉORÊT, 1976). Os canais utilizados foram reuniões, telefone, visitas e consultorias para levantar as informações dessa fase. E a combinação entre canais, informações e interpretação das pessoas envolvidas (processo de comunicação) serviu para originar a proposta de investimento apresentada.

Foram verificados três grupos de informações para a elaboração da proposta da organização A: técnicas, de mercado e econômico-financeiras. As informações técnicas foram basicamente do tipo rotineiro, ou seja, racionais e com o referencial compartilhado (LENGEL; DAFT, 1988). Porém, quando surgiram dúvidas sobre um equipamento ou processo entre as pessoas envolvidas na decisão, as informações técnicas assumiam caráter não-rotineiro, pois podiam gerar interpretações equivocadas e o referencial não era compartilhado previamente (LENGEL; DAFT, 1988).

As informações de mercado e econômico-financeiras foram, essencialmente, rotineiras, ou seja, foram simples, lógicas e sem necessidade de muitas trocas entre o emissor e o receptor para promover o entendimento (LENGEL; DAFT, 1988).

A fase de desenvolvimento é composta por dois processos: criação de alternativas e avaliação de alternativas. A criação de alternativas está mais ligada às informações técnicas no período anterior aos processos de discussão das propostas dos fornecedores, como foi apresentado no tópico anterior. A avaliação das alternativas está relacionada às informações de mercado, econômico-financeiras e do segundo período das informações técnicas que se referiram aos processos de construção da única proposta apresentada na fase seguinte.

Apesar de existir apenas uma rotina de comunicação para essa fase, foi possível verificar dois diferentes comportamentos para essa rotina. O primeiro relacionado a uma situação de criar alternativas, presente, principalmente, para as informações técnicas; e o segundo ligado às buscas e avaliação de dados específicos (mercado, econômico-financeiro e segundo período de informações técnicas) para a compilação da proposta final apresentada na fase de seleção.

Assim, de acordo com a modelagem síntese de análise, o primeiro momento pode ser classificado como comunicação para a criação de programas (MARCH; SIMON, 1966); e o segundo momento, como comunicação para dados (MARCH; SIMON, 1966).

Nessa fase, o primeiro momento identificado está relacionado a uma situação em que os objetivos já estavam definidos e era necessário criar possibilidades de abordagem para esses parâmetros. Esse aspecto é coerente com a corrente da influência seletiva que predomina nessa etapa, em que os princípios da atenção, percepção, recordação e ação seletivas do grupo de pessoas envolvidas influenciaram a interpretação dos objetivos predefinidos e, consequentemente, as possibilidades elaboradas (DEFLEUR; BALL-ROKEACH, 1993;

SIMON, 1965).

O segundo momento verificado está ligado a uma situação de busca e verificação de informações sobre as possibilidades criadas na etapa anterior. Esse aspecto é coerente com a corrente da influência indireta que predomina nessa etapa: as pessoas envolvidas utilizaram modelos aprendidos em situações anteriores para buscar informações que permitissem comparar e avaliar as possibilidades criadas (DEFLEUR; BALL-ROKEACH, 1993).

O contexto organizacional do primeiro momento, de acordo com os dados coletados, se configura como de incerteza (GALBRAITH, 1977 apud DAFT; LENGEL, 1986) baixa, pois já havia certeza sobre os objetivos da decisão e a organização coletou informações relacionadas diretamente àqueles objetivos. Porém a ambigüidade (DAFT; LENGEL, 1986) nesse momento era alta, pois não se sabia como abordar os objetivos determinados e foi necessário elaborar alternativas, baseadas nas informações técnicas, de proposta de modernização da planta industrial.

O segundo momento, pelo contrário, se configura como de ambigüidade (DAFT; LENGEL, 1986) baixa, pois as possibilidades de abordagem já haviam sido criadas, e de incerteza (GALBRAITH, 1977 apud DAFT; LENGEL, 1986) alta, porque a organização não possuía as informações necessárias de mercado e viabilidade econômico-financeira, para avaliar as possibilidades criadas e precisou buscá-las ou criá-las.