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4 ASSENTAMENTOS PRECÁRIOS NA CIDADE DE FORTALEZA

6.3 Fatores sociais e repercussões espaciais

Silva (2001), Pequeno (2008), Costa e Dantas (2009), Souza (2009), Pequeno e Aragão (2009), Pequeno, Barroso e Aragão (2009) e Gondim (2012) entendem que as áreas de risco em Fortaleza derivam dos problemas relacionados à moradia popular.

Nesse contexto, Pequeno (2008) e Gondim (2012) explicam que a terra urbana em Fortaleza sempre esteve primordialmente baseada na propriedade imobiliária privada, não sendo cumprida sua função social, gerando escassez para a moradia popular.

Os agentes do mercado imobiliário formal supervalorizaram a mercadoria caracterizada pela terra urbana, praticando altos preços, inacessíveis à população de baixa renda (até três salários mínimos). Integrando-se a isso, os agentes públicos não promoveram políticas com abrangência suficiente para conter o crescimento do déficit habitacional para as camadas populares.

Costa e Dantas (2009, p.8, 9 e 10) consideram que a produção das áreas de risco em Fortaleza é resultado da necessidade vital de morar. Trata-se de uma estratégia de sobrevivência. Souza (2009, p.60) explica que a população de mais baixa renda, para garantir o direito de morar na cidade, utilizou-se de imóveis extremamente precários, localizados em praias, margens de lagoas e riachos e encosta de dunas, terrenos desvalorizados no espaço urbano.

Da mesma forma, Pequeno e Aragão (2009) e Pequeno, Barroso e Aragão (2009; p.212) entendem que a formação das áreas de risco em Fortaleza esteve associada à busca pela solução para o problema da falta de moradia, realizada pela população de menor poder aquisitivo. Isso acarretou na ocupação inadequada do sítio urbano da cidade, ensejando a degradação ambiental e a exposição de grupos sociais vulneráveis às ameaças naturais.

Segundo os autores, o progressivo agravamento das condições socioeconômicas ao longo do século XX, tornou os imóveis residenciais negociados no mercado formal inacessíveis à população mais pobre. Com isso, houve a redução da demanda por imóveis de aluguel, devido aos altos preços e depreciação do poder aquisitivo e, como resultado, ocorreu o aumento significativo das migrações intraurbanas, em direção aos espaços mais precários da cidade.

Devido ao quadro de escassez de terras urbanizadas para a população de baixa renda, essa se dirigiu aos terrenos menos valorizados, sem infraestruturas e inseguros para instalação do uso residencial, dada as condições geoambientais limitantes.

Nesse contexto, foi expressiva a autoconstrução residencial nos ambientes costeiros, fluviais e lacustres, produzindo moradias improvisadas, construídas com materiais rústicos, com precária condição sanitária e em situação de risco ambiental (PEQUENO e ARAGÃO, 2009).

Concorda Gondim (2012), ao dizer que as áreas de risco de Fortaleza surgem do agravamento das péssimas condições de moradia enfrentadas pela população de mais baixa renda, devido à convergência entre as problemáticas habitacionais e ambientais evidenciadas na década de 1970.

A autora reafirma que essas áreas têm causas associadas ao problema da moradia popular, ou seja, na necessidade de morar da população de mais baixa renda. Esse tipo de problema é causado pela oferta insuficiente de moradias formais para as classes populares, criada pela escassez produzida pelo mercado imobiliário formal, incluindo a ação do poder público, com a pequena abrangência das políticas públicas habitacionais de interesse social.

Sumariza sugerindo que os problemas habitacionais integrados aos problemas ambientais na cidade de Fortaleza somente serão solucionados com o acesso universal da população a terra urbanizada, planejado por ações estatais, reguladoras do uso do solo urbano e não pautado pela lógica do mercado imobiliário. É necessária a intervenção no sistema de valorização e preços, impedindo a especulação sobre a terra urbana para fins econômicos.

Costa e Dantas (2009, p.8 e 9) ressaltam a vulnerabilidade social, predominante na população de Fortaleza, como fator que explica a produção das áreas de risco, cujos reflexos são mais aparentes nas péssimas condições de moradia.

As causas estruturais estão no mercado de trabalho insuficiente, com forte desemprego e subemprego. Nesse ínterim, reproduzem-se as desigualdades socioeconômicas, que repercutem na dificuldade de acesso a terra urbanizada e segura para os grupos vulnerabilizados. Com base nisso, essas áreas inserem-se na dimensão socioespacial da exclusão, reproduzindo perversas formas de moradia associadas com a problemática ambiental.

As áreas de risco são permeadas por conflitos na forma de ocupar o solo urbano, com os ocupantes degradando ambientes naturais instáveis ao mesmo tempo em que se apresentam expostos e vulneráveis aos efeitos adversos dos eventos naturais.

Zanella et al (2009, p.193) argumentam que os grupos sociais mais vulneráveis em Fortaleza tendem a se localizar em situação de risco, ocupando as áreas mais expostas à insalubridade e mais inseguras em relação a diversos tipos de acidentes, em que se destacam

os provenientes de ameaças naturais. Esses grupos encontram-se menos resilientes, ou seja, menos propensos a uma resposta positiva quando da ocorrência de algum evento adverso.

Souza (2009, p.59) coaduna com esse argumento, indicando que grupos sociais com baixos níveis de renda, com predominância de subempregados e desempregados, passaram a ocupar gradativamente os terrenos menos valorizados pelo mercado imobiliário formal e informal, caracterizados pelas limitações impostas pelas características naturais.

6.3.1 Tendências de distribuição espacial

Silva (2009, p.141), apresenta em síntese, que todas as regiões da cidade de Fortaleza têm os problemas da moradia precária agravada pela recorrência sazonal do período chuvoso. Argumenta o autor que, o sítio urbano de Fortaleza favoreceu a expansão física da cidade sem maiores restrições, no entanto, não foi considerado quanto às suas limitações. A ocupação inadequada de áreas inundáveis, encostas de dunas e terraços marinhos fundamentou a formação das áreas de risco.

Aponta Pequeno (2009, p.87) que, a principal localização das áreas de risco em Fortaleza está nas regiões intermediárias entre as áreas centrais e as franjas periféricas limítrofes da cidade, próximas aos corpos hídricos, ensejando as mais graves situações de degradação e inadequação ambiental no contexto urbano.

O autor destaca que, as favelas localizadas nas planícies de inundações dos principais rios de Fortaleza passaram a ser chamadas de áreas de risco, como uma nova denominação para assentamentos marcados pela profunda inadequação ambiental, integrada à extrema precariedade, inseridas em áreas de preservação permanente (APP) e impossibilitadas de regularização fundiária.

Pequeno e Aragão (2009, p.95) e Pequeno, Barroso e Aragão (2009, p.205, 207 e 213), identificaram que esses territórios cresceram nos espaços mais pobres da cidade, seja nas áreas centrais ou na periferia. As maiores concentrações estão nas zonas litorâneas a oeste e a leste do setor ocupado pela população de alta renda, assim como nas margens dos principais rios urbanos.

Na região litorânea, com exceção dos bairros Praia de Iracema e Meireles, encontra-se grande quantidade de áreas de risco. No litoral leste elas se concentram nas dunas e terraços marinhos próximos à zona portuária-industrial do Mucuripe. No litoral oeste, a faixa costeira a partir do Centro apresenta ocupação inadequada nas dunas frontais, terraços marinhos e faixas de praia, até a intervenção do Projeto Vila do Mar, a partir de 2009.

Na franja periférica de Fortaleza, inclusive nas áreas conurbadas com os demais municípios, a problemática ambiental é expressiva na ocupação residencial, localizada em ambientes de riachos, lagoas e açudes.

Costa e Dantas (2009, p.9) e Zanella et al (2009, p.213) analisam que, as áreas que apresentam os maiores riscos ambientais em Fortaleza são coincidentes com as áreas da cidade com maior vulnerabilidade social, localizadas nos ambientes sujeitos a inundações, alagamentos e movimentos de massa, devido à maior fragilidade ambiental.

Nesse contexto, as mais representativas áreas de risco se encontram nas margens dos rios Maranguapinho, Cocó e seus principais afluentes, várias lagoas e encostas íngremes dos principais campos de dunas.

As áreas de ocorrências de inundações periódicas do rio Maranguapinho abrangem setores dos bairros Genibaú, Bom Jardim, Granja Portugal, Canindezinho, Bom Sucesso, João XXIII, Henrique Jorge, Autran Nunes, Antônio Bezerra, Quintino Cunha, Vila Velha, Barra do Ceará. Nas margens do rio Cocó estão setores de bairros como Castelão, Passaré, Aerolândia, Alagadiço Novo, Jangurussu, Edson Queiroz. Importantes lagoas também apresentam áreas suscetíveis, como Precabura, Sapiranga, Parangaba, Messejana, lagoa da Zeza e lagoa do Papicu (ZANELLA et al, 2009, p. 210 e 211).

Os campos de dunas apresentam setores com população submetida aos deslizamentos e soterramentos, principalmente quando da ocorrência de eventos extremos de chuvas. Entre eles o Morro Santa Terezinha e as dunas da Praia do Futuro. Junto ao mar, nos bairros Pirambu, Cristo Redentor e Barra do Ceará, alguns setores são sujeitos à influência do mar, com a ocorrência de erosão acentuada da linha de costa. Também há presença de dunas que podem ser desestabilizadas (ZANELLA et al, 2009, p.211).

Além das explicações baseadas nos baixos níveis de renda e na vulnerabilidade social, as características naturais do sítio urbano de Fortaleza também são elementos importantes a serem considerados. Nesse contexto, Zanella et al (2009, p.201 e 203) citam que a ocupação residencial em ambientes com altimetrias de até 3 metros acima do nível do mar está sujeita aos impactos das inundações, assim como a ocupação nas encostas íngremes das dunas está sujeita adversidades causados por movimentos de massa, potencializando os riscos.