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Filosofia, Educação e Psicologia Educacional

3.3 O conceito de “Crença” nas diferentes áreas do conhecimento

3.3.1 Filosofia, Educação e Psicologia Educacional

O tópico “crenças” é uma das vertentes que tem despertado o interesse de pesquisadores nas mais diversas áreas de conhecimento, dentre elas na Filosofia, Educação e na Psicologia Educacional.

A Filosofia é uma forma de pensar acerca de certas questões. A sua característica mais marcante é o uso de argumentos lógicos. A atividade dos filósofos é, tipicamente, argumentativa: criam e/ou criticam os argumentos de outras pessoas ou fazem as duas coisas. Os filósofos também analisam e clarificam conceitos. Esta área do conhecimento tem por preocupação (cf. Barcelos, 2004a) compreender o que é falso ou verdadeiro. Por esta razão, alguns filósofos, dentre eles o grande filósofo estadunidense Peirce, tenta definir crenças. Para o referido autor, asseverado em Barcelos (2004a:129), crenças são “idéias que se alojam na mente das pessoas, como hábitos, costumes, tradições, maneiras folclóricas e populares de pensar”. Segundo Barcelos (2004a:129) “o prefixo folk usado por Peirce é incorporado a conceito recentes como, por exemplo, folklinguistics theories (...) e folklinguistics” (lingüística popular).

Para outros estudiosos, a discussão sobre a definição de crenças recai basicamente sobre a diferença entre crenças e conhecimento, ou sistema de crenças e sistema de conhecimento. Na Educação, Dewey (1933), um dos maiores pedagogos estadunidenses25, talvez tenha sido um dos primeiros estudiosos a chamar atenção para a compreensão da forma como pensamos e para sua importância na sua área de trabalho da Educação. Esse autor caracteriza as crenças como cruciais para que o entendimento da forma como pensamos se dê porque, segundo ele, elas “cobrem todos os assuntos para os quais ainda não dispomos de conhecimento certo, dando-nos confiança suficiente para agirmos, bem como os assuntos que aceitamos como verdadeiros, como conhecimento, mas que podem ser questionados no futuro” (Dewey, 1933:06).

25 O filósofo e pedagogo John Dewey contribuiu intensamente para a divulgação dos princípios do que se

Segundo Dewey (1933), as crenças envolvem dois tipos de comprometimentos: intelectual e prático, que mais cedo ou mais tarde irão requerer uma investigação para descobrir as bases sobre as quais se apóiam. O vigor da caracterização que Dewey (1933) faz de crenças pode ser sentido no mapeamento das características do sistema de crenças de Abelson (1979), Nespor (1987) e em Woods (1996), que serão discutidos nas próximas subseções.

Posner et al. (1982), assim como Dewey (1933), concebem as crenças como sendo dinâmicas e desenvolveram um modelo de mudança conceitual para explicar como os conceitos podem ser alterados. Posner et al. (1982) valeram-se dos conceitos de assimilação e acomodação de Piaget (1974) para descreverem como se dá o processo de incorporação de novas informações dentro da estrutura conceitual em processo de mudança. Para Piaget (1974), assimilação é o processo cognitivo de colocar (classificar) novos eventos em esquemas existentes. Seria a incorporação de elementos do meio externo (objeto, acontecimento, etc.) a um esquema ou estrutura do sujeito. Em outras palavras, a assimilação seria o processo pelo qual o indivíduo cognitivamente capta o ambiente e o organiza, possibilitando assim a ampliação de seus esquemas.

A acomodação, por sua vez, seria a modificação de um esquema ou de uma estrutura em função das particularidades do objeto a ser assimilado. A acomodação, segundo Piaget, pode ser de duas formas, visto que se pode ter duas alternativas: a) criar um novo esquema no qual se possa encaixar o novo estímulo, ou b) modificar o esquema já existente de modo que o estímulo possa ser incluído nele. Após ter havido a acomodação, a criança tenta novamente encaixar o estímulo no esquema e aí ocorre a assimilação. Por isso, a acomodação não é determinada pelo objeto e sim pela atividade do sujeito sobre ele, para tentar assimilá-lo. Na perspectiva de nossa discussão, a assimilação seria o processo pelo qual a nova informação é incorporada ao sistema de crenças pré-existentes, enquanto que a acomodação acontece quando a nova informação não se concilia com alguns aspectos das crenças preexistentes, os quais têm de ser substituídos ou reorganizados.

Tanto a assimilação quanto a acomodação “resultam em mudanças no sistema de crenças, mas a acomodação é uma alteração mais radical, o que não quer dizer abrupto, pois na verdade, segundo os autores, o processo de acomodação é lento e gradual, com avanços e recuos, implicando raciocínio lógico” (Silva, 2002:64). Ainda, segundo Posner et al. (1982) para que ocorram mudanças de crenças é necessário que as pessoas estejam satisfeitas com algum aspecto do seu atual sistema de crenças e que novos conceitos sejam inteligíveis, plausíveis e consistentes com algum outro aspecto da ecologia conceitual do indivíduo.

Kruger (1993), Pacheco (1995), Raymond e Santos (1995), Sadalla (1998), Del Prette e Del Prette (1999), Mateus (1999) e Rocha (2002), são outros estudiosos que discutem o conceito de crenças na sua área de trabalho: a Educação e a Psicologia Educacional. Para Sadalla (1998:32), as crenças representam “uma matriz de pressupostos que dão sentido ao mundo, não sendo apenas um mero reflexo da realidade construída na experiência, no percurso da interação com os demais integrantes dessa realidade”.

Sadalla (1998) leva em consideração o componente cognitivo da atitude e esta é explicada por Pacheco (1995:5), como sendo “uma totalidade delimitada do comportamento em relação a alguma coisa”. Para Pacheco (1995), existem quatro elementos comuns para que ocorra a caracterização de uma crença: a) um componente cognitivo: que permite a decodificação da realidade percebida pela pessoa que trará a ação respectiva a essa idéia; b) um efeito de valorização, ou seja, de acordo com a importância que se atribui ao que foi percebido, um pensamento é elaborado; c) um caráter mediatizador da ação: é quando o sujeito recorre às suas crenças para se comportar num determinando ambiente (no nosso caso, a sala de aula) de acordo com aquilo que se acredita; e d) caráter experiencial/adquirido: esta variável pode alterar/modificar ou fortalecer a crença pré-estabelecida.

Mateus (1999:49) adota o termo “conhecimento prático profissional” como sendo “o conjunto de conhecimentos prático e teórico, composto por crenças, proposições e resultados teóricos, insights e valores, orientados por meio de vivências e experiências de sala de aula, que permitem ao [futuro] professor conduzir seu trabalho nas escolas”.

Para Del Prette e Del Prette (1999), crenças são as cognições que interferem nas interações sociais e estabelecidas pelo sujeito e também no seu desempenho. Kruger (1993:7- 8) conceitua crença como representações mentais presentes em nossa subjetividade, exercendo “influências em nossa existência pessoal e vida coletiva”. Afirma ainda que as “crenças são indispensáveis à nossa conduta pelo simples fato de que norteiam, fornecendo- nos sentido e direção” (cf. Rocha, 2004).

Raymond e Santos (1995), citados por Sadalla et al. (2002:103), apontam que as “crenças são as idéias fundamentais da pessoa a respeito de suas experiências de vida e afetam diretamente as suas ações, quer se admita conscientemente essas crenças quer não”. Rocha (2002) afirma que as crenças são presunções ou convicções sobre os mais diversos objetivos e são defendidas e apoiadas por uma ou mais pessoas, sendo estáveis e portadoras de elementos avaliativos e afetivos que influenciam muitas das decisões do sujeito (cf. Sadalla et al., 2002:103). As crenças educacionais, segundo a autora, são “convicções a respeito dos vários

assuntos que dizem respeito à educação e se revelarão nas comunicações, ações, comportamentos do professor em sua prática pedagógica”.