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Instrumentos elaborados para elicitar as crenças sobre a aprendizagem de línguas

3.4 O conceito de “crenças sobre o ensino e aprendizagem de línguas” na Lingüística

3.4.2 Instrumentos elaborados para elicitar as crenças sobre a aprendizagem de línguas

línguas aparece, pela primeira vez, em Lingüística Aplicada, num instrumento que foi elaborado para se levantar as crenças de aprendizes de línguas de maneira sistemática (BALLI)”. Este inventário foi desenvolvido por Horwitz (1987) e tinha como propósito “avaliar as opiniões de estudantes em vários tópicos e controvérsias relacionados ao aprendizado de línguas” (Horwitz, 1987:121).

Como qualquer instrumento de coleta de registros, o inventário BALLI (veja o apêndice 15) tem as suas vantagens e as suas desvantagens. Inicialmente discutiremos as vantagens deste procedimento e, num segundo momento, discutiremos as desvantagens e as críticas recebidas por diversos pesquisadores. O BALLI apresenta inúmeras vantagens. Primeiro, não é tão ameaçador quanto às observações, além disso, é muito útil para pesquisadores que tem recursos limitados e pouco tempo, “são fáceis de tabular e particularmente adequados para um grande número de participantes”. (Gimenez, 1994:76). Além disso, fornece acesso a diversos contextos sócio-culturais e permitem que os registros sejam coletados em épocas diferentes. Entretanto, questionários como este apresentam algumas desvantagens.

Barcelos (2001:78) resume bem as críticas aos questionários. Segundo a autora, em primeiro lugar, “os questionários tornam difícil garantir uma interpretação consistente pelos participantes, por causa de sua generalidade (cf. Gimenez, 1994)”. Em segundo lugar, “os

39 Vale ressaltar que estas cinco visões ou cinco tipos de aprendizes estão presentes em Barcelos (2004a:126-

questionários restringem a escolha dos participantes quando estruturam respostas de acordo com um conjunto de afirmações pré-estabelecidas”. “Os questionários não permitem que os alunos usem suas próprias palavras e metáforas”, tornando difícil investigar as crenças dos próprios alunos e professores. Em terceiro lugar, “os participantes tendem a responder o que eles acham que seria adequado” (Barcelos, 1995:56). Além disso, este questionário tem como objetivo principal investigar as crenças de aprendizes, mas o faz através da ótica do professor.

Pelas razões explicitadas anteriormente, este questionário recebeu diversas críticas (Wenden, 1987; Pajares, 1992; Christison e Krahnke In: Kern, 1995; Kuntz, 1996; Barcelos, 2000; 2001). A primeira crítica foi feita por Wenden (1987). A referida autora afirmou que as diferenças encontradas nos questionários “apontam para a necessidade de se desenvolver um questionário mais abrangente e representativo do conjunto de crenças” (Wenden, 1987:113).

Pajares (1992) afirma que os inventários tradicionais de crenças oferecem informações limitadas com as quais obter inferências, além de propiciar um certo distanciamento entre crenças e o contexto. Christison e Krahnke (In: Kern, 1995) apontam problemas metodológicos de objetividade e amostragem em questionários dessa natureza. Segundo esses autores, entrevistas semi-estruturadas, como um conjunto de tópicos estruturados, produzem resultados mais válidos, especialmente quando se leva em conta a percepção de linguagem de alunos de culturas diferentes.

Kuntz (1996) foi outra estudiosa que fez severas críticas a este instrumento, alegando que o BALLI: a) levanta dúvidas quanto a validade, uma vez que, a ordem das perguntas pode influenciar grandemente as respostas do sujeitos-participantes; b) foi subdividido em cinco categorias (Aptidão para Aprendizagem de LE; Dificuldade no Aprendizado de Línguas; Natureza do Aprendizado de Línguas; Estratégias de Aprendizagem de Comunicação e Motivação), embora as mesmas não tenham sido discutidas com a autora do instrumento, e que, por sua vez, pode trazer uma série de problemas na hora em que o pesquisador discutir os dados obtidos; c) representa uma estrutura de crenças que os professores acham que os alunos têm, e não o que uma amostra de alunos revelou ter.

Devido a estas limitações, estudos recentes como Félix (1998)40, Sakui e Gaies (1999), Carvalho (2000) e Silva (2001)41 utilizaram a entrevista semi-estruturada e observação direta em sala de aulas para validar os dados obtidos pelo questionário BALLI.

40 Félix (1998) utilizou em seu estudo dois questionários para explicitar as crenças dos sujeitos-participantes:

CRESAL (Crenças sobre Aprendizagem de Línguas) e o QUALE (Questionário para Levantamento de Atitudes para com uma Língua Estrangeira). O primeiro foi desenvolvido por Horwitz (1985) e o segundo foi adaptado por esta autora. Os questionários utilizados por Félix (1998) se encontram respectivamente nos apêndices 15, 16 e 17, nesta dissertação.

Barcelos (2000) fez críticas a esse instrumento, alegando que o mesmo não considera o contexto na análise das crenças. Para a referida autora, o uso de questionários não permite que os professores e aprendizes expressem suas crenças. Além disso, segundo a autora, como as afirmações são pré-determinadas, existe a possibilidade de os informantes interpretarem os itens que fazem parte deste questionário de maneira diferente do pesquisador.

Dois outros instrumentos foram utilizados em pesquisas que têm como foco explicitar as crenças de professores e aprendizes: o questionário “Crenças sobre Aprendizagem de Línguas” (doravante CRESAL) que é uma versão adaptada do BALLI e o “Questionário para Levantamento de Atitudes para com uma Língua Estrangeira” (doravante QUALE) que é uma versão adaptada do “Foreign Language Aptitude Survey” (doravante FLAS). O primeiro foi desenvolvido por Horwitz (1985) e o segundo foi adaptado por esta autora. O primeiro tem por objetivo avaliar a opinião dos professores e aprendizes sobre aspectos e controvérsias a respeito da aprendizagem de línguas. Este questionário não visa classificar as respostas como corretas/incorretas ou certas/erradas, antes busca levantar crenças específicas e discutir o seu impacto nas expectativas e estratégias de professores e alunos.

Félix (1998) usou em sua pesquisa o questionário CRESAL, que é uma versão adaptada do BALLI. Kern (1995) justifica o uso deste questionário, pois afirma que a comparação de crenças de professores e aprendizes de seu estudo não apresentaria uma sistematicidade necessária sem uma lista comum de itens a serem respondidos. Barcelos (1995) afirma que esse tipo de questionário é válido desde que os professores queiram investigar os mesmos aspectos que o inventário cobre. Mesmo assim, “qualquer metodologia exige cautela ao ser transportada para outras situações com características, às vezes, muito diferentes daquelas relatadas pela autora” (Barcelos, 1995:56).

O segundo instrumento, QUALE, tem por objetivo auxiliar o professor a explorar suas atitudes e conceitos/hipóteses sobre ensino e aprendizagem de LE. Segundo Horwitz (1985), este questionário abarca uma ampla variedade de itens relacionados ao ensino de línguas, que vão desde a melhor maneira de ensinar gramática até a importância de ensinar elementos da cultura do país ou países onde a LE é falada. Basicamente, este instrumento contempla duas áreas: a) crenças a respeito de motivação de alunos; e b) estratégias instrucionais de comunicação e de aprendizagem.

41 Silva (2001) utilizou no seu estudo que consistia em elicitar crenças de alunos formandos de Letras de sete

Instituições de Ensino Superior do Estado de Minas Gerais somente questionários e entrevistas semi- estruturadas. A autora não utilizou observação direta em sala de aula como os demais pesquisadores (Félix, 1998; Sakui & Gaies, 1999 e Carvalho, 2000).

Embora esses instrumentos sejam amplamente utilizados em pesquisas que visem elicitar as crenças de professores e aprendizes de línguas, os mesmos recebem críticas de alguns pesquisadores, conforme já salientado e discutido nos parágrafos anteriores. Concordamos em parte com as críticas dos autores. Se considerarmos o uso isolado e exclusivo desse tipo de instrumento para a coleta dos registros, acreditamos que ele possa apresentar resultados limitados. Porém, caracterizamos-o como válido quando é utilizado em conjunto com outros instrumentos (entrevistas semi-estruturadas, observação em sala de aula, anotações de campo do pesquisador, etc.), garantindo assim que a posterior análise dos dados possa garantir maior confiabilidade e validade nos dados obtidos.

Almeida Filho e Silva (2004) apresentaram no VII CBLA um instrumento de coleta de registros denominado BraBELT42. Para a elaboração do mesmo, os autores levaram em consideração os estudos realizados na Lingüística Aplicada. Para tal intento, levaram em conta o perfil das crenças já levantadas em vários estudos realizados no contexto brasileiro, além de discutir o grau de ajuste desse instrumento às condições de ensino e aprendizagem de línguas.

Além deste aspecto tão relevante, a elaboração de instrumentos para se levantar, de maneira sistemática, as crenças de professores e aprendizes de línguas (BALLI, CRESAL, QUALE e BraBELT), o conceito crenças ganhou ainda mais proeminência com o movimento de autonomia na aprendizagem e de estratégias de aprendiz no final da década de 80 (cf. Barcelos, 2001).

3.4.3 Marcos Teóricos no contexto brasileiro

Segundo Barcelos (2004a:128), “foi somente na década de 90, que o conceito crenças sobre aprendizagem de línguas ganhou força no Brasil”. A autora reconhece os seguintes marcos teóricos no Brasil, que podem ser visualizados no quadro abaixo:

Quadro 11: Marcos Teóricos

Leffa (1991) Almeida Filho (1993) Barcelos (1995)

42 BraBELT significa “Brazilian Beliefs on Language Learning and Teaching” (Inventário de crenças sobre o

ensino e o aprendizagem de línguas elicitadas em estudos brasileiros). Se o leitor desejar visualizá-lo, veja o apêndice 18.

Leffa (1991) investigou as concepções de alunos do primeiro ano do Ensino Médio (5ª série) e mostra que, mesmo antes de iniciar o estudo de uma LE, eles já trazem concepções sobre linguagem e aprendizagem de línguas. Isso nos leva a acreditar que devem existir outros fatores, além da experiência educacional, que influenciam os tipos de crenças e concepções dos alunos sobre a aprendizagem de línguas.

Almeida Filho (1993:13) que definiu abordagem ou cultura de aprender como “maneiras de estudar e de se preparar para o uso da língua-alvo consideradas como ‘normais’ pelo aluno e típicas de sua região, etnia, classe social e grupo familiar, restrito em alguns casos, transmitidas como tradição, através do tempo, de uma forma naturalizada, subconsciente, e implícita”.

Barcelos (1995) que utilizou o conceito cultura de aprender (Almeida Filho, 1993) para investigar as crenças de alunos formandos de Letras, e possibilitou uma expansão do termo previamente definido por Almeida Filho (1993). Para a referida autora, a cultura de aprender línguas envolve o “conhecimento intuitivo implícito (ou explícito) dos aprendizes constituído de crenças, mitos, pressupostos culturais e ideais sobre como aprender línguas” (Barcelos, 1995:40). Esse conhecimento, compatível com a idade e o nível sócio-econômico do aprendiz, é baseado: a) na experiência educacional anterior; b) leituras prévias e c) contato com pessoas influentes. Ele envolve também, as maneiras usuais dos aprendizes de estudar e de se preparar para o uso da língua-alvo. (cf. Almeida Filho, 1993).