O cordel Deus e a Educação consiste em um louvor à cultura adquirida através da educação. O enunciador manifesta-se quando afirma que é um semianalfabeto, que teve pouco estudo, mas que, mesmo velho tinha interesse em estudar e, ainda, admirava os jovens indo em direção às escolas, porque iam em busca de educação. Dessa forma, é instaurada uma debreagem enunciativa, o eu da enunciação aparece no enunciado, sendo, pois, um enunciador-ator. Assim sendo, as zonas antrópicas manifestadas são a de proximidade, à medida em que o eu é manifestado. Por deixar claro que seu acesso ao conhecimento foi precário e demonstrando uma admiração pela educação. Esta, para o enunciador, desempenha um status de ídolo, uma vez que, de idade já avançada, não tinha conseguido atingir um bom nível de conhecimento.
“Não posso escrever completo
O que a educação merece A minha mente padece Por ser quase analfabeto Essas letras que eu desenho Como um garrancho de espírito.
Eu quase aprendi sozinho Conduzindo uma sacola Todos os dias ia a Escola
Junto ao meu irmãozinho”
“Se eu pudesse estudar
Mesmo com a idade avançada Prosseguia esta jornada
A fim de me preparar Sempre fico a contemplar
Esta linda mocidade Pelas ruas da Cidade Vibrando de emoção Em busca da educação
E do bem da família”
O texto não apresenta marcas temporais que organizam os acontecimentos de forma cronológica, a temporalização é representada, apenas, pela presença dos verbos no presente e no passado. O modo subjuntivo aparece para denotar uma probabilidade, uma ação que seria tomada se a vida lhe permitisse, representado pela fala do enunciador, quando fala na possibilidade de estudar se lhe fosse permitido, mesmo já velho: “Se eu pudesse estudar / Mesmo com a idade
avançada (...)”. Os verbos no presente aparecem para ilustrar o tempo do enunciado, o agora, numa ideia de que o enunciado ocorre concomitantemente com o tempo da fala do enunciador.
“Se vê tanta criatura
Usa a impressão digital Servindo de assinatura Vive nesse sofrimento Cego de entendimento Mas tem completa visão
Das letras foi afastado O analfabeto coitado! É pobre de educação.
A espacialização aparece representada pela cidade natal do enunciador, o município pernambucano de Vitória de Santo Antão que, segundo ele, possui um bom aparato educacional, atingindo todos os níveis de escolaridade, indo desde o ginásio, correspondente ao atual ensino fundamental II, até a faculdade, o nível superior, o terceiro grau do ensino, além de cursos profissionalizantes, como o de datilografia. Segue o exemplo que comprova:
“Nossa Vitória é cidade
Que tem bens Educandários Tem todos os necessários
Do Ginásio a Faculdade Curso contabilidade Ciência e Geografia Pra quem faz Filosofia Exigem maiores valores Formação de professores
Música e Datilografia”
As escolas do Mobral vêm a ser mais um espaço que aparece na narrativa. O Mobral foi um programa criado pelo governo federal, na década de 70, cujo propósito era erradicar o analfabetismo, ensinando aos interessados técnicas de escrita, leitura e de cálculo para
conseguirem melhores condições de vida. O termo “mobral” passou a ter, também, um sentido
pejorativo para se referir a pessoas não instruídas. No texto, aparece numa referência ao sofrimento daqueles que são cegos de entendimento por não saberem ler.
“Se vê tanta criatura
Nas Escolas do Mobral Usa a impressão digital Servindo de assinatura Vive nesse sofrimento Cego de entendimento Mas tem completa visão
Das letras foi afastado O analfabeto coitado! É pobre de educação.
No processo de actorialização, não aparece, no texto, sujeitos semióticos nomeados, ou seja, os atores específicos. Por se tratar de um discurso em louvor à educação, os atores que aparecem envolvem a temática trabalhada: o analfabeto, este considerado um sofredor por não saber ler, por não ter tido acesso à educação; o professor tem a função de transmitir conhecimento e fazer do sujeito um ser pensante e questionador da realidade em sua volta. O ensino aparece como o caminho escolhido pela educação para atingir seu público alvo, a população em geral, e os professores vêm a ser aqueles que facilitam o acesso dos cidadãos ao conhecimento, à educação.
“Mostrando todos os valores
Pelas luses do ensino O progresso e o destino Devemos aos professores
Estes são possuidores Desse dote da natura Aquela grande cultura Que cursou sobre Colégios
Hoje tem os previlégios
Da educação viva e pura”
Os temas que permeiam a narrativa, os valores investidos, são representados pelo analfabetismo; sofrimento; educação. O primeiro deles aparece numa referência ao sofrimento
por que passa o iletrado por não ter tido a oportunidade de se dedicar aos estudos, tornando-se uma pessoa sem entendimento do que se passa ao seu redor, pois saber decodificar e, consequentemente, interpretar as letras, corresponde ao fundamento, à base para a aquisição do conhecimento de todas as áreas. A educação vem a ser o tema principal, para o enunciador, e o caminho para o conhecimento que torna o ser humano, de fato, cidadão, conhecedor de seus direitos e deveres.
Dessa forma, a oposição básica da narrativa reside no conflito entre analfabetismo e educação. O analfabetismo, termo contrário à educação, é representado pelo estado em que ficam aqueles que, por algum motivo, não frequentaram a escola ou pouco a frequentaram, enfrentando maiores dificuldades em todas as áreas da vida, posto que as melhores oportunidades são dadas a quem se dedica à obtenção do conhecimento. Já a educação, num estado de contradição do analfabetismo e tendo, como contraditório o não-analfabetismo, corresponde ao caminho que leva ao conhecimento, logo, à cultura. Fato comprovado, no texto, pelas profissões bem conceituadas por possuírem um elevado grau de cultura, tais como doutores, oficiais, bacharéis, advogados, senadores e deputados.
Com a análise, fica evidente a importância que a educação e o ensino trazem na vida do cidadão, pois ela é responsável em alavancar a situação de vida daqueles que se dedicam à busca do conhecimento.
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
TÍTULO: Deus e a educação AUTOR: Luiz Teixeira
DATA: S/D CLASSIFICAÇÃO BIBLIOGRÁFICA: Educação CATEGORIAS DESCRITIVAS DESCRIÇÃO Enunciação Debreagem: Enunciativa Enunciador: Explícito Enunciatário: Pressuposto
Zona Antrópica: Identidade; proximidade
Objeto Transacional: Educação
Situação espaço- temporal
Tempo: Específico:
Genérico: Presente e passado
Espaço: Específico: Vitória de Santo Antão
Genérico: Escolas do Mobral
Atorialização
Específicos:
Genéricos: Analfabeto; Professores
Natureza dos Agonistas: Eufórico Disfórico
inteligente Sofrido
Valores investidos Analfabetismo; sofrimento; educação
3.10 Folheto 10: Os bicos do peito dela