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Função e relevância do catálogo: marcos evolutivos

Regras e códigos de catalogação

3.3 Síntese da literatura

3.3.1 Sobre a função, circunstância e relevância dos catálogos bibliográficos

3.3.1.1 Função e relevância do catálogo: marcos evolutivos

Centrando-nos apenas no passado recente e traçando uma evolução em traços largos que nos conduza aos últimos 20 anos, constatamos alguns marcos evolutivos.

A informatização dos catálogos manuais das bibliotecas teve início nos anos 60, dando origem ao que se começou a designar por OPAC (Online Public Access Catalogue). A conceção e a forma dos primeiros OPAC, que podemos designar por catálogos de acesso público em linha de 1ª geração, sofrem a influência de dois modelos de acesso. Um dos modelos reflete a emulação em linha do catálogo tradicional em fichas, o outro adota os modelos de pesquisa booleanos existentes em bases de dados em linha de serviços comerciais de pesquisa como a DIALOG50, a Medline51 e o software BRS52 (Borgman, 1996).

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Lançada em 1972, a DIALOG foi o primeiro serviço de informação em linha, com um alcance global que pode ser considerado predecessor da WWW, não na forma, mas em termos de conteúdos,

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Se é certo que a informatização do catálogo marcou decisivamente esta fase, também não deixa de ser evidente que a sua conceção inicial, baseada no modelo manual, estava longe de produzir resultados satisfatórios e funcionalidades transparentes para o utilizador: existe uma grande limitação de pontos de acesso e a “opacidade” dos catálogos públicos em linha (Borgman, 1986; Le Loarer, 1989; Le Marec, 1989) bem como a necessidade de os tornar mais compatíveis com as necessidades dos utilizadores, tornam-se temas recorrentes.

Com a implementação, a partir de meados dos anos 80, dos sistemas integrados de gestão de biblioteca (SIGB), que evoluem em termos de requisitos normativos de âmbito nacional e internacional (Cordeiro, 2001b), emergem os chamados catálogos de acesso público em linha de 2ª geração: com os seus múltiplos pontos de acesso, funcionalidades de pesquisa mais sofisticadas e formatos de visualização amigáveis, representam a junção dos dois modelos anteriormente referidos. Ao acompanharem o desenvolvimento da tecnologia dos sistemas de bases de dados, os SIGB passaram de sistemas de ficheiros para sistemas relacionais. Contudo, a estrutura, conteúdo e principais campos pesquisáveis das bases de dados bibliográficos continuam a ser desenhados com base nos modelos de ficha do catálogo manual, ou seja, pouca alteração apresentam relativamente às funcionalidades básicas do catálogo da primeira geração, enquanto as funções de pesquisa e as características dos interfaces são desenhados tendo como modelo os sistemas de recuperação de informação, apresentando-se também com ecrãs de visualização mais fáceis de utilizar e mais atrativos.

abrangendo uma grande diversidade de áreas científicas (Summit, 2002). Desde 2008, a Dialog é um serviço de informação em linha comercializado pela ProQuest.

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MEDLINE (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online) é uma base de dados bibliográficos de ciências da vida e de informação biomédica, cobrindo também literatura sobre biologia e bioquímica. É compilada pela United States National Library of Medicine (NLM) e pode ser pesquisada via PubMed ou pelo sistema do National Center for Biotechnology Information, da NLM.

52 Bibliographic Retrieval Services (BRS) é um motor de busca para bases de dados de texto integral que, em 1977, implementou serviços de pesquisa e recuperação de informação num conjunto de bases de dados entre as quais a MEDLINE. Desde 2001, esta ferramenta tecnológica integra o produto Open Text Discovery Server, da Open Text.

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Uma evolução histórica dos modelos de acesso inerentes aos catálogos para este período (anos 80/90), é-nos dada por Hildreth (1984, 1991, 1995) e Matthews (1991), que identificam três gerações de OPAC baseadas nas características e funcionalidades dos catálogos em linha e nos processos de entrada, armazenamento e saída de informação. Neste período, ainda são poucos os desenvolvimentos de modelos de acesso baseados na pesquisa probabilística ou exploratória, mesmo os mais inovadores ao nível de interfaces gráficos têm por base motores de busca que utilizam técnicas convencionais de recuperação de dados baseadas em palavra-chave e técnicas booleanas.

O que a literatura considera como os catálogos de terceira geração já envolve o reconhecimento da necessidade de desenvolver um esforço maior para compreender o comportamento dos utilizadores e para conseguir resolver um dos problemas que na década de 90 é apontado como um dos mais prementes: a dicotomia dos resultados de pesquisa, que tanto podem tender para zero como para um número demasiado elevado de referências53, obrigando à visualização de vários ecrãs de listas de resultados (O’Brien, 1994) e desmotivando quem pesquisa (Wiberley, Daugherty e Danowski, 199554; Carlyle e Summerlin, 2002).

Com a disponibilização das bibliotecas em rede, o catálogo emerge de uma posição de retaguarda para uma posição central, potenciada pelas possibilidades de pesquisa simultânea em varias bases com o protocolo Z39.50, e por novas funcionalidades de pesquisa e recuperação da informação (ver, por ex., Lynch, 2000). Nos anos 90 dá-se a expansão da World Wide Web e motores de busca tais como o Alta Vista começam a responder a algumas das solicitações que os utilizadores vinham a reclamar dos catálogos de biblioteca, e às quais estes não conseguiam dar resposta

53 Uma pesquisa por palavra-chave recupera um “conjunto” de registos, e o conjunto tanto pode ser vazio como de grandes dimensões.

54 No estudo realizado por estes autores, a necessidade de examinar longas listas é referida como o quinto aspeto mais problemático para o utilizador do catálogo, referindo também que muitos utilizadores consideram a recuperação de mais de 100 registos por pesquisa como uma grande sobrecarga.

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como, por ex., a utilização de pesquisa pós-Booleana55 com correção ortográfica automática, relevância do termo e relevância na apresentação das referências, ou a possibilidade de acesso a sumários, texto completo e metadados, entre outros (Yu e Yong, 2004; Calhoun, 2006).

A partir do início dos anos 2000, com a preponderância do serviço Google, vulgariza-se a facilidade da pesquisa em linha e aumenta a noção de que tudo o que interessa está na WWW. As novas ferramentas de pesquisa na WWW são mais fáceis de usar e têm maior acessibilidade que as antigas mas, por outro lado, são mais difíceis porque o grau de invisibilidade é maior face à proximidade de cada biblioteca física:

“In the traditional library, you used to be able to wander over to the shelf and use position on shelf or color of cover to jog your memory. Now, we have to concoct the right question out of thin air.” (Feldman, 1998.)

Os catálogos das bibliotecas passam a coabitar com a pluralidade do ambiente informacional – motores de busca, RSS feeds, meta-motores de busca –, que constituem alternativas para localizar recursos de bibliotecas.

A falta de acompanhamento, ou a lentidão que as bibliotecas tiveram em acompanhar a evolução tecnológica, contribuiu para a perda de notoriedade do OPAC enquanto sistema de recuperação de informação, e reflete-se na sua evolução, quer ao nível do desenvolvimento de novas funcionalidades, na criação de interfaces mais apelativos, no acesso a múltiplas bases de dados e a recursos em rede ou, ainda, numa mais ampla “satisfação” das necessidades informacionais dos utilizadores (Dalrymple e Roderer, 1994; O’Brien, 1994; Woodward, 1996). Ou, mais recentemente, na necessidade de repensar uma nova arquitetura do aparato de descoberta-distribuição de informação.

55 Utilização de métodos probabilísticos de recuperação que permitem um alargamento da pesquisa para além dos limites definidos na pesquisa original. Embora cada motor de busca possua o seu próprio algoritmo para a avaliação da relevância de um recurso, no geral há a assunção de que quanto maior for o número de vezes em que o termo aparece num documento, maiores são as probabilidades desse documento cobrir o assunto pretendido; a ocorrência de termos que apresentam maior frequência num documento, do que na base de dados como um todo, é indiciadora do tópico principal desse documento; a ocorrência de termos frequentes tanto num documento como na base de dados como um todo, é indiciadora de um aumento de probabilidade de o documento ser sobre esse tópico específico.

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A WWW, ao constituir uma fonte de recursos mais vasta que o catálogo local, passou a ser o foco da atenção do utilizador (Dempsey, 2006b). Na passagem para a designada “nova” ou “próxima” geração de catálogos – termo que em si próprio é ambíguo por sugerir uma realidade futura, quando o que se precisa é de um catálogo já, para suprir uma necessidade que não é nem futura, nem abstrata (Breeding, 2007) – há a necessidade de alterações estruturais que envolvam não só uma abordagem mais abrangente do corpus material que é visado numa pesquisa, mas também a própria estrutura dos dados para que, como defende Coyle (2010c), os dados não estejam apenas na WWW mas sejam parte integrante da própria WWW:

“…our services must not only be on the Web, but need to be of the Web. The services can not just pass through, but must live and interact on the Web. With Web-based data, we can use the vast information resources there to enhance our data by creating relationships between library data and information resources.” (Coyle, 2010c, p. 6).

Segundo Breeding (2007, p. 5), o que na generalidade constitui a “nova geração” é a habilidade para transcender alguns aspetos do modelo tradicional. Este conceito pode ser aplicado a todas as fases de evolução dos catálogos em que sempre houve a necessidade de ir mais além, com o desenvolvimento de algo novo no futuro para suprir necessidades dos utilizadores (profissionais e finais).

Na literatura que surge a partir do ano 2000, a designação de catálogo de “próxima geração” pode ser vista, no entanto, como a mais recente manifestação de uma tendência na história do catálogo de biblioteca para lutar pelo seu papel central no acesso às coleções – um portal único para a descoberta de recursos de biblioteca, e pelo aproveitamento dos investimentos existentes de organização de informação (Barton e Mak, 2012; Julien, Guastavino e Bouthillier, 2012).

Tecnologia, inovação e criatividade, em complemento aos sistemas integrados tradicionais de biblioteca, constituem componentes que tendem a fundir-se para criar um espaço localizado, em linha, que transporta para a web os serviços da biblioteca física e sua experiência de organização, e em que os profissionais de biblioteca devem explorar métodos alternativos de utilização dessas ferramentas dentro do modelo organizacional de biblioteca (Myung-Ja, 2012b; Tarulli e Spiteri, 2012).

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A construção dos catálogos de nova geração pode fornecer oportunidades para profissionais e utilizadores interagirem, colaborarem e melhorarem as funções fundamentais da biblioteca, e pode também motivar um trabalho conjunto com a indústria produtora de software de biblioteca, visando o desenvolvimento de OPAC mais independentes dos sistemas tradicionais de gestão de bibliotecas e com uma oferta de serviços mais enriquecida (Maisonneuve, 2008).

Um dado normalmente adquirido em relação ao interface de catálogos de biblioteca de nova geração é que a experiência do utilizador é melhor – isto é, é mais rica e intuitiva. Num estudo de utilizador realizado em 2005 (Slone, 2005), verifica-se que as pessoas mais familiarizadas com o uso de catálogos em linha estão mais à vontade a usar as ferramentas da web; por seu lado, as pessoas que tiveram experiências recentes na WWW têm como expectativa que a pesquisa nos catálogos em linha seja semelhante.

Talvez por estas razões, com frequência os novos interfaces vêm com pouca ou nenhuma documentação para o utilizador. Com base na assunção da facilidade de uso e familiaridade da experiência prática na Web, considera-se que os utilizadores podem realizar as tarefas comuns de biblioteca sem assistência (Majors, 2012).