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Interoperação e partilha em rede

Regras e códigos de catalogação

3.3 Síntese da literatura

3.3.1 Sobre a função, circunstância e relevância dos catálogos bibliográficos

3.3.1.3 Interoperação e partilha em rede

A rede passou a constituir o foco da atenção dos utilizadores e, para eles, a “coleção disponível” vai muito para além da coleção local de cada biblioteca ou catálogo, significando a existência de ambientes para descobrir onde os recursos podem ser localizados. Neste contexto, coloca-se novamente a questão da função do

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Sobre grupos de utilizadores especiais ver algumas das secções da IFLA. Por ex., Libraries Serving

Persons with Print Disabilities Section (anteriormente designada por Libraries for the Blind Section,

disponível em: http://archive.ifla.org/VII/s31/); e agora disponível em: http://www.ifla.org/lpd. Library

Services to People with Special Needs Section (anteriormente designada por Libraries Serving Disadvantaged Persons); disponível em: http://www.ifla.org/lsn. Libraries for Children and Young Adults

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catálogo e a diferença entre encontrar (descobrir) – identificar o recurso de interesse – e o localizar, isto é, identificar onde o recurso existe.

Uma partilha eficaz de recursos pressupõe a existência de uma infraestrutura que permita aos utilizadores localizar os recursos de interesse, em qualquer formato e local, de preferência sem haver a necessidade de aplicarem terminologia biblioteconómica (Sauperl e Saye, 2009). O desenvolvimento da Internet conduziu a que os produtores de bases de dados começassem a fornecer o acesso direto aos seus conteúdos na Web; mas as características técnicas da rede, por um lado, e as inerentes a cada sistema documental, por outro, exigem o desenvolvimento de pontes que possibilitem o intercâmbio entre as duas partes (Morineau e Boillot, 1997). Os catálogos coletivos em linha e a pesquisa através do protocolo Z39.50 constituem uma resposta a esta disseminação de bases de dados bibliográficos.

Os catálogos coletivos em linha surgem na década de 70 do século passado (a era dos grandes orçamentos) (Steinhagen, Hanson e Moynahan, 2007) e oferecem aos utilizadores a possibilidade de realizar pesquisas consistentes sobre registos oriundos de várias instituições proporcionando, também, o incremento dos serviços de empréstimo interbibliotecas, cujo declínio só se verificará décadas mais tarde com o aparecimento do Google e, também, com a vulgarização do acesso aos próprios documentos, na edição eletrónica ou na disponibilização em bibliotecas digitais.

Segundo Lynch (1997), os catálogos coletivos apresentam várias modalidades consoante os modelos organizacionais e de negócio que os suportam, considerando três tipos: i) os comerciais, onde se paga para pesquisar (como foi, por ex., durante muito tempo, o caso da OCLC70 e do RLG71), cujas bases de dados foram inicialmente um produto da atividade de partilha de catalogação; ii) os catálogos coletivos “puros”,

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Estabelecido em 1971, o WorldCat (até 1996 designado OLUC – OCLC Online Union Catalogue) é atualmente o maior catálogo bibliográfico do mundo, com participação de mais de 72 000 instituições de 170 países. Até 2006 o seu acesso era restrito aos membros da OCLC, passando, a partir desta, a ser livremente acessível na WWW, através do Open WorldCat Program, que visa dar total visibilidade às coleções que o integram (Giraud e Waller, 1995; Nilges, 2006).

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Fundado em 1974 por um grupo de bibliotecas de investigação, dois anos após a OCLC, o RLG (Research Libraries Group) desenvolveu o motor de busca Eureka, a base de dados bibliográfica RedLightGreen e a base de dados arquivística ArchiveGrid. Presentemente o RLG está fundido na OCLC.

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tais como os desenvolvidos por universidades, pensados especificamente para o acesso; e iii) os catálogos coletivos partilhados que utilizam em comum um sistema integrado de bibliotecas (integrando outras funções partilhadas para além do catálogo como, por ex., a circulação).

Nas pesquisas distribuídas cada catálogo apresenta as suas particularidades, mantendo-se autónomo, enquanto no catálogo coletivo há uma uniformidade de funções e algoritmos de pesquisa comuns a todo o catálogo, que tem em si próprio uma existência física, independentemente da origem dos registos bibliográficos.

A evolução do conceito de pesquisa distribuída dá-se na década de 90, altura em que a utilização do protocolo Z39.5072 começa a ganhar terreno como eventual substituto dos catálogos coletivos “estáticos”.Basicamente, a ideia subjacente a este tipo de pesquisa é a existência de um método usado para identificar e pesquisar um conjunto de catálogos em linha autónomos, e integrar os resultados recebidos no interface do sistema que lança as pesquisas, consubstanciando, assim, uma espécie de catálogo coletivo virtual.

Tanto o acesso aos catálogos coletivos ditos tradicionais, com existência de uma base de dados central, como o acesso via Z39.50 apresentam vantagens e limitações, motivo pelo qual podem ser considerados complementares e não em oposição (Lynch, 1997). Juntamente com a vulgarização do modelo cliente/servidor e da internet, um protocolo como o Z39.50 veio contribuir para mexer com os interfaces de utilizador e ajudar a reduzir a necessidade de conhecimento sintático e semântico requerido para a condução de pesquisas em linha em sistemas diferentes (Beheshti, 1997).

Em Lynch (1997) encontramos uma análise comparada dos benefícios e inconvenientes entre a pesquisa distribuída e a pesquisa centralizada dos catálogos coletivos, concluindo terem objetivos diferentes, e não se constituírem como

72 A norma ANSI/NISO Z39.50: Information Retrieval Service Definition and Protocol Specification for

Library Applications, foi publicada pela primeira vez em 1988, mas não teve implementações práticas

até à sua versão 3, de 1995. A correspondente norma ISO foi publicada pela primeira vez em 1993 (ISO 10162 e 10163) e alinhada com a ANSI/NISO numa segunda versão, publicada em 1998 (ISO 23950).

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alternativas. Embora levantem questões técnicas diferentes, em termos de implementação e operação, já no que toca à consolidação de informação oriunda de fontes com variadas políticas e critérios, designadamente de controlo de autoridade, a essência dos problemas não é muito diferente.

Embora não se possa dizer que houve uma cabal exploração do protocolo Z39.50 (Rosa Piñero, Senso Ruiz e Eíto Bru, 1998) – já que a sua implementação em larga escala acabou por não se verificar e, entretanto, a tecnologia web sobrepôs-se à do modelo OSI (Open Systems Interconnection), em que o protocolo assentava (Jones, 1998) – a sua utilização veio reforçar a importância da interconexão de sistemas e a atenção às questões da interoperabilidade (Coyle, 2000; Moen, 2001).

Moen (2001) analisa os problemas de interoperabilidade que se levantam à aplicação do protocolo, definindo quatro níveis de problemas: i) interoperabilidade de baixo nível (sintática), normalmente de fácil resolução, pois dizem respeito ao estabelecimento da interconexão de base entre os sistemas; ii) interoperabilidade de alto nível (funcional), correspondendo às diferenças de serviços suportados por cada sistema de recuperação de informação (por ex., pesquisa com truncatura); iii) interoperabilidade semântica, respeitando às diferenças entre sistemas em termos de índices, consistência das estruturas de dados, diferenças de granularidade, mapeamento dos dados/significado/atributos no protocolo, etc.; e iv) interoperabilidade ao nível das tarefas do utilizador, referindo-se à maior ou menor correspondência com as necessidades e expectativas dos utilizadores.

O aspeto da interoperabilidade semântica é aquele que apresenta mais pontos críticos, e mais diversificados, que não são resolúveis através da tecnologia, uma vez que dependem, sobretudo, de opções e práticas locais relacionados com a qualidade dos metadados e das respetivas estruturas, designadamente das normas e políticas consubstanciadas nos registos MARC. Para obviar a um certo nível destes problemas, o das configurações do protocolo, foram definidos perfis do Z39.50 para uso internacional, com detalhes de implementação do protocolo e outros aspetos como recomendações sobre a indexação das bases de dados. O mais importante desses

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perfis é o Bath Profile (Bath Group, 2003), que ajuda a resolver parte dos problemas mais gerais de interoperabilidade semântica mas não as diferenças geradas por práticas inconsistentes, ou muito localizadas, refletidas nos registos MARC, como também acontece com os catálogos coletivos físicos (bases de dados centralizadas).

Cousins e Sanders (2006) reportam uma experiência de conjugação de Z39.50 com middleware específico para a transformação das pesquisas formuladas em função das características dos servidores alvo, permitindo ultrapassar diferenças importantes mesmo que o perfil de implementação do protocolo varie de sistema para sistema, ao mesmo tempo que potencia a sua integração com outros serviços de informação em rede. Os resultados da experiência mostram a utilidade da intermediação através do

middleware de transformação das pesquisas, sublinhando também o potencial de

perfis comuns como o Bath Profile, mas não deixando de reconhecer que dificilmente, só por si, estas estratégias ultrapassam todas as questões, complexas, da interoperabilidade semântica que chegam até ao âmago da informação representada nos dados, em função da qualidade, coerência, nível de especificação, etc., dos mesmos dados e respetiva estrutura.