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5 CATEGORIAS E TAXONOMIAS DE REPRESENTAÇÃO E PENSAMENTO NA

5.4. As funções computáveis de Tony Kotnik

Em 2010, um artigo intitulado Digital Architectural Design as Exploration of

Computable Functions, publicado na Revista International Journal of Architectural Computing, trazia os conceitos das funções Computáveis descritas e articuladas por Toni

Kotnik. Assim como Mitchell (1975) e Oxman (2006), com Kotnik (2010), vê-se uma tentativa de exame das teorias que convergem para uma classificação da arquitetura digital. As definições não tratam da avaliação da qualidade da arquitetura como o resultado de um projeto, e também não se trata de uma análise da forma em si, mas da forma de pensar conjugada com a habilidade computacional em se usar ferramentas na arquitetura digital.

Kotnik (2010) inicia sua teoria explicando o computador enquanto função e que a informação é escrita numa sequência finita de bits, as quais podem ser codificadas como um número natural. Sua formulação parte da ideia da máquina de Turing que estabelece tudo que pode ser feito num computador. Assim, segundo o autor, um programa P é uma função parcial num conjunto de números naturais N, significando uma função definida num subconjunto

Para ⊆ N, com o output out ∈ Var ⊆ N, como o resultado da computação do input in ∈

Para, que é p(in) = out. Esse é o conjunto abstrato para o dispositivo computacional que

torna claro o princípio da computabilidade, para cuja função f existe um programa P tal qual

f(in) = p(in) para cada input válido in ∈ N. Dessa forma, uma tarefa é computável se for possível especificar uma sequência finita de instruções que, quando seguidas, resultarão na conclusão de uma tarefa.

Apesar das máquinas terem capacidades diferentes e consequentemente isso fazer com que elas executem funções computáveis diferentes, a definição de computabilidade tende a ter a mesma classe de funções, o que na prática equivale dizer que se alguém prover uma descrição formal passo a passo da computação de uma função, então alguém também pode encontrar o procedimento algorítmico em uma dessas definições precisas. Essa é, de certa forma, uma formulação comumente aceita na conhecida hipótese da conjectura de Church- Turing. Baseado na ideia de Turing de que uma função f apresenta um domínio A e um contradomínio B, Kotnik (2010) mostra que o domínio e o contradomínio são subconjuntos dos números Naturais e que as relações entre esses elementos podem ser descritas por meio de sequências de simples regras formais, podendo, no entanto, haver regras cujas as relações entre os conjuntos de número naturais não sejam computáveis. Apoiado nesse pensamento matemático, Kotnik (2010) defende que usar o computador significa, sem exceção, a limitação necessária de funções computáveis como mediador entre input e output. No entanto,

a resolução de problemas na arquitetura pode se apoiar na riqueza de se explorar as funções computáveis.

Baseado nas funções computacionais desenvolvidas no processo de projeto, Kotnik (2010) distinguiu três níveis graduais de computabilidade: representacional, paramétrico e algorítmico (Figura 30). O autor defende que as metodologias de projeto podem se enquadrar em algum dos níveis por ele proposto.

Figura 30 - Níveis de computabilidade. Fonte: Adaptado de Kotnik (2010) pelo autor (2019).

O nível representacional é caracterizado principalmente pelo uso computacional como uma ferramenta eletrônica de desenho. Nesse nível, não há uma percepção real da natureza computacional que governa o ambiente digital. O processo continua numa linha visual semelhante a abordagem do desenho feito no papel. O que existe é uma mera consciência de uma extensão da linguagem da geometria tradicional da arquitetura que está presente em uma descrição matemática invisível das ferramentas digitais de projeto. A relação existente é de que um input gera um único output f(in) = out. Um exemplo de aplicação é o projeto de Peter Cook e Colin Fournier da Kunsthaus Graz ou Museu de arte em Graz, construído na Áustria em 2003. No projeto, NURBS foram usadas para digitalmente descrever a forma da pele externa do edifício baseado num modelo físico existente.

O nível paramétrico é caracterizado pela relação da função f em relação ao espectro de possibilidades entre um input in e o output out, o que significa uma variação entre o parâmetro de espaço Para. Nesse nível, há um entendimento claro da existência de uma

relação computacional f entre um input in e um output out e a integração dessa relação no processo de projeto como um esquema de interdependência entre várias partes do projeto. No entanto, a descrição algorítmica não é conscientemente ativada como uma ferramenta de projeto. A relação é mais fixada e focada na relação de quantificação do input in que no habilitar uma variação controlada do output out. Um exemplo de aplicação foi Estação de Trem Waterloo em Londres projetada por Nicholas Grimshaw.

O nível algorítmico abre a relação entre input e output e é caracterizado pela utilização de uma descrição formal da função f em si e a sua aplicação como estratégia de projeto. Nesse nível, o foco está no desenvolvimento de um projeto de uma lógica computacional que é uma sequência de operações algébricas, analíticas e geométricas para a manipulação de informação e seu translado em propriedades arquitetônicas. Trata-se da descrição algorítmica de uma função computável f em si e a possibilidade de um domínio individualizado das limitações das funcionalidades embutidas de um software usado. Um exemplo dessa aplicação é o National Swimming Center em Beijing projetado pelo escritório PTW Architects. Nele foram usados algoritmos para a descrição formal do comportamento de preenchimento do espaço de bolhas de espuma e sua abstração geométrica permitiu o uso de células poliédricas complexas como um sistema de construção, o que a princípio parece ser aleatório, mas na verdade foi uma solução racional. Assim, uma função matemática torna explícito regras que governam uma relação de causa e efeito.

Percebe-se dessa forma, uma evolução do esforço em se categorizar e atualizar a arquitetura digital de acordo com o nível e autoconsciência do pensamento computacional empregado. Enquanto Mitchell (1975) fala de níveis de ambição, anos depois Oxman (2006) atualiza esse cenário trazendo quatro níveis de classe de interação por meio de uma categorização taxonômica inspirada em seu antecessor, enquanto Kotnik (2010) busca uma classificação baseada no nível de computabilidade e que, segundo o próprio autor, está relacionado às classes de Oxman (2006). Para os dois últimos autores, é o grau de consciência sobre o uso do computador, mais precisamente da computação, que faz com que os níveis paramétrico e algorítmico sejam distintos da metodologia do modelo representacional.

Kotnik (2010) ressalta que o “desempenho” descrito por Oxman (2006) é considerado um processo de “conformação” e a “geração” é guiada pelo desempenho desejado. No entanto, Kotnik classifica o “desempenho” como não distinto das outras classes paradigmáticas, mas uma subclasse que transita entre modelos de “conformação” e “geração”. Deve-se observar ainda que os modelos podem ser compostos, isto é, pode haver mais de um nível de computabilidade empregado, assim como uma classe de interação, de tal modo que

um projeto pode conter: a) níveis representacionais; b) níveis paramétricos; c) níveis algorítmicos; d) níveis representacionais e paramétricos; e) níveis representacionais e algorítmicos; f) níveis paramétricos e algorítmicos.

Baseado numa classificação combinada de Oxman (2006) e Kotnik (2010), Vasconselos e Sperling (2017) criaram um esquema (Figura 31) para a representação dos níveis de computabilidade e suas subcategorias, e consideraram os níveis Paramétrico e Algorítmico como Digital Design, separando-os do CAD Representacional. Todos os três níveis foram considerados dentro do universo CAD/CAAD.

Figura 31 - Níveis computacionais, categorias e subcategorias. Fonte: Traduzido de Vasconselos e Sperling (2017) com base em Oxman (2006) e Kotnik (2010).