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Os fundamentos da crise estrutural do capital: reestruturação produtiva, neoliberalismo e as bases para o acirramento do trabalho precário

Apreender os processos de precarização do trabalho no capitalismo contemporâneo, e por seu turno nas condições de trabalho dos assistentes sociais atuantes no Instituto Federal de Alagoas, requer pensá-los no contexto da crise estrutural do capital mundializado, desde os idos dos anos 1970 até a atualidade, tendo presente os seus mecanismos de enfrentamento expressos na restruturação produtiva e no neoliberalismo. Alves (2012) afirma que a crise estrutural do capital introduziu uma nova temporalidade histórica do desenvolvimento civilizatório, que foi caracterizada por um conjunto de fenômenos sociais qualitativamente novos que, segundo o autor, compõem a fenomenologia do capitalismo global com seus “trinta anos perversos” (1980-2010). Com isso, o sistema mundial do capital como sistema social global reestruturou-se efetivamente numa dimensão inédita (ALVES, 2012).

O movimento de precarização do trabalho é acelerado e ampliado substantivamente em decorrência da crise estrutural do capital, encontrando no neoliberalismo sua base de sustentação atual. Sendo assim, é impensável investigar a precarização das condições de trabalho dos assistentes sociais divorciando-a do movimento gestado na quadra histórica da crise do capitalismo contemporâneo, que produziu mudanças no mercado de trabalho das diferentes profissões, deslanchando alterações significativas na dinâmica das relações trabalhistas e sociais em sua totalidade. Para refletirmos sobre isso é necessário questionarmos: quais os fundamentos da crise estrutural do capital e qual a sua relação

com o acirramento do trabalho precário?

É consensual a constatação, a despeito das interpretações distintas, que o modo de produção capitalista é acometido por crises que são características de sua forma de ser. Para enfrentá-las diferentes estratégias são utilizadas, conforme o momento histórico e o nível de

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desenvolvimento do capitalismo. As crises não são exclusividades desse modo de produção, pois nas sociedades pré-capitalistas elas já existiam, no entanto eram advindas da escassez de recursos materiais e bens necessários à vida social e da insuficiência da produção de valores de uso para atender a todos os indivíduos. Dito de outro modo: tinha-se uma crise de subprodução. A novidade trazida pelo capitalismo reside no fato de a crise apresentar-se na superprodução dos valores de uso, tendo suas raízes nesse modo de produção e sendo intrínseca ao sistema do capital.

De modo geral, “o sistema do capital é orientado para a expansão e movido pela acumulação”, sendo esta sua determinação mais profunda (MÉSZAROS, 2011, p. 100, grifos do autor). Para Mészaros (2011), o capital enquanto “sistema de controle sociometabólico” é plenamente irremovível desde que consiga retirar e acumular trabalho excedente, sendo esta uma das finalidades essenciais para extração máxima de mais-valia. O capital também anseia sua expansão, que pode ser dada pelo aumento da capacidade de consumo das mercadorias, reduzindo a vida útil dos produtos. Por este motivo, expansão e acumulação andam juntas.

Ainda assim, é primordial apontar que havendo qualquer obstáculo neste processo de expansão e acumulação, o sistema do capital pode sofrer efeitos devastadores sendo acometido por crises. As crises cíclicas66 são inerentes ao desenvolvimento do sistema do capital, que é passível a elas, e se revelam sob certa “normalidade”. Contudo, os bloqueios cíclicos podem decorrer em implicações de uma ordem “sistêmica” ou “estrutural”, provocando “uma crise que afete o sistema do capital global não apenas em um de seus aspectos – o financeiro/monetário, por exemplo-” (MÉSZAROS, 2011, p.101). Em tempos de crises cíclicas ou “bloqueios cíclicos” o sistema do capital pode sofrer enormes consequências67 em seu processo de reprodução colocando “em questão a sua viabilidade como sistema reprodutivo social”.

Num cenário de crise estrutural do capital os seus “constituintes destrutivos avançam com força extrema, ativando o espectro da incontrolabilidade total numa forma que faz prever a autodestruição, tanto para este sistema reprodutivo social excepcional, em si, como para a

66 Um exemplo emblemático de crise do capital está na crise de 1929-1932, que se iniciou com a queda do

sistema financeiro americano, traduzida pela quebra na bolsa de Nova York, no dia 24 de outubro de 1929. Com seu alastramento pelo mundo, esta crise de superprodução foi ocasionada pelo desabamento do valor das ações na bolsa de valores e teve como consequências a redução do comércio mundial, o corte nos gastos públicos, a elevação dos impostos e o aumento do desemprego. Pode-se caracterizar a crise de 1929 como uma crise cíclica, pois permitiu medidas protelatórias para seus efeitos, a exemplo das medidas saneadoras e políticas macroeconômicas que foram tomadas, na década seguinte, no sentido de reverter os efeitos da crise.

67 Apesar disso, Mészaros (2011) mostra que o capital vem historicamente conseguindo superar todos os

obstáculos que surgem contra ele “elevando seu modo de controle metabólico ao poder de dominância absoluta como sistema global plenamente estendido”, garantindo seu desenvolvimento (idem, p.101). Uma das formas dessa superação de obstáculos se dá com o aumento da exploração dos trabalhadores e a retirada de seus direitos.

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humanidade em geral” (MÉSZÁROS, 2011, p. 100). A crise estrutural do capital traz à tona as contradições do sistema capitalista e o seu caráter antagônico, pois quanto mais se trabalha, mais se intensifica a miséria do trabalhador e mais se explicita as manifestações da “questão social”.

Os fenômenos tecidos pelo fluxo histórico do capital contemporâneo demonstram que atualmente vivemos uma crise estrutural que, para Mészáros (2011, p. 795), não há nada de incompatível na associação desta crise ao sistema do capital. “Pelo contrário, crises de intensidade e duração variadas são o modo natural de existência do capital”, pois o permitem prosperar para além de seus empecilhos imediatos, estendendo “com dinamismo cruel sua esfera de operação e dominação”. Por este motivo, não é viável para o sistema do capital a superação definitiva de suas crises, pois elas constituem-se em parte permanente de sua dinâmica de reprodução.

A crise estrutural do capital contém uma novidade histórica explicitada em quatro aspectos: “seu caráter é universal”, não se reduzindo a uma esfera particular; “seu alcance é verdadeiramente global”, alcançando todos os países; “sua escala de tempo é extensa, contínua, se preferir, permanente”, e não limitada e cíclica, como foram as crises anteriores; e por fim “seu modo de se desdobrar poderia ser chamado de rastejante” (MÉSZAROS, 2011, p. 795-796, grifos do autor). A crise estrutural não se origina por si só, mas “reside dentro e emana das três dimensões internas”, que incidem na produção, no consumo e na circulação/distribuição/realização. Enquanto tais dimensões estiverem em completo funcionamento haverá apenas crises cíclicas. A crise estrutural altera a totalidade do compósito do capital em todas as suas dimensões, onde cada uma delas possuem limites absolutos que interagem entre si (MÉSZAROS, 2011, p. 798).

Com esse entendimento, a crise estrutural do capital que experimentamos inicialmente nos anos 1970 está relacionada, de fato, “a algo muito mais modesto que as tais condições absolutas. Significa simplesmente que a tripla dimensão interna da autoexpansão do capital exibe perturbações cada vez maiores”. A crise estrutural “não apenas tende a romper o processo normal de crescimento, mas também, pressagia uma falha na sua função vital de deslocar as contradições acumuladas do sistema” (MÉSZÁROS, 2011, p. 799).

As manifestações da crise estrutural eclodida nos anos 1970 não podem ser ocultadas, pois afetam toda a totalidade do complexo social da sociedade capitalista, colocando “em risco a sobrevivência contínua da estrutura global”, tendo em vista seu grau de severidade nas partes que são afetadas por ela (MÉSZÁROS, 2011, p. 797). A propósito, com o colapso do

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pacto keynesiano não foi possível manter as mesmas condições favoráveis à expansão ininterrupta do capital. Os primeiros sinais da crise nos países de capitalismo avançado aparecem já nos anos 1960 em decorrência da desaceleração das taxas de crescimento nas principais economias do mundo, bem como com a dificuldade de se manter as taxas de lucro. Outro fator estimulador da crise foi a elevação do preço do petróleo em 1973, desencadeando quebras nos indicadores de produção. Mas, “o biênio 1974-1975 é claramente o momento culminante da crise, onde as economias passam a apresentar inclusive taxas negativas de crescimento” (CARCANHOLO, 2010 p.03). A partir daí o mundo vivencia o aumento da inflação e das taxas de desemprego, seguidas da redução da produção e da estagnação da economia.

Ademais, a crise não se relaciona “aos limites imediatos, mas aos limites últimos de uma estrutura global” (MÉSZÁROS, 2011, p.797, grifos do autor). Ao contrário das crises cíclicas, que ativavam somente os limites relativos68 do capital, a crise estrutural ativa seus limites absolutos69. Em decorrência da ativação dos limites absolutos do capital, que não podem ser deslocados nem ultrapassados, emanam implicações destrutivas que podem atingir o conjunto da humanidade. Mészáros (2011, p. 222) aponta algumas questões graves decorrentes da crise estrutural: o desemprego crônico, a destruição do meio ambiente, a contradição entre o desenvolvimento econômico transnacional e os Estados nacionais e a luta pela emancipação das mulheres. Essas questões não devem ser analisadas de forma isolada, pois “elas demonstram ser insuperáveis precisamente porque, em conjunto, intensificam imensamente a força desintegradora de cada uma e a influência global desses conjuntos particulares tomados em seu todo” (idem). As transformações no capitalismo contemporâneo não eliminam a contradição capital-trabalho, ao contrário, intensificam-nas.

A década de 1970 demonstra a magnitude e a severidade da crise estrutural do capital na contemporaneidade que se alastra globalmente e não se limita a um país ou a uma região

68Vale advertir que os limites relativos são aqueles que “podem ser superados quando se expande

progressivamente a margem e a eficiência produtiva – dentro da estrutura viável e do tipo buscado – da ação socioeconômica”, e minimiza “por algum tempo os efeitos danosos que surgem e podem ser contidos pela estrutura causal fundamental do capital” (MÉSZÁROS, 2011, p. 175).

69 Os limites absolutos colocam “em ação a própria estrutura causal” e “ultrapassá-los exigiria a adoção de

estratégias reprodutivas que, mais cedo ou mais tarde, enfraqueceriam inteiramente a viabilidade do sistema do capital em si” (MÉSZÁROS, 2011, p. 175). Para Mészáros, as expressões que ativam os limites absolutos do capital representam um “conjunto de grandes contradições” que são inerentes ao sistema do capital, tais como: o antagonismo estrutural inconciliável entre o capital transnacional e os Estados nacionais; a destruição e devastação do meio ambiente; a liberação das mulheres; e o desemprego crônico. Podemos apontar, assim, que “somente quando os limites absolutos das determinações estruturais mais internas do capital vêm à tona é que se pode falar de uma crise que emana da baixa eficiência e da assustadora insuficiência da extração do trabalho excedente”, que gera “imensas implicações para as perspectivas de sobrevivência do próprio sistema do capital” (MÉSZÁROS, 2011, p. 103).

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geográfica. Para Alves (1999) a crise do capital atingiu inicialmente os países centrais a partir de 1973. Com isso foi desenvolvida a mundialização do capital, que impulsionou um novo “complexo de reestruturação produtiva, uma ofensiva do capital na produção, que busca constituir um novo patamar de acumulação capitalista em escala planetária e que tende a debilitar o mundo do trabalho” (idem, p.79). Para o autor, “sob o impulso da mundialização do capital, houve o desenvolvimento da acumulação flexível, um novo tipo de acumulação capitalista que se impõe, cada vez mais, às corporações transnacionais”. Esse modo de acumulação decorre da necessidade de o capital reconstituir sua base de valorização. (ibidem)

E assim, numa ofensiva do capital sobre o trabalho, implantam-se formas mais precárias de emprego para garantir as condições de acumulação do capital aspirando e impulsionando os superlucros. A novidade reside nas novas formas as quais se compra, se controla, se consome e se explora a força de trabalho. É nesse solo histórico que o foi nomeado nesta tese de determinações secundárias da precarização do trabalho são manifestadas por distintas tendências e expressões.

Vale lembrarmos que as determinações secundárias da precarização do trabalho referem-se às condições trabalho às quais o trabalhador está submetido, que tendem a repercutir objetivamente (através do vínculo empregatício, da jornada de trabalho, do nível salarial, das condições materiais de trabalho, que envolvem instalações, meios e instrumentos de trabalho) e subjetivamente sobre o trabalhador (expressando-se nas formas de controle exercidas nos trabalhadores e no grau de preservação física e psíquica da força de trabalho).

O capital, numa ofensiva contra o trabalho, se vê empenhado em buscar novas estratégias para a crise, reordenando a produção e as formas de acumulação. Uma das respostas a essa crise se deu pela chamada reestruturação produtiva, onde houve a adoção de novas formas de gerenciamento e de produção. A reestruturação produtiva “[...] expressa as estratégias utilizadas pelo capital em direção ao enfrentamento da crise e se dá através da reorganização do processo de produção de mercadorias e realização do lucro”. Isso diz respeito à “reorganização das fases do ciclo global da mercadoria e da criação de mecanismos sócio-políticos, culturais e institucionais necessários à manutenção do processo de reprodução social” (MOTA e AMARAL, 1998, p.27).

“O movimento de posição (e reposição) dos métodos de produção de mais-valia relativa denomina-se de reestruturação produtiva, em que o capital busca novas formas de organização do trabalho mais adequadas à autovalorização do valor” (ALVES, 2011, p.33). A finalidade da reestruturação produtiva do capital é criar um trabalhador mais adaptado a essa

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nova forma de exploração do trabalho pelo capital, além de tentar mudar a postura dos trabalhadores, prezando um incentivo à interdependência deles. Ao mesmo tempo em que se trabalha em equipe, é incentivada a competitividade entre os trabalhadores, que controlam a si próprios no intuito de efetivar o cumprimento das tarefas.

Decorrente deste fator há uma desmobilização da classe trabalhadora nos sindicatos trabalhistas, enfraquecendo a luta por melhores condições de trabalho. Assim, além dos impactos objetivos da crise implicarem para os trabalhadores em desemprego, rebaixamento dos salários, desmonte do sistema de proteção social, vê-se “outras formas de sociabilidade marcadas por iniciativas pragmáticas de enfrentamento da crise, fraturando suas formas históricas de organização e esgarçando uma cultura política que comporta alternativas à ordem do capital” (MOTA e AMARAL, 1998, p.30).

Proliferam-se no solo histórico atual a ampliação da precarização do trabalho, advinda da crise estrutural do capital, que tem um contorno mundial com formas e níveis complexos, alcançando tanto os países centrais quanto os países periféricos. Alves (2012) acrescenta que o capitalismo global caracteriza-se como movimento da heterogeneidade e não do alcance da homogeneidade, sendo o movimento do capital global concretamente heterogêneo no plano territorial. Enquanto alguns países vivenciam crises inéditas, o centro da acumulação e crescimento da economia capitalista desloca-se para outros países ditos “emergentes” e para a China (ALVES, 2012).

A precarização do trabalho não “apenas desvela uma condição ontológica da força de trabalho como mercadoria, mas explicita novos modos de alienação/estranhamento e fetichismo da mercadoria no mundo social do capital” (ALVES, 2007, p.115). O trabalho assalariado, apesar de ser dotado da determinação ontológica da precarização, sofre com diferentes nuances das determinações secundárias dessa precarização, que podem ser ocultadas numa conjuntura de um “Estado social” (como, por exemplo, o Estado de Bem- estar) ou intensificados na ocorrência de um Estado com um viés endurecido, como o Estado neoliberal.

Para Alves (1999, p.80) as novas tecnologias microeletrônicas aplicadas à produção possibilitaram a constituição de novos níveis de flexibilidade para o capital. Contudo, o autor chama atenção que é “não apenas as determinações tecnológicas contribuíram para impulsionar a nova ofensiva do capital na produção, mas principalmente as determinações políticas”, que são “caracterizadas pelo processo político das derrotas históricas da classe trabalhadora (ocorridas sob a conjuntura de meados dos anos 70 nos principais países

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capitalistas)” (ALVES, 1999, p.80). Um exemplo foi a instauração de políticas neoliberais, desde meados de 1979, com a vitória de Thatcher, na Grã–Bretanha, e de Reagan, nos Estados Unidos da América, que geraram a “desregulamentação da concorrência e a liberalização comercial, além de adotarem políticas anti-sindicais, impulsionando, deste modo, novos patamares de flexibilidade e contribuindo, para instaurar um novo poder do capital sobre o trabalho assalariado” (idem).

Na atmosfera de instabilidade causada pela crise estrutural do capital, que estimula a ampliação da generalizada precarização estrutural do trabalho, engendrando novas condições e relações de trabalho envoltas pela desregulamentação e por rebatimentos nefastos para o conjunto da classe trabalhadora, inclusive para os assistentes sociais, o papel do Estado neoliberal70 no desenvolvimento desta crise é basilar, pois auxilia o capital na tarefa de explorar intensamente a força de trabalho e garante condições para a exacerbação do trabalho precário.

Lembremos que o Estado é uma esfera necessária nas sociedades de classes para preservar as condições gerais de reprodução das classes sociais antagônicas e da propriedade privada, buscando amortecer os conflitos sociais. A respeito do Estado, Marx (1995) faz a análise das formas as quais ele se utiliza para tentar solucionar os problemas sociais originados da exploração de uma classe sobre a outra. Para o referido autor, o Estado nunca encontrará em si próprio ou na organização da sociedade a raiz dos males sociais. O fundamento dos males sociais, em grande parte, é encontrado numa forma específica de organização do Estado, mas não na essência dele (idem, p.79).

Marx (1995) suscita que o Estado procura a causa dos problemas sociais na própria administração e, assim, procura as soluções também em medidas administrativas, “exatamente porque a administração é a atividade organizadora do Estado” (MARX, 1995, p.80). Não há possibilidade de o Estado suprimir a contradição entre a função da administração e suas possibilidades, sem que haja sua própria eliminação. O Estado é impotente para resolver os problemas sociais, sua função é administrá-los, e assegurar a manutenção da exploração de

70 Para Castelo (2011, p.230) “a ideologia neoliberal materializa-se pela primeira vez em um projeto político sob

os auspícios da autocracia burguesa, e não dentro das regras do jogo formal da democracia representativa”. Outro elemento que merece ser destacado pelo autor é o uso da coerção, que foi decisivo na conversão “do neoliberalismo de uma ideologia para uma estratégica política das classes dominantes”, que estavam preocupadas com as sequelas da crise (idem, p. 231). O processo de expansão e legitimação do neoliberalismo, em nível global, não ocorre simploriamente somente a partir da adoção das recomendações do Banco Mundial ou do Fundo Monetário Internacional. Ocorre justamente o inverso, tendo em vista que a diversidade das contradições e resistências de determinadas realidades nacionais. As ideias motrizes da doutrina neoliberal demoraram a se concretizar como um consenso, vindo acontecer apenas na década de 1990 com o Consenso de Washington (CASTELO, 2011, p.232).

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uma classe sobre a outra. Para que o Estado pudesse eliminar a sociedade de classes ele teria que extinguir a si próprio.

Com esse entendimento sobre o papel do Estado, podemos inferir que na conjuntura de crise estrutural do capital, surgida após os anos 1970, o Estado encontra-se no centro desta crise, como também é responsabilizado por ela. Os argumentos utilizados são a culpabilização do Estado nos gastos sociais excessivos, que seriam um dos motivos da crise. A proposta trazida é a redução nos custos dos gastos sociais, para manter a ordem e o equilíbrio da economia. No entanto, na análise de Paniago (2012) em período de crise estrutural do capital a atuação do Estado “torna-se ainda mais importante, comprometendo-se com a própria sustentação direta de atividades de produção e circulação de valor” (PANIAGO, 2012, p. 61). Ainda que se propague o discurso de defesa da redução das ações do Estado, no intuito de favorecer a ação do mercado na recomposição do crescimento econômico, o que se constata é o fluxo contrário. O Estado é mais requisitado se fazendo presente por meio “das políticas de incentivos fiscais, subsídios de toda ordem, financiamentos com taxa de juros reduzida e investimentos necessários para a estabilização do sistema como um todo. Essa tendência tem se acentuado com a crise estrutural” (idem, p. 62).

Na análise de Castelo (2011, p. 229) até a década de 1970, o neoliberalismo ainda se constituía em uma doutrina ideológica sem grande força substantiva “pois não havia se materializado em mandatos políticos ou sido incorporado como teoria das massas via um projeto hegemônico das classes dominantes”. As condições propícias para a difusão do neoliberalismo, incialmente em países como a Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha, foram dadas no fim da década de 1970, em meio à crise do capital. Para os neoliberais, a crise da