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Gêneros emergentes no meio virtual

No documento INGUAGEM EM SITUAÇÃO DE TRABALHO (páginas 39-52)

1.2 Estudos sobre Linguagem

1.2.1 Práticas Discursivas na Internet

1.2.1.4 Gêneros emergentes no meio virtual

Antes de comentar sobre os gêneros propriamente ditos, Marcuschi (2010) defende a idéia de Patrícia Wallace sobre os ambientes virtuais, segundo a qual há seis ambientes da

Internet que constituem entornos com características próprias, a saber: ambiente web (Word

Wide Web ou www); ambiente e-mail (correio eletrônico); foruns de discussão assíncronos; ambiente chat síncrono; ambiente mud; ambientes de áudio e vídeo (videoconferências). Logo, pode-se afirmar que a Internet é um ambiente heterogêneo, que abriga diversos gêneros, permitindo variadas “culturas”.

Marcuschi lista alguns gêneros desse ambiente virtual, dentre eles, o e-mail, os variados tipos de chats, a videoconferência, a lista de discussão e o weblog; sendo que os mais

praticados até o momento da sua pesquisa eram os e-mails e os chats. Independentemente do gênero, a comunicação se dá pela linguagem escrita, aliás, pelo intenso uso da escrita; porém, é uma escrita com certa informalidade, menor monitoração e cobrança, em função da fluidez do meio e da rapidez quanto ao tempo.

A caracterização desses gêneros emergentes se dá pela “transmutação” de outros gêneros pré-existentes: por exemplo, o gênero e-mail tem como contraparte os gêneros carta pessoal / bilhete / correio; o gênero chat reservado tem relação com conversações duais (casuais). De qualquer forma, esses gêneros emergentes têm características próprias, mas pertencem ao mesmo conjunto de gêneros, como uma constelação e, devem ser analisados especificamente.

Particularmente, entendo constelação como um conjunto de gêneros que são irmanados pela relação genética que existe entre eles, ou seja, todos pertencem à mesma família e, por isso, são variedades de um único gênero que, por ser complexo, atende a propósitos comunicativos distintos e não a subpropósitos. Assim é o que acontece com gêneros como a carta (carta pessoal, carta de apresentação, carta de demissão, etc.), a entrevista (entrevista jornalística, entrevista médica, etc.), a aula (aula expositiva, aula participativa, aula seminário, etc.), etc. (ARAÚJO, 2004, p.05).

I. Chat

É uma conversa/conversação20 informal teclada em tempo real através da Internet. Caracteriza-se como uma escrita abreviada e os usuários de Internet usam um código discursivo escrito complexo (alfabético, semiótico, logográfico), em que simultaneamente misturam alfabeto tradicional, caretinhas (emoticons), scripts, etc. para “conversar” teclando, portando, escrevendo. Trata-se de um novo código discursivo e cultural, espontaneamente construído, que se caracteriza como um conjunto de recursos icônicos, semióticos, logográficos, tipográficos e telemáticos.

20 Troca de palavras, de idéias entre duas ou mais pessoas sobre assunto vago ou específico; pode ser informal

ou formal. É simétrica, pois pressupõe o mesmo direito à palavra por parte de todos os participantes da conversação. Nesse sentido, difere da entrevista, que é assimétrica. A conversação é presencial, se dá face a face, ou seja, é síncrona espacial e temporalmente. Nesse aspecto, também difere da conversa mediada por telefone (conversa telefônica) ou computador, via internet, em que o tempo é o mesmo, mas os espaços dos interlocutores são diferentes. Esses tipos de conversação possuem características próprias, constituindo-se gêneros diferentes. Contudo, esses atos de fala são mediados pelo diálogo, a forma canônica da conversação (COSTA, 2009).

Os chats surgiram na Finlândia no verão de 1988, quando Jarkko “WIZ” Oikarinen escreveu o primeiro IRC (Internet Relay Chat), na universidade de Oulu, com o objetivo de estender os serviços dos programas BBS (os e-mails de então) para comunicações em tempo real.

Com peculiaridades distintas dos e-mails, como o caráter síncrono e a simulação da relação face a face, os chats são produções escritas no formato de diálogo, em uma sequência imediata, de retornos rápidos, com o sistema de seleções de parceiros. As contribuições são em geral curtas não indo além de umas poucas linhas, no entanto podem chegar a textos maiores.

Há vários tipos de chat, cada um com suas peculiaridades. Por exemplo: há o chat privado e reservado, também com as mesmas características dos bate-papos, mas a diferença está no fato de os indivíduos interagirem em particular, podendo até isolar-se dentro da sala, a partir da escolha exclusiva de um parceiro.

Figura 4: A organização constelar do Gênero Chat (Fonte ARAÚJO, Anais da XX Jornada – GELNE)

Atualmente, há uma grande diversidade de teorias para conceituar gêneros. Aquelas que privilegiam a forma ou a estrutura estão ultrapassadas, tendo-se em vista que o gênero é essencialmente flexível e variável como a linguagem. Assim como a língua varia, também os gêneros variam, adaptam-se, renovam-se e multiplicam-se.

Conforme já exposto, há diferença entre os gêneros textuais e discursivos. O primeiro foi explanado à luz de Marcuschi (2010), que afirma ser o chat um gênero emergente, no caso, textual. Para estudarmos o estatuto discursivo do chat, faz-se necessário, estabelecer o gênero a partir de agora, como discursivo, conforme Maingueneau (2004).

Já a proposta de Maingueneau (2010), discutida no capítulo Hipergênero, gênero e

internet, busca compreender a razão pela qual as produções da Web são sempre resistentes à clássica concepção de gênero na Análise do Discurso. Para tanto, o autor realizou uma distinção entre os vários “modos” de genericidade em relação aos componentes da cena de enunciação (cena englobante > cena genérica > cenografia), bem como às principais formas de textualidade.

A concepção clássica de gênero, que não leva em consideração a internet, foi estruturada por uma dupla hierarquia: a hierarquia dos suportes materiais e a hierarquia dos componentes da cena de enunciação. [...] Na internet, a situação é diferente [...] As coerções genéricas estão se tornando mais fracas. Isso pode ser explicado pelo fato de que na internet todas as unidades comunicacionais são da mesma ordem (elas são “websites”), submetidas a uma larga escala de restrições técnicas; a necessidade de circular de site para site reforça sua homogeneização [Grifo meu] (MAINGUENEAU, 2010, p.132).

É notório que a noção de gênero, do ponto de vista sociodiscursivo, é imprescindível na AD, pois

Refletir sobre eventos sociais sem levar em consideração os textos – orais ou escritos – que esses eventos tornam possíveis (redução sociológica), ou refletir sobre textos sem levar em consideração os eventos sociais dos quais eles participam (redução linguística), significaria que o discurso não é considerado do ponto de vista da análise do discurso (MAINGUENEAU, 2010, p.129).

Maingueneau trabalhou a questão dos gêneros em dois momentos teóricos. No primeiro (2001), defende que um gênero do discurso (termo usado por ele) não se limita apenas à organização textual, embora seja um de seus elementos. Há outras características, igualmente pertinentes e definidoras: finalidade, lugar e momento, suporte material (televisão, diálogo, rádio, jornal), estabelecimento de parceiros coerentes com a situação (o autor chama de parceiros legítimos). Nesse último caso, acrescenta que o enunciador e o co-enunciador travam um contrato comunicativo, uma espécie de jogo, e que exercem papéis definidos na situação comunicativa. Um médico atendendo a um paciente, por exemplo. A pessoa enferma está no consultório para tratar-se de alguma moléstia (finalidade). Era esperada no consultório ou no hospital (lugar e momento). O canal é o diálogo oral (correspondente ao suporte material). O fato de um ser médico e outro, paciente, torna a situação coerente. Um exerce, ali, o papel de autoridade de saúde; o outro, de enfermo. É um acordo pressuposto, não declarado (contrato que faz parte do jogo comunicativo).

Maingueneau assume o gênero do discurso atrelado a uma cena enunciativa. Para ele, a situação de comunicação funciona tal qual uma encenação. São três as cenas:

Cena englobante - É a que define o tipo de discurso a que pertence a situação comunicativa. Pode ser, por exemplo, religioso, político, publicitário, acadêmico, empresarial.

Cena genérica - É o gênero do discurso a que pertence a situação de comunicação. A cena genérica, aliada à englobante, define o quadro cênico do texto. Por exemplo, para a cena englobante acadêmica, podemos falar em cena genérica como sendo esta dissertação.

Cenografia - É a forma como o quadro cênico é transmitido. Em outras palavras: é a própria cena da enunciação. Retomando o exemplo acima, a cenografia é o próprio curso stricto sensu de mestrado.

As três cenas podem ocorrer ao mesmo tempo. Maingueneau afirma que há uma tensão, um conflito entre elas. O resultado dessa articulação emerge no texto. Um exemplo do autor torna mais fácil o entendimento dos três conceitos: uma carta elaborada em 1988 pelo ex-presidente francês François Mitterand, então candidato à reeleição, publicada na imprensa. Um trecho dessa carta diz:

Meus caros compatriotas,

Vocês o compreenderão. Desejo, nesta carta, falar-lhes da França. Graças à confiança que depositaram em mim, exerço há sete anos o mais alto cargo da República. No final desse mandato, não teria concebido o projeto de apresentar-me novamente ao sufrágio de vocês se não tivesse tido a convicção de que nos restava ainda muito a fazer juntos para assegurar a nosso país o papel que dele se espera no mundo e para zelar pela unidade da Nação (MAINGUENEAU, 2001, p. 91).

Segundo o modelo de Maingueneau, a cena englobante é o discurso político, em que os parceiros interagem num espaço-tempo eleitoral. A cenografia é a da correspondência particular própria de uma carta. Para o autor, nem todos os gêneros permitem cenografias diferentes. Num extremo, há os textos que dificilmente permitem uma mudança na cena genérica, como uma receita médica. No outro extremo, estão os casos que permitem uma gama diferenciada de cenografias, caso, por exemplo, das publicidades, dos jingles, etc. Entre os dois polos estariam os gêneros que tendem a usar uma cenografia mais rotineira, como é o caso atual dos gêneros digitais.

Analisarei, especificamente, a cena englobante atendimento ao cliente – Web Call

Center e a cena genérica chat e falarei, pois, em atendimento chat para caracterizar um lugar de inscrição do sujeito do discurso. Esse lugar de inscrição apresenta condições específicas de enunciação, reguladas pela cena englobante Web Call Center e pela cena genérica chat, ou seja, pela composição do quadro cênico: chat em situação de trabalho.

Partindo dessa concepção de gênero, Maingueneau (2010) afirma que certas categorias como o “diálogo”, a “carta, o “diário”, dentre outras, não podem ser consideradas como gêneros de discurso, visto que para categorizar, por exemplo, um texto como diálogo, basta apenas escalar dois interlocutores, ou seja, há poucas restrições para sua existência. Podemos encontrar o diálogo, por exemplo, num artigo de jornal, em uma revista, num programa de TV, considerados gêneros discursivos. Logo, o “dialogo” está além do gênero, ou seja, podemos categorizá-lo como hipergênero.

Segundo Maingueneau (op cit., p.131), “Os hipergêneros não sofrem restrições sócio-

históricas: eles apenas “enquadram” uma larga faixa de textos e podem ser usados durante longos períodos e em muitos países”, ou seja, quando nos deparamos com duas pessoas

conversando na rua, seja na Washington St (EUA), seja na Rua Washington (SP/BR) ou em qualquer outro lugar, inferimos, então, que essas pessoas estão dialogando.

Assim, para conceituar o hipergênero, Maingueneau estuda as práticas comunicacionais na Internet, por meio de site de relacionamento - blog, afirmando que a Web, além de ser um lugar onde surgem novas formas de genericidade, permite também transformar as condições de comunicação e a própria noção de textualidade.

Maingueneau (2010), ao analisar as práticas comunicacionais pela internet, afirma que

A noção de hipergênero pode ser útil para estudar as práticas comunicacionais na internet. “Blogs”, por exemplo, não podem ser considerados gêneros. Na realidade, “blog” é uma categoria que atravessa categorias temáticas (pessoal, institucional, comercial, educacional...) e impõe rígidas restrições formais. Ele é uma espécie de hipergênero típico, cujas propriedades comunicativas são mínimas: alguém (com um nome próprio) fala sobre si mesmo (a) para alguém que esteja visitando seu website” [grifo meu] (MAINGUENEAU, 2010, p.131).

Logo, segundo Maingueneau (2010), todas as práticas comunicacionais na internet, são consideradas hipergênero, pois são categorias que atravessam outras categorias (pessoal, institucional, educacional, etc.); estão alocadas numa rede composta de websites, que são submetidos às restrições técnicas (TI, software, rede computacional, etc.). Um texto, como

blog, chat, email, dentre outros, uma vez enquadrado no website, não é possível que sofra muitas restrições; ou seja, há limites às restrições técnicas (tecnológicas). Como se fosse uma "colagem" num quadro: pode-se colar um "texto", mas não se pode ultrapassar as restrições técnicas ou parâmetros daquele quadro. Então, independentemente da prática comunicacional, o texto virtual, que já faz parte desse mundo da internet websites, não pode mais sofrer restrições específicas.

Na internet, a situação é diferente. (...) As coerções genéricas estão se tornando mais fracas. Isso pode ser explicado pelo fato de que na internet todas as unidades comunicacionais são da mesma ordem (elas são

necessidade de circular de site para site reforça sua homogeneização (MAINGUENEAU, 2010, p. 132).

Maingueneau (2010) conclui que fez distinção entre os vários "modos" de genericidade em relação aos componentes da "cena de enunciação" e, também que "podemos

compreender melhor a razão pela qual as produções da Web são resistentes à clássica concepção de gênero em AD" (p.138). Considera as práticas comunicacionais com um todo, a

website e a rede como uma homogeneização da circulação de sites para sites.

Esta dissertação não visa enxergar o todo, mas sim, a prática comunicacional numa categoria específica, no caso, institucional. Analisa e discute o chat em situação de trabalho, pois mesmo alocado num website, sofre restrições específicas decorrentes da situação de trabalho, que são indícios de um novo gênero.

A noção de gênero, do ponto de vista sócio-discursivo não é

refletir sobre eventos sociais sem levar em consideração os textos – orais ou escritos – que esses eventos tornam possíveis (redução sociológica), ou refletir sobre textos sem levar em consideração os eventos sociais dos quais eles participam (redução linguística), significaria que o discurso não é considerado do ponto de vista da análise do discurso (MAINGUENEAU, 2010, p.129).

Focado em seu objetivo, ou seja, compreender melhor a razão pela qual as produções da Web são resistentesà clássica concepção de gênero na Análise do Discurso, Maingueneau (2010, p.132) pressupõe que

A concepção clássica de gênero, que não leva em consideração a Internet, foi estruturada por uma dupla hierarquia: a hierarquia dos suportes materiais e a hierarquia dos componentes da cena de enunciação.

- Suporte: mídium > modos de comunicação do mídium > hipergênero > gênero.

O suporte também desempenha um papel fundamental na estabilização de um gênero. Podemos partir de três pressupostos: 1) as ferramentas (o computador, o teclado, os programas de interface); 2) o suporte (a tela); 3) os dispositivos (meios eletrônicos) que promovem certos recursos técnicos que nos permitem interagir num determinado discurso, por meio de comunicação, organização e construções textuais. “A mídia permite a

‘manifestação material dos discursos’ e, por esta razão, ao analisarmos determinados enunciados discursivos, é importante analisar as coerções que a mídia imprime ao discurso”

(MAINGUENEAU, 2001, p.71).

Ao analisarmos a “árvore de respostas – Chat Unidade Operacional” (ANEXO II) disponível no próprio midium do chat, temos a oportunidade de observar algumas coerções que a instituição imprime ao discurso. Por exemplo, quando o técnico consulta uma proposta eletrônica a pedido do corretor e percebe que a mesma ainda não está disponível no sistema, poderá utilizar a seguinte expressão já pronta: “Esta proposta está em processo de

comunicação, portanto está indisponível para análise neste momento. Peço que aguarde o retorno eletrônico para fazer nova comunicação e obter as devolutivas. Mais alguma consulta?”

Em outra situação, após o término do procedimento solicitado pelo corretor, o técnico de seguros sempre utiliza a expressão “Há outra informação em que eu possa ajudar?” e, em caso encerrado, o técnico informa “Obrigada por utilizar nossos serviços. Peço que clique no

botão ‘Fechar’ para encerrar a sua conexão.”

As mídias, principalmente as audiovisuais e as que advêm do desenvolvimento da informática, provocam uma verdadeira revolução na linguagem, alterando sensivelmente a maneira pela qual se produz e se recepciona o discurso, posto que “o modo de transporte e de

recepção do enunciado condiciona a própria constituição do texto, e modela o gênero do discurso. Muitas mutações sociais se manifestam através de um simples deslocamento midiológico” (MAINGUENEAU, 2001, p.72).

Levando em conta a diversidade genérica, Maingueneau (2004) propõe ainda classificar os gêneros do discurso em três grandes categorias: gêneros “autorais”, “rotineiros” e “conversacionais”, sugerindo, mais tarde, uma re-classificação dessas categorias.

As classificações dos gêneros, elaboradas principalmente por pesquisadores, devem lugar a múltiplas tipologias de acordo com os seguintes critérios: linguísticos, funcionais e

situacionais. Os linguísticos são fundados na enunciação, na distribuição estatística das marcas linguísticas e na organização textual. Outra classificação dos gêneros pode ocorrer a partir de critérios funcionais, como textos com intencionalidade lúdica, didática, etc. Os critérios situacionais, ou seja, o tipo de atores que estão implicados, as circunstâncias da comunicação, o canal utilizado, etc. também sugerem outra classificação para o gênero. Por fim, pode-se falar em tipologias discursivas, correspondendo à combinação desses três critérios apresentados.

Na AD, o gênero de discurso é geralmente definido a partir de critérios situacionais. A área teórica aponta, de fato, “dispositivos de comunicação sócio-historicamente definidos e

elaborados, de modo geral, com a ajuda de metáforas tais como as de ‘contrato’, ‘ritual’, ou ‘jogo’. Assim, fala-se de ‘gêneros de discurso’ tendo por base um jornal, uma conversação, um programa de televisão, uma dissertação, etc.” (MAINGUENEAU, 2004, p.45). Esses gêneros são caracterizados por certos parâmetros, como os papéis dos participantes, seus objetivos, seu mídium, seu enquadramento espaço-temporal, o tipo de organização textual, dentre outros.

Maingueneau (2001) defende a idéia de que um gênero do discurso não se limita apenas à organização textual, embora seja um de seus elementos. Afirma, pois, que há outras características, igualmente pertinentes e definidoras:

a) a determinação correta de uma finalidade contribui para que o alocutário produza uma resposta esperada, ou seja, torne-se um co-enunciador;

b) a identificação dos co-enunciadores, com papéis específicos para cada um, como parceiros legítimos de um determinado gênero em comum;

c) a identificação de um lugar e um momento legítimos, que se embasam na periodicidade, no encadeamento, na continuidade deste e na validade;

d) a existência de um suporte material adequado às finalidades do gênero escolhido para o ato de comunicação;

e) a forma correta de organização textual, ou seja, saber utilizar os modos de encadeamentos dos constituintes de um gênero, tendo em vista a linguística textual.

Essas características resumem-se ao que Maingueneau defende como a cenografia como espaço discursivo da enunciação, ou seja, não é somente um quadro ou um cenário; a

cenografia é a enunciação que, ao se desenvolver, valida progressivamente o seu próprio dispositivo de fala. Logo, a categoria de gêneros não é estática, podendo sofrer coerções sócio-históricas, ou seja, os gêneros evoluem com a sociedade.

Maingueneau (2004) distinguiu três regimes de genericidade: gêneros “autorais”, “rotineiros” e “conversacionais”. O primeiro trata de gêneros determinados pelo próprio autor e eventualmente por um editor. Esse tipo de gênero está presente em alguns tipos de discursos, como literário, filosófico, religioso, político, jornalístico, dentre outros. “Atribuindo

a certa obra uma determinada etiqueta genérica, indica-se como se pretende que o texto seja recebido, impõe-se um quadro para a sua atividade discursiva.” (Idem, p.46). Os gêneros

“rotineiros” são, basicamente, aqueles presentes no cotidiano e podem ser ritualizados como um texto de horóscopo, por exemplo, que apresenta variação mínima, ou podem apresentar grande espaço para variações individuais, como matérias jornalísticas.“São os que melhor

correspondem à definição de gênero de discurso, visto como dispositivo de comunicação e definido em uma perspectiva sócio-histórica”. E, por último, os gêneros “conversacionais” possuem uma composição e temática mais instáveis, além de estratégias de ajustamento e de negociação entre os interlocutores (Idem, p.47).

No entanto essa tripartição, mesmo apoiando-se sobre fatos indiscutíveis, despertou diversos problemas, mas não iremos aqui levantá-los por não ser o foco neste trabalho. Maingueneau realizou uma re-classificação dessa tipologia, gerando somente dois regimes de genericidade: o regime dos gêneros conversacionais e o dos gêneros denominados instituídos, que reagrupam os gêneros “rotineiros” e “autorais”.

Debruçando somente sobre o grupo de gêneros instituídos, Maingueneau (2004) propõe distinguir quatro modos dentro dessa genericidade, a fim de focar toda a sua diversidade genérica de acordo com a relação que se estabelece entre “cena genérica” e “cenografia”. Conforme já comentado, pelo menos no que tange à “cenografia”, ambas pertencem à “cena de enunciação”, podendo ser distinguida a partir de três possibilidades: a

cena englobante, a cena genérica e a cenografia. Juntas, elas compõem um quadro dinâmico que torna possível a enunciação de um determinado discurso.

Ambas as cenas definem conjuntamente o que Maingueneau chama de quadro cênico do fragmento do discurso. É esse quadro que define certo espaço estável, o do tipo e do

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