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INGUAGEM EM SITUAÇÃO DE TRABALHO

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Academic year: 2018

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RÁTICAS DE

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INGUAGEM EM SITUAÇÃO DE TRABALHO

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:

UM NOVO GÊNERO DIGITAL

Dissertação apresentada como exigência parcial

para obtenção do título de MESTRE em

Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem à

Comissão Julgadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, sob a orientação da Profª

Drª Maria Cecília Pérez de Souza-e-Silva.

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BANCA EXAMINADORA

_____________________________________

Profª Drª Maria Cecília Pérez de Souza-e-Silva

_____________________________________

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(4)
(5)

Primeiramente a Deus, Luz de todo conhecimento e sabedoria. Agradeço-te,

meu Senhor por todas as bênçãos em minha vida, inclusive por esta!

Agradeço-te por confiar e acreditar em mim. Obrigada!

À Profª Drª Maria Cecília Pérez de Souza-e-Silva, pela confiança em mim e no

meu trabalho, pela competente orientação e pelo incentivo, principalmente nos

momentos mais desafiantes.

À querida Maria Otília Guimarães Ninin pelo apoio, pelo carinho, pela amizade,

pela confiança depositada em mim e em meu trabalho. Obrigada por ter tornado

meu trabalho possível com sua valiosa ajuda.

À Profª Drª Kathryn Marie Pacheco Harrison, pela ajuda, pelas considerações

feitas em meu trabalho, pela amizade e carinho.

À Profª Drª Vera Lúcia de Albuquerque Sant’Anna pelo importante “outro

olhar”, pelas preciosas contribuições, pela amizade e carinho.

Aos colegas do grupo ATELIER Linguagem e Trabalho, em especial, Inês

Ortranto, Marília Rodrigues e Silma Mendes, que me ajudaram nos momentos

mais difíceis desse processo, pelas trocas enriquecedoras, que proporcionaram o

meu crescimento como pesquisadora. Obrigada pelo carinho, atenção e amizade

de todos.

A todos os professores do curso, pelos ensinamentos, confiança e estímulo.

À Maria Lucia e Márcia, pelo carinho com que tratam a todos os alunos,

indistintamente.

Aos meus familiares, obrigada pelo amor, pelo carinho, pela compreensão, pela

paciência, pelo incentivo e apoio de sempre.

Aos meus pais, Aurelino e Dalia, pelo amor incondicional, pela compreensão,

pelo apoio, pelo conforto de tê-los sempre ao meu lado.

(6)

deste trabalho.

À amiga Ana Paula Mariano, coordenadora da unidade na qual trabalhei, na

seguradora pesquisada, pela disponibilidade em compartilhar saberes e

experiências, pela compreensão, pelo carinho, pela amizade. Obrigada “Aninha”

pelo seu apoio inestimável.

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Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão

(8)

Algumas empresas têm instituído, ao lado dos Call Center, intitulados atualmente de Web Call Center, o chat como uma nova modalidade de atendimento agente-cliente, visando, sobretudo, ao aumento da produtividade e engajamento com a nova tecnologia. Considerando essa nova atividade de trabalho, esta pesquisa, pautada em metodologia qualitativa, de base epistemológica interpretativista de observação, teve como objetivo investigar e analisar interações ocorridas em situação de atendimento ao cliente, via chat, para compreender as características das práticas discursivas nesse contexto. Nesse sentido, procurou responder a duas questões: Qual(is) a(s) característica(s) da situação de trabalho das atendentes do Web Call Center? Qual o estatuto discursivo do chat em situação de trabalho? Do ponto de vista teórico, recorreu aos estudos da linguagem - mais especificamente às contribuições de Marcuschi (2010), que considera o chat como gênero, e de Dominique Maingueneau (2001), que o vê como hipergênero - e aos estudos do trabalho, mais especificamente à Ergologia, entendida como um modelo teórico-metodológico inovador para abordar a atividade de trabalho (Schwartz, 1997, 2006). O corpus considerado para análise constituiu-se de registros de atendimento ao cliente por meio do chat, entre técnicos de seguros na função de agentes de atendimento de uma Seguradora Nacional e, seus clientes - corretores de seguros. Por meio da análise e discussão desses registros, concluiu-se que o chat em situação de trabalho sofre várias coerções que permitem caracterizá-lo como gênero. Ficaram claras também as várias renormalizações feitas pelas atendentes, as quais indicam a dialética entre os saberes instituídos, isto é, as normas que antecedem a atividade, e os saberes investidos, a experiência advinda da prática.

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Some companies have been offering online chats named as Web Call Centers besides traditional Call Centers. This is a new tool for communication between companies and clients which aims for more productivity and commitment. Considering this new work activity and through qualitative methodology and epistemological interpretative orientation, this research examines onlinechat interactions to understand the characteristics of the discursive practices in this given context. This work has looked for answering two major questions: what are the characteristics of the situation of work of Web Call Center attendants?; and what is the discursive status of the online chat in this work situation? Theoretically, we have recurred to language studies that consider online chats as a genre, specifically Marchurschi’s contibutions (2010). We have also recurred to language studies that consider online chats as a hypergenre like Dominique Maingueneau’s work (2001) – and, we have recurred to studies of work, specifically Ergology, which is considered an innovative theory to approach work activities (Schwartz, 1997, 2006). The corpus considered in the analysis consists of registers of online

chats in customer service with interactions between insurance technicians as attendants and their clients who were insurance agents. By doing the analysis of these registers and by discussing them, we have come to the conclusion that in work situation the online chat goes under coercion that allows us to classify it as a genre. Some other aspects were revealed in the study as well, such as the normalization, done by the attendants, that points to the dialectics among the instituted pieces of knowledge, i. e., the rules that precede the activity, and the invested knowledge, the experience that comes with practice.

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Figura 1 - Dispositivo Dinâmico de Três Pólos (DD3P)? 11

Figura 2 - Primeiro mapa lógico da ARPANET 19

Figura 3 - INTERNET - Um fenômeno dos Anos 1990 21

Figura 4 - A organização constelar do Gênero Chat 28

Figura 5 - Contexto de pesquisa – espaço de atendimento Web Call Center 52

Figura 6 - Organograma Superintendência de Atendimento 57

Figura 7 Prédio Call Center 58

Figura 8 - Convite: Monitoria 61

Figura 9 - Tela: WorkCenter 62

Figura 10 - Tela inicial do atendimento chat para o técnico de seguros 63

Figura 11 - Tela do Corretor online (COL) 64

Figura 12 - Tela atendimento chat (1) 65

Figura 13 - Tela atendimento chat (2) 77

Figura 14 - Fragmento da Tela de atendimento (1) 88

Figura 15 - Primeira página Web Corretor online 91

Figura 16 - Primeira página do atendimento online chat para o corretor 92

Figura 17 - Atendimento online chat pelo corretor 93

Figura 18 - Última página do atendimento online chat para o corretor 94 Figura 19 - Sistema Tutorial do Ambiente Virtual de Aprendizagem 108

Figura 20 - Cursos Web Aula 108

Quadro 1 - Quadro comparativo chat em “bate-papo” (Web) e chat em situação de trabalho (Web)

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COL - Corretor online

SUSEP - Superintendência de Seguros Privados

PPW - “Primícia” Print Windows

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INTRODUÇÃO 01

CAPÍTULO I: Fundamentação Teórica 05

1.1 Estudos sobre Trabalho 06

1.2 Estudos sobre Linguagem 13

1.2.1 Práticas discursivas na Internet 17

1.2.1.1 Enunciação digital: a Internet 18

1.2.1.2 Linguagem na web e tecnologia 23

1.2.1.3 Comunidades virtuais 25

1.2.1.4 Gêneros emergentes no meio virtual 26

1.2.2 Tecnologização do discurso e suas características 41 1.2.2.1 Emergência de “tecnólogos do discurso” especialistas 43 1.2.2.2 Mudança no “policiamento” de práticas discursivas 43 1.2.2.3 Formulação e projeção de técnicas discursivas livres de

contexto

44

1.2.2.4 Simulação estrategicamente motivada do discurso 44 1.2.2.5 Pressão para a padronização de práticas discursivas 45 1.2.3 Tecnologização do discurso e processos de mudança mais amplos 45 1.2.4 Tecnologização do discurso e mudanças na “cultura do trabalho” 46

1.2.5 Impacto nas práticas discursivas 47

CAPÍTULO II: Metodologia 51

2.1 Contexto da Pesquisa 51

2.2 Procedimentos de Pesquisa e Coleta de Dados

CAPÍTULO III: Análise e Discussão de Dados 68

3.1 Registros de Atendimento na Perspectiva do Trabalho 68

3.2 Registros de Atendimento na Perspectiva Discursiva 74

3.2.1 Perspectiva de Marcuschi 75

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3.2.2.3 O lugar e o momento legítimos 86

3.2.2.4 Um suporte material 90

3.2.2.5 Uma organização textual 95

CONSIDERAÇÕES FINAIS 112

REFERÊNCIAS 114

GLOSSÁRIO 117

ANEXOS 121

Anexo I: Manual de Políticas e Normas Corporativas – Política de Atendimento – 03/07

121

Anexo II: Script: “Árvore de Respostas” 124

Anexo III: Entrevista 129

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INTRODUÇÃO

Atualmente, em função das profundas mudanças organizacionais ocorridas no meio empresarial, devido ao impacto dos avanços tecnológicos no mundo do trabalho, as empresas vêm promovendo um acentuado crescimento em busca de excelência no atendimento e, para isso, partem à procura de inovações e vantagens competitivas e da habilidade de atender, de modo diferenciado, às demandas da clientela (GORDON, 1998). Assim, as características mais valorizadas por essas empresas, nos seus atendimentos, têm sido os discursos chamados pragmáticos, ou seja, aqueles embasados no conhecimento de mundo, na iniciativa, na visão estratégica e, principalmente, na habilidade de interação dos funcionários contratados.

Considerando-se o fato de ser este o tempo das mídias e linguagens eletrônico-digitais, das redes telemáticas e das comunidades virtuais, acredito ser consideravelmente relevante recorrer aos estudos da linguagem para compreender os discursos que circulam em situação de trabalho, mais especificamente, nos Web Call Center, nomenclatura atualmente utilizada para designar os Call Center1 que utilizam a Web como forma de comunicação, seja por e-mail, chat ou outra modalidade da internet. Em vista disso, este texto, apresentado sob a forma de dissertação de mestrado, constitui-se como resultado de uma reflexão acadêmica associada a uma experiência real de trabalho.Nesse contexto, parece haver uma cumplicidade entre o pesquisador e os atendentes da seguradora, cujo relacionamento está pautado no “ser colega de trabalho”.

Nesse sentido, cabe destacar que esta pesquisa decorre da observação operacional de prestação de serviços - atendimento ao cliente, em ambiente Web Call Center de uma empresa situada na cidade de São Paulo, no segmento de seguros de automóveis. O presente trabalho é fruto de uma investigação científica realizada em uma conceituada seguradora nacional, tendo sido selecionado como campo de pesquisa a matriz da seguradora, uma das empresas que

1 Uma central de atendimento (Call Center em inglês) é composta por estruturas físicas e de pessoal, que tem por

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constituem a Corporação, com sede própria localizada em Campos Elíseos, no centro da cidade de São Paulo.

O corpus da investigação é constituído por dados coletados em observação de campo no Web Call Center e por registros do chat em situação de trabalho. Com base em tais coletas, serão levadas em conta as práticas linguageiras2 dos técnicos de seguros3, na função de agentes de atendimento da seguradora, para com seus clientes/parceiros de trabalho – corretores de seguros4.

Com o intuito de identificar a relevância desta pesquisa, recorri a outros trabalhos que pudessem contribuir para contextualizar e justificar sua existência. Foram encontrados artigos que discutem não apenas sobre o chat em “bate-papo” aberto e privado, mas também acerca de chat educacional. Há também, pesquisas que discutem a utilização do chat e de temas relacionados aos impactos da tecnologia no mundo contemporâneo, com foco nos estudos da linguagem e do trabalho, inseridas na área educacional, como a tese intitulada: “trabalhodoprofessor@chateducacional.com.br. Aportes para compreender o trabalho do professor iniciante em EaD”, de Tardelli (2006), que aborda as definições para o trabalho do professor em Educação a Distância, no âmbito do interacionismo sociodiscursivo.

Outros exemplos encontrados dizem respeito a pesquisas que discutem a utilização do

chat na área de “entretenimento” e “bate-papo”, tal como a de Araújo (2004), intitulada “A organização constelar do gênero chat”, que discute chat aberto, chat educacional e chat com convidado, investigando a organização das práticas discursivas no chat, considerado um gênero. Todavia, esse estudo está restrito aos chats em situação de “bate-papos” e entretenimento pela internet.

É relevante mencionar também que não foram encontrados trabalhos que discutem o

chat como gênero em situação de trabalho, tampouco pesquisas nas áreas de Linguística e

2 Segundo Charaudeau e Maingueneau (2008), práticas linguageiras indica uma “noção forjada a partir do

neologismo ‘atividade linguageira, introduzido pelo linguista Culioli nos anos 70. O termo foi introduzido juntamente com o de ‘formação linguageira’ por Boutet et al. (1976): “Nós propomos a idéia de uma formação linguageira, entendida como um conjunto regrado de práticas linguageiras, que as organiza segundo relações de força em práticas dominantes e práticas dominadas”. (2008, p.396-397).

3 Basicamente, é o profissional que analisa e aceita riscos em operações de seguros. Em nosso caso,

especificamente, são considerados somente os seguros no ramo de automóveis.

4 Basicamente, é um profissional do ramo securitário certificado, no Brasil, pela Escola Nacional de Seguros e

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Análise de Discurso (AD) que estudam o chat em situação de trabalho na área empresarial. Portanto, quero destacar não só a relevância deste trabalho, bem como sua contribuição aos estudos da linguagem, uma vez que o fato de investigar o discurso produzido nesse meio é importante para caracterizar uma atividade profissional em ascensão e um novo cenário mercadológico decorrente dos avanços tecnológicos.

Diante do exposto, a fim de cumprir com os propósitos desta pesquisa, que tem por objetivo investigar e analisar interações ocorridas em situação de atendimento ao cliente via

chat, para compreender as características das práticas discursivas nesse contexto, estabeleço as seguintes indagações:

Qual(is) a(s) característica(s) da situação de trabalho das atendentes do Web Call Center ? Qual o estatuto discursivo do chat em situação de trabalho?

Do ponto de vista metodológico, foram observados os seguintes procedimentos para a coleta dos dados: primeiramente, foi solicitada à coordenação do setor de chat da empresa, autorização para esta pesquisa de campo, formalizada posteriormente conforme registro no Comitê de Ética em Pesquisa da PUC-SP, sob o nº 113/2011. Em seguida foi apresentado o pré-projeto aos técnicos de seguros convidados a participar da investigação. Somente dois técnicos prontificaram-se e foram, então, selecionados pela coordenação dos registros de atendimento. Dessa forma, ficou acertada sua participação para a realização deste estudo, sendo quatro registros de cada técnico de seguros, atores do discurso.

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suporte mídium em um gênero discursivo e, ainda, para a noção de cenografia. Para considerações acerca da situação de trabalho, recorri a alguns aportes da Ergologia (Schwartz, 2004) tais como os explicitados por alguns de seus comentadores, em especial, Trinquet (2010).

O presente trabalho faz parte das investigações desenvolvidas pelo grupo de pesquisa Atelier Linguagem e Trabalho5 (CNPq) formado por pesquisadores de diferentes universidades (PUC-SP, PUC-RGS, UERJ, USP, UNISINOS, UNIRIO, UFF), os quais desenvolvem atividades de pesquisa direcionadas a três vertentes: a) estudo das práticas de linguagem em situação de trabalho; b) estudo dos discursos sobre o trabalho; c) estudo dos discursos que remetem à atividade de linguagem em diferentes contextos. O grupo está sediado no Programa de Estudos Pós-Graduados de Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL) da PUC/SP, sob coordenação da pesquisadora professora doutora M. Cecília Pérez de Souza-e-Silva.

Por fim, quanto à organização deste texto, além da Introdução, apresenta três capítulos, sendo o primeiro dedicado à fundamentação teórica, trazendo estudos da linguagem com foco na discussão de gênero e hipergênero, bem como acerca dos estudos sobre o trabalho, ancorados na ergologia, e o conceito de tecnologização do discurso; o segundo capítulo trata da contextualização do tema, abordando dados históricos e a descrição da empresa em estudo, descrição da atividade de trabalho dos agentes de atendimento e relato pessoal da pesquisadora; no terceiro, são apresentadas a análise e a discussão dos registros de atendimento de dois profissionais. Uma seção de considerações finais discorre sobre os resultados encontrados, bem como sobre novas perspectivas para o trabalho. Seções finais apresentam as referências bibliográficas, os anexos, contendo os registros coletados ao longo da pesquisa e um glossário com alguns dos termos utilizados em contextos Web Call Center.

5 Em 1997, formalizou-se um acordo Capes-Cofecub entre o grupo constituído pelas instituições acadêmicas

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CAPÍTULO I: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

É preciso ter em mente a diferença entre a Linguística Aplicada (LA) e a chamada linguística “pura”. Esta, basicamente, tem como objetivo descrever o funcionamento da língua e do discurso em uma dada situação de um determinado corpus. Já a LA implica o interesse por situações sociais, que solicitam uma intervenção de cidadania, por meio da linguagem.

A linguística aplicada nasceu, basicamente, como uma disciplina voltada para os estudos sobre ensino de línguas estrangeiras e, atualmente, configura-se como uma área responsável pela emergência de uma série de novos campos de investigação transdisciplinar, de novas formas de pesquisa e de novos olhares sobre o que é ciência.

Na verdade, estou indicando que esse foco transdisciplinar em contextos institucionais está redefinindo objetos novos de investigação em LA. Na redefinição desses objetos em contextos institucionais em que “pessoas reais” trabalham, amam, sofrem, aprendem, se envolvem nas malhas do discurso e, portanto, do poder - em resumo, se constroem e constroem os outros -, a relação entre poder, ética e pesquisa merece atenção especial (MOITA LOPES, 1996, p.09).

Logo, podemos afirmar que a LA faz uso não somente dos conhecimentos teóricos produzidos pela Linguística, mas, acima de tudo, dialoga com as descobertas de uma variedade de campos tais como a Antropologia, a Teoria Educacional, a Psicologia e a Sociologia, entre outros, para alcançar seus objetivos, mantendo, assim, uma forte característica multidisciplinar.

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Inicio os estudos sobre trabalho considerando os aportes teóricos ergológicos discutidos por Schwartz e Trinquet (2010), que analisam o trabalho como uma atividade realizada por sujeitos singulares. Em seguida, abordo os estudos da linguagem, focalizando, especificamente, a noção de gênero e hipergênero, segundo Marcuschi (2010), que afirma ser o chat um gênero textual; e segundo Maingueneau (2004), que analisa o chat como hipergênero.

O capítulo organiza-se, portanto, para discutir trabalho e linguagem, nas perspectivas apontadas acima.

1.1 Estudos sobre Trabalho

Nesta pesquisa, procurei identificar o gênero6 em situação de trabalho. É notório que o avanço da tecnologia7 tenha causado impactos no mundo do trabalho, sejam eles benéficos ou não; de qualquer forma, minha investigação vai ao encontro da mudança de estratégia em uma empresa conceituada no ramo de seguros de automóvel, que aproveitou o avanço da tecnologia para alavancar-se no mercado segurador. Informatizou os processos desde o modo de analisar e emitir as apólices de seguros até o atendimento ao cliente, desmembrando este último para um setor específico de Call Center, por meio de telefone (0800, 300fácil), por e-mail e, mais recentemente, por chat – objeto da minha pesquisa.

A complexidade da atividade humana levou-me também a focar os estudos da linguagem, no caso o chat como um dos gêneros da Internet, a partir da situação de trabalho. Essa complexidade conduziu-me aos estudos da ergologia, perspectiva científica e filosófica que tem como objetivo estudar o trabalho humano em todas as suas dimensões, propondo uma abordagem transdisciplinar que considera a atividade humana, em geral, e a atividade de trabalho, em particular.

6 Na seção Estudos sobre Linguagem discutirei com maior profundidade as terminologias gênero textual e

gênero discursivo.

7 Não é objetivo desta pesquisa analisar o impacto da tecnologia eletrônica na civilização contemporânea.

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Logo, para considerações acerca da situação de trabalho recorri a alguns aportes dos estudos ergológicos, tais como explicitados por alguns de seus comentadores, em especial, Trinquet (2010). Essa abordagem vem sendo desenvolvida por Yves Schwartz8 a partir da década de oitenta, apresentando-se como mais um meio para se pensar questões relativas ao trabalho.

Estudos nessa direção foram desencadeados pela necessidade de o linguista colocar sua prática em sincronia com as questões que interrogam o mundo do trabalho atual, como o desemprego, a formação profissional, o crescimento do setor de serviços, as restrições de orçamento no setor público, dentre outros.

No Brasil, parece-me que cabe à Linguística Aplicada contribuir para reverter tal situação e desvendar a linguagem como um componente essencial da ação nas atividades de trabalho [...] Só mais recentemente, e por meio de alguns grupos de pesquisa, entre os quais o nosso grupo ATELIER, as pesquisas estão se voltando para a natureza do trabalho que se realiza em diferentes situações (SOUZA-e-SILVA & ROCHA, 1999, p.01).

O foco no trabalho a partir dos estudos da linguagem iniciou-se, no Brasil, na década de noventa, com as trocas acadêmicas entre pesquisadores brasileiros e franceses9, cujas relações consolidaram-se por meio de acordos institucionais e interuniversitários entre esses países10.

A ergologia analisa o trabalho como uma atividade realizada por sujeitos singulares e, em especial no Brasil, vem dialogando com várias áreas do conhecimento, interessadas no estudo do trabalho como um agir tipicamente humano. Pesquisas em Linguística Aplicada,

8 Filósofo francês e principal precursor da abordagem ergológica. É professor de Filosofia na Universidade de Provence, foi membro do Institut Universitaire de France, publicou inúmeros artigos e livros, entre eles Expérience et Connaissances du Travail (1988), Travail et Philosophie: convocations mutuelles (1992) e Le paradigme ergologique ou un métier de Philosophe (2000).

9 Por meio do grupo de pesquisa ATELIER Linguagem e Trabalho (PUC/SP), cujos pesquisadores estão alocados na USP, UNISINOS, UFPe, UNIRIO UFMT e UCPel na França, por intermédio das equipes Analyse Plurisiciplinaire dês Situations de Travail (APST), Réseau Langage & Travail (l&T), Ergonomie de IÁctivité dês Professionnels de I`´Education (Ergape), Dymaniques Sociolangagières (Dyalang) e Clinique de I´Activité et de I´action.

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Educação, Sociologia, Psicologia, entre outras, começam a utilizar esse referencial teórico não como uma ciência associada, mas como um modo transversal de olhar o trabalho, tal que favoreça a subjetividade presente em cada trabalhador.

Assim, a atividade de trabalho de um atendente de Call Center pode ser estudada e investigada por meio dos aportes teóricos da ergologia, visto que cada atendimento é único e singular, envolvendo pessoas de conhecimentos e experiências distintas. Podemos afirmar que a ergologia busca transformar “os conhecimentos atuais e os métodos de pesquisa, em todos os domínios em relação à atividade humana de trabalho, quer seja no âmbito da pesquisa, da formação, da gestão, da prevenção dos riscos, etc.” (TRINQUET, 2010, p.95). Traz, portanto, um encontro de saberes e promove certo “desconforto intelectual”, noção chave da ergologia, que,

Em outras palavras, admite e aceita que não sabemos tudo e que nunca poderemos sabê-lo, quando se trata de agir sobre e com os humanos; que não há verdade imutável e definitiva; que nunca há somente uma maneira certa para fazer as coisas. Mas isso quer dizer também que jamais estamos seguros para tentar compreender, analisar e, sobretudo, normalizar ou enquadrar as atividades humanas. Que devemos sempre estar em dúvida e em situação de busca, pois, sempre há o imprevisto, o imprevisível, a energia livre e dinâmica (TRINQUET, 2010, p.100).

Fundamentada em um estudo de toda a atividade humana e, em especial, da atividade humana do trabalho, o objetivo da ergologia é

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Seu foco é colocar em diálogo a pluridisciplinaridade dialética dos saberes instituídos

(saber acadêmico, saber convocado para estabelecer o prescrito, conceitos, regras, coerções e normas) e dos saberes investidos (saber tácito presente na atividade).

A atividade, aí incluída a atividade de trabalho, é entendida, segundo a abordagem ergológica, como “um impulso de vida, de saúde, sem limite pré-definido, que sintetiza, cruza e nutre tudo aquilo que as diferentes disciplinas têm apresentado separadamente: o corpo/o espírito, o individual/o coletivo, o privado/o profissional, o fazer e os valores, o imposto/o desejado etc." (SCHWARTZ, 1997a, p.000). Em situação de trabalho, o ser humano confronta-se com os saberes instituídos e investidos: toda atividade de trabalho é sempre singular e historicamente datada e situada; logo, o indivíduo, ao exercer, de fato, sua atividade em situação de trabalho irá sempre renormalizar o que já está prescrito, a partir de sua competência e experiência. Por exemplo: um professor que planeja a sua aula, ao entrar em sala de aula, em algum momento precisará renormalizar o seu planejamento. Por mais que ele tenha estudado, tenha personalizado, para aquela disciplina, assunto, curso, alunos, no momento da situação de trabalho realizado contará não somente com os saberes instituídos, mas também com os investidos, para obter êxito em sua atividade.

A atividade humana está sempre em constante evolução em todos os lugares, não sendo jamais estática. Corresponde a uma capacidade especificamente humana, denominada por Schwartz (2004) de uso de si. É uma capacidade dos humanos voltada à utilização de si mesmos, como lhes convém, resultado de suas próprias escolhas para consigo, com os outros e com a vida social na qual se encontram engajados, ou seja, é a gestão dos valores que cada indivíduo possui.

É uma liberdade – que é perceptível por todo o mundo –, muito limitada pelas coerções inevitáveis, mas nunca há somente uma única melhor maneira de fazer as coisas. Pois, sempre há escolhas, por mais ínfimas que elas sejam. É isso que diferencia os seres humanos dos robôs, estes fazem sempre igual e tal como foram programados. Um robô não tem estado de alma, enquanto que um humano sempre hesita porque é consciente e pode escolher adaptar-se, atualizar e, portanto, inovar (TRINQUET, 2010, p.97) 11.

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Logo, há uma distância entre o trabalho prescrito, ou seja, aquele que foi normatizado por uma instituição, e o trabalho realizado ou real, aquele que efetivamente ocorreu na atividade de trabalho. Devido a essa distância, cria-se a chamada subjetividade do/no trabalho. É nesse momento que se expressa a individualidade de cada um, a personalidade e a história singular dos “executantes” da atividade de trabalho. O resultado desse “drama” é o que a ergologia nomeia de dramáticas dos usos de si.

Gerir a complexidade do trabalho implica as chamadas “dramáticas do uso de si”, isto é, em nossas escolhas cotidianas, entram em jogo, simultaneamente, os imperativos do setor econômico - produtividade, eficiência, manutenção do próprio emprego - e aqueles dos valores não econômicos: solidariedade, respeito, ética (SOUZA-e-SILVA, 2008a, p.4).

Trinquet (2010) caracteriza a metodologia do Dispositivo Dinâmico de Três Pólos (DD3P). Para tanto, define um pólo como “o lugar virtual onde se agregam, sintetizam-se e exprimem-se objetivos, competências, saberes e conhecimentos, interesses, etc., mais ou menos comuns, da realidade coletiva” (p.103).

O pólo dos saberes instituídos ou investidos refere-se a todos os conceitos, competências, habilidades e conhecimentos disciplinares acadêmicos e/ou profissionais. São todos os saberes necessários, exteriores e anteriores à situação de trabalho, ou ainda, saberes que estão em desaderência12 em relação à atividade. São os saberes que não estão em sintonia com o aqui e agora da situação de trabalho (TRINQUET, p.101).

O pólo dos saberes investidos na atividade remete à experiência prática e permanentemente recriadora (alusão à noção de uso de si de Schwatz) de saberes por meio do debate de normas, da competência adquirida pela atividade e/ou experiência e que não podem ser controlados pelos saberes instituídos.

O terceiro pólo é o pólo dos processos socráticos de duplo sentido; está relacionado ao processo de questionamento entre os diferentes representantes de cada pólo. Segundo o autor, essa interação entre os saberes precisa ser eficaz e construtiva. Para tanto, devem ser convocados tanto os saberes acadêmicos como os saberes da experiência, num processo de

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duplo sentido, em que todos participam das perguntas e das respostas às situações problematizadas.

Processo socrático de duplo sentido são situações em que não há somente Sócrates (aquele que sabe), que coloca as questões aos executantes (aqueles que estão na ignorância total e que buscam o saber), que devem responder, mas em que os “executantes” também colocam questões à Sócrates. Daí o duplo sentido. Portanto, é juntos que se deve buscar as respostas apropriadas que levem em conta tanto os saberes acadêmicos quanto os saberes de experiência (TRINQUET, 2010. p.99).

Tais saberes estão alocados em determinados lugares organizados no seio de um dispositivo dinâmico de três pólos (DD3P), respectivamente, o pólo dos saberes investidos na atividade, o pólo dos saberes instituídos e o pólo do questionamento, como eixo socrático13 em duplo sentido, em que a reunião dos diferentes protagonistas em torno da atividade laboriosa é essencial à organização e à adaptação do meio ambiente físico e social, conforme mostra o quadro abaixo:

Figura 1: Dispositivo Dinâmico de Três Pólos (DD3P) (Fonte: TRINQUET, 2010, p.104)

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Em suma, para a ergologia, toda e qualquer atividade de trabalho coloca em prática um saber pessoal que vai gerir a distância entre o prescrito e o realizado. Esse saber é resultado da história, da subjetividade, da singularidade da experiência humana. Advém da experiência profissional dos indivíduos e de sua inserção no meio social, familiar, cultural, etc. Também designado de saber investido,remete à gestão de toda a atividade de trabalho, assim como ao

saber instituído (erudito ou acadêmico), visto que ambos são indispensáveis para compreendermos toda situação de trabalho.

Na vertente do trabalho, há ainda, outros estudos direcionados especificamente ao mundo do telemarketing. Os pesquisadores Braga e Santana (2009) apresentam a formação de um novo proletariado, o infoproletariado, cuja imagem simbólica seria a do operador de telemarketing. Para eles, esse é um trabalhador sob controle absoluto, pois fica isolado em baias, impossibilitado de conversar com o colega ao lado; seu tempo é cronometrado para ir ao banheiro e para o lanche; é, geralmente, punido se não cumpre metas estipuladas pela instituição e, por fim, como na indústria fordista, faz um trabalho prescrito e repetitivo levado ao limite.

Infoproletariado ou ciberproletariado são termos que compreendem uma ampla gama de trabalhadores que floresceu nas últimas décadas a partir do aumento do uso da tecnologia da informação e da globalização. Esse duplo processo originou um tipo de proletário contraditório, que é moderno porque usa tecnologia avançada, mas é atrasado porque herdou condições de trabalho vigentes no início do século 20.

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1.2 Estudos sobre Linguagem

Como já mencionado, umas das preocupações dos estudiosos da linguagem tem sido com a questão do gênero. Na pesquisa aqui discutida, além de identificar o gênero em situação de trabalho, procurei visualizar qual o impacto da tecnologia no mundo mercadológico, em especial, na empresa onde trabalhava naquele momento. Pude identificar que o ramo de seguros de automóvel, foco dos trabalhos desenvolvidos no departamento ao qual tinha acesso, sofreu algumas mudanças14 e, no setor de atendimento ao cliente, a implantação de um Call Center foi um marco divisor para novas estratégias processuais e operacionais daquela Cia.

Nessa nova realidade, muitas empresas e corporações, em busca da excelência no atendimento aos seus clientes, procuram investir significativamente no emprego de soluções tecnológicas nos canais de comunicação de atendimento, tais como a utilização de e-mail, os números 0800 e, sobretudo o chat, possibilitando o surgimento de um gênero voltado à

Internet no cenário mercadológico.

Entrando nesse cenário, pela vertente da AD, a investigação científica restringiu-se ao ambiente virtual, em especial ao chat, para compreender o conceito de gênero e hipergênero na Internet, a fim de tentar encontrar respostas para as seguintes indagações, apontadas nesta dissertação: Qual(s) a(s) característica(s) da situação de trabalho das atendentes do Web Call Center? Qual o estatuto discursivo do chat em situação de trabalho?

Para tanto, os estudos de linguagem voltados à questão do gênero, especificamente do

chat, terão como base teórico-metodológica formulações da Linguística Textual, mais especificamente as contribuições de Marcuschi (2010), que propõe o chat como um novo gênero digital, por sua caracterização de hipertexto (texto-som-imagem); e também da Análise do Discurso, na perspectiva enunciativa, mais especificamente, as contribuições de Dominique Maingueneau (2001), que assume o chat como hipergênero. Ambos os autores, no entanto, consideram o chat em bate-papo e entretenimento. Para esclarecer esse ponto,

14 No capítulo metodológico, seção Contexto de pesquisa, apresento detalhes sobre as mudanças ocorridas na

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explano, a seguir, o chat em situação de trabalho, com destaque para as noções de gênero e a importância da utilização do suporte mídium nos meios de comunicação.

Partindo primeiramente da noção de gênero, tendo em vista ter sido iniciada na poética e retórica grega, sua concepção ainda é relativamente recente e o conceito tem sido utilizado para descrever inúmeros tipos de enunciados engendrados em sociedade. Podemos afirmar que gêneros são dispositivos de comunicação condicionados aos critérios situacionais sócio-históricos, como o papel dos participantes, a organização textual, o tempo, o lugar, dentre outros. Nessa perspectiva, vale destacar o significado de mídium:

o mídium não é um simples “meio” de transmissão do discurso, mas ele imprime certo aspecto a seus conteúdos e comanda os usos que dele podemos fazer. [...] (ele) não é um instrumento para transportar uma mensagem estável: uma mudança importante do mídium modifica o conjunto de um gênero de discurso (MAINGUENEAU, 2001, p.71).

Para discutir a noção de gênero, faz-se necessário diferenciar os conceitos de gênero textual e gênero do discurso. Basicamente, gênero textual corresponde à diversidade de textos que ocorrem nos ambientes discursivos de nossa sociedade, os quais são materializações linguísticas textualizadas de discursos, com estruturas relativamente estáveis:

[...] os gêneros textuais surgem, situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem. Caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais do que por suas peculiaridades linguísticas e estruturais. São de difícil definição formal, devendo ser contemplados em seus usos e condicionamentos sócio-pragmáticos caracterizados como práticas sócio-discursivas. Quase inúmeros em diversidade de formas, obtêm denominações nem sempre unívocas e, assim como surgem, podem desaparecer (MARCUSCHI, 2002, p.19).

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envolvendo enunciadores (enunciador e co-enunciador). Como exemplo, podemos citar o discurso judiciário, político, educacional, acadêmico, religioso, familiar, etc.

De acordo com Maingueneau (2001, p.66-68), um gênero do discurso submete-se a certas condições de êxito, como: uma finalidade reconhecida pelo co-enunciador; o estatuto de parceiros legítimos (enunciador/co-enunciador(es)); o lugar e o momento legítimos; uma organização textual típica. Essas condições serão discutidas posteriormente, no capítulo de análise e discussão dos resultados.

É notório que sempre que nos manifestamos linguisticamente, o fazemos por meio de textos. Cada produção textual, oral ou escrita, realiza um gênero porque é um trabalho social e discursivo. Os gêneros textuais existem como mecanismos organizacionais das atividades sociocomunicativas do dia a dia, caracterizando-se como eventos textuais maleáveis e dinâmicos.

Os usuários de uma língua têm certa consciência da existência da diversidade desses gêneros e são capazes de reconhecer certo número deles e de nomeá-los de forma mais ou menos comum (por exemplo: sabemos reconhecer que o texto que temos em mão é um romance, ou uma notícia, ou uma carta, uma novela, etc.).

Cada esfera de atividade social – medicina, direito, arte etc. – tem seus próprios gêneros. Na área do Direito temos gêneros como a petição inicial, a sentença, o recurso, o parecer, enquanto na área da Medicina temos as receitas, as bulas, os diagnósticos de exames laboratoriais, etc. Entretanto, embora em um determinado momento histórico os gêneros tenham certa estabilidade, isto é, certa forma constante de se concretizar, eles também se modificam constantemente, de acordo com as mudanças sociais e com os instrumentos novos que vão surgindo; alguns desaparecem, outros se modificam e outros surgem.

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(transformação do gênero carta); o chat (transformação do gênero diálogo/conversação); o

twitter (transformação do gênero mensagem/bilhete); e o blog (transformação do diário).

Segundo Marchushi (2010), a existência de bate-papos por escrito em tempo real,

fóruns eletrônicos de discussão, comunidades virtuais, e-mails, simultaneidade de textos, sons e imagens, dividindo um mesmo espaço de interpretação (hipertexto), corresponde aos usos de configurações textuais que poderíamos chamar de gêneros digitais.

No mundo empresarial, por exemplo, o impacto da tecnologia teve como uma das consequências a busca constante de soluções rápidas e eficazes, possibilitando o surgimento dos gêneros digitais, em especial o chat. Esse novo gênero permite que enunciador e co-enunciador comuniquem-se em tempo real, seja numa sala de bate-papo, seja numa sala de aula virtual, ou até mesmo num ambiente empresarial, provocando um diálogo escrito, mas com indícios fortes de oralidade.

Geralmente, os indivíduos apóiam-se nos conhecimentos de gêneros textuais já consolidados para a apropriação de novos gêneros emergentes. Considera-se gênero um texto concreto, histórica e socialmente constituído, com padrões de uso recorrentes, culturalmente sensível, além de “relativamente estável do ponto de vista estilístico e composicional, servindo como instrumento comunicativo com propósitos específicos como forma de ação social” (MARCUSCHI, 2010, p.20). De acordo com o autor:

O gênero reflete estruturas de autoridade e relações de poder muito claras. Observe-se o caso da vida acadêmica e veja-se quem pode emitir um parecer, dar uma aula, confeccionar uma prova, fazer uma nomeação, defender uma tese de doutorado e assim por diante. Os gêneros são formas sociais de organizações e expressões típicas da vida cultural. Contudo, os gêneros não são categorias taxionômicas para identificar realidades estanques (MARCUSCHI, 2010, p.19).

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Esses gêneros, chamados de emergentes, não estão consolidados, mas já causam polêmica quanto à sua natureza e à proporção de seu impacto, seja na linguagem, seja na vida social, inseridos em um ambiente denominado de virtual. Assim, na atual sociedade da informação, podemos fazer alusão à Web como um cânone de novas formas de comportamento comunicativo; uma mídia eficaz, se bem aproveitada.

Essa nova tecnologia possibilita a inserção de várias formas de linguagem, tais como som-imagem-escrita, ou seja, uma intersemiose/múltiplas semioses, “interferindo na natureza dos recursos linguísticos utilizados” (MARCUSCHI, 2010, p.16). Além do mais, o dinamismo e a agilidade da veiculação na Web, bem como sua flexibilidade linguística, aceleram a penetração entre as demais práticas sociais. Além de ser um espaço onde surgem novas formas de genericidade, pode também transformar as condições de comunicação e a própria noção de textualidade empresarial.

É nesse contexto que Marcuschi (op cit.) afirma ser o momento ideal para analisar a influência mútua entre novas tecnologias e linguagem. As reflexões do autor são de caráter epistemológico e metodológico, com explicitação do tema na perspectiva da teoria dos gêneros, baseando-se em observações de caráter etnográfico.

1.2.1 Práticas Discursivas na Internet

Para trazer à luz a noção de gênero e hipergênero, atenho-me às práticas discursivas, mais especificamente: a) a Internet como espaço de enunciação digital, apresentando um panorama sobre o seu surgimento e impacto na sociedade; b) a linguagem na web e a tecnologia; c) comunidades virtuais; d) gêneros emergentes no meio virtual, com foco no

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1.2.1.1 Enunciação Digital: a Internet

A Internet15 surgiu em meados da década de 60, a partir de pesquisas militares nos períodos áureos da Guerra Fria. Havia dois blocos ideológicos e politicamente antagônicos, liderados pela antiga União Soviética e pelos Estados Unidos, que exerciam enorme influência e “controle” sobre o mundo. A criação da Internet decorreu da necessidade de proteção da base de dados militares dos Estados Unidos contra a ex-União Soviética. Um ataque poderia trazer a público informações sigilosas, tornando os EUA vulneráveis. Então, foi idealizado um modelo de troca e compartilhamento de informações que permitisse a descentralização dessa base de dados. Criou-se a ARPANET, uma rede de computadores desenvolvida pela ARPA (Advanced Research and Projects Agency), em 1957, pelo DoD (Department of Defense), um órgão amerciano de defesa.

A ARPANET começou a funcionar originalmente com 4 (quatro) pontos interligados, conforme figura abaixo. Os quatros pontos foram UCLA (University of California Los Angeles), SRI (Stanford Research Institute), UCSB (University of California Santa Barbara) e UoU (University of Utah).

15 Não é objetivo deste trabalho fazer uma análise sobre a internet, menos ainda sobre a tecnologia da

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Figura 2: Primeiro mapa lógico da ARPANET (Fonte E-dictionary: dicionário de termos usados na Internet, 2001).

A ARPANET contava com um backbone16 que passava por baixo da terra. A rede deu início à conexão de indivíduos sem ter um centro definido ou uma mesma rota para as informações, conforme Briggs e Burke (2004, p.310):

(...) no início, tratava-se de uma rede limitada, compartilhando informação entre universidades (...) e outros institutos de pesquisa. Graças ao tipo de informação que estava sendo compartilhada, um elemento essencial de sua razão de ser era que a rede pudesse sobreviver à retirada ou destruição de qualquer computador ligado a ela e, na realidade, até à destruição nuclear de toda a “infra-estrutura” de comunicações. Era a visão do Pentágono. A visão das universidades era a de que a Net oferecia “acesso livre” aos usuários professores e pesquisadores, e que eram eles comunicadores.

16 Espinha dorsal de uma rede, uma estrutura composta de linhas de conexão de alta velocidade, que, por sua

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Ao longo da década de 70 houve uma grande difusão da Internet em meios acadêmicos americanos e a rede passou a ser experimental, com o objetivo de expandir-se cada vez mais. Foram realizadas, por exemplo, algumas conexões dentro e fora dos EUA; o número de servidores da ARPANET aumentou, principalmente após a sua apresentação oficial ao público, no ano de 1972, quando foi realizado, pela primeira vez, um chat entre dois computadores. Também foi criado o programa de e-mail. Enfim, a Internet anunciava um horizonte de novas possibilidades e, mesmo após o término da Guerra Fria expandiu-se pelo mundo, consolidando-se como um dos principais veículos de comunicação da atualidade.

O termo Internet é resultado da ampliação da tecnologia da ARPAnet ao conectar, além dos laboratórios, as universidades americanas e, posteriormente, instituições do mundo inteiro. Inicialmente, a Internet possibilitava, somente, a troca de banco de dados e dispositivos gráficos entre os pesquisadores, mas, logo em seguida, descobriu-se que a rede de computadores, também, permitia a cooperação verbal, surgindo, desta maneira, o uso do correio eletronico. Hoje, a Internet é a soma de mais de 40 mil redes espalhadas pelo mundo que, graças ao conjunto de regras do chamado protocolo TCP/IP (transmission Control Protocol/Internet Protocol), podem se comunicar entre si (ARAUJO e RODRIGUES, 2005, p.49).

Conforme Araujo (2010), dentre as redes criadas para a utilização da Internet a que mais se destacou foi a Web, sendo, inclusive, a maior responsável pela popularização da

Internet. A rede World Wide Web (rede de alcance mundial) ou www foi idealizada em 1991 por Tim Berners-Lee, para possibilitar que importantes documentos científicos fossem

hiperlinkados, ou seja, ligados entre si pelo mesmo suporte eletrônico, que se baseia em hipertexto (som-imagem-texto) e vários outros recursos computacionais, dinamizando o acesso.

É notório que a Internet possibilitou a comunicação em escala mundial. A partir da

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de informações disponibilizadas, tanto quanto a diversidade de usuários, inclusive no âmbito empresarial.

A evolução do acesso a essa rede mundial pode ser verificada no gráfico abaixo:

Figura 3: INTERNET - Um fenômeno dos Anos 1990. (Fonte: Revolução Digital, 2007).

Corroborando a visão apresentada no gráfico acima, recorremos a Siqueira (2007, p.274), que afirma:

A Internet é um fenômeno dos anos 1990. Com base em dados da União Internacional de Telecomunicações, comprova-se que a rede mundial inicia essa década com menos de 40 mil servidores em todo o mundo ao final de 1990, e termina o ano de 1999 com mais de 76 milhões. Em número de usuários, passa de poucos milhares a mais de 500 milhões.

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por órgãos de pesquisa (como o CNPq) e governamentais. Desde então, diversos interesses passaram a constituir uma motivação ainda maior para o uso da Internet. (GONÇALVES e FILHO, 1995).

No contexto empresarial, graças ao advento da Web, surgiu um novo canal que possibilitava às organizações anunciar e vender seus produtos e serviços (e-commerce), difundir sua imagem e ter contato com seus clientes, usuários e consumidores. Vários setores incorporaram rapidamente essa tecnologia, proporcionando aos clientes novos canais de relacionamento. É o caso da procura cada vez maior, por exemplo, pelo atendimento online chat, objeto do nosso estudo, que proporciona o diálogo entre a instituição e sua clientela e/ou usuários em tempo real. Possuindo natureza conversacional síncrona, similar a uma conversa face a face, o chat é uma forma dinâmica de a empresa aproximar-se do seu consumidor final, proporcionando uma interação em benefício de ambos.

Gonçalves e Gonçalves Filho (1995), em artigo científico, mencionam que a possível redução dos custos dos equipamentos, a expansão das redes e o desenvolvimento de software

e hardware aumentarão a cada dia as possibilidades de se aplicar a tecnologia da informação no marketing. Nesse contexto, ganharão as empresas inovadoras que souberem utilizar a TI para melhorar o relacionamento com seus clientes, na busca da vantagem competitiva. Conforme os autores, as inovações na TI estão normalmente voltadas para os sistemas de apoio ao cliente (SAC).

Diante desse cenário, milhares de organizações passaram a usar a tecnologia da informação não somente para automatizar processos repetitivos, reduzir despesas e agilizar tarefas, mas principalmente para viabilizar e otimizar o relacionamento com clientes e com o macroambiente, obtendo vantagem competitiva nos seus negócios. (...) classifica os sistemas de informação como (...) Suporte a Clientes (SSC - Sistemas de Apoio a Clientes: apoio a operações com clientes). A inovação tecnológica normalmente está voltada para os SSC (Idem, p.22-4).

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também, de aplicação no âmbito estratégico e de marketing, o que inclui a comunicação com o consumidor final.

Diante do exposto, para conhecermos melhor esse novo cenário de enunciação digital, proponho um panorama de alguns gêneros que compõem a Internet, para, em seguida discutir efetivamente o chat, objeto deste estudo.

1.2.1.2 Linguagem na web e tecnologia

A introdução da escrita eletrônica é tão intensa e revolucionária que nos conduz, inevitavelmente, a uma cultura eletrônica comparada, até mesmo, à cultura letrada após o advento da escrita, em meados do século XIV aC. Essa afirmação é relevante, quando percebemos as várias expressões existentes com prefixos e-, conforme observou Crystal (2001)17.

Partindo da noção de gênero textual como fenômeno social e histórico, Marcuschi (2010) procura identificar e caracterizar alguns dos gêneros que emergiram nas três últimas décadas18, analisando-os em contexto atual, denominado mídia eletrônica ou CMC (comunicação mediada por computador), que desenvolve um novo modo discursivo de “discurso eletrônico”.

Para tanto, posiciona-se junto a Carolyn Miller (1994 apud Marcuschi, 2010), que “ no gênero um constituinte específico e importante da estrutura comunicativa da sociedade, de modo a constituir relações de poder bastante marcadas, em especial dentro das instituições. O gênero reflete estruturas de autoridade e relações de poder muito claras” (Marcuschi, p.19). Infere-se que há marcas institucionais que não podem ser violadas/alteradas para não

17 Observa Crystal (2001, p.21) que a expressão e- foi a expressão do ano em 1998. Veja-se em quantos casos ela apareceu: e-mail (correio eletrônico); e-book (livro eletrônico); e-therapy (terapia virtual); e-manager (negócios eletrônicos); e-business (negócios virtuais)e uma infinidade de outras. A expressão “eletrônico” ou mesmo “virtual” (talvez em menor escala, também “digital”) passou a fazer parte do dia a dia de quase todos nós. Mas em especial, o caso dos e-mails está se tornando uma expressão já bastante disseminada.

18 O autor esclarece que não dará conta de abordar a linguagem na

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comprometer o bom funcionamento e a imagem da instituição. O chat, enquadrado como gênero, ou talvez como hipergênero, reflete à sociedade estruturas bem marcadas de autoridade e poder da instituição.

No entanto, não podemos considerar o gênero como categoria taxionômica, isto é, um princípio de classificação científica estável e estagnado; pode-se dizer que é um tipo social de enunciado com certos traços característicos (regularidades), constituído historicamente nas atividades humanas, em uma situação social de interação relativamente estável, e que é reconhecido pelos falantes.

Sendo o gênero constituinte de um fator sócio-histórico-cultural, podemos afirmar que um novo meio tecnológico, na medida em que interfere em pelo menos um desses fatores, se não em todos, deve também interferir na natureza do gênero produzido. É o caso, por exemplo, da utilização cada vez maior do chat, seja para um bate-papo, interação com professor em sala de aula virtual ou, até mesmo, interação com o cliente em casos de atendimento nas empresas. Somente após o advento tecnológico, mais especificamente, o surgimento da Web, como vimos anteriormente, foi possível a chegada ou transformação desse gênero – o chat. Marcuschi (2010) faz alusão ao gênero diálogo ou conversação espontânea, transmutando para a mídia virtual, mais especificamente para o chatbate-papo.

Conclui-se que “Não é propriamente a estrutura que se reorganiza, mas o enquadre que forma a noção do gênero. Em suma: muda o gênero” (MARCUSCHI, 2010, p.21). No entanto, seus estudos restringem-se aos gêneros textuais, no âmbito da organização textual e não discursiva; bem como ao contexto bate papo/entretenimento na Internet. Logo, para responder a uma das perguntas de pesquisa sobre o estatuto discursivo do chat em situação de trabalho, torna-se necessário dialogar e, até mesmo, confrontar as discussões já apresentadas às propostas pelo teórico D. Maingueneau, que analisa o chat em ambiente de bate-papo, vendo-o como hipergênero.

Além do mais, esse novo espaço da tecnologia digital revela-se totalmente dependente da escrita. No entanto, não mais uma escrita assíncrona, caracterizada pela defasagem temporal, mas sim de uma escrita síncrona19, ou seja, realizada em tempo real.

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O fato inconteste é que a Internet e todos os gêneros a ela ligados são eventos textuais fundamentalmente baseados na escrita. Na Internet, a escrita continua essencial apesar da integração de imagens e de som. Por outro lado, a idéia que hoje prolifera quanto a haver uma “fala por escrito” deve ser vista com cautela, pois o que se nota é um hibridismo mais acentuado, algo nunca visto antes, inclusive com o acúmulo de representações semióticas (Idem, p.22).

Portanto, após o surgimento da internet, em especial da web, criou-se uma imensa rede social (virtual), voltada aos diversos indivíduos e às mais diversificadas formas de textos, em uma relação síncrona, apontando para uma nova noção de interação social. Surgem, então, as comunidades virtuais, nas quais os membros interagem de forma rápida e eficaz.

1.2.1.3 Comunidades virtuais

Marcuschi (2010) questiona a expressão “comunidade virtual”, ou seja, indaga o que seria, de fato, uma comunidade em um ambiente virtual, que é diferente de uma comunidade social, por exemplo. Procura, à luz de Erickson (1997, apud Marcuschi, 2010), analisar algumas características da noção de comunidade no sentido tradicional e na nova visão, com o objetivo de observar a natureza dos gêneros textuais no ambiente virtual. Propõe mudar a expressão “comunidade virtual” para o conceito de gênero, a fim de entender melhor esse tipo de discurso online; porém não dá conta de abarcar as características que envolvem a noção de

comunidade.

Em suma, são as práticas comuns aos participantes de certa comunidade, os engajamentos e interesses mútuos que dão a noção de compartilhamento linguístico ou comunidades de práticas discursivas, como um pano de fundo em um ambiente virtual.

Os casos mais frequentes no ambiente virtual são as comunidades como aulas virtuais,

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que Erickson e o próprio Marcuschi (2010) substituam a noção de comunidade pela de

gênero, já que os participantes têm uma suposta relação entre si. Erickson define gênero do seguinte modo:

Um gênero é um padrão de comunicação criado pela combinação de forças individuais, sociais e técnicas implícitas numa situação comunicativa recorrente. Um gênero estrutura a comunicação ao criar expectativas partilhadas acera da forma e do conteúdo da interação, atenuando assim a pressão da produção e interpretação (ERICKSON, 2000, p.03 apud MARCUSCHI, 2010, p.28).

Já as principais propriedades para o suposto “gênero ‘chat online’ são: ‘sequencialidade’, ‘interatividade’, ‘conteúdo comum’. Isso transforma o evento em um gênero participativo”, dando oportunidade aos participantes de se portarem como no seu dia a dia” (MARCUSCHI, 2010, p.30), sendo que tais propriedades são essenciais às práticas discursivas.

1.2.1.4 Gêneros emergentes no meio virtual

Antes de comentar sobre os gêneros propriamente ditos, Marcuschi (2010) defende a idéia de Patrícia Wallace sobre os ambientes virtuais, segundo a qual há seis ambientes da

Internet que constituem entornos com características próprias, a saber: ambiente web (Word Wide Web ou www); ambiente e-mail (correio eletrônico); foruns de discussão assíncronos; ambiente chat síncrono; ambiente mud; ambientes de áudio e vídeo (videoconferências). Logo, pode-se afirmar que a Internet é um ambiente heterogêneo, que abriga diversos gêneros, permitindo variadas “culturas”.

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praticados até o momento da sua pesquisa eram os e-mails e os chats. Independentemente do gênero, a comunicação se dá pela linguagem escrita, aliás, pelo intenso uso da escrita; porém, é uma escrita com certa informalidade, menor monitoração e cobrança, em função da fluidez do meio e da rapidez quanto ao tempo.

A caracterização desses gêneros emergentes se dá pela “transmutação” de outros gêneros pré-existentes: por exemplo, o gênero e-mail tem como contraparte os gêneros carta pessoal / bilhete / correio; o gênero chat reservado tem relação com conversações duais (casuais). De qualquer forma, esses gêneros emergentes têm características próprias, mas pertencem ao mesmo conjunto de gêneros, como uma constelação e, devem ser analisados especificamente.

Particularmente, entendo constelação como um conjunto de gêneros que são irmanados pela relação genética que existe entre eles, ou seja, todos pertencem à mesma família e, por isso, são variedades de um único gênero que, por ser complexo, atende a propósitos comunicativos distintos e não a subpropósitos. Assim é o que acontece com gêneros como a carta (carta pessoal, carta de apresentação, carta de demissão, etc.), a entrevista (entrevista jornalística, entrevista médica, etc.), a aula (aula expositiva, aula participativa, aula seminário, etc.), etc. (ARAÚJO, 2004, p.05).

I. Chat

É uma conversa/conversação20 informal teclada em tempo real através da Internet. Caracteriza-se como uma escrita abreviada e os usuários de Internet usam um código discursivo escrito complexo (alfabético, semiótico, logográfico), em que simultaneamente misturam alfabeto tradicional, caretinhas (emoticons), scripts, etc. para “conversar” teclando, portando, escrevendo. Trata-se de um novo código discursivo e cultural, espontaneamente construído, que se caracteriza como um conjunto de recursos icônicos, semióticos, logográficos, tipográficos e telemáticos.

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Os chats surgiram na Finlândia no verão de 1988, quando Jarkko “WIZ” Oikarinen escreveu o primeiro IRC (Internet Relay Chat), na universidade de Oulu, com o objetivo de estender os serviços dos programas BBS (os e-mails de então) para comunicações em tempo real.

Com peculiaridades distintas dos e-mails, como o caráter síncrono e a simulação da relação face a face, os chats são produções escritas no formato de diálogo, em uma sequência imediata, de retornos rápidos, com o sistema de seleções de parceiros. As contribuições são em geral curtas não indo além de umas poucas linhas, no entanto podem chegar a textos maiores.

Há vários tipos de chat, cada um com suas peculiaridades. Por exemplo: há o chat

privado e reservado, também com as mesmas características dos bate-papos, mas a diferença está no fato de os indivíduos interagirem em particular, podendo até isolar-se dentro da sala, a partir da escolha exclusiva de um parceiro.

Figura 4: A organização constelar do Gênero Chat (Fonte ARAÚJO, Anais da XX Jornada – GELNE)

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Conforme já exposto, há diferença entre os gêneros textuais e discursivos. O primeiro foi explanado à luz de Marcuschi (2010), que afirma ser o chat um gênero emergente, no caso, textual. Para estudarmos o estatuto discursivo do chat, faz-se necessário, estabelecer o gênero a partir de agora, como discursivo, conforme Maingueneau (2004).

Já a proposta de Maingueneau (2010), discutida no capítulo Hipergênero, gênero e

internet, busca compreender a razão pela qual as produções da Web são sempre resistentes à clássica concepção de gênero na Análise do Discurso. Para tanto, o autor realizou uma distinção entre os vários “modos” de genericidade em relação aos componentes da cena de enunciação (cena englobante > cena genérica > cenografia), bem como às principais formas de textualidade.

A concepção clássica de gênero, que não leva em consideração a internet, foi estruturada por uma dupla hierarquia: a hierarquia dos suportes materiais e a hierarquia dos componentes da cena de enunciação. [...] Na internet, a situação é diferente [...] As coerções genéricas estão se tornando mais fracas. Isso pode ser explicado pelo fato de que na internet todas as unidades comunicacionais são da mesma ordem (elas são “websites”), submetidas a uma larga escala de restrições técnicas; a necessidade de circular de site para site reforça sua homogeneização [Grifo meu] (MAINGUENEAU, 2010, p.132).

É notório que a noção de gênero, do ponto de vista sociodiscursivo, é imprescindível na AD, pois

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Maingueneau trabalhou a questão dos gêneros em dois momentos teóricos. No primeiro (2001), defende que um gênero do discurso (termo usado por ele) não se limita apenas à organização textual, embora seja um de seus elementos. Há outras características, igualmente pertinentes e definidoras: finalidade, lugar e momento, suporte material (televisão, diálogo, rádio, jornal), estabelecimento de parceiros coerentes com a situação (o autor chama de parceiros legítimos). Nesse último caso, acrescenta que o enunciador e o co-enunciador travam um contrato comunicativo, uma espécie de jogo, e que exercem papéis definidos na situação comunicativa. Um médico atendendo a um paciente, por exemplo. A pessoa enferma está no consultório para tratar-se de alguma moléstia (finalidade). Era esperada no consultório ou no hospital (lugar e momento). O canal é o diálogo oral (correspondente ao suporte material). O fato de um ser médico e outro, paciente, torna a situação coerente. Um exerce, ali, o papel de autoridade de saúde; o outro, de enfermo. É um acordo pressuposto, não declarado (contrato que faz parte do jogo comunicativo).

Maingueneau assume o gênero do discurso atrelado a uma cena enunciativa. Para ele, a situação de comunicação funciona tal qual uma encenação. São três as cenas:

Cena englobante - É a que define o tipo de discurso a que pertence a situação comunicativa. Pode ser, por exemplo, religioso, político, publicitário, acadêmico, empresarial.

Cena genérica - É o gênero do discurso a que pertence a situação de comunicação. A cena genérica, aliada à englobante, define o quadro cênico do texto. Por exemplo, para a cena englobante acadêmica, podemos falar em cena genérica como sendo esta dissertação.

Cenografia - É a forma como o quadro cênico é transmitido. Em outras palavras: é a própria cena da enunciação. Retomando o exemplo acima, a cenografia é o próprio curso stricto sensu de mestrado.

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Meus caros compatriotas,

Vocês o compreenderão. Desejo, nesta carta, falar-lhes da França. Graças à confiança que depositaram em mim, exerço há sete anos o mais alto cargo da República. No final desse mandato, não teria concebido o projeto de apresentar-me novamente ao sufrágio de vocês se não tivesse tido a convicção de que nos restava ainda muito a fazer juntos para assegurar a nosso país o papel que dele se espera no mundo e para zelar pela unidade da Nação (MAINGUENEAU, 2001, p. 91).

Segundo o modelo de Maingueneau, a cena englobante é o discurso político, em que os parceiros interagem num espaço-tempo eleitoral. A cenografia é a da correspondência particular própria de uma carta. Para o autor, nem todos os gêneros permitem cenografias diferentes. Num extremo, há os textos que dificilmente permitem uma mudança na cena genérica, como uma receita médica. No outro extremo, estão os casos que permitem uma gama diferenciada de cenografias, caso, por exemplo, das publicidades, dos jingles, etc. Entre os dois polos estariam os gêneros que tendem a usar uma cenografia mais rotineira, como é o caso atual dos gêneros digitais.

Analisarei, especificamente, a cena englobante atendimento ao clienteWeb Call Center e a cena genérica chat e falarei, pois, em atendimento chat para caracterizar um lugar de inscrição do sujeito do discurso. Esse lugar de inscrição apresenta condições específicas de enunciação, reguladas pela cena englobante Web Call Center e pela cena genérica chat, ou seja, pela composição do quadro cênico: chat em situação de trabalho.

Partindo dessa concepção de gênero, Maingueneau (2010) afirma que certas categorias como o “diálogo”, a “carta, o “diário”, dentre outras, não podem ser consideradas como gêneros de discurso, visto que para categorizar, por exemplo, um texto como diálogo, basta apenas escalar dois interlocutores, ou seja, há poucas restrições para sua existência. Podemos encontrar o diálogo, por exemplo, num artigo de jornal, em uma revista, num programa de TV, considerados gêneros discursivos. Logo, o “dialogo” está além do gênero, ou seja, podemos categorizá-lo como hipergênero.

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conversando na rua, seja na Washington St (EUA), seja na Rua Washington (SP/BR) ou em qualquer outro lugar, inferimos, então, que essas pessoas estão dialogando.

Assim, para conceituar o hipergênero, Maingueneau estuda as práticas comunicacionais na Internet, por meio de site de relacionamento - blog, afirmando que a Web,

além de ser um lugar onde surgem novas formas de genericidade, permite também transformar as condições de comunicação e a própria noção de textualidade.

Maingueneau (2010), ao analisar as práticas comunicacionais pela internet, afirma que

A noção de hipergênero pode ser útil para estudar as práticas comunicacionais na internet. “Blogs”, por exemplo, não podem ser considerados gêneros. Na realidade, “blog” é uma categoria que atravessa categorias temáticas (pessoal, institucional, comercial, educacional...) e impõe rígidas restrições formais. Ele é uma espécie de hipergênero típico, cujas propriedades comunicativas são mínimas: alguém (com um nome próprio) fala sobre si mesmo (a) para alguém que esteja visitando seu website” [grifo meu] (MAINGUENEAU, 2010, p.131).

Logo, segundo Maingueneau (2010), todas as práticas comunicacionais na internet, são consideradas hipergênero, pois são categorias que atravessam outras categorias (pessoal, institucional, educacional, etc.); estão alocadas numa rede composta de websites, que são submetidos às restrições técnicas (TI, software, rede computacional, etc.). Um texto, como

blog, chat, email, dentre outros, uma vez enquadrado no website, não é possível que sofra muitas restrições; ou seja, há limites às restrições técnicas (tecnológicas). Como se fosse uma "colagem" num quadro: pode-se colar um "texto", mas não se pode ultrapassar as restrições técnicas ou parâmetros daquele quadro. Então, independentemente da prática comunicacional, o texto virtual, que já faz parte desse mundo da internet websites, não pode mais sofrer restrições específicas.

Na internet, a situação é diferente. (...) As coerções genéricas estão se tornando mais fracas. Isso pode ser explicado pelo fato de que na internet todas as unidades comunicacionais são da mesma ordem (elas são

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Figura 1: Dispositivo Dinâmico de Três Pólos (DD3P) (Fonte: TRINQUET, 2010, p.104)
Figura 2: Primeiro mapa lógico da ARPANET ( Fonte E-dictionary: dicionário de termos usados na Internet, 2001 )
Figura 3: INTERNET - Um fenômeno dos Anos 1990. (Fonte: Revolução Digital, 2007).
Figura 4: A organização constelar do Gênero Chat (Fonte ARAÚJO, Anais da XX Jornada – GELNE)
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Referências

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