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A.C.1 SUB-PLANO GENÉRICO DA EXPRESSIVIDADE: A ESTÉTICA DA MENSAGEM Como “caracteres” ou características formais da expressividade do Gênero Publicitário

PARTE III. AS TRÊS SUPERFÍCIES COMUNICATIVAS NA MENSAGEM PUBLICITÁRIA

A. O CONTEÚDO EXPRESSIVO A amplitude da expressão do Discurso Publicitário

III. A.C.1 SUB-PLANO GENÉRICO DA EXPRESSIVIDADE: A ESTÉTICA DA MENSAGEM Como “caracteres” ou características formais da expressividade do Gênero Publicitário

subentendem-se todos aqueles traços de linguagem que usualmente fazem parte do DP, e o caracterizam como tal. Linguagem sumária, criativa, e outras minúcias “de linguagem” (qualquer que seja ela, verbal ou não) são alguns dos assuntos apontados aqui. A maior parte das obras acerca da “redação”, “texto”, discurso ou direção de arte na publicidade apontam para estes caracteres. A seguir se dará um resumo destes aspectos levantados nesta literatura, bem como se procederá a uma breve inclusão de alguns aspectos expressivos da linguagem notados no decorrer desta pesquisa.

III.A.C.1.1. Aspectos Listados Pela Literatura

Apontar-se-á aqui os principais aspectos listados pela literatura consultada, de forma a destacar-se apenas os pontos principais e não repetidos.

João CARRASCOZA (1999) afirma que “inegavelmente, o texto publicitário contemporâneo de mídia impressa é regido por um conjunto de normas que constitui o procedimento padrão” (p. 19-20). A seguir, o autor apresenta alguns destes principais caracteres (apontados resumidamente abaixo):

 A Publicidade como um “discurso deliberativo”: no qual o autor faz um paralelo com a Arte Retórica de Aristóteles, apontando o DP predominantemente na categoria aristotélica que “delibera aconselhando ou desaconselhando para uma ação futura”

(CARRASCOZA, 1999). Não é um texto judiciário, no qual “a acusação ou defesa incide sobre fatos pretéritos”, já que o DP é voltado a acontecimentos futuros (a compra ou valorização de uma marca/empresa/serviço, etc); tampouco é um discurso demonstrativo, categoria retórica essa que atua no tempo presente, sem incitar a uma ação futura;

 A publicidade segundo o esquema aristotélico: no qual o texto publicitário seguiria as quatro etapas básicas do pensador grego, a saber, exórdio (introduão); narração (exposição de fatos conhecidos); provas (demonstração de provas); e peroração (quando se “predispõe o ouvinte ao favor de quem emite”, como no call to action, e quando se “amplifica” o que foi dito ou recapitula-se a narração: o slogan);

 A unidade do texto publicitário: o fato de o texto tratar geralmente de um único objeto, um centro argumentativo, ou a “Unique Selling Preposition” (USP);

 A estrutura circular do texto: além de ter um objeto único, o texto volta a seus argumentos iniciais, fechando o raciocínio;

 Escolha lexical e substituição de nomes como importante elemento persuasivo;  O emprego de figuras de linguagem;

 A função conativa como predominante no texto publicitário;  O emprego frequente de estereótipos no texto;

 A criação de inimigos como estratégia frequente na propaganda;

 O apelo à autoridade, como citação a especialistas ou testemunho de celebridades;  A afirmação e repetição de argumentos como caractere estilístico frequente;

 Por fim CARRASCOZA apresenta a idéia de rede semântica, como artifício usual do texto, em que palavras de um mesmo universo semântico são empregados em todo corpo do anúncio a fim de atrair atenção do consumidor e facilitar sua fixação.

Celso FIGUEIREDO (2005) ainda estabelece alguns outros parâmetros interessantes a respeito da ancoragem entre texto e imagem na publicidade. O autor propõe uma analogia matemática para categorizar os efeitos de sentido entre estas modalidades discursivas:

 “1+1=1”: quando o texto figura como mero referencial à imagem, quase como uma legenda da mesma. O autor exemplifica esta categoria com um anúncio cujo título “precisando de uma luz” estampa uma fotografia de uma lâmpada.

 “1+1=2”: quando texto completa o sentido da imagem e vice-versa. O autor exemplifica este caso com o anúncio de um iogurte para gestantes, no qual o título

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aponta “a mamadeira da mamãe” e a imagem mostra uma grávida segurando uma embalagem do produto.

 “1+1=3”: para uma classe especial de anúncios, nos quais texto e imagem são completos por si só mas, em sinergia, produzem um sentido mais sofisticado.

Tânia HOFF e Lourdes GABRIELLI (2004), apontam ainda para aspectos de ritmo e sonoridade como importantes elementos constitutivos da linguagem. Elementos como rima, métrica, extensão do verso e aliterações contribuem para construir estes elementos importantes para atrair e cativar a atenção do consumidor, bem como para aumentar suas chances de recordação da mensagem.

Exemplos de rítmica, rima e sonoridade em alguns slogans (deste pesquisador) BAMBA - É cor. É Brasil. É Bamba no pé.

ARNO – Você Imagina, Clic, a Arno Faz. GRAPETTE - Quem bebe grapette, repete.

Tabela 21. Exemplos de rítimica, rima e sonoridade em slogans (deste pesquisador).

A emoção como grande foco do texto publicitário (CARRASCOZA, 2007) e a síntese como elemento de comunicação são outros dois traços que não podem deixar de ser mencionados.

Figura 31. Exemplo de Síntese83 na linguagem publicitária: Outdoor do absorvente interno feminino ―o.b‖ mostra a imagem

de uma mulher banhando-se numa praia vestindo biquínis e, sugestivamente, utilizando o produto anunciado, como se averigua no título ―Triquíni‖ (E011).

Outro aspecto observado nesta pesquisa é a dualidade, ou ambigüidade do texto como forma construtiva (e estética), na publicidade, que ressalta a “criatividade” do redator. Alguns slogans selecionados nesta pesquisa atestam a presença massiva desta ambiguidade no DP:

AMBIGUIDADE COMO CARÁTER CONSTITUTIVO

CAFÉ FLORESTA – o café bom por natureza. (natureza: origem; natureza: ambiente natural) ALL STAR - O tênis de todas as estrelas. (estrelas: da marca; estrelas: celebridades)

AMERICAN AIRLINES - Algo de especial no ar. (ar: espaço aéreo; no ar: no ―momento‖) CAFÉ PILÃO – O café forte do Brasil. (forte: teor do café; forte: líder de mercado)

CARBONELL – O azeite do seu coração. (coração: querido; coração:combate ao colesterol) CHEVROLET PRISMA – Seu primeiro grande carro. (grande: sedan; grande:bom)

DUMONT – O primeiro a cada segundo. (primeiro: cronológico; primeiro: líder de mercado) LACTA - Tá na boca da gente. (na boca: alimento; na boca: o mais falado, conhecido)

MORTADELA MARBA – A melhor fatia do mercado. (fatia: a fatia do produto; fatia: parcela do mercado)

Tabela 22. Exemplos selecionados por este pesquisador para o caráter de ambiguidade no texto publicitário;

Outro aspecto importante do discurso publicitário é seu caráter intergenérico84, ou seja, que

mescla uma série de gêneros (jornalísticos, cinematográficos) para perfazer sua linguagem. A publicidade em seu nível expressivo apresenta uma profusão de gêneros em inter-relação como forma constitutiva de sua linguagem. Ou seja, é de seu feitio misturar linguagens na construção de seu efeito de sentido. Telenovela, discurso político, acadêmico, jornalísticos, etc.: são vários os exemplos de apropriação inter-genérica na propaganda. Para Aline Saddi CHAVES:

Assim sendo, apesar de o discurso publicitário revelar, na época atual, uma inclinação para a negação de um regime genérico prototípico, sob justificativa de inovar e renovar um discurso manifestamente efêmero, o problema do gênero não somente persiste, como escapa ao controle. Vê-se surgir, assim, um novo gênero publicitário, o gênero "publicidade que convoca gêneros”, tantas vezes mencionado aqui, testemunha do que há de mais estável nesse discurso: o inconformismo às fórmulas prontas. (CHAVES, 2010, p. 347)

Importante frisar que não é apenas por ser “intergenérica” que a publicidade não guarde caracteres próprios e únicos de sua formação discursiva; tampouco que estes não possam ser alcançáveis.

III.A.C.1.2. O Discurso Publicitário (DP) e o Discurso Coloquial Cotidiano (DCC)

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Acima destes caracteres listados pela literatura acerca do gênero discursivo publicitário, é importante notar um de seus aspectos fundantes. O discurso publicitário procura assemelhar-se com o Discurso Coloquial Cotidiano (DCC). Poder-se-ia definir Discurso Coloquial Cotidiano como aquele discurso que está nas ruas, nos círculos de amizade, no falar dos jovens, nas conversas de família, enfim, fora das mídias ou demais suportes ou círculos discursivos (artes, literatura, academia, política, direito, etc.).

É claro que a publicidade tem sua própria e distinta formação discursiva, mas faz parte dela esse intertexto freqüente com as formas discursivas do cotidiano. Ao contrário do discurso jurídico, por exemplo, que em nada se assemelha ao DCC, o discurso Publicitário alimenta-se do último a todo instante, permite a entrada de tais termos coloquiais, construções gramaticais incorretas, gírias, traços de oralidade, dentre outros. São exemplos do DP utilizando o DCC (Discurso Coloquial Cotidiano):

 Skol desce “redondo”, e não “redondamente”.

 “Responsa vale vida, véi”: modo de falar do motoboy em campanha da CET. (E065) Por isso, pode-se afirmar que o DP opera colocando-se como filiado ao DCC. Ou seja, o DP afirma ter vindo e se conectar a todo instante ao DCC, e, nessa operação, deixa clara sua “ode” e subserviência ao outro. Em ordem fundante, ou seja, numa “ordem” que legitima sua origem, o DP é filiado ao DCC, e a ele obedece e dele se alimenta. Há até casos de regionalismo, ou de imitação de “modo de falar”, como se vê nas figuras X, abaixo, e X (/OFNER/ no início do capítulo 4):

Figura 32. ―Frango a Passarim. É de comer lambendo os dedos, sô‖. Exemplo de apropriação do modo de falar popular, regional (E012).

São vários os exemplos da publicidade que mostram essa filiação. Embora tenha seus traços constitutivos próprios, o DP é fundado em uma mímese do cotidiano. Nota-se, por exemplo,

expressões extremamente coloquiais junto de estruturas tipicamente publicitárias (Exemplo: imitação de oralidade em E001, E012, E065 e outros); coloquializações impostas pela publicidade (E066), etc.

A mímese do cotidiano não restringe à apropriação formal, estilística ou lexical do DCC pelo DP. As situações engendradas pelo DP remetem sempre a situações do cotidiano: uma mãe limpando a casa e cuidando dos filhos, uma família tomando café da manhã, um casal de namorados passeando no parque, crianças brincando com o cachorro, executivos andando na rua com smartphones na mão, e centenas de outras. Nota-se, portanto que a filiação do DP ao DCC é um de seus traços mais marcantes, sendo que tal constatação não é estranha, e totalmente justificável, visto que a publicidade comercial trabalha justamente com produtos para uso nesse cotidiano.

III.A.C.1.3. Genérico-Formais X Genérico-Expressivos

Por fim, antes de encerrar o tópico sobre os caracteres genéricos da expressividade da propaganda, é importante um esclarecimento. Estes caracteres genéricos da expressividade diferem-se dos outros caracteres genéricos da forma, discutidos no capítulo III.B. Os primeiros, expostos aqui, tratam de aspectos “expostos” na mensagem, enquanto os outros são aspectos “agregados” a partir de sua existência (secundários), não sendo, por si só, passíveis de ser expostos (é preciso uma enunciação primária para resultar em caracteres genéricos da forma publicidade).

Outro aspecto que difere os genérico-expressivos dos genérico-formais é que os primeiros não provocam “desvio” do sentido expresso na “superfície expressiva”, ao contrário dos últimos, que podem direcionar a mensagem para sentidos secundários (eles próprios ou não). Aqui, estes caracteres são antes aspectos “constitutivos”, ou “traços” da linguagem, enquanto lá se revelam mais como traços “críticos”, provenientes da existência prévia da mensagem e sua atuação formal-contextual. Enquanto os caracteres genérico-expressivos provêm de características estéticas, os outros apresentam caracteres da publicidade implicada num contexto na sociedade.

Caracteres Genérico-EXPRESSIVOS Caracteres Genérico-FORMAIS Provém da EXPRESSIVIDADE, do Discurso Exposto Provém da FORMA, adquirida após existência da

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mensagem Expostos, explícitos Captados, não expostos Não desviam o sentido para si Podem desviar o sentido para si

Traços constitutivos Traços geralmente críticos

Provém de aspectos estéticos, lingüísticos, técnicos próprios

Provêm de aspectos relativos a sua inserção repetida num contexto social onde há outras mensagens como ela.

Tabela 23. Caracteres Genérico-Formais X Genérico-Expressivos.

É claro que esta “forma” da expressividade pode talvez chamar atenção para si, o fazendo de um modo poético, quase “parnasiano”: “Triquíni” (E011) surpreende pela “sumariedade”, “7 dias”85 (E067) pela poesia. Nesta hora, aí sim, este aspecto genérico-expressivo se torna um

aspecto genérico-formal da publicidade, pois passa a ser um aspecto formal percebido por si só, e não por sua expressividade. Mas, como se verá, provavelmente esta percepção estará em âmbito eufórico, e não em âmbito crítico como a maior parte dos caracteres negativos da publicidade.

III.A.C.2. O SUB-PLANO DA MENSAGEM EXPRESSA: O CORAÇÃO DA MENSAGEM