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CONCEITOS E APLICAÇÃO NA AMAZÔNIA 1.1 A Questão Ambiental e o Conceito de Sustentabilidade

SEPROF Sec de Extrativismo e

3.2.6. Gestão Ambiental da Produção

Nesse item apresenta-se um quadro dos produtos florestais e das iniciativas de adequação sócio-ambiental da produção.

Da pesquisa pôde-se apreender 20 PFNMs – produtos florestais não-madeireiros contemplados em políticas estaduais: Frutos, fibras e óleos de palmeiras: açaí, bacaba, patauá, buriti, murmuru, jarina; Sementes: castanha-do-brasil (conhecida como castanha-do-Pará); Óleos e resinas: copaíba, andiroba, seringueira (borracha), breu; Fitoterápicos: unha-de-gato, jatobá, ipê roxo. Além destes , o guaraná, a pimenta-longa (que dá origem ao safrol, componente de perfumes), a pupunha (que dá o melhor palmito entre as palmeiras brasileiras, além dos frutos), a cajá e o cupuaçú (frutas) e as

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sementes de cedro e mogno (para reflorestamento) são priorizados, tanto para extrativismo quanto para cultivo agro-florestal.

O setor de PFNMs encontra-se enfraquecido e desorganizado no Estado; há poucos planos de manejo aprovados e baixíssima expressividade econômica. Há enorme carência de políticas públicas para este setor que, como já foi comentado, depende do Estado para se inserir nas desfavoráveis condições de mercado. Entrevistados de dez instituições externas ao Governo re-afirmaram esta carência, e criticam a baixa prioridade conferida aos não- madeireiros (exceto a borracha e a castanha). Consideram que o Governo não tem visão de longo prazo para este setor, o qual será de grande interesse no futuro próximo.

Arthur Leite (2004) destaca a importância estratégica de se desenvolver os produtos não-madeireiros, além de outros motivos, para viabilizar a real conservação florestal até que se obtenha, no futuro, renda pelos serviços ambientais da floresta. Afinal, os não-madeireiros são a modalidade produtiva mais sustentável na floresta, e no Acre a seringueira desponta como crucial, podendo estimular o interesse por outros produtos florestais, daí a importância dos incentivos à borracha.

Grandes transnacionais estão se aparelhando fortemente em P&D no setor não-madeireiro (ALBAGLI, 2001; DIAS, 2004). A pesquisa de não- madeireiros com enfoque local é imprescindível – a variedade de produtos florestais é imensa, mas a viabilidade técnica, social e econômica é uma conquista lenta, caso a caso. Como foi comentado, o Governo do Acre quase não investe em P&D.

O Governo apóia, através da ANAC, algumas micro-empresas acreanas de cosméticos e doces à base de produtos florestais. A SEPROF tem alguns projetos pontuais em convênios com o Ministério do Meio Ambiente para este setor, com prioridade para a copaíba e a andiroba. Alguns avanços foram observados para o óleo de copaíba, em que conseguiu-se o aumento do preço ao produtor de R$ 3,50, em 1999, para R$ 12,00 / litro, em 2004.

A unanimidade dos entrevistados da área rural lamentam que muitas frutas de valor econômico apodrecem na mata. Salta aos olhos a falta de políticas para o açaí e o cupuaçú, itens de franco crescimento econômico; quase toda a produção concentra-se no Pará. Há projetos pontuais de iniciativa das próprias comunidades. O Governo, em 1999, falava na intenção de construir usinas de óleo de andiroba (em Tarauacá), de polpa de açaí (em Brasiléia) e de óleos de murmuru e buriti (em Cruzeiro do Sul).

O Governo apresenta ações de apoio ao artesanato de base florestal, como a construção da loja “Casa do Artesão” em Rio Branco. O artesanato tem tido grande expressividade no Acre, como o de bijuterias de sementes, artigos de decoração, cestaria, marchetaria e tecidos de tear.

A castanha e a borracha sempre foram os principais produtos não-madeireiros do Estado, e o Governo tem viabilizado incentivos a eles, principalmente à castanha da Região do Alto Acre. Essa região é prioritária para o Governo, e ao nosso ver ela o é por três motivos: 1) É a área com os maiores índices de desmatamento, por ser área de influência da BR-317. Contempla-la com políticas produtivas de caráter ambiental é exigência do Projeto BID e do PGAI. Essa área também é priorizada pelos programas federais Proambiente, Prevfogo e Proarco. 2) Esta região, que compreende Xapuri e Brasiléia, é densa em movimentos sócio-ambientais fortes e de tradição. Boa parte deles constitui-se de aliados políticos do Governo. 3) O Alto Acre é altamente produtivo em borracha e castanha, e portanto é local estratégico para alavancar modelos de desenvolvimento ambientalmente sustentáveis.

A castanha foi dinamizada na safra de 2004 por meio da captação de um financiamento da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento), órgão do Ministério da Agricultura. Este recurso foi repassado pelo Governo do Estado às cooperativas. O preço médio obtido no local da produção foi de R$ 15,00 / lata.70 Nos anos anteriores, o preço era de R$ 4,00 / lata, ou seja, o

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ganho do produtor foi de 275%. A castanha vem sendo chamada de “ouro da Amazônia”.71

Uma ação importante do Governo foi a construção de duas novas usinas72 de beneficiamento de castanha, uma em Xapuri e outra em Brasiléia.

Este beneficiamento é apenas o básico, ou seja, produção da castanha in natura (amêndoa sem casca) – ainda não se estudou a possibilidade de inserir o beneficiamento mais elaborado (óleo, farinha e biscoito). As usinas de castanha serão gerenciadas pelas cooperativas e ainda não inauguraram, embora estejam construídas há mais de um ano. Enquanto as usinas não iniciam, a castanha do Acre tem sido quase toda beneficiada na Bolívia.

Outra iniciativa governamental foi a construção de alguns armazéns de grande porte para a castanha, nas áreas rurais mais produtivas.

Para dinamizar a produção de borracha, instalou-se um subsídio estadual que hoje é de R$ 0,70 / kg, repassado do Governo às cooperativas, e dessas ao produtor. Há também o subsídio federal, de forma que o extrativista vem obtendo de R$ 2,00 a R$ 2,10 / kg de borracha produzida. Houve períodos em que o repasse falhou gerando descontentamentos. Ainda assim, esse incentivo gerou o retorno de seringueiros que haviam migrado para a cidade às áreas rurais73, bem como a volta de colonos à atividade de corte da seringa. A

produção de borracha aumentou em 157% entre 1999 e 2004 (Acre em Números, 2003, p. 93).

Quanto à produção do couro vegetal e de outros derivados da borracha nas áreas rurais, há alguns projetos apoiados pelo Governo, pontualmente.

71 A exportação da castanha aumentou em 38% em 2004 (Min. do Desenvolvimento, 2004).

72 As usinas antigas foram fechadas há mais de dois anos em virtude da contaminação pela aflotoxina, fruto da exposição da castanha à umidade e ao calor.

73 Os dados são imprecisos. O STR de Xapuri diz que o aumento de famílias cortando seringa foi de 10 a 15%. A AMOPREB fala em 30%, e a CAEX em 40%. O Governo diz que 6.259 famílias foram beneficiadas com o subsídio até 2002 (Acre em Números, 2001, p. 77).

Está na fase de projeto, de iniciativa do Governo,74 a Fábrica de

Preservativos Masculinos a ser construída em Xapuri, pois a borracha acreana é muito adequada para este fim, reconhecida como a de melhor qualidade do mundo (RÊGO, 2001). Diz-se que a construção iniciará em 2005, e que ela produzirá o equivalente a 1/3 do consumo brasileiro. Há grande expectativa dos seringueiros com essa Fábrica.

A principal política produtiva do Governo baseia-se na madeira manejada. Segundo o discurso oficial, a prioridade é a modalidade comunitária, ou seja, em áreas de assentamentos ou comunidades de colonos. Ainda hoje mais da metade da madeira explorada no Acre é de grandes madeireiras ou fazendeiros, de origem clandestina e predatória, mas o Governo demonstra o firme propósito de imprimir as técnicas de manejo em toda a exploração. Tarefa difícil, pois os incentivos econômicos e estruturais ao manejo, no Brasil, ainda são pouco atrativos (SOUZA, 2002).

Os principais instrumentos de promoção da madeira manejada são a implementação das florestas públicas de produção e do Conselho Florestal, bem como a atração de indústrias de transformação madeireira. Todos se encontram em fase inicial. Um resumo dos princípios da política madeireira do Acre encontra-se no Anexo 5.

Quando o manejo madeireiro é prioridade, o modelo das florestas públicas de produção (FLOPs) tem sido defendido como adequado para a Amazônia (SOUZA, 2002). As FLOPs são propriedade do Estado, efetuando-se concessões de exploração pela iniciativa privada. Apontam-se as seguintes vantagens dessa modalidade em comparação com o manejo em áreas privadas (adaptado de SOUZA, 2002, p. 175 e 225):

O poder público tem maior controle sobre as florestas manejadas, as quais são patrimônio da humanidade, podendo assim garantir a função sócio-ambiental das florestas. Como gestor da área, o Estado define os critérios das concessões e planos de manejo, nos quais pode-se incluir o direito das populações residentes, a prioridade aos produtos não-madeireiros e a valoração dos serviços ambientais.

74 Os recursos são oriundos da SUFRAMA, do Ministério da Saúde e do Governo do Acre, e a execução é da SEPROF em cooperação com a FUNTAC.

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Nesse âmbito, pode-se promover o desenvolvimento local das comunidades residentes.

O Estado tem maior controle sobre a qualidade dos planos de manejo, podendo, ele próprio, elaborar os planos, às custas da empresa requerente.

Pode-se evitar a ocupação agro-pecuária após a exploração.

Freia-se a privatização das florestas. A privatização traz problemas intrínsecos, pois a tendência do proprietário é explorar toda a madeira possível e vender a terra. Esta é uma comprovação empírica de que é bem mais provável que ocorra a “tragédia [ambiental] dos [recursos] privados” do que a “tragédia dos comuns” de Garret Hardin. O outro problema é social: os proprietários costumam expulsar os posseiros residentes.

Reduzindo as terras privadas e devolutas, reduz-se a disponibilidade de madeira barata, valorizando-a.

Aumenta-se a arrecadação pública com as taxas sobre as concessões. Efetua-se a tão necessária regularização fundiária.

Para as empresas, este modelo também é vantajoso, pois (SOUZA, 2002, p. 167): Desonera-se a empresa da necessidade de adquirir terras.

Evitam-se os riscos fundiários, garantindo-se o fornecimento de madeira no longo prazo, necessário para observar os ciclos de corte do manejo.

Se o Estado assumir a atribuição de fazer o plano de manejo, pode-se simplificar e baratear os investimentos da empresa.

As vantagens das FLOPs podem se resumir em uma só frase; elas são unidades de conservação por definição, o que as colocam, ao menos em tese, sob controle do poder público e das organizações sociais, segundo prioridades ambientais. Seu objetivo principal deve ser a conservação, e não o lucro. Porém, questiona-se o fato de que não se garanta, nem na lei federal (o SNUC) nem na estadual, áreas de preservação ao longo da floresta manejada, nem reflorestamentos, nem áreas reservadas ao extrativismo não-madeireiro. O manejo madeireiro envolve impactos ambientais consideráveis. As FLOPs são adequadas, portanto, para substituir modalidades predatórias, e não para aplicação em larga escala na Amazônia.

As vantagens deste modelo, no entanto, são um tanto utópicas por basearem-se em condições ideais quase inatingíveis. Este modelo depende da forte capacidade de gestão governamental, que envolve monitoramento e fiscalização ambiental. Ora, no cenário do Estado mínimo, as dificuldades para esse ideal são

muitas. No caso do Acre, os órgãos estaduais não parecem ter estrutura para arcar com essas atribuições. As concessões, assunto polêmico, devem ser rigidamente controladas, com regras claras, transparência e permitindo controle social. As taxas cobradas devem refletir os custos reais das atividades assumidas pelo governo (SOUZA, 2002). Mas talvez os maiores riscos sejam sócio-culturais. É pouco provável que os modos de vida tradicionais presentes sejam respeitados. As florestas ocupadas por extrativistas são áreas grandes, para permitir a extração da borracha e outros produtos. Com certeza surgirão conflitos, pois a convivência de práticas extrativistas, não-madeireiras, não é nada pacífica com as madeireiras. E como equacionar a presença das comunidades indígenas?

Além das florestas públicas, o Governo pretende incentivar a exploração de madeira em áreas privadas e de assentamentos rurais (manejo comunitário), totalizando 6,0 milhões de hectares,75 ou seja, 40% do Estado

(ROCHA, 2003), fazendo crescer a economia madeireira em 5% ao ano (ANAC, 2003). O ZEE indica uma permissividade ainda maior de se explorar madeira no Acre, em 60,7% do território (ACRE, 2000, vol. III, p. 27).

Alguns pontos positivos da postura governamental são:

Os objetivos anunciados de que toda a madeira explorada no Acre se torne manejada e certificada.

A ênfase no manejo comunitário e no modelo das florestas públicas.

O esforço para a agregação de valor local, por exemplo com a construção dos Pólos Moveleiros.

Há críticas de acadêmicos e de associações rurais pelo fato que o Governo não contempla, na política madeireira, o grande potencial de aproveitamento de madeira caída (dos desmatamentos) para o artesanato e a movelaria em pequena escala. Capacitações nesse sentido poderiam promover agregação local de valor, bem como o aproveitamento dos resíduos florestais (o desperdício é enorme, inclusive de madeiras nobres). Há projetos exemplares em curso no Estado do Pará.

75 Destes, 2,7 milhões são previstos para o manejo florestal comunitário, 1,8 milhão para o manejo privado (áreas de reserva legal) e 1,5 milhão para as florestas públicas de produção (SEPLANDS, 2004).

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Quanto à produção madeireira nas reservas extrativistas, tem havido um acirrado conflito político. Boa parte dos moradores, das instituições ambientalistas e do IBAMA é contra, mas o Governo e outra parte dos moradores são a favor, e exercem pressão nesse sentido. A legislação do SNUC é clara em colocar a madeira em último plano nas reservas extrativistas, apenas sob condições excepcionais de necessidade, já que estas reservas são destinadas ao extrativismo (divergente da exploração madeireira). O atual Plano de Uso da Reserva Extrativista Chico Mendes proíbe exploração comercial de madeira, entretanto algumas famílias de três seringais (Dois Irmãos, Floresta e Palmari) estão efetuando planos de manejo com este fim.

Quanto à certificação, existem vários produtos obtendo selos (do Forest Stewardship Council - FSC e de outras instituições), como o óleo de copaíba do PAE Porto Dias, a castanha da CAPEB e a madeira do Seringal Cachoeira (PAE Chico Mendes). A certificação é incentivada pelo Governo como forma de agregar valor e atingir nichos de mercado. Há críticas em virtude de se buscarem apenas mercados externos ao Acre, muito específicos e elitizados. Por outro lado, a certificação do FSC não garante sustentabilidade ambiental, pois os critérios ambientais são superficiais e os últimos a serem requeridos, segundo funcionários do próprio órgão certificador (DIAS, 2004).

Quanto à infra-estrutura para escoamento da produção florestal e rural, que consiste basicamente na melhoria dos ramais,76 entrevistados de

diversos locais rurais afirmam que há bastante empenho do Governo, mas este empenho é muito concentrado no Vale do Acre em detrimento do restante do Estado.

Na agricultura, sobressaem os cultivos de milho, mandioca, café e feijão, sendo que o Acre está longe de ser auto-suficiente em produtos agrícolas. O café e a farinha de mandioca são produtos prioritários para o Governo, sendo a farinha de Cruzeiro do Sul, de feitio artesanal e familiar, considerada a

melhor do mundo.77 O Governo, através da SEPROF, construiu de 120 “casas-

de-farinha” (unidades de produção) (SEPLANDS, 2004).

Quanto à pecuária, a carne é significativa na produção acreana, mas o leite78 e seus derivados não têm expressividade. O gado leiteiro seria

mais adequado que o de corte, pois gera menor desmatamento e maior agregação de valor. O Governo vem apoiando significativamente a pecuária, o que gera crítica de muitos setores.

Quanto à re-orientação da agricultura e da pecuária com vistas à sustentabilidade ambiental, há considerável discurso mas poucas ações. As experiências em sistemas agro-florestais que existem são pontuais, exercidas mais por instituições como a UFAC (Projeto Arboreto) e o PESACRE. Atividades de melhoria da pecuária, algumas com objetivo ambiental, têm sido encabeçadas pela EMBRAPA.

O Acre contém poucas indústrias. As principais são madeireiras / serrarias, movelarias, agro-indústrias e cerâmicas. A indústria e o comércio foram temas absorvidos pela SEPLANDS na segunda gestão (tendo sida extinta a secretaria que cuidava desses temas) e ganharam um conselho específico. A ANAC atua na promoção de negócios. Incentivos tributários, creditícios e de infra-estrutura são concedidos às empresas que se adequarem aos critérios de desenvolvimento sustentável relacionados no Anexo 6 (COPIAI, 2004):

Um Parque Industrial foi inaugurado na capital em 2004, destinado a indústrias de base florestal, principalmente madeira (Pólo Moveleiro de Rio Branco). Há também o Pólo Moveleiro de Xapuri, que inclui escola de marcenaria e ebanosteria. Este Pólo prioriza a madeira certificada, e boa parte de sua matéria-prima vem do Seringal Cachoeira. Há investimentos para instalação de indústrias à base de madeira em Cruzeiro do Sul, prevendo o aporte da madeira manejada das FLOPs próximas a esta cidade. Alguns ambientalistas manifestam preocupação quanto à atração de indústrias de

77 A farinha tem sido exportada para o exterior em 12 mil toneladas anuais (dados da SEPRO, em fevereiro de 2002). 78 A produção de leite no Acre diminuiu de 26,7 % entre 2001 e 2003 (Acre em Números, 2003, p. 98).

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grande porte que tem havido, pois a grande demanda de madeira poderá representar pressão sobre outras unidades de conservação além das FLOPs.