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A Gestão Financeira e Orçamental do Estado e a Contabilidade Pública Actual – O POCAL

PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

V.III A Gestão Financeira e Orçamental do Estado e a Contabilidade Pública Actual – O POCAL

Contabilidade Pública Actual – O POCAL

A Constituição da República Portuguesa, define no Título IV, o essencial no que respeita às regras constitucionais para o Sistema Financeiro e Fiscal do Estado, reservando o Título VIII às questões em matéria do Poder Local.

Ao nível das autarquias, as mudanças no enquadramento legal, decorrem do âmbito de um processo mais alargado de reforma da gestão financeira e contabilística de todo o Estado, com implicações ao nível da contabilidade pública em geral e com aplicação, umas vezes de forma directa outras de uma forma indirecta, às autarquias locais.

A satisfação de necessidades de carácter colectivo através da prestação de serviços, em princípio sem finalidade lucrativa, é uma das características transversais às organizações que integram todo o sector público, ainda assim, quaisquer acções desenvolvidas incorrem normalmente no consumo de recursos monetários, razão pela qual as preocupações de carácter financeiro/orçamental, são normalmente o primeiro desafio.168

Até à década de 90 do século passado (menos de 20 anos), a contabilidade pública vinha adoptando a designada base de caixa para registo dos factos com expressão contabilística.

A expressão das preocupações manifestadas pela necessidade da normalização das contas do Estado, bem como de contabilizar as operações com base no regime de acréscimo de custos/gastos (registados quando incorridos) e de proveitos /rendimentos (registados quando obtidos) e não quando se dá o respectivo pagamento ou recebimento, motivaram o início de um processo alargado de reforma da gestão financeira e contabilística de todo o Estado em Portugal.

Página 99 O POCP não abandonou a óptica de caixa, mas simultaneamente passou a contemplar informação na óptica do acréscimo.

A execução orçamental tem reservadas contas na classe 0 para a evidenciação de algumas das suas fases, estando reservadas às classes de contas do código 1 e ao código 8 as rubricas para as ópticas de acréscimo de caixa, esta última prevista nas fases de pagamento das despesas e de recebimento das cobranças.

A inexperiência na adopção do novo método, dificuldades no inventário e na avaliação patrimonial, prática deficiente em matéria de aprovisionamento, défice de informação de “terceiros”, ou a aversão à contabilidade por muitos funcionários públicos, revelaram-se alguns obstáculos à sua implementação.

A adopção da óptica do acréscimo em muitos organismos viria a suscitar diversas interrogações, particularmente quanto à aplicação do conceito de proveito/rendimento à generalidade dos organismos do sector público, com o fundamento no seu carácter prestador de serviços, com vista à satisfação de necessidades de carácter colectivo e cuja finalidade não era lucrativa, o que dificultaria a medição dos benefícios (outputs).

Acabariam então naturalmente por surgir alguns planos sectoriais de contabilidade169, entre os

quais o POCAL.

Na figura que se segue apresenta-se um quadro com uma breve síntese do enquadramento legal no que a esta temática diz respeito, destacando-se os diplomas com aplicação directa ou indirecta às autarquias locais.

FIGURA N.º 8–ENQUADRAMENTO LEGAL DA GESTÃO FINANCEIRA E DA CONTABILIDADE PÚBLICA DO ESTADO

Ano Diploma Descrição

1990 Lei n.º 8/90, de 20 de Fevereiro Lei de Bases da Contabilidade Pública

1992 Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho Regime da Administração Financeira do Estado 1997 Decreto-Lei n.º 232/97, de 3 de

Setembro Plano oficial de Contabilidade Pública – POCP

1998

Orientação n.º 1/98 da CNCAP Adopção do POCP e definição de entidades piloto

Decreto-Lei n.º 68/98, de 20 de

Março Lei orgânica da Comissão de normalização Contabilística para a Administração Pública

169 Entende-se por plano sectorial, aquele que abrange o tratamento das operações específicas dos organismos que compõem um

Página 100

Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto Lei das Finanças Locais

1999

Decreto-Lei n.º 54-A/99, de 22 de

Fevereiro Plano oficial de Contabilidade das Autarquias Locais – POCAL e as alterações que se lhe seguiram. Despacho n.º 4.839 – 2.ª série,

Diário da República, de 7 de Março de 1999

SATAPOCAL – serviço de Apoio Técnico à Aplicação do POCAL

Lei n.º 162/99, de 14 de Setembro

Primeira alteração, por apreciação parlamentar, do Decreto-Lei n.º 54-A/99 de 22 de Fevereiro, que aprova o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL), definindo-se os princípios orçamentais e contabilísticos e os de controlo interno, as regras previsionais, os critérios de valorimetria, o balanço, a demonstração de resultados, bem assim os documentos previsionais e os de prestação de contas.

2000

Portaria n.º 671/2000, de 1 de Abril Cadastro e inventário dos Bens do Estado (CIBE)

Orientação n.º 2/2000 da CNCAP

Adopção generalizada pelos serviços e organismos obrigados a aplicar o POCP e planos sectoriais, das normas de inventariação aprovadas pela Portaria n.º 671/2000, de 1 de Abril.

Portaria n.º 794/2000, de 20 de

Setembro Plano Oficial de Contabilidade para o Sector da Educação (POC–Educação).

Portaria n.º 898/2000, de 28 de

Setembro Plano Oficial de Contabilidade do Ministério da Saúde (POC-MS).

Decreto-Lei n.º 315/2000, de 02 de Dezembro

Altera o Decreto-Lei n.º 54-A/99 de 22 de Fevereiro, que aprova o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL).

2001

Aviso n.º 7.467/2001, de 30 de Maio Norma interpretativa nº 2/2001 da CNCAP (movimentação contabilística da conta 25-Devedores

e Credores pela Execução do Orçamento)

Resolução n.º 4/2001, de 18 de Agosto, do Tribunal de Contas

Instruções para a organização e documentação das contas das autarquias locais e entidades equiparadas, sujeitas ao POCAL

Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto Lei do Enquadramento Orçamental

2002

2002

Decreto-Lei n.º 12/2002, de 25 de Janeiro

Plano Oficial de Contabilidade das Instituições do Sistema de Solidariedade e Segurança Social (POC- ISSSS)

Decreto-Lei n.º 26/2002, de 14 de

Fevereiro Novo classificador económico das receitas e das despesas públicas Decreto-Lei n.º 84-A/2002, de 05 de

Abril

Altera o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 54-A/99 de 22 de Fevereiro, no que respeita às regras previsionais.

2004 Resolução n.º 1/2004, de 18 de

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MS e POC-ISSSS

2005 Circular (série A) n.º 1.314 da

Direcção Geral do Orçamento O IVA como operação não orçamental (operação de tesouraria)

2006

Lei n.º 53-E/2006, de 29 de

Dezembro Regime geral das Taxas das Autarquias Locais

Lei n.º 53-F/2006, de 29 de

Dezembro Regime Jurídico do sector Empresarial Local

2007

2007

Lei n.º 2/2007, de 1 de Janeiro Nova Lei das Finanças Locais Declaração de Rectificação n.º

14/2007 de 15 de Fevereiro de 2007

Rectifica a Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, que aprovou a Lei das Finanças Locais, revogando a Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto

Decreto-Lei n.º 50-C/2007 de 03 de

Junho de 2007 Estabelece as normas de execução do Orçamento do Estado para 2007

Lei n.º 22-A/2007 de 29 de Junho de 2007

Procede à reforma global da tributação automóvel, aprovando o Código do Imposto sobre Veículos e o Código do Imposto Único de Circulação e abolindo, em simultâneo, o imposto automóvel o imposto municipal sobre veículos o imposto de circulação e o imposto de camionagem

Lei n.º 67-A/2007 de 31 de Dezembro Orçamento do Estado para 2008 (Altera a Lei 2/2007, se de 15 de Janeiro)

2008

Decreto-Lei n.º 38/2008 de 03 de Julho de 2008

Densifica as regras referentes aos regimes de saneamento e de reequilíbrio financeiro municipal, bem como do Fundo de Regularização Municipal, previstos na Lei das Finanças Locais

Decreto-Lei n.º 41/2008 de 03 de

Outubro de 2008 Estabelece as normas de execução do Orçamento do Estado para 2008 Despacho n.º 30190/2008 de 24 de

Novembro de 2008

Delegação de competências do Ministro das Finanças no Secretário de Estado do Orçamento em matéria de autarquias locais

2009 Circular (Série A) n.º 1.345 da

Direcção Geral do Orçamento Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) – Contabilização

Fonte[50]: Carvalho, João, Fernandes Maria J., Camões, Pedro, Jorge, Susana, (2007) Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2007, págs. 36-37 Quadro 2.02, Recolhido em 21-07-2009 de http://www.ctoc.pt/fotos/editor2/Anuario%202007%20final.pdf

Alterado/revisto por: Carvalho, Manuel

Como se pode constatar através do quadro anterior, a década de 90 foi realmente a década que incrementou a reforma legal ao nível da contabilidade e finanças da Administração Pública em geral e particularmente da Administração Local.

A aprovação da Lei de Bases da Contabilidade Pública, seguida do Decreto-lei que define o Regime da Administração Financeira do Estado, o Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP), a Lei das Finanças Locais e o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL), foram talvez no plano legal os factos mais relevantes para a reforma durante esta década.

Página 102 Apesar de previsto na Lei n.º 42/98 de 06 de Agosto, a adopção de forma massificada por parte das Autarquias Locais do Plano Oficial de Contabilidade Pública, tal apenas viria a ocorrer em meados da primeira década deste século.

De acordo com um inquérito de 2002, tornado público pela Direcção Geral das Autarquias Locais, em 1 de Janeiro de 2003, 90% dos municípios estavam a aplicar o POCAL destes, 60% estavam a aplicá-lo em exclusivo. 170

Assim, o POCAL, que entrou em vigor em 1 de Janeiro do ano 2002171, suportado no Decreto-Lei

n.º 54-A/99, de 22 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 162/99, de 14 de Setembro e pelos Decretos-Lei n.º 315/2000, de 2 de Dezembro, n.º 84-A/2002, de 5 de Abril, consubstancia a reforma da administração financeira e das contas públicas no sector da Administração Autárquica, nomeadamente municípios, freguesias, associações de municípios e de freguesias de direito público e ainda áreas metropolitanas e demais entidades que, por lei, estão sujeitas ao regime de contabilidade das autarquias locais,172 traduzindo assim a aplicação à

Administração Local do POCP.

Os objectivos desta reforma passam pela integração consistente dos subsistemas de contabilidade orçamental, patrimonial e de custos numa contabilidade adequada à gestão pública moderna, por forma a constituir um instrumento fundamental de apoio à gestão das autarquias locais e assim ser capaz de traduzir informação cada vez mais útil à gestão.

Com a entrada em vigor do POCAL, foram revogados os seguintes diplomas:173

• Decreto-Lei n.º 341/83, de 21 de Julho; • Decreto-Lei n.º 226/93, de 22 de Junho; • Decreto-Lei n.º 92-C/84, de 28 de Dezembro.

Com o POCAL foi introduzido, o método de registo digráfico ou de partidas dobradas, na contabilidade das autarquias locais sujeitas ao regime completo174, o qual substituiu o método

anteriormente utilizado, de registo unigráfico.

170 Informação consultada em 27-11-2009 no sítio da WEB: http://www.dgaa.pt/pocal_principal.htm 171 Ver [72]: Decreto-Lei n.º 315/2000, de 2 de Dezembro, art.º único & art.º 10º

172 Ver [67]: Decreto-Lei n.º 54-A/99, de 22 de Fevereiro, art.º 2º.

173 Ver [72]: Decreto-Lei n.º 315/2000, de 2 de Dezembro, art.º único & art.º 12º.

174 Nos termos do ponto 3. do capítulo 2. (Considerações técnicas) do POCAL, na redacção dada pelo art. 2º da Lei n.º 162/99, de 14 de

Setembro, apenas estão dispensadas do sistema completo de organização contabilística do POCAL as autarquias locais cujo movimento de receita seja inferior a 5000 vezes o índice 100 da escala indiciária das carreiras do regime geral da função pública (para 2004 corresponde a 1 551 650 €).

Página 103 Conforme determina a Resolução n.º 4/2001 do Tribunal de Contas, de 18 de Agosto 175, as

autarquias locais sujeitas ao regime completo de organização contabilística e de prestação de contas, tal como as sujeitas ao regime simplificado, estão obrigadas a elaborarem inventário e sistema de controlo interno, por forma a habilitar os respectivos órgãos de instrumentos que lhes permitam conhecer o valor completo do património da respectiva autarquia e gerir de forma mais eficaz e eficiente, os bens, direitos e obrigações ao seu dispor.

Com a introdução do POCAL foram introduzidos mapas de controlo orçamental detalhados, essenciais à gestão corrente e à prestação de contas das Autarquias Locais e cujos documentos têm de remeter ao Tribunal de Contas, a saber:176

• Balanço;

• Demonstração de resultados; • Mapas de execução orçamental; • Anexos às demonstrações financeiras; • Relatório de gestão.

Estes instrumentos de registo da despesa anual por código da classificação económica, são uma importante ferramenta de previsão e acompanhamento para o exercício actual e para os exercícios futuros, na medida em que têm de estar articulados com o plano de investimentos plurianuais.

Os mapas do Balanço e da Demonstração de Resultados apresentam as rubricas das operações desagregadas e devem ser acompanhados de comentários das contas, justificação da não- aplicação de disposições do POCAL, indicação dos critérios valorimétricos e dos métodos de cálculo, nomeadamente das amortizações e das provisões; deste modo, espera-se que estes possam dar uma imagem verdadeira e apropriada do activo, do passivo e dos resultados do Município.

A referida Resolução determina ainda que os documentos de prestação de contas apresentados pelas autarquias locais cujo movimento anual da receita seja igual ou superior a 5.000 vezes o

175 Ver [73] e [77]: A informação a prestar, no âmbito da prestação de contas das autarquias locais, está estabelecida no POCAL, bem como

nas respectivas normas, conforme estipulado, designadamente, na Resolução n.º 4/2001 do Tribunal de Contas, de 18 de Agosto de 2001. Já a informação a prestar pelas autarquias que estão dispensadas de integrar este regime, deverá contemplar os seguintes elementos: Caracterização da entidade; Controlo orçamental – Despesa; Controlo orçamental – Receita; Execução anual do plano plurianual de investimentos; Operações de tesouraria; Contas de ordem; Fluxos de caixa; Empréstimos; Outras dívidas a terceiros; Relatório de gestão, estando estas autarquias ainda obrigadas a adoptar procedimentos internos de registo e actualização de fluxos de caixa e inventário, designadamente nos termos aprovados pela mesma Resolução. As Freguesias com contas de gerência cuja receita ou despesa seja superior a 850 000 €, nos termos da Resolução n.º 83/2002 do Tribunal de Contas, de 17 de Dezembro de 2002, deverão remeter a esse Tribunal os seguintes elementos: Mapa da conta de gerência e mapa de fluxos de caixa; Acta da aprovação das contas; Relação nominal dos responsáveis.

Página 104 índice 100 da escala indiciária das carreiras do regime geral da função pública sejam acompanhados da seguinte documentação:

• Guia de remessa;

• Acta da reunião em que foi discutida e votada a conta; • Norma de controlo interno e suas alterações;

• Síntese das reconciliações bancárias; • Relação nominal dos responsáveis.

Com a introdução do POCAL, o controlo da execução orçamental sofreu profunda alteração, sendo constituídos grupos de apoio técnico à sua aplicação e à formação profissional necessária, os quais integram técnicos do Centro de Estudos de Formação Autárquica (CEFA) e das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), coordenados pela Direcção- Geral das Autarquias Locais (DGAL).