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Grupos étnico-raciais

No documento PASSAPORTE PARA A AMERICANIDADE (páginas 136-153)

CAPÍTULO III MERCOSUL: VERTENTE CULTURAL

3.4 Grupos étnico-raciais

porque, para elles, o nome da lingua é : ava nhenhen, litteral: língua de gente” (MAGALHÃES, idem ). O tupi tinha algumas diferenças na pronúncia e no uso das palavras segundo a região que o falava.

Magalhães defendeu o estudo do tupi-guarani e até ensinou o idioma, chamado de “nhengatu”, falado no período colonial, mas depois proibido pelo Marquês de Pombal, porque dificultava a comunicação com a população. Entendia Couto de Magalhães, que ela ajudaria não apenas organizar a fala brasileira no período do Império, cujo português estava já misturado também à língua dos imigrantes e dos escravos africanos, como facilitaria o entendimento entre as diferentes etnias que conviviam entre si no cotidiano, já que cor da pele, mas também a língua, distinguiam socialmente as pessoas nas ruas das cidades brasileiras, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo. Entendeu e pregou o espírito da alteridade: “Desde que o homem fale duas línguas, comprehende que aquelles que não falam a sua se possam exprimir tão bem quanto elle o faz na propria. (MAGALHÃES, idem).

3.4 Grupos étnico-raciais

Quando os colonizadores chegaram na América, o “Novo Mundo” já era ocupado por centenas de etnias. Era uma população em movimento pulverizada em pequenos grupos pelo territòrio americano. Teria sido formada pelos povos autóctones, surgidos das ondas migratórias procedentes da Ásia há 40.000 anos (MELATTI,1970), parte dos quais dirigiram-se para o Sul, penetrando diferentes regiões, entre as quais, o hoje território brasileiro (8.000 anos). Esse movimento migratòrio foi interrompido e recuou, quando começaram a desembarcar no continente portugueses e espanhóis colonizadores que chegaram à região entre 1500 e 1914 (FAUSTO, 1999); africanos entre 1530 a 1850; outros povos europeus, 1815 a 1920; e imigrações mais recentes originárias de outras regiões do mundo, em particular dos países asiáticos e do Oriente Médio. Esses diversos povos e etnias fundiram-se em territòrio brasileiro, tornando-se argentinos, uruguaios, paraguaios, etc. Ao longo da història, as etnias exóticas foram se diluindo na mistura com os nativos, fazendo surgir , no Brasil, um tipo étnico misto, amorenado, cabelos pretos e altura mediana, descrito em diversos trabalhos por antropólogos como Darcy Ribeiro, Roberto Cardoso de Oliveira, Roberto da Matta; sociólogos como Gilberto Freire, Sílvio Romero, Sérgio Buarque de Holanda; escritores: José de Alencar, Machado de Assis, Monteiro Lobato, Guimaraes Rosa; e alguns estrangeiros como van Staden.

Roque Laraia (2000), um estudioso da etnografia brasileira, entendia que falar em etnia brasileira, por exemplo, constituía uma simplificação, pois a população do Brasil é historicamente resultante da fusão de muitas etnias - fatores culturais, como tradições, línguas e identidades; diferentes do que se chama de raça, descrita a partir de fatores biológicos como a cor da pele, o formato da cabeça, tipo de cabelo etc. Membros de uma etnia compartilham, portanto, valores culturais próprios e se comunicam por meio de uma ou mais línguas também próprias, dizia.

Os principais grupos indígenas que ocuparam o territòrio brasileiro, de acordo com sua origem lingüística, eram os tupi-guarani, os jê ou tapuia, os aruaque ou maipuré, e

os caraíba ou caribes. Esses grupos se espalharam pelo Brasil , de modo que, quando os portugueses desembarcaram nas costas do Nordeste e depois no Sudeste, eles estavam lá: tupi, potiguara, tupininquin, carijó. Logo foram vistos e apropriados pelos estrangeiros como mão de obra e prestadores de serviços . Foi com eles que os bandeirantes desbravaram e ocuparam o interior do Brasil no século XVIII. No início da colonização, eles representavam entre 3 a 5 milhões de indivíduos. O processo de ocupação, exploração e miscegenação praticado pelos portugueses e espanhóis foi, entretanto, vagarosamente exterminando-os ou assimilando-os. Deles remanesceram poucos grupos.

Paralelamente a esse processo de assimilação do gentio, um outro elemento contribuiu para a formação do povo brasileiro: o negro. Ele chegou, “transplantado”, como disse Darcy Ribeiro, já a partir de 1530, na condição de escravo, procedente de vários pontos da África – cada grupo com sua cultura própria e diferenciada - e foi sendo redistribuìdo pelo território brasileiro. Até o fim do tráfico negreiro, em 1850, havia ingressado no Brasil perto de 4 milhões de africanos ,o que correspondia a 37% do tráfico negreiro entre a África e as Américas. Entre 1870 - quando o tráfico de negros jà estava suspenso - e 1953, o Brasil recebeu mais 5 milhoes de imigrantes de diversas nacionalidades, conforme dado divulgado pelo Memorial do Imigrante. De tal forma que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística passou a adotar em seus censos cinco categorias de origem racial: branco, negro, índio, pardo e amarelo. Os brancos, considerados como descententes de europeus, constituiam-se na maior parte da população brasileira: cerca de 49,9%, chegando a 93 milhões de indivìduos (Censo de 1960), de um total de 189 milhões de habitantes. Estavam espalhados por todo o território brasileiro, com uma maior concentração na regiáo Sul e Sudeste. Até a metade do século XIX, os brancos eram praticamente os descendentes de portugueses, hoje são originários de uma grande diversidade de povos, mesmo da Europa.

No censo de 1960, o índios representavam 0,4% da população brasileira, somando perto de 350 mil indivìduos. Desde o descobrimento, portugueses e espanhóis vinham ocupando as terras dos índios, expulsando-os com violência , e apropriando-se delas, processo que se completava com a catequese, destituindo os diferentes povos dos seus valores e identidade. Os índios, ao lado dos negros, forneceram, entretanto, um importante aporte genético para a configuração dos chamados “Povos Novos” (RIBEIRO,1995, p.134) da América, entre os quais surgiram o mestiço e o mulato, resultantes do cruzamento étnicos ocorridos no continente.

Enquanto a escravatura do negro foi abolida, a pressão sobre o índio nunca se arrefeceu. No sèculo XIX, os estudos das grandes epidemias, a varíola, por exemplo, terminaram por constatar a sua capacidade destrutiva, passando a ser usada contra os índios para a apropriaçao de seus territórios. Segundo o antropólogo Mércio Pereira Gomes27 (1988), na vila de Caxias, no Sul do Maranhão, por volta de 1816, fazendeiros presentearam os índios timbira com roupas de pessoas infectadas pela varíola, provocando a morte coletiva daquele povo. Apropriadas, a terras passaram a ser utilizadas por eles para a criação de gado. Mércio relata ainda que, no fim do século XIX, os "bugreiros de Santa Catarina e

27 Quando foi descoberta a etiologia das epidemias e sua contaminação, os portugueses e brasileiros não

sentiram nenhum escrúpulo em utilizar-se desse conhecimento para promover o extermínio de povos indígenas que estavam no seu caminho. Essa mistura mais cruel de guerra e epidemia é que se chama hoje de guerra bacteriológica “(GOMES, 1988).

Paraná, financiados por companhias de imigração, deixavam em pontos determinados de troca de presentes com índios (Xokleng e Kaingang), cobertores infectados com sarampo e varíola". Casos similares aconteceram em várias regiões, em outras partes da América do Sul.

No Brasil, durante o governo de Getùlio Vargas, foi criado o Dia do Índio (19 de abril) para relembrar a realizaçao do primeiro Congresso Indigenista Interamericano, realizado na cidade do México em 1940. Lideranças indígenas passaram a usar essa data para denunciar ou fazer reivindicações em nome das suas populações. Ao conhecer a história dos seus antepassados, começaram a reivindicar a retomada de suas terras e de seus direitos ancestrais, enquanto cidadãos. Tal fato foi ocorrido no nordeste brasileiro e no oeste da Argentina.

Vivem no Brasil cerca de 220 povos nativos, falando mais de 180 linguas classificadas em dois grandes troncos ou formando famílias lingüísticas isoladas. Consta ter sido o viajante alemão Karl von den Steinen o primeiro inventariante dos povos indígenas brasileiros em 1884. Ele registrou quatro grupos ou nações indígenas de acordo com as suas línguas: tupi-guarani, jê ou tapuia, nuaruaque ou maipuré e caraíba ou cariba.

As populações indígenas estão espalhadas por todo o território brasileiro, embora mais da metade localize-se na região Norte e Centro-Oeste. Os índios sãoconsiderados descendentes originais dos povos autóctones do Brasil . Estudos genéticos recentes teriam comprovado que a maioria dos brasileiros têm mais de 10% de traços negros e até de uma longínqua ascendência de povos indìgenas.

Nos seus 350 anos de existência, a escravidão no Brasil trouxe para o país cerca de 4 a 5 milhões de africanos negros, que se multiplicaram, somando cerca de 11 milhões de indivíduos, ou 6,3% da população. A maior parte dessa populaãao é encontrada no Nordeste, embora esteja distribuìda por todo o território brasileiro. No censo de 2005, uma população da ordem de 80 milhões de indivíduos, cerca de 43,2, declarou-se “parda”, uma categoria que distingue o miscigenado. Os chamados “amarelos”, indivíduos de ascendência asiática, chegaram ao Brasil entre 1908 e 1960, motivados por problemas econômicos nos países de origem. Representam hoje cerca de um milhão de pessoas, ou perto de 0,5% da população brasileira, constituindo-se na maior comunidade japonesa fora do Japao. Esses indivíduos estão localizados entre Sao Paulo e o Paraná.

Essas práticas massivas históricas de imigração e miscigenação vão destruir qualquer possibilidade de retomar as identidades originais na América. As crenças, mitos e práticas sociais introduzidos no meio das comunidades autóctones no território brasileiro, com, por exemplo, novas religiões e deuses exóticos trazidos pelos imigrantes, arrematados pela liberdade de culto, levaram a maioria dessas populações a um estado de alienação cultural, que as posicionou fora do espaço das novas sociedades. A Constituição Federal, que os índios chamam de “a lei do branco” assegura, até coercitivamente, a participação de cidadãos brasileiros em quaisquer atividades religiosas no país, como um “direito e uma responsabilidade individual que não deve jamais ser abdicada, sofrer quaisquer tipos de coerções e/ou incitações”. A maioria da população brasileira pratica o cristianismo, como religião, sendo o Brasil o país com a maior população católica do mundo, o que tem facilitado manifestações políticas da igreja. Contudo, nenhuma religião é considerada acima

das leis seculares vigentes no país. Apenas 7% da população não pratica religião alguma; dentro dessa categoria estão os povos indígenas.

3.4.1 Canteiro de línguas e culturas vivas

O Tratado de Assunção procurou estabelecer, logo de início, que os idiomas espanhol e português seriam as línguas oficiais do Mercosul. Todorov e Faulstich chamam a atenção, contudo, para o fato de a América do Sul ser um “canteiro de línguas vivas”

(TODOROV e FAULSTICH, 1996, p. 19). São cerca de 400 línguas em uso por mais de 400 grupos indígenas na América do Sul, correspondendo a, aproximadamente, 50 milhões de pessoas. Essas línguas foram acrescidas de algumas adoções lexicais que fizeram surgir ao longo do tempo na fala – e também na escrita – variações novas como o “portuñol” – fusão do português e espanhol; ou “guarañol” – guarani com o espanhol; na divisa do Paraguai com o Brasil, em Mato Grosso, fala-se uma espécie de “guaranês”, uma fusão do guarani com o português. Mas não fica aí: existem outras línguas, como o aimarà, o quéchua, o mapuche e até o tupi (nhengatu), reclamando seu lugar ao sol no processo de integração da América do Sul. Cada uma dessas línguas tem seus heróis, seus mitos, sua produção social. Algumas delas mantêm estruturas de comunicação sofisticadas com gramática, dicionários, inclusive bilíngües, e mantêm, jornais, rádios, e até sites na Internet.

O tupi-guarani não formava uma língua uniforme, segundo observou Couto de Magalhães. Constituía-se numa estrutura lingüística, mas os índios desse tronco étnico, o falavam por dialetos. A criação de uma língua tupi padrão, ainda falada pelos povos nativos na Amazônia - deve-se aos padres jesuítas que simplificaram a língua, atribuindo-lhe o nome de nheengatu (língua boa) ou abanheenga (língua de gente). Os que não falavam nheengatu eram "nheêgaiba" (gente de língua ruim). Dois terços da população brasileira no período colonial chegaram a falar o nheengatu, levado pelos jesuítas para a Amazônia, onde existem grupos que o falam até hoje.

Mas em 1759, sob influência do Marquês de Pombal, o governo português baixou um decreto proibindo o uso do idioma "híbrido" ao qual embutia a acusação de que estava prejudicando as comunicações na colônia brasileira e impondo punições para quem não usasse o idioma português. Foi assim que, à força, o tupi- guarani foi tirado de circulação ao longo do tempo. Se não houvesse essa medida, o Brasil seria um país bilíngüe cuja população usaria o português e o tupi-guarani, tal como hoje ocorre no Paraguai em que o povo de lá exprime-se em espanhol e guarani, uma língua parente do tupi. (ALVES JR, Ozias. Disponível em 22.01.07)

Para Alves (2007), tupi e guarani diferenciam-se em algumas palavras e na pronúncia, mas são compreensíveis entre si, da mesma forma como o brasileiro pode

entender sem problema o castelhano, quando falado devagar. "A língua em que Anchieta catequizava o gentio brasílico é a mesma em que Montoya catequizava o gentio paraguaio. [...] Ganharam o status de línguas diferentes apenas por questões geográficas” (MAGALHÃES, 1935, apud ALVES, 2007).

Autor da "Gramática de Língua Brasílica", o senador amazonense e oficial do Exército Brasileiro na Guerra do Paraguai (1865-1870), Pedro Luís Simpson (1840-1892), entendia perfeitamente o guarani falado pelos soldados paraguaios prisioneiros. Simpson aprendeu, em Manaus, o nheengatu brincando com crianças índias. Conta que o tupi-padrão era usado pelos padres jesuítas em suas missões pela Amazônia.

Proibido pela Coroa Portuguesa e, após a expulsão dos jesuítas do Brasil (1759), o tupi-guarani ou nheengatu foi desaparecendo, mesmo diante do esforço de alguns brasileiros para resgatá-lo e preservá-lo. Presidente do Instituto Histórico de São Paulo, Afonso A. de Freitas, autor de o "Vocabulário Nheengatu" publicado post mortem em 1976, pela Companhia Editora Nacional, São Paulo, tentou criar , em 1925, um curso de tupi- guarani. O curso não teve grande sucesso, mesmo gratuito; mas, em 1934, a Universidade de São Paulo instituiu uma disciplina de língua tupi-guarani, nomeando, para responsabilizar por ela, Plínio Ayrosa, um conhecedor da língua indígena.

Embora não se perceba, muitas das formas e palavras do tupi-guarani incorporaram-se ao português falado no cotidiano no Brasil. Influenciou, inclusive, na sintaxe. Até perto da metade do século XIX, em São Paulo, o caboclo falava tupi.

A ligação do elemento colonizador com o aborígine deu-se tão íntima e intensa que, por muito tempo, o uso do idioma guarani foi corrente no seio da população civilizada de São Paulo, notando-se, ainda hoje, sua poderosa influência no falar paulista: a circunstância dos atuais caipiras dos arredores de Conceição dos Guarulhos preferirem dormir em esteiras, no chão, desprezando o uso de cama, é uma clara reminiscência das velhas usanças dos murumimis, os quais, como é sabido, não faziam uso de redes, salientou Afonso Freitas, filho de Augusto de Freitas, em depoimento Ozias Alves (Alves, 2003).

Dom Pedro II, que era poliglota, sabia falar tupi. Conseguiu junto ao Vaticano cópias de manuscritos de canções escritas em tupi por José de Anchieta. As cópias do manuscrito.

Nheenga apiàba pé avaré Joseph Anchieta recê "(Fala aos índios pelo Padre José de Anchieta) chegaram às mãos de Couto Magalhães, já no século XX. Além de canções, o lendário padre compôs orações católicas no idioma indígena como esta "Tupã rerobia re tebo// Teco puero neobopa// Ageirira yniye rebo// Sancta Maria cupé// O mi by porangueté// Tomoye recoab orebo//” (Eu

peço e pedirei à Virgem Maria e ao menino formoso que perdoe nós todos ( ALVES, 2007).

Trabalhando em cima dos escritos de Afonso de Freitas, Ozias Alves registrou alguns exemplos da influência do tupi-guarani no português do Brasil.

[...] a expressão "Tá". É uma contração do verbo "Estar" na 3ª pessoa do singular? Muita gente pensa que sim, mas não é. É uma expressão do tupi incorporada na fala brasileira.

[...] O tupi-guarani não sabia modular a voz em interrogativa: suprindo tal deficiência, sempre que perguntava incluía na frase as partículas tahá, tá, pá, projeções de uma mesma raiz, e “será”, todas supletivas da inflexão de voz imodulável pelo órgão vocal do aborígine.

Observa Ozias Alves que, dessas partículas – “será - fixou-se no vernáculo, por modismo, mas também substituindo a expressão portuguesa – será – [...] Em nheengatu a partícula- será- aparece, de ordinário, encerrando a frase, posição essa ainda mantida no português falado entre a gente do povo do Norte do Brasil: - chove será, isto é, será que chove?”.

Continua dizendo que são raros os brasileiros que pronunciam o "r" de final de palavras: "pagar" é falado "pagá", "amor" soa "amô". “Esse vício de linguagem vem do tupi-guarani”.

Há tantas palavras tupi incorporadas ao português que nem percebemos, inclusive até na gíria de jovens. Por exemplo, há jovens que dizem: "O fulano chegou no serviço e babau. Perdeu o emprego". O "abau", que muitos acham ser uma gíria de surfista, é uma expressão secular do tupi-guarani, que significa "acabou-se” (ALVES, 2007).

Outra expressão tupi é "nhenhenhén". "Aquele cidadão é muito cheio de nhenhenhén", ou seja, que fala e reclama incessantemente. A fala vem de "nheen nheen", que significa em tupi "fala fala". Vejamos a seguinte frase: "Este cara é meu xará". Esta palavra, também tida como gíria, significa "amigo" no antigo idioma indígena. (ALVES, 2007).

Observa ainda Ozias Alves (2007) que os gaúchos usam e abusam do seu típico "tchê" no final de suas frases:

"Tchê" é outro sinônimo tupi-guarani que significa "amigo". Também significa "eu" e "meu". Mas esta palavra tão usada pelos gaúchos incorporou-se tanto no português do Rio Grande do Sul como no espanhol dos argentinos e uruguaios dos pampas fronteiriços ao Brasil por influência também do guarani do Paraguai. Aliás, o famoso guerrilheiro argentino que participou da Revolução Cubana, Ernesto Guevara, que morreu na Bolívia em 1967, era chamado de "Che" (como é escrito "Tchê" no espanhol). Portanto, Che Guevara significa "Amigo Guevara", que a história imortalizou como símbolo da rebeldia e da luta revolucionária esquerdista. (ALVES, 2007).

Os registros de Augusto de Freitas, compilados por Ozias Alves mostram também a influência do tupi no vocabulário da fauna.

Nome de animais e plantas como jaguar, jacaré, macaco, sagüi (pêlo), tapera (casa abandonada), cangueiro (de "Acanga"-cabeça, instrumento de tração para os bois), ipê, piracem, etc., etc., etc. Ao todo, como lembra Raquel F. A. Teixeira, em artigo no livro "A Temática Indígena na escola (MEC, Mari/ Unesco, Brasília, 1995), 70% do vocabulário do português brasileiro sobre animais plantas

provém do tupi-guarani.(ALVES JR, Disponível em

22.01.07)

É de se considerar, portanto, que se pretende uma integração cultural dentro do Mercosul, é impossível ignorar a presença dessas marcas da cultura nativa no cotidiano das populações. Se elas estivessem mortas, talvez sua importância apresentasse outro sentido, mas são culturas e línguas vivas, faladas por milhares de pessoas em todos os territórios da integração, em particular no Paraguai, onde a língua guarani é tratada como a segunda língua nacional. A língua das relações institucionais, tanto interna quanto externa, é o espanhol, porém como conseguir a adesão para a integração, se o Mercosul não falar a língua das populações? De modo que aí uma janela aberta. No Paraguai circulam jornais em língua guarani, e a mídia de maior porte mantém páginas ou colunas em guarani. Existem sites na internet, cartilhas e escolas ensinando em guarani A menos que na reconfiguração cultural do Mercosul pretenda-se, em nome da modernidade, eliminar de vez o guarani. Mas a própria modernidade assume a fragmentação cultural. Essa discussão, seguida de mobilizações no Paraguai, terminou por ser o guarani admitido como a terceira língua do Mercosul, que em guarani é representado lexicamente pelas palavras Ñemby Ñemuha

Em que pese a região do Chaco ter sido o caminho de alguns conquistadores espanhóis, a vida comunitária dos grupos indígenas do Chaco sofreu impactos significativos a partir de meados do século XIX: Cadiwéus e terenas do lado do Brasil; paiaguás e toba do Paraguai e moscovi , Argentina. Os índios se viram envolvidos de lá para cá em três guerras desencadeadas pelos Estados que dominavam seus territórios, e que destruíam e se apropriavam dos seus sistemas produtivos, sobretudo da erva mate, uma cultura nativa e extensiva. Começou com a Guerra do Paraguai, e, em seguida, com o sentido de abrir seus

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