• Nenhum resultado encontrado

Heurística da Representatividade

No documento Coleção Jovem Jurista 2010 (páginas 42-45)

iii Problemas com estatísticas

2. Heurística da Representatividade

Outra heurística amplamente estudada pela literatura comportamental consiste na heurística da representatividade.113 Essa heurística se refere à tendên-

cia de indivíduos a ignorarem evidências estatísticas e estimarem a probabili- dade de ocorrência de um evento pelo grau que este (i) é similar às principais características da população do qual foi retirado e (ii) refl ete os fatores salientes

111 Por exemplo, TAYLOR, Shelley E., “Th e availability bias in social perception and interaction” in KAH- NEMN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambridge University Press, p. 197-198.

112 HANSON, Jon e Douglas Kysar, Ob. cit., p. 763.

113 Veja, por exemplo, TVERSKY, Amos e Daniel Kahneman, “Belief in the law of small numbers”, Psycho-

logical Bulletin, 1971, 1, pp. 105-110; KAHNEMAN, Daniel e Amos Tversky, “Subjetive probability:

a judgment of representativeness”, Cognitive Psychology, 2, p. 430-454, 1970; KAHNEMAN, Daniel e Amos Tversky, “On the psychology of prediction”, Psychological Review, 80, pp. 237-251, 1973; BAR- -HILLEL, Maya, “Studies of representativeness”, in KAHNEMN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambridge University Press; e TVER- SKY, Amos e Daniel Kahneman, “Judgments of and by representativeness”, in KAHNEMN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambrid- ge University Press.

do processo pelo qual a amostra foi obtida.114 Em outras palavras mais simples,

indivíduos tendem a considerar um evento mais “representativo” como mais provável, quer este efetivamente o seja ou não.115 De fato, em determinadas

situações eventos mais representativos são de fato mais prováveis que outros menos representativos. Contudo, esse não é sempre o caso, pois já diversos fatores que afetam a probabilidade de ocorrência de um evento, mas não sua representatividade (por exemplo, probabilidades anteriores, confi abilidade das evidencias, especifi cidade do evento etc) e vice-versa.

Um exemplo trabalhado por Tversky e Kahneman ilustra essa heurística. Indivíduos receberam uma descrição de uma mulher com diversas caracterís- ticas que pareciam ser compatíveis com o que a maioria das pessoas entende como características de uma feminista. Os mesmos indivíduos foram chamados a decidir se a mulher descrita era (a) uma bancária ou (b) uma bancária engaja- da no movimento feminista. Quase 90% do indivíduos escolheram a alternati- va b, uma escolha no mínimo curiosa dado que toda pessoa descrita pela alter- nativa b também é descrita pela alternativa a. Os indivíduos ignoraram o dado estatístico lógico de que existem mais mulheres apenas bancárias do que mu- lheres bancárias engajadas no movimento feminista, apenas porque a descrição apresentada de certos detalhes se enquadrava no estereótipo de uma feminista. Ou seja, como consequência dessa heurística as pessoas tendem a prestar muita informação em poucos detalhes e, a partir deles, extrair inferências, ignorando diversas outras informações de fundo mais relevantes.

A literatura destaca alguns fatores que contribuem para a percepção de indivíduos da similaridade entre amostras.116 Primeiro, se a amostra em ques-

tão aparenta ser mais ou menos aleatória. Por exemplo, sequências de mesmo eventos, ainda que pequenas, que são aleatórios (e.g. arremessos de moedas que apresentam certa regularidade não são tidos como “representativos”), são tidas como menos “prováveis” do que sequências nas quais a aleatoriedade é mais aparente. Segundo, se a amostra preservar a relação entre maioria e minoria da população. Terceiro, se a amostra considerada é mais ou menos consistente, de forma que a percepção de uma inconsistência interna em amostras diminuiu

114 TVERSKY, Amos e Daniel Kahneman, “Judgments of and by representativeness”, in KAHNEMN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambridge University Press, pp. 84-85.

115 KAHNEMAN, Daniel e Amos Tversky, “Subjetive probability: a judgment of representativeness”, Cog-

nitive Psychology, 2, p. 430, 1970.

116 KAHNEMAN, Daniel e Amos Tversky, “Subjetive probability: a judgment of representativeness”, Cog-

nitive Psychology, 2, p. 430-454, 1970 e BAR-HILLEL, Maya, “Studies of representativeness”, in KAH-

NEMN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambridge University Pres..

a confi ança em previsões.117 Por exemplo, indivíduos preveem a média de um

estudante 7,5 com mais confi ança caso esse tenha efetivamente tirado 7,5 em algumas disciplinas do que se o mesmo estudante tiver tirado nota 10 e 5.

Uma má-percepção relacionada a essa heurística é o que se cunhou de lei

dos números pequenos (law of small numbers).118 Trata-se da crença de que “a lei

dos números grandes se aplica a números pequenos da mesma forma”119. Em

outras palavra, indivíduos acreditam que amostras aleatória ainda que mesmo muito pequenas são altamente representativas da população da qual foram re- tiradas, isto é, que a amostra é similar à população em todos os aspectos rele- vantes. Dessa forma, indivíduos tendem a subestimar a variabilidade das amos- tras analisadas. Essa tendência verifi ca-se também em sequências temporais, conforme denominado mapeado pela literatura de falácia do jogador (gambler’s

fallacy): a crença de que uma sequência pequena de amostra de “jogadas” deve

necessariamente replicar o padrão geral. Assim, probabilidades são vistas como processos autocorretivos nos quais um desvio em uma direção induz um desvio na direção oposta para restaurar o equilíbrio, quando na realidade probabili- dades apenas se tornam signifi cativas sobre amostras sufi cientemente grandes, isto é, são “diluídas”.120 Similarmente, indivíduos tendem a esperar poucas e

raras sequência iguais em eventos entendidos como aleatórios. Dessa forma, quando deparados com tais sequências, tendem a criar uma explicação para o aparente desvio da aleatoriedade, quando na realidade não houve desvio algum. Como exemplo, jogadores de esportes costumam afi rmar que um jogador está “quente” quando acerta diversas jogadas seguidas. Contudo, estudos demons- tram que um jogador aparentemente “quente” na realidade não possui maiores chances de acertar sua próxima jogada do que um jogador “frio”.121

O perigo da heurística da representatividade pode ser signifi cativo. A cren- ça errônea ou desejo de ver padrões em eventos aleatórios faz com que toma-

117 SLOVIC, Paul, “Cue consistency and cue utilization in judgment”, American Journal of Psychology, 79, 1966, pp. 427-434.

118 TVERSKY, Amos e Daniel Kahneman, “Belief in the law of small numbers”, Psychological Bulletin, 1971, 1, pp. 105-110 (relatando a existência do fenômeno e como o mesmo se verifi ca em larga escala entre cientistas que lidam com pesquisas empíricas, demonstrando que mesmo conhecimento avançado de estatítisca não é sufi ciente para eliminar completamente essa tendência cognitiva. Por exemplo, como cientistas ao subestimar a variabilidade de suas amostras tenderiam a conseguir resultados equivocados dêem relação à signifi cância, pode explicativo níveis de confi ança de suas experiências).

119 TVERSKY, Amos e Daniel Kahneman, “Belief in the law of small numbers”, Psychological Bulletin, 1971, 1, pp. 105-110.

120 TVERSKY, Amos e Daniel Kahnemn, “Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias” in KAHNE- MN, Daniel, Paul Slovic e Amos Tversky (eds.) Judgment Under uncertainty: Heuristics and Bias, New York: Cambridge University Press, p. 07 e 24.

121 Veja TVERSKY, Amos e Th omas Gilovich, “Th e “Hot Hand”: Statistical Reality or Cognitive Illusion?”, Chance, vol. 1989, p. 31.

dores de decisão passem a ter expectativas irrealistas sobre a variabilidade dos eventos observados e as repetição das experiências anteriores. Da mesma forma, a desconsideração de informações estatísticas pode levar a estimativas com pou- ca ou nenhuma relação às probabilidades reais. Em ambos os casos, tomadores de decisão podem também tender a apresentar uma confi ança excessiva quanto a suas avaliações, acreditando que o mundo é muito mais ordenado e determi- nista do que realmente é.122

No documento Coleção Jovem Jurista 2010 (páginas 42-45)

Outline

Documentos relacionados