• Nenhum resultado encontrado

2 GROUNDING 45.

2.3 COMO SE ESTRUTURA O GROUNDING 52.

2.3.4 Hiperintensionalidade 58.

Comumente diz-se que a relação de grounding é hiperintensional no que diz respeito a sua granularidade. O que se quer dizer com isso, para além de uma óbvia utilização metafórica do termo “granularidade”? Parece intuitivo ligar a noção a certa especificidade ou precisão da relação que se estabelece entre seus termos. Ainda assim, continua a metáfora a pairar sobre esse traço atribuído ao conceito, tanto mais

quando temos em mente que a visão mais comum sobre o mesmo tem-no como relação que se estabelece entre fatos ou proposições verdadeiras.

O esclarecimento demanda que sejam expostas aqui as noções de extensão e intensão, muito utilizadas para discriminar modos de definição de conjuntos, objetos lógico-matemáticos. Uma definição extensional ou por extensão é aquela que emerge da simples enumeração dos membros de um dado conjunto, e, como podemos imaginar, leva-nos por vezes a situações em que não se pode estabelecer uma definição sintética ou um critério de eleição desses elementos. Imaginemos um conjunto A cujos três elementos são o teclado do computador em que estou escrevendo este texto, o número 2 e Sócrates.

Uma definição intensional de um conjunto, por seu turno, parte de uma

enunciação de critério de identificação de seus elementos que nos fornece sua conformação. Um conjunto B pode ser intensionalmente definido como aquele formado por números naturais pares inferiores a 10, o que nos leva à conclusão de que B é {0, 2, 4, 6, 8}.

Voltando ao grounding e sua tão ventilada hiperintensionalidade o que podemos agora extrair? Um primeiro juízo é o de que não bastará a junção aleatória de fatos relacionando-os como fundante e fundado, com base apenas na certeza de que ocorrem necessariamente. Isso nos levaria, por exemplo, aos problemas derivados de uma tentativa de análise do conceito em termos modais em que se procura a identificar o ground de fatos necessários em outros fatos verdadeiros sem nenhuma relação explicativa ou de relevância para sua ocorrência, nada os ligando em termos de explicação.

Correia e Schnieder constatam que a mencionada hiperintensionalidade leva à ocorrência de instâncias falsas para fórmulas do tipo (versão operacionalista):

1. Se p porque q, q’, ... e por força de necessidade lógica, p sse r, então r porque q, q’, ...

2. Se p porque q, q’, ... e por força de necessidade lógica, q sse r, então p porque r, q’, ...

Recorrendo aos exemplos para “traduzir” e esclarecer o que expressam essas sentenças, tomemos por p o fato de que o conjunto unitário {Sócrates} existe. Ora, o

fato de que tal conjunto existe se funda no fato de que seu único elemento (Sócrates) também existe, sendo este segundo fato expresso nas sentenças pelas sequências de termos singulares q, q’, ... O que temos aí é uma atribuição direta de grounds, sem problemas.

No entanto, como por força de necessidade lógica o fato de que o conjunto unitário {Sócrates} existe é implicado pelo fato de que Sócrates existe OU alguma árvore não é uma árvore (o termo singular r), é refutável que o fato de que o conjunto unitário {Sócrates} existe tenha por fundamento a disjunção Sócrates existe OU alguma árvore não é uma árvore, ante evidente falta de relevância. Mais, seria também passível de objeção fundar no segundo fato (Sócrates existe) a conjunção Sócrates existe E toda árvore é uma árvore. A introdução da disjunção parece atingir frontalmente a relevância que se espera na enunciação de uma relação de fundamentalidade.

Isso não afasta, contudo, toda regra de fechamento lógico. Equivalências lógicas como as do par (¬(pvq), (¬p∧¬q)) preservam a verdade da relação de

grounding. Em outras palavras, fórmulas como essas imediatamente acima em que

os termos singulares relacionados por grounding fossem substituídos por ¬(pvq) ou ¬p∧¬q não possuem instâncias falsas. Não parece possível falsear sentenças tais como:

Se o fato ¬(pvq) é fundado em g, g’, ..., então o fato (¬p∧¬q) é fundado em g, g’, ...

Se f é fundado no fato ¬(p∨q), g ‘, ..., então f é fundado no fato (¬p∧¬q), g’, ...

O mesmo pode ser dito para fechamento com base na relação de igualdade, casos em que os relata fossem substituídos por outros termos singulares que guardam para com eles essa relação de igualdade (por exemplo p = w, ou ainda q = r, q’= r’, etc.): a verdade ainda estaria preservada se, por exemplo, fossem p e q substituídos no par acima mencionado (¬(pvq), (¬p∧¬q), levando a algo como (¬(pvq), (¬w∧¬r).

Neste último caso, a problemática que envolve a igualdade de fatos merece abordagem mais acurada e específica, objeto de investigações próprias36.

Para alguns filósofos, fatos podem ser analisados entre particulares que instanciam propriedades ou universais ou ainda indivíduos que se adequam ou caem sob certos conceitos. Embora a uma primeira vista não se dispute que há um mesmo indivíduo/particular que instancie ou calhe de ser o caso de certo conceito, sempre será possível discutir por exemplo se a propriedade ou o conceito de ser solteiro é a mesma propriedade ou conceito de ser não casado. Ao se divergir sobre a igualdade de conceitos ou propriedades, cai por terra a preservação da verdade propiciada pela relação de igualdade.

Em lugar da igualdade, operacionalistas tendem a lançar mão do operador de equivalência factual () que propicia a preservação da verdade em sentenças tais como as seguintes:

Se p porque q, q’, ... e p  r, então r porque q, q’, ... Se p porque q, q’, ... e q  r, então p porque r, q’, ...

2.3.5 Lógica de Grounding

Ao nos referirmos a uma Lógica de Grounding devemos ter em mente qual a estrutura lógica que está por trás das sentenças que contenham relações de ground entre seus termos. Não se trata apenas de sua formalização (o que já foi objeto de seção precedente), mas perquirir quais relações lógicas estão aí colocadas. Nesse ponto normalmente se faz uma divisão entre princípios de lógica pura e de lógica impura do grouding. Vejamos em que eles consistem.

36 O tema é explorado em artigo de Correia (2016), ao qual se remete o leitor. A noção de equivalência factual é fornecida pelo autor logo no início do artigo: “Say that two sentences are factually equivalent

when they describe the same facts or situations, understood as worldly items, i.e. as bits of reality rather than as representations of reality. Factual equivalence is a form of “sameness of content”, but it is to be distinguished from synonymy: the former is sameness of worldly content, whereas the latter is sameness of representational content. Synonymous sentences — at least, synonymous sentences which are in the business of stating facts — must be factually equivalent, but factually equivalent sentences need not be synonymous. Thus, for instance, ‘Hesperus is Phosphorus’ and ‘Hesperus is Hesperus’ are factually equivalent but not synonymous, and the same goes for ‘The Mediterranean Sea contains water’ and ‘The Mediterranean Sea contains a substance composed of H2O molecules’.” – pg.103. De seus