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CAPÍTULO VI – SOBERANIA E INTEGRAÇÃO NO CONTINENTE

6.1 Histórico

Inaugurando nova fase no processo de integração daquele continente, advinda da necessidade da criação de bases concretas para a construção da Europa do futuro, o Tratado da União Européia (TUE), além de promover a unificação dos países europeus via eliminação das barreiras que segmentavam a Europa e melhorar as condições da vida e de emprego, torna mais evidente a sua finalidade maior, qual seja, a de garantir aos seus cidadãos segurança e liberdade.

Em termos científicos, a União Européia (UE) não se equipara, por certo, às tradicionais Organizações Internacionais, sobretudo se levado em consideração sua estrutura, funcionamento, poderes e competências – bem assim a forma de exercer esses dois últimos. Se bem que atue como se Estado-continente fosse, seja criando e promulgando normas jurídicas dirigidas a todos os seus Estados-membros, seja celebrando acordos com outros grupos de Estados ou com Estados específicos, não pode tal instituição ser vista como um Estado na acepção do termo, ainda que com destaque para os traços federalizantes ou confederalizantes.

Ao longo de sua história, perdendo em parte o foco dos objetivos inicialmente estabelecidos, observa-se que a UE vem apresentando um acréscimo significativo em termos de competências, passando a atuar em novos domínios –

v.g.: cultura, informação, segurança, energia, meio ambiente, relações

internacionais, desenvolvimento científico e tecnológico, dentre outros. Tal situação acabou por distingui-la dos demais organismos internacionais conhecidos,

permitindo-lhe atingir a complexidade estrutural que hoje apresenta, sendo-lhe atribuída natureza sui generis.

É nesse entrementes que tem ensejo um pluralismo jurídico, marcado pela co-existência de dois ordenamentos distintos: (i) um deles representado pelo Direito Nacional, composto por normas internas elaboradas no âmbito de cada Estado- membro; e (ii) outro consubstanciado no Direito Comunitário, integrado por normas supranacionais decorrentes dos Tratados comunitários e elaboradas pelas instituições comunitárias76 e reforçados pela jurisprudência emanada de decisões do

Tribunal de Justiça das Comunidades Européias.

Mesmo apresentando características que vão além daquelas inerentes a uma simples Confederação de Estados, a União Européia não chega a ser considerada um Estado Federal. O seu sistema político tem evoluído de maneira expressiva, tendo por suporte vários ajustes por meio dos quais os Estados- Membros concordam em delegar parte de sua soberania para instituições supranacionais – instituições, portanto, comuns também a outros Estados –, as quais representam não somente interesses nacionais, mas também aqueles comunitários.

A atual União Européia (UE) representa a congregação de esforços e realizações concretas de uma miríade de pessoas que vislumbraram uma oportunidade para reunificar a Europa. Sem receio de incorrer em erro grosseiro, pode-se afirmar que em nenhuma outra parte do mundo Estados soberanos partilharam de modo tão amplo sua soberania, notadamente em domínios de fundamenta relevância para os cidadãos que os integram.

Idealizada inicialmente como um sonho, a UE foi capaz de dar origem a uma moeda única e a um mercado interno marcado por impressionante dinamismo, onde pessoas, serviços, mercadorias e capitais não encontram barreiras, ou seja, circulam livremente, permitindo com que um elevado número possível de pessoas possa usufruir os benefícios advindos desse mercado interno.

Suas bases constitutivas foram consagradas numa série de tratados, dentre os quais se destacam o Tratado de Paris, cujo teor instituiu a Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA - 1951), e o Tratado de Roma, constituído por dois atos que deram origem à Comunidade Econômica Européia (CEE - 1957) e à Comunidade Européia da Energia Atômica (EURATOM - 1957).

Posteriormente, esses tratados foram alvos de alterações, consubstanciadas nos seguintes documentos: Ato Único Europeu (1986); Tratado da União Européia (Maastricht, 1992); Tratado de Amsterdã (1997); e Tratado de Nice (2001). De fato, os tratados em comento criaram vínculos jurídicos muito fortes entre os Estados-membros, a ponto de tornar possível que a legislação da União Européia se aplique diretamente aos cidadãos europeus, conferindo-lhes direitos específicos.

O primeiro ensaio rumo à integração européia deu-se quando Bélgica, República Federal da Alemanha, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos – seis países – criaram um mercado comum do carvão e do aço. Decorridos alguns anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, o seu objetivo primordial consistia em simplesmente assegurar a paz entre as nações européias, não levando em conta se vencedoras e vencidas, mas associando-as em um sistema institucional comum, fundado nos princípios da cooperação e igualdade.

Os seis Estados em relevo, optaram por construir uma Comunidade Econômica Européia (CEE), tendo como base um mercado comum ainda mais alargado, englobando uma infinidade de bens e serviços. Os direitos aduaneiros entre esses seis países foram totalmente suprimidos desde 01.07.1968 e, no decorrer da mesma década, estabeleceram-se políticas comuns, com especial destaque para aquelas residentes nos domínios do comércio e da agricultura.

O sucesso obtido por esses países, encorajou outros a “aderirem” a esse grupo; foi quando Dinamarca, Irlanda e Reino Unido decidiram unir-se às Comunidades – dando lugar ao primeiro alargamento em 1973, ocasião em que se pode notar um indiscutível aprofundamento das competências das Comunidades, acompanhada de perto pela introdução de novas políticas social, regional e ambiental.

Os líderes comunitários, já no início da década de 70, compreenderam o quão importante era a convergência das suas economias, bem assim de conceber, com essa visão, uma união monetária. Quase nessa mesma época, os Estados Unidos decidiram não mais obedecer ao “padrão ouro”, suspendendo a convertibilidade do dólar em ouro. Essa atitude provocou uma grande crise nos mercados monetários mundiais, agravando-se com os choques petrolíferos de 1973 e 1979.

Foi quando se instituiu o Sistema Monetário Europeu – SME (1979), o qual contribuiu para a estabilização das taxas de câmbio, levando os Estados-membros a adotarem políticas visando à manutenção da solidariedade, bem assim disciplinando suas economias.

Posteriormente, com a adesão da Grécia (1981), Espanha e Portugal (1986) às Comunidades, tornou-se necessário a implementação de programas estruturais, cujo objetivo maior visava a redução das diferenças de desenvolvimento econômico entre os Estados-membros, que perfaziam um total de doze.

Desempenhando de forma paralela um papel importante no plano internacional, a CEE celebrou uma série de acordos visando à cooperação para o desenvolvimento comercial (Lomé I, II, III e IV, 1975-1989), os quais deram origem, em 2000, ao Acordo de Cotonu. Em função desses acordos, a Europa se viu alçada à categoria de maior potência comercial do mundo, ganhando espaço no plano internacional.

Sem olvidar a acontecimentos marcantes como a assinatura do Ato Único Europeu (1987)77 e a queda do muro de Berlin (1989)78 – dentre outros – observa-se

uma evolução das Comunidades Européias; Os Estados-membros negociaram um novo Tratado, adotado em 1991 pelo Conselho Europeu em Maastricht. O Tratado da União Européia (TUE) entrou em vigor em 11/1993, passando a CEE a ser designada “Comunidade Européia” (CE), dando origem à União Européia79 e

estabelecendo metas ambiciosas para os Estados-membros (união monetária até 1999, cidadania européia, novas políticas comuns – incluindo uma política externa e de segurança comum (PESC) – e mecanismos de segurança interna).

Essa nova dinâmica, emprestada aos contornos iniciais da CEE – por certo, reforçada pela inegável evolução geopolítica do continente europeu – levou a 77Em 1985, sob a presidência de Jacques Delors, a Comissão Européia, estabeleceu um calendário para

concluir a realização do mercado interno europeu até 01.01.1993. O Ato Único Europeu foi assinado em 1986, entrando em vigor em 01.07.1987.

78Da queda do muro de Berlin decorreu a reunificação da Alemanha (1989) e a democratização dos países da

Europa Central e Oriental, que se viram livres do jugo soviético. O fim da União Soviética se deu em 12/1991.

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A criação da UE se destacou pelo fato de o TUE haver acrescentado políticas de cooperação intergovernamental ao sistema comunitário existente.

Áustria, Finlândia e Suécia, em 1995, a aderirem à UE, a qual passou a contar com quinze Estados-Membros80, já se preparando para a substituição das moedas

nacionais pelo euro, uma moeda única européia81. Nos idos de 1997 e 1999 –

respectivamente em Luxemburgo e Helsink – foram iniciadas as negociações para um novo alargamento que seria o maior da história da UE, culminando com o término das negociações para o ingresso de mais dez países candidatos (Copenhagen, 2002).

Embora a União Européia, na atualidade, seja integrada por um total de vinte e sete Estados-membros82, ainda conta com perspectivas de crescimento, o qual será verificado à medida que novos países manifestarem intenção de ingressar nesse “modelo” de união política (no caso, políticas social, econômica e monetária).

A União Européia pode ser entendida como uma reação à onda de desafios impostos pela globalização, consubstanciando valores e princípios acreditados pelos europeus e, mais que isso, constituindo-se em um mecanismo capaz de garantir, de forma comum, a busca permanente pela liberdade e paz, podendo ser apontada, dentre os blocos econômicos, como “[...] a mais exitosa experiência de integração econômica conhecida”, pois:

[...] estabeleceu desde seu início o objetivo do mercado comum (livre circulação de bens, serviços, capitais e pessoas), atingindo de forma

80Período de alargamento em que a UE também ficou conhecida como “Europa dos 15”.

81No dia 01.01.2002, cédulas e moedas metálicas dessa nova moeda (euro) entraram em circulação em doze

países – também conhecido como a “zona euro”.

82Segundo dados coletados junto ao sítio da União Européia, “o último alargamento de 15 para 25 Estados-

Membros foi o mais importante da história da União. As origens deste alargamento remontam ao colapso do comunismo, simbolizado pela queda do muro de Berlim em 1989, que ofereceu uma oportunidade inesperada e sem precedentes para alargar à Europa Central e Oriental a estabilidade e prosperidade dos cidadãos europeus. Uma das prioridades do primeiro pós-alargamento da União é melhorar os níveis de vida dos países que aderiram em 2004 (Chipre, República Checa, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Polónia, Eslováquia e Eslovénia) a níveis da UE”. São membros, atualmente, da União Européia os seguintes países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polônia, Portugal, Reino Unido, Romênia, República Checa e Suécia.

acabada apenas em 1993, mas convivendo durante muito tempo com espaços econômicos reservados aos nacionais de seus países constitutivos (monopólios estatais ou exceções nacionais em matéria de transportes aéreos, sistemas bancários, meios de comunicação em massa, por exemplo). (ALMEIDA, 2002, p. 6)