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As “Pilulas Holloway” fazem parte de uma categoria convencionalmente chamada na literatura de patent medicines, produtos que se presentam como panaceia para os males do corpo e do espírito, e que

NOTÍCIAS, O SÉCULO E O PRIMEIRO DE JANEIRO

DO ANÚNCIO AO RECLAME

9 As “Pilulas Holloway” fazem parte de uma categoria convencionalmente chamada na literatura de patent medicines, produtos que se presentam como panaceia para os males do corpo e do espírito, e que

são geralmente creditados como os percursores no uso de ferramentas publicitárias para divulgar as suas marcas junto do grande público (Laguna Platero, 2018: 73).

Apesar dos novos incentivos e do aumento significativo das marcas registadas em Portugal ao longo do último quartel do século XIX (Pereira & Cruz, 2017: 412), a maioria dos empresários portugueses parece não ter aderido entusiasticamente à revolução publicitária (Matos, 2014: 255), investindo frugalmente em «anúncios tísicos, apertados, muito avaros de espaço e de ideias claras, ou em cartazes que lembram editais de graves magistrados…» (Caldevilla, 1914: 33). Dez anos depois, continuava a invectivar-se contra o «anúncio em composição tipográfica, [que] salvo raríssimas excepções, é quase sempre falho de interesse» (“O leitor de anuncios”, 1924: 6).

O legado do modelo de “classificados” manteve-se presente na publicidade comercial durante largos anos, e ainda perdurava no final da década de 1930, segundo a análise de Estrela, que atribui a este estilo de peça publicitária, essencialmente focado na descrição das funcionalidades do produto, um peso que se aproximava de metade dos anúncios publicados na imprensa. Dominavam, ainda nesta altura, os pequenos formatos: cerca de 2/3 das inserções dimensionavam-se entre 1/8 e 1/7 de página (Estrela, 2004: 36-37).

Com a excepção do comércio, em particular os grandes armazéns de Lisboa e do Porto, os grandes protagonistas dos reclames em Portugal serão as marcas estrangeiras (Estrela 2004: 101). São elas que primeiro vão recorrer a agentes publicitários, investindo largamente em grandes e sofisticados reclames, alguns dos quais desenvolvidos por artistas de renome, que farão circular não apenas nos jornais de grande tiragem mas também num formato que se tornará cada vez mais popular ao longo da primeira metade do século XX: as revistas ilustradas (Cardal & Almeida, 1994: 12; Santos, 2015: 33, 37).

CONCLUSÃO

A publicidade serviu de motor económico para a imprensa de massas desde o seu primeiro momento, assegurando a relação financeira que permitiu aos jornais baixar o preço de venda ao público e aumentar as suas tiragens. Nesse sentido, podemos acrescentar um quarto elemento à fórmula económica que caracteriza o modelo de negócio em análise: a atenção dos leitores. A atenção de muitos milhares de leitores, tantos

quantos os números da circulação dos jornais, será o principal factor de decisão a considerar pelos anunciantes na hora de investir em publicidade. Como Ohmann refere, sintetizando a questão, «publishers mass-produced a physical product, which they sold at a loss, and used it to mass-produce an immaterial product, the attention of readers, which they sold at a profit» (Ohmann, 1998: 346).

Os dados que recolhemos demonstram uma evolução globalmente crescente dos anúncios entre 1865 e 1926, período em que assistimos a uma explosão das tiragens, sobretudo dos grandes diários de Lisboa e Porto, e a uma proliferação de títulos por todo o país. Os três diários em estudo evidenciam o crescimento exponencial da circulação, sempre acompanhado pelo desenvolvimento em quantidade e qualidade das suas páginas de publicidade.

Quanto ao tipo de inserção publicitária, assistimos a uma gradual transformação de formato, com a progressiva distinção entre anúncios e reclames. Os reclames, ancorados em marcas comerciais, caracterizam- se pela sua grande dimensão e sofisticação gráfica, em consonância com uma nova linguagem da publicidade que podemos classificar como “moderna”, e que marcará o paradigma publicitário das décadas seguintes.

FONTES

Contabilidade Nacional

Conta Geral da Administração Financeira do Estado. Anos económicos de 1889/90

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1927/28.

Acessível através de http://purl.sgmf.pt/repositorio. Consultas entre Junho e Julho de 2019.

Legislação

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do Ministério. Lisboa.

Decreto nº 7:772 de 3 de Novembro. Diário do Governo nº 220/1921 – I Série. Ministério das Finanças. Lisboa.

Lei nº 1:663 de 17 de Julho. Diário do Governo nº 159/1924 – I Série. Ministério das Finanças. Lisboa.

Decreto nº 4:056 de 9 de Abril. Diário do Governo nº 72/1918 – I Série. Presidência do Ministério. Lisboa.

Acessível através de http://legislacaoregia.parlamento.pt/ (legislação até 1910) e https://dre.pt/ (legislação depois de 1910). Consultas entre Junho e Julho de 2019.

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