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A hOmOFOBIA SEGUNDO OS/AS PROFESSORES/AS DAS ESCOLAS PúBLICAS DO LITORAL DO PARANá

A primeira experiência do grupo ligada à formação de professores/as foi vinculada ao programa Brasil sem homo- fobia, desenvolvida em 2007 em parceria com o Grupo de Es-

tudos de Gênero e Tecnologia (GETEC) da Universidade Tec- nológica Federal do Paraná (UTFPR) e intitulada Refletindo gênero na escola: a importância de repensar conceitos e preconceitos. Participaram da estratégia 120 pessoas, em sua grande maioria docentes de escolas públicas de Matinhos, que compreende o ensino fundamental (à época, 1ª à 4ª sé- rie) e educação infantil (pré-escolar), além de diretores, su- pervisores pedagógicos e equipe de apoio escolar. O projeto consistiu de um curso de formação presencial, com duração de 40 horas, buscando sensibilizar os/as participantes para questões de gênero, diversidade sexual e direitos humanos.

Naquela ocasião elaborou-se um formulário de pesqui- sa com perguntas objetivas e subjetivas a respeito de temas ligados à homossexualidade, preconceito e homofobia. Antes do início das atividades do projeto, os/as participantes eram convidados/as a participar de uma pesquisa anônima, com objetivo de identificar situações observadas pela comunidade escolar a respeito da homossexualidade no ambiente escolar e seus desdobramentos, bem como situações de homofobia nas escolas. Após ser respondido, o instrumento era deposita- do em uma urna, sendo, ao final, contabilizados os resultados. Do total de participantes (n=120), 54% relataram já ter presenciado casos de piadinhas, chacotas ou comentários de- bochados envolvendo a orientação sexual dos/as estudantes, embora desses, a maioria (64%) considera tal situação rara. Dentre o grupo que já presenciou tais situações, cerca da me- tade admitiu ter dificuldades para lidar com tal circunstância no cotidiano escolar. À época, apenas cerca de 40% relataram tomar alguma atitude ou dar encaminhamento ao problema,

como, por exemplo, conversar com o/a estudante ou encami- nhar para orientação especializada.

O fato de tomar uma atitude não é aqui colocado nem como algo positivo nem como negativo, mas como uma cir- cunstância a ser interrogada. Muitas vezes, tomar alguma ati- tude pode ser interessante para o/a estudante que enfrenta problemas na escola, proveniente dessa situação, especial- mente quando encaminhado/a à orientação educacional ou psicológica especializada. Em outras conjunturas, tomar ati- tudes pode causar alardes e levar a uma excessiva exposição do/a estudante e de sua sexualidade, dependendo da maneira como o caso é conduzido internamente na escola e até mes- mo externamente, quando são envolvidos pais/mães/respon- sáveis. Assim, com base nessas respostas, o grupo ponderou que esse era um ponto nevrálgico, que trazia angústias e in- certezas aos membros da comunidade escolar, e que merece- ria ser abordado ao longo das oficinas subsequentes previstas no projeto (SIGNORELLI, 2011).

Com o intuito de (re)conhecer as atitudes dos/as profes- sores/as com relação à imagens homossexuais, foram incluí- das no instrumento três figuras com cenas de beijos homosse- xuais, uma com dois homens e outras duas figuras com duas mulheres. Perguntamos qual a opinião deles/as ao se deparar com situações como essas, que poderiam acontecer em suas escolas, por exemplo. Uma grande parte assinalou encarar normalmente, seguido de 19% que aceitam, concordam e apoiam. Cerca de 12% dos/as entrevistados/as acham di- ferente, enquanto algumas pessoas, mesmo que minorita- riamente, escolheram respostas como: acho anormal; sinto pena; sinto nojo ou, ainda, acho que isso é doença, um des-

vio, sendo esta última relatada por apenas uma pessoa. Feliz- mente, uma das alternativas não foi assinalada: sinto raiva.

Os aspectos investigados por meio desse instrumento forneceram importantes elementos para o direcionamen- to das atividades nos encontros subsequentes, realizados durante as oficinas de sensibilização do referido projeto. Já havia um cardápio de temas pré-estabelecidos, mas com os achados dessa pesquisa foi possível incrementar alguns dos temas abordados nos módulos. Optou-se pela modalidade de oficinas, com a participação ativa dos/as cursistas, de ma- neira dinâmica, alternando-se as estratégias metodológicas entre projeções, exposições dialogadas, discussões, exibições de vídeos, exposição de arte, fotografias, atividades em grupo, músicas, elaboração de cartazes e atividades de artes visuais, entre outras (SIGNORELLI, 2011).

Já na experiência mais recente da equipe, em curso en- tre 2014 e 2016, junto ao curso de pós-graduação em nível de Aperfeiçoamento em Gênero e Diversidade na Escola (GDE), buscou-se privilegiar um aprofundamento nos conteúdos, já que esta foi uma das demandas do público dos cursos ini- ciais, fruto das primeiras experiências. Assim, com o GDE obteve-se um upgrade de um curso de formação presencial de 40 horas para um curso ofertado por meio de Educação a Distância (EaD) – modalidade semipresencial – de 200 horas. O quantitativo que a EaD também permite abarcar, fez com que houvesse um salto de 120 para 250 estudantes matricu- lados/as. A EaD também permite que estudantes de fora da região em relevo participem das atividades propostas, embo- ra a maioria dos/as participantes continua sendo da região litorânea, uma vez que os encontros presenciais são na sede da UFPR Litoral, em Matinhos.

Na turma em vigência no biênio 2013/2014 também foi elaborado um instrumento de pesquisa, que, desta vez, foi es- truturado e respondido de modo on-line pelos/as participan- tes, seguindo a lógica de interação virtual do curso. Além de objetivar conhecer o perfil deste grupo em relação às temáticas ligadas à homossexualidade, diversidade, homofobia e direitos humanos, buscou-se também comparar algumas das atitudes relatadas por esses/as professores/as com aquelas dos/as pri- meiros/as participantes, das turmas de formação anteriores.

Nessa última turma, de um total de 253 cursistas, 75% já se depararam com situações de homofobia em suas respec- tivas escolas, dos quais somente 3,6% não tomaram nenhu- ma atitude. A maioria (79%) ao menos conversou e acolheu o/a estudante, embora não tenham encaminhado à ajuda especializada. 96% consideram necessário o enfrentamento da discriminação por gênero/orientação sexual, sendo que 99% ponderam que podem contribuir para tal enfrentamen- to. Por outro lado, apenas 4,7% relataram bom conhecimento sobre o tema (homofobia) antes do início do curso, enquanto a maioria (65%) admitiu ter pouco, algum ou nenhum conhe- cimento para lidar com a homofobia nas escolas.

Os dados desta pesquisa mais recente, conduzida com docentes de escolas públicas entre 2013/2014 contrastam com o da primeira pesquisa, realizada com em 2007. Enquanto na- quela época a maioria dos/as professores/as não tomava ne- nhum tipo de atitude quando se deparava com situações de homofobia nas escolas, atualmente apenas uma pequena mi- noria continua negligenciando o problema. O fato de conver- sar e acolher o/a estudante em tal situação é colocado como um primeiro e significativo passo para o combate à homofo- bia, assim como outras violências nas escolas. Pondera-se o

fato também de o tema estar cada vez mais na mídia, o que contribui para sua visibilidade e chama a atenção de docen- tes para seu papel como mediadores de tais situações nos am- bientes escolares. Adicionalmente, o fato de grande parte dos/ as participantes assumir que, em sua condição de docentes, podem ter papel crucial em tal processo de mediação, associa- do ao reconhecimento de que necessitam mais subsídios para lidar com a problemática, justificam a oferta de iniciativas com a de cursos de formação em GDE.

De acordo com o programa Brasil sem homofobia (2004), a violência contra pessoas homossexuais, que pode culminar em seu assassinato, é, sem dúvida, uma das faces mais nefastas da discriminação por orientação sexual no Brasil. Tal violên- cia tem sido denunciada com bastante vigor pelo Movimento LGBT, por pesquisadores/as de diferentes instituições e pelas organizações da sociedade civil, que têm procurado sistema- tizar dados de qualidade. Com base em levantamentos feitos a partir de notícias sobre a violência contra homossexuais pu- blicadas em jornais brasileiros, os números divulgados pelo movimento LGBT são alarmantes, revelando que nos últimos anos milhares de LGBT foram assassinados no país. O Grupo Gay da Bahia (GGB) contabilizava na metade da década pas- sada que a cada 2 dias um/a homossexual era morto no Brasil, pelo simples fato de ser homossexual. Já em 2013, o GGB esti- mou a morte de um/a homossexual a cada 28 horas, contabi- lizando 312 assassinatos ao longo do ano. Todavia, para além da situação extrema do assassinato, muitas outras formas de violência menores (mas não menos lesivas) vêm sendo assina- ladas, envolvendo familiares, vizinhos, colegas de trabalho ou de instituições públicas, como a escola, serviços de saúde, as forças armadas, a justiça ou a polícia.

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