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se da linha de costa115. A primeira referência aos Kiriri é datada de 1584. Somente a partir de 1654, na Bahia, sofreram a influência de religiosos, particularmente do Padre João de Barros. As aldeias se concentravam às margens do Rio São Francisco. Apesar de estarem submetidos a várias ordens religiosas, os Kiriri estiveram sob a tutela dos capuchinhos, notadamente, os que vieram de Pernambuco em 1670116.

Em Sergipe, coube aos jesuítas e aos franciscanos o aldeamento e catequese dos Kiriri, sobretudo a partir da segunda metade do século XVII, em Geru, sul de Sergipe. Desse modo, podemos inferir que se houve mesmo a presença desse tipo de grupo indígena na Vila de Lagarto, ao que parece confirmar a antropóloga Beatriz Góis Dantas em outro trabalho117, este jamais foi aldeado e catequizado por jesuítas.

Retomando a questão da presença jesuíta em Sergipe nos primórdios de sua conquista, os religiosos e o capitão Garcia D´Ávila chegaram ao Rio Real no dia 28 de fevereiro daquele ano, 1575. As fontes dão conta de que Gaspar Lourenço, João Salônio e algumas pessoas de sua antiga aldeia que o acompanharam seguiram em visita a aldeias indígenas em território sergipano a uma distância de seis léguas do Rio Real118.

A distância atual entre Lagarto e o Município de Rio Real é de 108 km. Hoje, uma légua equivale a 6.600 metros. No período colonial, uma légua podia variar entre 4 e 7 mil metros. No Nordeste, durante anos, chegou a equivaler a 6 km. Considerando essa última medida, a distância entre Rio Real e Lagarto seria, à época, de 18 léguas. Assim, a Aldeia de São Tomé não poderia, a nosso ver, estar localizada nas proximidades do Povoado Santo Antônio, na antiga Vila de Nossa Senhora da Piedade do Lagarto.

115

DANTAS, Beatriz Góis. Missão Indígena do Geru. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju, n. 28, 1979-1982. p. 66.

116 DANTAS, Beatriz Góis. Missão Indígena do Geru. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico

de Sergipe. Aracaju, n. 28, 1979-1982. p. 66.

117

DANTAS, Beatriz Góis. A Tupimania na Historiografia Sergipana. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju, n. 29, 1983-1987. p. 43.

118 ALMEIDA, Padre Aurélio Vasconcelos de. Vida do Primeiro Apóstolo de Sergipe: Padre Gaspar

Lourenço. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju, n. 21, 1951-1954, p. 173.

Curioso notar, ainda, como Adalberto Fonseca omite uma informação muito importante, como a criação de uma escola para crianças indígenas, segundo o Padre Aurélio Vasconcelos, a primeira que houve em Sergipe, cujo nome foi “Escola de São Sebastião, tendo como primeiro Mestre o companheiro de Gaspar Lourenço, o Irmão João Salônio119”.

É sabido também, que a rota de Gaspar Lourenço e seus amigos compreendeu, além das proximidades do Rio Real, a aldeia do Cacique Surubi, onde ergueu uma igreja em honra a Santo Inácio, na atual cidade de Itaporanga-SE; na mesma região, fundou, ainda, um orago dedicado a São Paulo, “junto ao mar”120, nas terras que seriam do Cacique Serigy, cujo nome dará inspiração para a atual alcunha de Sergipe. A julgar pelos escritos do Padre Aurélio, à luz da Carta de Tolosa121 e de Serafim Leite122, sobre os quais também nos debruçamos para fundamentar as questões aqui expostas, o missionário português percorreu uma extensão de terra que se circunscreveu entre as localidades de Rio Real, Santa Luzia, Tomar do Gerú, Indiaroba, Estância e Itaporanga, sem a mínima condição e notícia de ter estado nas terras que hoje correspondem ao Povoado Santo Antônio, no município de Lagarto.

Como se vê, a descrição não combina com as condições geográficas da antiga Vila do Lagarto, sobretudo por seu isolamento característico e distância de regiões marítimas e próximas aos rios Vaza-Barris e Sergipe. Nesse sentido, vale destacar o que afirma o Padre Aurélio Vasconcelos:

A aldeia de S. Tomé continuou sendo o centro das primeiras atividades missionárias no território sergipano, com ares de metrópole improvisada na

119 A respeito de João Salônio, afirma Padre Aurélio: “O Pe. Gaspar Lourenço ao nomeá-lo no magistério

dessa escola representava, então, o papel de primeira autoridade escolar de Sergipe”. Cf. ALMEIDA, Padre Aurélio Vasconcelos de. Op. cit. p. 175. Fato este, também referendado por Maria Thetis Nunes em História da Educação em Sergipe. 2 ed. São Cristóvão-SE: EDUFS, 2008. p. 22.

120 ALMEIDA, Padre Aurélio Vasconcelos de. Op. cit. p. 181.

121 Versão digitalizada do acervo do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE).

122 LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil. Tomo I. Lisboa: Livraria Portugália,

floresta [grifos nossos], como se fôra a primeira capital histórica do Estado de Sergipe, levantada por seu primeiro Apóstolo123.

Observe-se que em nenhum momento se usa o termo Tapera de São Tomé como o quis Adalberto Fonseca, o que nos leva a crer, a priori, não haver nenhuma relação entre o Povoado Tapera dos Modestos e Taperinha com a antiga aldeia de São Tomé, de Gaspar Lourenço. O cenário de dominação religiosa da Igreja Católica seguido de uma bem sucedida operação militar proposto pelo historiador Adalberto Fonseca vale mais para a região do Vale do Cotinguiba do que para Lagarto, cujo mote parece ser a conquista do interior sergipano pelo tangimento do gado e subsequente presença de religiosos.

Descartada, assim, a hipótese da presença jesuítica na Vila de Nossa Senhora da Piedade nos primórdios da colonização de Sergipe, vale destacar como se deu efetivamente a conquista religiosa de Lagarto, sobretudo a devoção a Santo Antônio e subsequente devoção a Nossa Senhora da Piedade, Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, para, enfim, compreender a presença do catolicismo nessas terras do interior sergipano.

As missões do Rio Real e Sul-Norte da Capitania de Sergipe D´El Rei levadas a cabo pelos jesuítas na segunda metade do século XVI, de algum modo, lograram êxito, inclusive porque interessava ao Capitão Garcia D´Ávila ter passe livre para tanger o gado para o sertão. Lagarto se insere nesse processo.

A exemplo do que ocorreu com as demais partes dos primórdios do Brasil Colônia, em Sergipe seguiu-se a doação de sesmarias, notadamente aos envolvidos, juntamente com Cristóvão de Barros, na conquista e fundação do território da Capitania de Sergipe D´El Rei como se convencionou chamar-se. Coube ao Capitão-Mor e então Governador Providencial, Diogo de Quadros fazer essa distribuição, particularmente, entre os que vieram para Sergipe na companhia do conquistador.