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4. Qualidade em Saúde

4.3. Benchmarking

4.3.2. Impacto da avaliação de indicadores de benchmarking

Tal como em muitos outros aspetos da qualidade em saúde, as evidências do impacto (positivo ou negativo) da avaliação de indicadores em saúde é escassa. Alguns estudos têm sido conduzidos, focando o impacto da avaliação de indicadores, bem como o impacto da divulgação dos resultados deste tipo de avaliação, contudo os resultados têm-se mostrado maioritariamente inconclusivos.

A AHRQ desenvolveu um estudo de avaliação do uso dos seus indicadores de qualidade, bem como de outros indicadores em utilização nos Estados Unidos da América (EUA) [56], não tendo sido encontrado evidência de impactos significativos. O estudo foi desenvolvido seguindo o método de entrevista a utilizadores dos AHRQ QI, a indivíduos que desenvolvem outros indicadores similares e a “vendedores” de ferramentas que permitem a avaliação da qualidade. Da amostra estudada, apenas uma organização revelou ter medido o impacto dos AHRQ QIs [57], estudo no qual se revelaram evidências de que a avaliação dos cuidados de saúde nesta IS e respetiva divulgação pública melhorou a qualidade das áreas clínicas, melhoria esta que parece ter sido conduzida pela preocupação dos administradores hospitalares com a reputação da IS (e que levou à aposta na implementação destes indicadores). Alguns dos indivíduos entrevistados revelaram que nas suas IS ainda é cedo para conseguir observar qualquer impacto, bem como outros revelaram que o facto de os indicadores serem atualizados frequentemente dificulta a avaliação

de impacto. Por fim, alguns entrevistados revelaram ainda que, na sua opinião, os AHRQ QIs têm algum impacto na melhoria do processo, mas que não é visível uma melhoria nos resultados.

Nielson et al. [58], utilizando os dados recolhidos pelo IKAS, na Dinamarca, mostrou que uma melhor qualidade dos cuidados de saúde prestados aos doentes hospitalizados com fratura da anca parece estar associada a uma menor taxa de mortalidade.

Hibbert et al. [59] reviram a literatura acerca dos indicadores de performance usados para a divulgação pública do desempenho das IS. Neste estudo, as evidências do impacto da divulgação dos resultados dos indicadores na qualidade dos cuidados de saúde também foram pouco conclusivas. Se por um lado, os resultados indicam que os indicadores promovem melhorias organizacionais, por outro lado, a sua divulgação pode condicionar o desempenho das IS, levando a que se concentrem maioritariamente na procura de bons resultados nos indicadores e não na melhoria da prestação de cuidados de saúde propriamente dita. Neste estudo, foi ainda notada a pouca evidência de que os utentes utilizem realmente a informação que está ao seu alcance no processo de escolha da IS.

O estudo do Monitor sobre impacto dos Cost Improvement Plans (CIP) [60] na qualidade dos cuidados de saúde prestados corrobora resultados anteriores. Nestes planos são estudados uma grande variedade de indicadores, que se focam em medidas como a falta de doença, o tempo gasto pelos prestadores em trabalhos temporários, avaliação dos prestadores ou a rotatividade dos mesmos. Depois é comparado o valor dos indicadores tendo em conta o desempenho e o número de profissionais envolvidos, permitindo uma medida da produtividade nesta IS e, consequentemente, tomar medidas para aumentar a mesma. Deve existir ainda a monitorização dos CIPs, com especial atenção para as medidas de impacto sobre os utentes, como as taxas de mortalidade, as reclamações ou as escolhas dos mesmos. Apesar dos CIPs teoricamente permitirem identificar formas de melhorar a produtividade e a qualidade, o estudo não encontrou evidência empírica a suportar esta relação.

A Organization for Economic Co-operation and Development (OECD) publicou uma revisão [61] à qualidade dos cuidados de saúde dinamarqueses, considerando este país como um dos pioneiros nas iniciativas centradas na qualidade em saúde. Mesmo tendo a Dinamarca um sofisticado leque de mecanismos de controlo da qualidade (como o IKAS), o sistema de saúde deste país pode ser melhorado, não havendo evidência empírica de que a centralização do utente no sistema de saúde esteja realmente a ser aplicada e, por isso, o foco no utente deve ser reforçado. O facto de se divulgarem os resultados publicamente também deverá ter as suas

vantagens: afeta positivamente a qualidade dos processos e dos resultados; motiva os hospitais e os prestadores a melhorar os seus serviços; dá a oportunidade aos utentes de fazerem uma escolha ponderada (mesmo não havendo resultados práticos de que isto aconteça) [62].

Em 2014, a Care Quality Comission (CQC) implementou algumas modificações [63] no seu modelo de inspeção, monitorização e avaliação dos Adult Social Care (ASC) services britânicos. As modificações ao nível da precisão do registo e no rigor da inspeção (com a atribuição de diferentes níveis de rating) terão um maior impacto sobre os utentes, dando-lhes maior confiança nos prestadores, confiando maior atenção às sugestões e críticas destes e conferindo maior informação sobre as IS para uma tomada de decisão ponderada. Contudo, também os prestadores de saúde ver-se-ão positivamente afetados pelas medidas da CQC, uma vez que terão mais informação disponível acerca dos seus serviços, bem como uma voz ativa nas decisões acerca da atividade do seu serviço e confiança na qualidade do serviço em que trabalham. Apesar das diversas vantagens apontadas, estas são apenas teóricas, faltando evidência empírica de que estas existam e se façam sentir na prática dos cuidados de saúde.

Contrariamente à evidência inconclusiva anteriormente apresentada, um estudo com dados do Houston Methodist Hospital [64] mostrou resultados extremamente animadores ao nível do impacto da utilização dos AHRW QIs. Neste estudo foi revelada uma redução da taxa de mortalidade associada à sepsis de 36,0 % (2009) para 12,2 % (2013), o que se traduziu em 672 vidas salvas. Sabendo que a sepsis é a sexta razão mais comum para a hospitalização bem como estando associada a que o tempo de internamento seja duas vezes maior do que seria expectável, estes resultados são de extrema relevância. A utilização dos AHRW QIs permitiu observar a diferença entre a forma como as práticas médicas são realizadas na IS e a forma como estas deveriam ser realizadas. Assim, este conjunto de medidas conduziu a uma menor mortalidade, a um menor tempo de internamento e a uma redução dos custos na IS.

Em 2015, o relatório da HealthGrades [65], agência norte-americana que agrupa os hospitais consoante os seus resultados clínicos (3 níveis: melhor do que esperado – cinco estrelas -, como esperado – três estrelas - ou pior do que esperado –uma estrela), mostrou algumas evidências relevantes. De forma geral, se todos os hospitais fossem classificados com o nível 5 (resultados específicos melhores do que esperado), 228426 vidas poderiam ser salvas entre 2011 e 2013. Para além destes números, que representam a totalidade do hospital, também foram retiradas neste estudo conclusões mais específicas, como por exemplo no caso da taxa de

mortalidade associada à sepsis que é 13,4 % nos hospitais com cinco estrelas e de 23,1 % nos hospitais com uma estrela.

Comparando as conclusões relativamente à sepsis referidas no relatório da HealthGrades com as que foram retiradas em Houston, pode-se fazer um paralelismo entre os Hospitais com cinco estrelas e os hospitais depois de aplicarem os AHRQ QIs, uma vez que se verifica que quanto “maior a qualidade” do hospital, menor a taxa de mortalidade (em qualquer um dos referenciais de avaliação da qualidade referidos). Outras variáveis que se viram diminuídas neste estudo comparativo entre hospitais com cinco ou uma estrela foram a taxa de mortalidade associada a ataque cardíaco, pneumonia, cirurgias coloretais, AVC ou doença pulmonar obstrutiva crónica e a taxa de complicações média associada à substituição total do joelho, substituição da anca, cirurgia carótida ou cirurgia de remoção da vesícula biliar. Assim, devem ser tomadas medidas de melhoria da qualidade por todos os hospitais, mas especialmente nos hospitais com uma estrela, uma vez que são aqueles em que há um maior risco de morte associado a diversos procedimentos clínicos.

Apesar de continuar a haver poucas evidências do impacto dos indicadores de qualidade nos cuidados de saúde, os poucos estudos realizados com evidências do impacto dos indicadores mostram o potencial das melhorias da qualidade se traduzirem em vidas salvas, que é o principal objetivo do trabalho de qualquer IS, bem como providenciar informação para os utentes sobre aqueles hospitais que prestam melhores cuidados de saúde e, desta forma, permitir que estes façam uma escolha informada (embora esta tomada de decisão com base na informação de indicadores de avaliação dos cuidados de saúde ainda não tenha resultados práticos que comprovem os objetivos teóricos).

4.4. Intervenção Regulatória da ERS

Nas mais recentes atribuições da ERS publicadas no Decreto-Lei nº126/2014, de 22 de Agosto, no artigo 14º, alínea d, é referido que incumbe à ERS “Verificar o não cumprimento das obrigações legais e regulamentares relativas à acreditação e certificação dos estabelecimentos”, atribuição esta que já estava presente no Decreto-Lei nº127/2009, de 27 de Maio, no artigo 36º, alínea d.

Apesar da acreditação e certificação serem processos voluntários, no Despacho nº399/2009, de 7 de Janeiro, é referido que deverá estar implementado um sistema de qualidade (em Laboratórios de Anatomia Patológica, no caso do despacho referido), optando os laboratórios pela implementação da certificação ISO 9001 para este fim. Para além desta utilização da norma

ISO 9001, também na Portaria nº165/2014, de 21 de Agosto (que se refere aos Laboratórios de Anatomia Patológica), se enuncia que “as normas de qualidade e segurança devem ser cumpridas em todas as situações previstas no presente diploma de acordo com as regras, os códigos científicos e técnicos internacionalmente reconhecidos”, normas estas presentes nos requisitos da certificação ISO 9001, pelo que, se um laboratório implementou esta certificação, certamente estará a cumprir o enunciado nesta portaria.

Assim, facilmente se conclui que, embora não haja uma obrigatoriedade legal direta, há várias legislações vigentes em Portugal que, indiretamente, direcionam o caminho dos laboratórios na direção da certificação. Desta forma, é importante averiguar se realmente está a haver uma implementação da certificação ISO 9001 em laboratórios ou outras unidades equivalentes.

Ainda no Decreto-Lei nº126/2014, de 22 de Agosto, no artigo 10º, apresentam-se os objetivos gerais da atividade reguladora da ERS, sendo de salientar a alínea d: “Zelar pela prestação de cuidados de saúde de qualidade”. Tendo em conta que o objetivo da acreditação e certificação é a avaliação das IS, com os mais altos padrões de qualidade, a verificação das entidades que se encontram certificadas e/ou acreditadas, vem de encontro ao desempenho desta tão importante função que se encontra nas atribuições da ERS.

Considerando a diversa legislação referida, a realização deste estudo não poderia ser mais oportuna, uma vez que vai mostrar que IS é que se encontram certificadas e/ou acreditadas, bem como algumas das razões que as levam a seguir este caminho.

5. Retrato da Situação Portuguesa em Matéria de Certificação