• Nenhum resultado encontrado

4. Qualidade em Saúde

4.2. Acreditação/Certificação

4.2.5. Impacto da Certificação/Acreditação

Apesar de haver um cada vez maior número de IS certificadas/acreditadas, há ainda pouca evidência dos benefícios que a implementação de um programa voluntário traz para a IS.

Greenfield e Braithwaite [41] analisaram 66 estudos relativos ao impacto da acreditação, dividindo as conclusões encontradas em dez categorias. Em duas categorias (promoção da mudança e desenvolvimento profissional) foram encontradas evidências de que realmente a acreditação traz impacto positivo para a IS. Em cinco categorias (atitude dos profissionais perante a acreditação, impacto organizacional, impacto financeiro, medidas de qualidade e avaliação do programa) não foram encontradas evidências fortes do impacto da acreditação, sendo que os estudos apresentam evidência mista e pouco robusta. Por fim, em três categorias (satisfação do paciente, divulgação pública e problemas de auditoria) concluíram não existir número suficiente de estudos que permitisse tirar quaisquer conclusões.

Llewellyn et al. [42] analisaram 56 estudos que focavam o impacto da certificação/acreditação nas IS. A maioria dos estudos analisados notaram um impacto positivo na melhoria da gestão institucional (nomeadamente na comunicação entre os profissionais ou na gestão das emergências e do risco) e nas práticas dos profissionais. Contudo, a atitude dos profissionais perante a acreditação tanto levanta aspetos positivos como negativos (principalmente

o aumento da carga de trabalho). Tal como no estudo anterior, estes autores notaram a inexistência de estudos para avaliar o impacto nos resultados e na satisfação dos utentes.

Alkhenizan e Shaw [8] analisaram 26 estudos que focavam o impacto da acreditação especificamente na prestação de cuidados de saúde, nomeadamente no enfarte agudo de miocárdio, traumatismo, cirurgia de ambulatório, controlo de infeção e gestão da dor. A maioria dos estudos mostraram que os programas de acreditação gerais melhoram significativamente os resultados clínicos, bem como os programas de acreditação que focam especialidades específicas, e também conduzem a uma melhoria dos resultados nestas especialidades. Estes resultados contrariam o encontrado previamente por Greenfield e Braithwaite [41]. Contudo, é de notar que o trabalho de Alkhenizan e Shaw apenas focou 26 estudos, num número limitado de especialidades.

Mais recentemente, Almasabi, Yang e Thomas [43] analisaram 20 estudos que focavam a satisfação dos utentes, dividindo-os em três tipos: satisfação dos utentes entre IS acreditadas e não acreditadas, satisfação dos utentes antes e depois da acreditação e envolvimento dos utentes no processo de acreditação. De acordo com os resultados dos autores, a evidência produzida não suporta a hipótese da existência de impacto da acreditação na satisfação dos utentes. O atual foco dos processos de acreditação no paciente pode, pelo menos em parte, justificar este resultado, quando comparado com os estudos anteriores.

Suñol et al. [44] estudaram o impacto de sistemas de avaliação da qualidade em quatro dimensões (procedimentos clínicos, segurança, foco no utente na IS em geral e foco no utente nos diferentes serviços) em 389 IS em oito países europeus. Em todas as quatro dimensões foi encontrado um impacto positivo dos programas, contudo estas dimensões precisam de ser mais estudadas futuramente.

Shaw et al. [10] procuraram descobrir se a acreditação e a certificação ISO conduziam a melhores resultados nas IS que os implementavam. Para tal, foi analisada a conformidade com certos critérios de qualidade em 89 hospitais em seis países europeus. Os resultados mostraram que hospitais com acreditação ou certificação ISO tinham melhores desempenhos que hospitais sem qualquer referencial de avaliação da qualidade. Foi ainda notado que os hospitais acreditados tinham melhor conformidade que os certificados na gestão hospitalar, segurança do paciente e prática clínica (Figura 1), o que pode ser justificado pelo facto de a acreditação ser específica para hospitais, enquanto a certificação é desenhada para sistemas de gestão da qualidade em geral. Não se notaram vantagens específicas quando ambos os tipos de referencial de avaliação da

qualidade estão implementados. Estas evidências poderiam ser mais reforçadas se tivesse sido utilizada uma amostra maior e se clarificassem os conceitos de certificação e acreditação, já que os mesmos são muitos variáveis entre pessoas, organizações e países.

Figura 1 – Comparação entre o desempenho de hospitais acreditados, certificados e sem nenhum referencial em várias dimensões [3].

Num outro estudo, Shaw et al. [45] estudaram o efeito da certificação e acreditação em áreas específicas de 73 hospitais de sete países. As áreas clínicas que decidiram estudar foram o enfarte agudo de miocárdio, o Acidente Vascular Cerebral (AVC), a fratura da anca e os cuidados obstétricos, em dimensões como a liderança clínica, a segurança do paciente, a revisão clínica e a prática clínica. Foi notado que a acreditação e a certificação favorecem as três primeiras, mas não a última, já que estes focam estruturas e processos, mas não na prestação específica de cuidados de saúde. Foi, ainda, notado que quando a acreditação e a certificação estão implementadas no mesmo hospital, este tem uma melhor performance nas áreas estudadas, o que pode mostrar que ambos os referenciais têm benefícios próprios que não são partilhados entre si. Contudo, a interpretação destes conceitos e normas é muito variável, pelo que as conclusões não são muito robustas.

Devkaran e O’Farrell fizeram um estudo pioneiro nos Emirados Árabes Unidos [46] em que foi investigada a performance de um hospital relativamente à acreditação ao longo do tempo (e não comparando dois pontos apenas – antes e depois da acreditação, por exemplo). Esta avaliação mostrou que há uma melhoria da qualidade na preparação para a acreditação, que sofre

um ligeiro declínio após a obtenção da mesma, tendendo a estabilizar ao longo dos 3 anos de validade da acreditação (Figura 2).

Figura 2 – Percentagem de conformidade com medidas de qualidade num hospital dos EAU desde a preparação para a acreditação até ao final da validade da mesma[46].

Relativamente a Portugal, poucos estudos foram realizados pelo que pouco se sabe do impacto das certificações/acreditações nas IS. Um estudo bastante interessante foi desenvolvido em 2008 por Boto, Costa e Lopes [47], comparando a taxa de mortalidade intra-hospitalar, ajustada pelo risco, entre hospitais envolvidos e não envolvidos em processos de acreditação e/ou benchmarking. Para isso, foram tidos em conta os resumos de alta entre 2001 e 2006, ajustados consoante a gravidade do doente, de hospitais envolvidos em processos de acreditação e/ou benchmarking. Os autores concluíram que não existem diferenças estatisticamente significativas na taxa de mortalidade entre os hospitais considerados.

Ressalva-se, novamente, que é importante explicitar o conceito de acreditação, já que o mesmo é muito variável entre países, pelo que uma comparação entre hospitais de países diferentes pode levar a conclusões que não são tão claras como poderão parecer. Assim, recomenda-se que se faça uma análise entre hospitais do mesmo país ou que se faça uma clarificação/acordo entre países (por isso exemplo, ao nível da União Europeia) para a definição de acreditação, embora este processo envolva bastantes constrangimentos.

Apesar de não haver conclusões que se vejam confirmadas em vários estudos, os referenciais de avaliação da qualidade deverão promover a mudança organizacional, o desenvolvimento das capacidades dos profissionais, bem como a melhoria da performance clínica, não havendo um impacto claro na satisfação dos utentes, pelo que é importante desenvolver mais

estudos que foquem estas temáticas, principalmente a satisfação dos utentes, que é o foco da maioria destes referenciais.